Acórdão nº 367/21.7T8MNC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 29 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelJOAQUIM BOAVIDA
Data da Resolução29 de Setembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório 1.1. M. P.

intentou ação sob a forma de processo especial, de divisão de coisa comum, contra M. R.

, alegando que Requerente e Requerido são comproprietários, em partes iguais, do prédio urbano composto de casa de morada de rés de chão e primeiro andar, com rossios, situado no lugar de ..., ..., Monção, inscrito na matriz predial urbana da União de Freguesias de Monção e ... sob o artigo ... (correspondente ao anterior artigo urbano ... da freguesia de ...) e descrito na Conservatória do Registo Predial de Monção sob o nº …/19930709 – ..., com o valor patrimonial de € 42.560,00, e que a aquisição resultou da adjudicação operada no inventário para partilha dos bens comuns do casal, em consequência da dissolução por divórcio do casamento de ambos, que correu termos sob o nº 83/21.0T8MNC.

Mais alega que o prédio é integrado por uma casa para habitação, unifamiliar, comunicando o rés do chão com o primeiro andar por escadas interiores, e com rossios circundantes, sendo, por sua própria natureza e no estado em que se encontra, indivisível em substância; a sua autonomização em duas frações autónomas não é viável, quer porque a divisão obrigaria a obras vultuosas, sujeitas a licenciamento municipal, com a realização das quais a Requerente não está de acordo, quer porque a divisão determinaria o seu detrimento e a perda do seu valor, e a Requerente nunca estaria de acordo nessa autonomização e propriedade horizontal.

Conclui que o prédio deverá ser adjudicado ou, não havendo acordo, proceder-se à sua venda, terminando pedindo que seja definida a indivisibilidade do prédio, fixar-se a quota parte da Autora e do Réu na compropriedade do imóvel, na proporção de metade para cada um, prosseguindo os autos para a conferência prevista no artigo 929º do CPC.

*1.2.

Contestou M. R.

, alegando que o prédio é divisível em substância, em duas frações autónomas, por o imóvel reunir todos os requisitos enunciados no artigo 1415º do Código Civil, uma vez que o rés do chão e o 1º andar constituem unidades independentes, isoladas, separadas por placas de cimento, tijoleira e vigas, cada uma delas com saída própria e direta para os rossios do prédio, e daí, diretamente, para a via pública.

Mais alega que a autonomização do prédio em duas frações é viável e a sua divisão não importaria obra vultuosa, importando apenas a realização de «pequenos ajustes e pequenas obras de pouco relevo económico».

*1.3.

Findos os articulados, o Tribunal recorrido determinou a realização de perícia e a obtenção de informação junto da Câmara Municipal de ....

Produzida a prova indicada, proferiu-se decisão com o seguinte teor, na parte relevante para a apreciação do objeto do recurso: «Nos termos do disposto no artigo 926.º, n.º 4 do Código de Processo Civil, ainda que as partes não tenham suscitado a questão da indivisibilidade, o juiz conhece dela oficiosamente, determinando a realização das diligências instrutórias que se mostrem necessárias.

O conceito de divisibilidade ou indivisibilidade de um prédio é um conceito jurídico, fixado no artigo 209.º do Código Civil: são divisíveis as coisas que podem ser fraccionadas sem alteração da sua substância, diminuição de valor ou prejuízo para o uso a que se destinam.

Para decidir da divisibilidade ou indivisibilidade de um prédio, tem que se atender ao que ele é e não ao que poderá vir a ser.

Assim, e seguindo o entendimento plasmado no acórdão citado pela autora, Não é legitimo a um comproprietário de um prédio utilizar a acção de divisão de coisa comum para, com o concurso do tribunal, mas sem a concordância dos demais comproprietários, proceder à constituição da propriedade horizontal, sem o acordo de todos os comproprietários.

Na verdade, “Excede manifestamente os poderes de um dos comproprietários, actuando por si só, alcançar o efeito decretado em primeira instância, já que a alteração que supõe quanto à estrutura e natureza do prédio ultrapassa claramente o âmbito dos poderes de administração que a lei lhe confere (artigos 1407º e 985º, nº 1, do C.C.). A circunstância de um prédio estar em regime de compropriedade não impede a constituição da propriedade horizontal, nem dispensa a intervenção das autoridades administrativas competentes; «apenas impõe, como condição específica, a concordância de todos os titulares (ou o recurso a algum mecanismo de resolução de eventuais divergências, de forma a que se alcance uma vontade juridicamente imputável ao conjunto dos comproprietários) na realização de tais operações” (vide Acórdão do STJ, de 23-09-2008, in www.dgsi.pt.).

Ou seja, não pode ser imposto o regime da propriedade horizontal de um prédio contra a vontade de algum dos comproprietários. Tal imposição ultrapassaria, como se disse, o âmbito dos poderes de administração que o artigo 985º, nº 1, do C.C., aplicável ex vi do artigo 1407º do mesmo diploma legal, confere aos comproprietários.

Ainda que assim não se entendesse, a constituição de unidades prediais distintas a partir de um único edifício passa, necessariamente, no nosso sistema jurídico, pela constituição da propriedade horizontal. Constitui condição de procedência da pretensão de divisão a demonstração de estarem satisfeitos os pertinentes requisitos administrativos até ao momento em que o tribunal deva pronunciar-se sobre a questão da divisibilidade.

In casu, do ofício da Câmara Municipal resulta que não estão ainda verificados os requisitos administrativos de constituição da propriedade horizontal, pois que seria necessário a realização de obras.

Assim, ao abrigo das normas citadas, tendo em conta as quotas de cada um dos comproprietários (1/2 cada), o relatório pericial, e a informação técnica da CM (fls. 34 e 34 verso, do teor do qual resulta “considera-se que o edifício poderá ser dividido em propriedade horizontal, devendo para isso serem efectuadas obras de adaptação, de modo a dar cumprimento aos (…) requisitos”) de onde se infere o estado actual do prédio (não sujeito ao regime da propriedade horizontal), a indivisibilidade, cujo conhecimento é oficiosamente imposto, não pode deixar de ser declarada.

Fixam-se as quotas de Autora e Réu em ½ cada.

iii.

Nestes termos, o Tribunal decide: ▪ Declarar a indivisibilidade do imóvel objecto dos autos; ▪ Fixar as quotas de Autora e Réu na proporção de ½ (metade) cada um».

*1.4.

Inconformado, o Requerido M. R.

interpôs recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões: «1.

O Réu não se conforma com o despacho dado pela Meritíssima Juiz “a...

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