Acórdão nº 3371/17.6T8VNF-F.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 27 de Junho de 2019
Data | 27 Junho 2019 |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I – RELATÓRIO 1.1.
Por apenso ao processo de insolvência de Irmãos X – Sociedade de Construções, Lda., decretada por sentença de 23.05.2017, o Administrador da Insolvência apresentou a relação de créditos reconhecidos e não reconhecidos.
Foram apresentadas impugnações, sendo que parte delas foram julgadas procedentes, restando controvertidos os créditos de A. F., M. P., J. F. e F. F..
Notificados para prestar esclarecimentos, vieram A. F. e F. F. referir que não foi fixado prazo para a devolução dos montantes alegadamente mutuados à sociedade a título de suprimentos e que esta teria lugar quando houvesse disponibilidade financeira por parte da sociedade.
*1.2.
Por se ter entendido que o estado dos autos permitia conhecer, desde já, da questão relativa à verificação dos créditos de suprimentos reclamados por A. F.
e F. F., foi proferido saneador-sentença a «julgar improcedente ambas as impugnações e não reconhecer os créditos invocados para efeitos deste processo de insolvência (sem prejuízo de ambos os reclamantes virem a intentar acção como que aquilate da existência do seu direito)».
*1.3.
Inconformado, o credor reclamante A. F.
interpôs recurso de apelação do saneador-sentença e formulou, a terminar as suas alegações, as seguintes conclusões: «1.º O tribunal recorrido fez, no douto despacho saneador, uma incorrecta valoração dos factos e uma ainda menos subsunção dos mesmos às disposições legais, designadamente, do disposto nos artigos 49.º, n.º 2, 90.º e 91.º do CIRE, e 243.º e seguintes do Código das Sociedades Comerciais.
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Em suma, o recorrente, credor, entende que o seu crédito de suprimentos deve ser reconhecido, e sendo o recorrente sócio da aqui insolvente “Irmãos X - Soc. De Construções, Lda.”, esse crédito seria subordinado nos precisos termos do artigo 49.º n.º 2 do CIRE.
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Como tal, não se pode concordar com o despacho saneador, ao determinar que: “não tendo sido fixado prazo para o cumprimento da obrigação, não vemos como os reclamantes possam ser vistos como credores. E, assim sendo, urge julgar improcedente ambas as impugnações e não reconhecer os créditos invocados para efeitos deste processo de insolvência (sem prejuízo de ambos os reclamantes virem a intentar acção como que aquilate da existência do seu direito).
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E, não se pode concordar com a fundamentação do despacho saneador, porque, havendo suprimentos, estes obrigam a sociedade a restituir o dinheiro emprestado pelo sócio, estando o regime jurídico do contrato de suprimento regulado nos artigos 243.º e seguintes do Código das Sociedades Comerciais, constata-se que o suprimento constitui um crédito do sócio em relação à sociedade.
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Existindo o contrato de suprimento, a obrigação de restituir o dinheiro existe, mesmo que não tenha sido fixado prazo para cumprimento dessa obrigação de restituição da sociedade ao sócio.
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O que a lei prevê é um mecanismo específico no caso de não ter sido fixado prazo para o reembolso dos suprimentos, previsto no artigo 245.º n.º 1 do Código das Sociedades Comerciais, mas, a lei não faz depender a validade do contrato de suprimento da fixação de prazo para o cumprimento da obrigação de reembolso do suprimento.
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Sucede que, a sociedade em questão foi declarada insolvente nos presentes autos principais, pelo que, é no processo de insolvência respectivo que tem de se reclamar todos os créditos da insolvente, sob pena dos mesmos não serem admitidos.
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No caso concreto, a sociedade foi declarada insolvente, nos presentes autos, com publicação no CITIUS a 23/05/2017.
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Assim, porque determinado pelo artigo 90.º do CIRE “Os credores da insolvência apenas poderão exercer os seus direitos em conformidade com os preceitos do presente Código, durante a pendência do processo de insolvência”, o credor dos suprimentos reclamou o seu crédito nos respectivos autos de insolvência.
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Neste sentido veja-se o Acórdão do STJ de Uniformização de Jurisprudência n.º 1/2014: Transitada em julgado a sentença que declara a insolvência, fica impossibilitada de alcançar o seu efeito útil normal a acção declarativa proposta pelo credor contra o devedor, destinada a obter o reconhecimento do crédito peticionado, pelo que cumpre decretar a extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, nos termos da alínea e) do art. 287.º do C.P.C.
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Salvo melhor entendimento, e com respeito por opiniões diversas seria inócuo intentar acção judicial para fixação de prazo, tal como sugerida pelo juiz a quo, mesmo que essa acção não seja uma acção declarativa, porque a declaração de insolvência da determina o vencimento imediato das obrigações da insolvente, nos termos do artigo 91.º do CIRE, por maioria de razão também o crédito do sócio relativo ao reembolso dos suprimentos pela insolvente está vencido.
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Ademais, o artigo 245.º n.º 3 do Código das Sociedades Comerciais prevê especificamente essa possibilidade, dizendo que “os suprimentos só podem ser reembolsados aos seus credores, depois de inteiramente satisfeitas as dívidas daquela para com terceiros”.
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Este artigo, basicamente, corresponde ao vertido no artigo 49.º n.º 2 do CIRE, ao determinar que devem ser reconhecidos os créditos de suprimentos, mas os mesmos devem ser qualificados como créditos subordinados, com as consequências legais daí decorrentes.
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Na prática, pode não haver dinheiro para pagar os suprimentos, mas, por lei os mesmos devem ser admitidos na reclamação de créditos e qualificados como subordinados, como é de Direito, o que desde já se pede.
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Em suma, porque foi reclamado pelo credor o crédito de suprimentos na reclamação de créditos da insolvente deve o respetivo crédito ser reconhecido e qualificado como subordinado e em consequência substituir a decisão do tribunal a quo por uma...
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