Acórdão nº 1485/18.4T8BGC-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelANIZABEL SOUSA PEREIRA
Data da Resolução10 de Outubro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES:*I- RELATÓRIO: Veio a Autora, (…) Lda., instaurar acção especial de destituição de gerente contra os Réus, (…) e (…) Lda., peticionando a destituição definitiva como gerente da 2ª Demandada do 1º Demandando, A. S., bem como a sua suspensão imediata do exercício das funções de gerência da 2ª Ré com a consequente condenação na entrega imediata das chaves da sede e do estabelecimento comercial “Restaurante P.” explorado pela aludida sociedade.

Alegou, para o efeito, que a única actividade desenvolvida pela 2ª Ré prende-se com a exploração do predito “Restaurante P.”, o qual foi trespassado para tal sociedade pela Sociedade Autora em 6 de Abril de 2017, nessa sequência, passando o aludido estabelecimento comercial a ser gerido de forma exclusiva pelo Réu, A. S..

Mais referiu a Autora que, no âmbito de uma inspecção da ASAE no decurso de uma fiscalização do aludido restaurante, verificou-se que, em tal restaurante, eram mantidos alimentos adulterados e fora do prazo de consumo que se destinariam a ser comercializados para consumo público, o que conduziu à constituição como arguidos dos Réus em inquérito criminal, no âmbito do qual foi aplicado o instituto da suspensão provisória do processo. Esclareceu ainda a Demandante que o conhecimento público de que, no referido restaurante, estariam a ser mantidos alimentos adulterados e fora de prazo afectou sobremaneira a reputação e a imagem que a população de Bragança tinha do aludido estabelecimento comercial, constituindo uma infracção grave dos deveres contidos no artigo 64º do CSC que, enquanto gerente, o 1º Réu, se encontrava vinculado a cumprir, sendo certo que este também não zelou pela apresentação das contas relativas ao exercício de 2017, o que também traduziria a violação do dever previsto no artigo 65º nº1 e 5 do CSC.

Concluiu que tais factos afectavam irremediavelmente a confiança da Autora, sócia da 2ª Ré, no 1º Réu, enquanto gerente da 2ª Demandada, justificando a respectiva suspensão imediata de funções.

*Em sede de Contestação, alegaram os Réus, por excepção, que, tendo a sociedade Demandada sido constituída em 17/2/2017, apenas o 1º Demandado, A. S., procedeu à entrega do valor da sua entrada nos cofres da sociedade, não tendo o sócio da Autora, E. C., feito o mesmo, sendo certo que, posteriormente, cedeu a respectiva quota à Demandante sem que, para o efeito, tivesse havido lugar a qualquer deliberação e, como tal, consentimento da Sociedade Ré, o que tornaria tal cessão de quotas ineficaz com a consequente ilegitimidade activa da Demandante para requerer a suspensão e a destituição do 1º Réu como gerente da 2ª Ré.

Mais alegaram os Réus, ainda por excepção, que o negócio de cessão de quota supra aludido seria nulo por simulação, visando apenas afastar do património do aludido sócio da Autora, E. C., a respectiva participação na sociedade Ré, do que resultaria igualmente a referida ilegitimidade activa da Demandante para instaurar o presente processo.

Referiram ainda os Réus que a Sociedade Autora não adoptou qualquer deliberação no sentido de instaurar a presente acção, o que também constituiria motivo para a absolvição da instância daqueles.

Finalmente, e quanto aos motivos invocados pela Autora para a suspensão do 1º Réu do cargo de gerente, esclareceram os Demandados que o restaurante “P.” explorado pela 2ª Demandada constituiria um restaurante recomendado pela Guia Michelin, sendo motivo de vários artigos de jornais, fruto da reputação do 1º Réu como chefe de renome, sendo certo que o episódio ocorrido aquando da inspecção da ASAE, não só nada teria afectado tal reputação, como se teria devido ao sócio da Autora, E. C., o qual havia deixado os referidos alimentos adulterados e fora do prazo de consumo numa arca existente no estabelecimento, não se destinando, pois, estes ao consumo dos clientes.

Por último, salientaram os Réus que a Autora nunca pediu à contabilidade da 2ª Ré quaisquer documentos contabilísticos, recusou comparecer a assembleias gerais, pelo contrário, fruto das desavenças entre os referidos E. C. e o 1º Réu, A. S., aquele tem vindo a adoptar uma atitude de ataque à imagem dos Demandados e do Restaurante P..

Concluiu no sentido da improcedência do pedido de suspensão do 1º Réu como gerente da 2ª Ré.

*Dispondo o artigo 1055º do CPC no sentido de que, sendo requerida a suspensão do exercício do cargo de gerente, o Tribunal deveria decidir imediatamente tal questão após realização das diligências necessárias, foi realizado julgamento com audição das testemunhas arroladas pelas partes.

No decurso do julgamento, foram admitidos 2 articulados supervenientes deduzidos pela Autora referentes ao facto de o restaurante “P.” explorado pela Segunda Ré e gerido pelo 1º Réu ter estado encerrado durante sensivelmente 1 mês (em Fevereiro de 2019), bem como ter anunciado na página do respectivo Facebook que, a partir de Março de 2019, estaria aberto apenas para a realização de eventos. Foi produzida prova também quanto a tais factos supervenientes.

Mantendo-se a instância válida, cumpre proferir decisão de mérito quanto ao referido pedido cautelar.

*Após a competente audiência de julgamento, foi proferida decisão de mérito quanto ao referido pedido cautelar, nos seguintes termos: “ I- Absolver da instância a 2ª Ré, A. S. & E. C., Lda., ao abrigo do disposto nos artigos 30º, 577º alínea e) e 278º alínead) do CPC, bem como do artigo 257º nº5 do CSC.

  1. Absolver o 1º Réu, A. S., do pedido cautelar de suspensão do exercício do cargo de gerente da 2ª Ré, A. S. & E. C., Lda.

  2. Condenar a Autora em custas, a atender a final (artigos 527º nº1 do CPC, 7º e 30º do RCP).

.” *É do ponto II daquela decisão ( não procedência do pedido cautelar de suspensão do exercício do cargo de gerente do 1º R) que vem interposto recurso pela sociedade A, a qual termina o seu recurso formulando as seguintes conclusões: 1ª. A Autora, ora Recorrente, não se conforma com a douta decisão proferida em 5-4-2019, que, no que diz respeito à parte da ação agora em causa, relativa ao pedido de suspensão de gerente, determinou “II. Absolver o 1º Réu, A. S., do pedido cautelar de suspensão do exercício do cargo de gerente da 2ª Ré, A. S. & E. C., Lda”, considerando que, em face da materialidade constante dos autos, dos factos provados, e ainda dos factos supervenientes à douta sentença (já perspetivados pela Autora no decurso dos autos) a douta sentença recorrida não fez a melhor interpretação e aplicação das normas jurídicas vigentes e pertinentes. São FUNDAMENTOS: 2ª. Conforme resulta da petição inicial, foram essencialmente dois os fundamentos pelos quais a Autora peticionou a suspensão do gerente A. S. nos termos previstos no artº 257º, nºs 4 a 6, do mesmo CSC.

  1. O PRIMEIRO FUNDAMENTO tem a ver com o facto da sociedade “A. S. & E. C., Lda” explorar um estabelecimento de restauração denominado “Restaurante P.”, sito no Largo ...

    , em Bragança, o que faz na prossecução do seu objeto social e que constitui a sua única atividade e, no dia 28 de setembro de 2018, pelas 11.20 h, a Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE) ter procedido a uma fiscalização ao Restaurante P., no âmbito da qual foram detetadas uma série de graves anomalias nos respetivos géneros alimentícios existentes para utilização confeção das refeições, que reconduziu à imposição da respetiva destruição. Tais factos, na perspetiva da Autora, traduziram designadamente violação grave dos deveres de cuidado e de lealdade do gerente previstos no artº 64º do Código das Sociedades Comerciais e levaram á total quebra de confiança da Autora / sócia no gerente da sociedade; 4ª. O SEGUNDO MOTIVO traduziu-se no facto de, não obstante a “A. S. & E. C., Lda” ter sido constituída em 17-02-2017, aquele mesmo gerente A. S. não ter apresentado ainda as contas relativas ao exercício de 2017, a que, na perspetiva da Autora, traduz também a violação o dever de relatar a gestão e apresentar contas, previsto nos artº 65º, nºs 1 e 5, CSC.

  2. Ocorre que, porque não foram efetivamente apresentadas, o gerente A. S. não provou que apresentou as contas da “A. S. & E. C., Lda” relativas ao exercício de 2017, ónus que lhe competia nos termos do artº 342º, nº 2, do Código Civil.

  3. Todavia, a douta sentença não conheceu minimamente sobre tal facto, não o tendo elencado nos factos provados ou não provados (limitando-se a dar como provados os factos 29 e 30, que nada aludem àquela obrigação de prestação anual de contas da sociedade por parte do gerente), o que constitui nulidade da douta sentença, por omissão de conhecimento daquele facto, o que se invoca nos termos do artº 615º, nº 1, al. d), do CPC.

  4. Em consequência, deverá agora DAR-SE COMO PROVADO que “O gerente A. S. não apresentou as contas da sociedade “A. S. & E. C., Lda” relativas ao exercício de 2017”, o que respeitosamente se requer, nos termos do artº 662º, nº 1, do CPC.

    Sem prescindir: 8ª. Tendo em conta a factualidade dada como provada na douta sentença sob os pontos 7, 8, 9, 14, 15, 16, 16, 17, 18, bem como nos pontos 10, 22 e 23, e ainda 27 e 28 (esta decorrente da apresentação de dois articulados supervenientes por parte da Autora / cfr. fls 3 da douta sentença e Atas da audiência de discussão e julgamento de 22-2-2019 e 22-3-2019), dos autos resulta designadamente apurado que: .

    Na prossecução do respetivo objeto social e como única atividade por si desenvolvida, a partir de Abril de 2017, data do respetivo trespasse do estabelecimento, a sociedade “A. S. & E. C., Lda” passou a explorar o estabelecimento de restauração denominado “Restaurante P.”, sito no Largo ...

    , em Bragança, local que também constitui a sua sede.

    .

    A partir da segunda metade de 2017, o Restaurante P. passou a ser gerido única e exclusivamente pelo Réu A. S.

    ; .

    Em 28 de Setembro de 2018, a Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE) procedeu a uma fiscalização ao Restaurante P.

    , fazendo onsignar em auto designadamente que ”Constatou-se...

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