Acórdão nº 5068/18.0T8GMR-F. G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 24 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelJOSÉ ALBERTO MOREIRA DIAS
Data da Resolução24 de Outubro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

  1. RELATÓRIO Recorrente: (…) Lda.

Recorridos: Massa insolvente DE (…) S.A., e restantes credores reclamantes.

No âmbito do processo especial de revitalização que correu termos sob o n.º (…), do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo de Comércio de Guimarães, Juiz 1, o administrador judicial provisório informou que a devedora “... saúde” se encontrava impossibilitada de cumprir as suas obrigações vencidas, na medida em que tendo em conta os proveitos expectáveis para o presente exercício, não se descortina a possibilidade de, em termos práticos, a mesma libertar meios suficientes para pagar aos credores e continuar a laborar de forma lucrativa, requerendo a declaração de insolvência daquela, facto esse que levou a que se tivesse determinado a remessa do processo à distribuição como processo de insolvência.

Por sentença proferida em 02/10/2018 declarou-se a insolvência de “... saúde - S.G.P.S., S.A.”, onde, além do mais, se nomeou o Exmo. Senhor Dr. R. J. como administrador de insolvência e fixou-se em trinta dias o prazo de reclamação de créditos.

Aberto o apenso de reclamação de créditos, o administrador de insolvência apresentou a relação de créditos reconhecidos e não reconhecidos, tendo em relação à “X – …, Lda.” relacionado como crédito comum reconhecido o valor de 21.921,30 euros, sendo 21.525,00 euros de capital e 396,30 euros de juros vencidos, relativo à prestação de serviços para elaboração do plano de recuperação no âmbito do PER n.º 1197/18.9T8GMR.

A “X” veio impugnar a lista de créditos reconhecidos pelo administrador de insolvência alegando que o crédito no valor de 21.921,30 euros reconhecido pelo último foi qualificado como crédito comum quando aquele goza de privilégio mobiliário geral, nos termos do art. 17º-H, n.º 2 do CIRE, porquanto, no âmbito do PER foi celebrado entre a impugnante e a insolvente “... saúde” um contrato de prestação de serviços em que a primeira se obrigou a assessorar a administração da segunda, a elaborar o plano de pagamentos, a efetuar estudo de viabilidade económico-financeira e plano de recuperação daquela e a liderar e a acompanhar as negociações tendentes à aprovação do plano de recuperação, mediante a obrigação desta de lhe pagar 20.000,00 euros, acrescido de IVA, em prestações; Esse contrato foi remetido pela impugnante ao administrador provisório nomeado no âmbito de PER para que este o autorizasse e ratificasse e, bem assim concedesse o privilégio previsto no art. 17º-H, n.º 2 do CIRE, dado que tais serviços foram prestados a crédito e eram essenciais à recuperação da ora insolvente e, bem assim, incluísse esse crédito no plano de recuperação como privilegiado para que pudesse ser sindicado pelos credores e pelo tribunal, o que obteve resposta do administrador provisório no sentido de que autoriza e ratifica o referido contrato, gozando os respetivos créditos das prerrogativas do art. 17º-H, n.º 2 do CIRE; Nessa sequência, no plano de recuperação da ora insolvente esse crédito de 20.000,00 euros, acrescido de IVA, foi relacionado como gozando de privilégio mobiliário geral nos termos do art. 17º-H, n.º 2 do CIRE; Acresce que a impugnante financiou a atividade da ora insolvente, disponibilizando-lhe os meios para revitalização desta, com o plano de recuperação elaborado; Conclui pedindo que o crédito reclamado, no valor de 21.921,30 euros, seja reconhecido como privilegiado. Observado o contraditório, o administrador de insolvência pronunciou-se quanto à impugnação, sustentando que o crédito da impugnante não integra a previsão legal do art. 17º-H, n.º 2 do CIRE, dado que o mesmo emerge de um contrato de prestação de serviços e não de qualquer financiamento, pelo que esse crédito tem de ser reconhecido como comum, nos termos do art. 47º, n.º 4, al. e) do CIRE.

Sobre esta impugnação, em 25/06/2019 recaiu a seguinte decisão, julgando improcedente a impugnação: “A credora X - ..., LDA., veio impugnar a lista de créditos reconhecidos, no que se reporta à classificação do crédito que foi levada a cabo pelo Sr.(a) Administrador (a) de Insolvência, porquanto pese embora tenha reclamado o seu crédito como privilegiado, o Exm.º Sr. Administrador de Insolvência reconheceu o seu crédito como sendo comum. Alega que reiterando o já devidamente vertido em sede de reclamação de créditos, o seu crédito goza, indubitavelmente, de privilégio creditório mobiliário geral, graduado antes do privilégio creditório mobiliário geral concedido aos trabalhadores, nos termos do disposto no n.º2 do art.º 17º-H do CIRE, uma vez que esse privilégio foi-lhe concedido no âmbito do Processo Especial de Revitalização que correu termos sob o n.º 1197/18.9T8GMR, no Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo de Comércio de Guimarães, Juiz 2 e em que foi nomeado seu Administrador Judicial Provisório o Sr. Dr. D. M.. Alega ainda que contrariamente ao sustentado pelo Sr. Administrador de Insolvência nomeado nos presentes autos, na comunicação remetida à Impugnante nos termos do art.º 129º, n.º4 do CIRE, a verdade é que financiou a atividade da ora insolvente, disponibilizando-lhe os meios para sua revitalização, com o plano de recuperação elaborado, o que, indubitavelmente, consubstancia a disponibilização de capital para a sua recuperação, pelo que não pode agora ser prejudicada pelo incumprimento da Insolvente do contrato de prestação serviços entre ambas celebrado, devendo, assim, o crédito da Impugnante ser qualificado como privilegiado, nos termos já supra expostos, nos termos do disposto no art.º 17º-H, n.º2 do CIRE.

Devidamente notificada da impugnação deduzida, a Insolvente nada disse.

Por sua vez, o Sr.(a) Administrador (a) de Insolvência respondeu a tal impugnação, invocando que o crédito reclamado resulta de um contrato de prestação de serviços, de assessoria, firmado entre a Impugnante e a Insolvente, tal crédito/contrato não tem o abrigo legal que a Impugnante defende (de privilégio creditório mobiliário geral), porquanto o privilégio creditório mobiliário geral, previsto no n.º 2 do artigo 17.º-H do CIRE, circunscreve-se aos credores que “financiem a atividade da empresa disponibilizando-lhe capital para a sua revitalização”, tal não sucede com o contrato em apreço, que é de serviços, e não de financiamento, pelo que, não assiste razão à Impugnante, devendo o crédito ser reconhecido como comum, nos termos do disposto no artigo 47.º, n.º 4, alínea e) do CIRE.

Decidindo: Dispõe o art. 17º H do CIRE que: “1. As garantias convencionadas entre a empresa e os seus credores durante o processo especial de revitalização, com a finalidade de proporcionar àquela os necessários meios financeiros para o desenvolvimento da sua atividade, mantêm-se mesmo que, findo o processo, venha a ser declarada, no prazo de dois anos, a sua insolvência. 2 - Os credores que, no decurso do processo, financiem a atividade da empresa disponibilizando-lhe capital para a sua revitalização gozam de privilégio creditório mobiliário geral, graduado antes do privilégio creditório mobiliário geral concedido aos trabalhadores.

”.

Da documentação junta pela impugnante e da sua própria alegação resulta que a mesma celebrou com a Insolvente um contrato de prestação de serviços, tal como resulta de fls. 42 verso a fls. 44. e do qual não decorre qualquer obrigação contratual para a ora Impugnante de financiamento da atividade da ora Devedora, sendo que das obrigações que para a mesma decorrem e que se mostram fixadas no artigo 1º do dito contrato, não contempla qualquer financiamento.

Tal também não resulta dos documentos juntos.

A circunstância de tal crédito ter sido qualificado de forma diferente no âmbito do PER, tal não vincula o Tribunal (art. 130 nº 3 do CIRE e art. 5º nº 3 do Código de Processo Civil, aqui aplicável ex vi art. 17º do CIRE).

Não constando dos autos qualquer contrato de financiamento ou qualquer outro suporte documental de qualquer financiamento realizado pela impugnante à Devedora, não constando do próprio objeto social da Impugnante qualquer atividade de financiamento, os serviços prestados ao abrigo do contrato de prestação de serviços que juntou aos autos e os créditos daí advenientes não são suscetíveis de ser enquadrados no art. 17ºH do CIRE, porquanto não resulta demonstrado que haja disponibilizado à Devedora capital conducente à sua revitalização, ou sequer que haja financiado a sua atividade de algum modo.

As obrigações contratuais que resultam do contrato junto aos autos, são próprias de uma prestação de serviços, não decorrendo das mesmas qualquer atividade de financiamento ou disponibilização de capital para a revitalização da Devedora no exercício da sua atividade, pelo que assiste inteira razão ao Sr.(a) Administrador (a) de Insolvência quando qualificou tais créditos comuns.

Em face do exposto, julga-se improcedente a impugnação deduzida, mantendo-se o reconhecimento do crédito levado a cabo pelo Sr.(a) Administrador (a) de Insolvência, ou seja, um crédito de natureza comum.

Notifique”.

Inconformada com esta decisão, a impugnante veio interpor o presente recurso de apelação em que formula as seguintes conclusões: 1.

A interpretação efetuada pela Venerando Tribunal de 1.ª instância é absolutamente restritiva e não equaciona as decisões tomadas pelos credores no âmbito do PER.

  1. Não pode ser a ora recorrente prejudicada com o não reconhecimento do seu crédito como crédito privilegiado, tão-somente porque entende o Venerando Tribunal de 1ª Instância não dever ser considerado a prestação efetuada pela recorrente como um financiamento ao abrigo do art.º 17.º-H, n.º2 do CIRE, contrariando tudo aquilo que foi decidido no plano de recuperação da devedora.

  2. Motivo pelo qual, reitera a recorrente que o seu crédito terá de gozar necessariamente de privilégio creditório mobiliário geral, graduado antes do privilégio creditório mobiliário geral concedido aos trabalhadores, nos termos do disposto no n.º2 do art.º 17.º-H do...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT