Acórdão nº 1601/18.6T8VRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 24 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelANTERO VEIGA
Data da Resolução24 de Outubro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães.

Carlos … intentou a presente ação especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, contra “ SOCIEDADE …”.

O A. apresentou o formulário a que se refere o artº. 98-C do C.P.T. opondo-se ao despedimento de que foi alvo por parte da demandada em 30/07/2018.

Foi convocada a audiência de partes, não tendo sido possível a conciliação.

O R. apresentou o articulado a que se refere o artº. 98 - G, do C. P. Trabalho e juntou o procedimento disciplinar e os documentos comprovativos do cumprimento das formalidades exigidas.

Alega a licitude do despedimento descrevendo os factos que o fundamentaram, relativos no essencial a não entrega atempada de correspondência e ocultação de tal facto.

O autor apresentou contestação pugnando pela ilicitude do despedimento e, em consequência, pela condenação da ré/empregadora na sua reintegração ou, caso venha a optar pela indemnização, pagar a quantia correspondente à antiguidade do autor, calculada nos termos do art. 389º, nº. 1, a) e 391º do Código do Trabalho, a fixar pelo seu máximo, atento o elevado grau de ilicitude e correspondentes juros moratórios.

Refere que a instauração do processo disciplinar desencadeou um surto psicótico, agravando consideravelmente o seu estado de saúde, já débil, considerando os seus problemas psíquicos, agravados com o acidente de trabalho sofrido, aquando do giro, em que foi vítima de uma agressão, pelo que teve de ser assistido no Hospital e faltar a uma reunião agendada pela sua mandatária, para preparação da sua defesa, por indicação da sua médica psiquiátrica. No demais, impugna parte da factualidade que lhe é imputada e os fundamentos da justa causa invocada pela ré/empregadora.

A empregadora ofereceu articulado/resposta à contestação impugnando as questões de saúde invocadas na contestação.

Realizado o julgamento foi proferida decisão julgando a ação improcedente.

Inconformado o autor interpôs recurso apresentado as seguintes conclusões: 1… 2. A Sentença de que se recorre viola a lei por incorreta aplicação dos arts.º 351º e 357º do Código do Trabalho, aos factos.

  1. O A/Apelante não pode conformar-se com a matéria de facto dada como provada porquanto a mesma, ou não se encontra minimamente provada ou resulta de juízos de valor que não atendem às especiais condições psíquicas do trabalhador, estando neste caso os artº 5º, 6º, 23º, 24º, 25º, 26º, 27º, 28º, 34º 36º, 39º, 40º e 41º da matéria de facto dada como provada, que deverão ser considerados não provados.

  2. Os artº 36º a 41 não poderão ser dados como provados na medida em que o Tribunal visando a condenação do A dá como provados juízos de valor e não factos. Na verdade, quando refere que, o A “sabia” ou é conhecedor (artº 36º, 39º, 40º e 41º) está a pressupor uma premeditação e proferir de imediato um juízo de culpabilidade que está reservada à fundamentação e aplicação do direito aos factos.

  3. No tocante ao vertido no artº 37º e 38º o A/Apelante não “ocultava”, “nem deixava de distribuir as correspondências”. O facto ou factos provados são apenas que não distribuiu as correspondências dentro do tempo que a R/Apelada determinava que o fizesse e que no dia 21 de Março tinha correspondência dentro do carro por distribuir e entregou-a quando lhe pediram que abrisse o carro. Tudo o resto, são ilações que caberiam na respetiva fundamentação e convicção a formar, mas que, definitivamente, não podem ser inseridas (as convicções) na matéria dada como provada.

  4. Por sua vez, os factos considerados não provados pelo Mmo Juiz do tribunal “a quo” deveriam ter resultado como provados na sequência de uma correta interpretação da prova produzida, quer testemunhal, quer documental. São, pois, de considerar provados os factos descritos nas alíneas a) a i) dos factos não provados.

  5. A suspensão decorrente da baixa médica e impossibilidade de deslocação, por fobia, medo de sair de casa, condicionam não só os direitos do trabalhador (defesa eficaz) como condicionam os direitos do empregador, uma vez que, o poder disciplinar se insere no poder de direção e este se encontra coartado pela doença do trabalhador.

  6. O trabalhador suspenso em virtude de doença incapacitante está também impedido de se defender em processo disciplinar contra si instaurado, devendo a baixa médica por si só, doença natural ou não, determinar a suspensão.

  7. O surto psicótico não só se encontra provado por relatório médico junto aos autos, como o respetivo relatório não foi impugnado quanto ao respetivo conteúdo mas e apenas quanto ao momento, sendo que também esta razão falece porque o momento em que o relatório é passado é distinto da doença e respetivo desenvolvimento desta conforme atestam as diferentes de declarações e respetivos conteúdos.

  8. Os Relatórios médicos, enquanto prova documental, nenhuma referência é feita pelo Mmo juiz que, não só não a valora, como a ignora.

  9. Durante todo o julgamento não foram exibidas as correspondências devolvidas, as datas do respetivo correio, o auto que terá sido realizado e onde se inscreveram as cartas registadas, as não registadas, os vales de correio, etc.

  10. A incapacidade do A/Apelante que se encontra efetivamente doente do foro psíquico torna evidente a não compreensão e alcance de um procedimento disciplinar e, por maioria de razão, um que tenha como intenção o seu despedimento e implicações 13. Da prova documental entregue nos autos pelo autor e do conhecimento da R/ apelada consta a medicação prescrita pelo médico Dr. “A” e passada no ACES …, constando do respetivo cabeçalho – “Renovação de medicação prolongada”.

  11. É a este trabalhador e, aqui Apelante, que a R/Apelada retira as limitações e obriga a um giro completo e ainda dobras. Trabalhador que saiu de uma baixa prolongada que sofre de depressão, tem um transtorno de pânico e sofre de stress pós-traumático.

  12. A explicação científica para o stress pós traumático, explica de forma clara a inimputabilidade de trabalhador e a incapacidade de perceber que não poderia reter a correspondência, qualquer que ela fosse, apenas porque tencionava entrega-la durante a noite e ao fim de semana.

  13. O estado físico, cognitivo e emocional do A/Apelante era visível a olho nu e todos sabiam, menos o próprio que, não tem capacidade de se auto avaliar. Se somarmos ao seu estado psíquico as consequências da medicação que tomava percebemos, e a R/Apelante também o percebeu, que nem o giro normal este conseguiria fazer, quanto mais, dobras.

  14. E é esta incompreensão por parte da A/Apelada que se torna chocante, considerando que possuía sim, conhecimento do estado de saúde do A/Apelante, conhecimento este desvalorizado pelo Tribunal “a quo” que se limita a avaliar este despedimento de um ponto de vista objetivo como se um despedimento desta natureza se tratasse, esquecendo o grau de culpa, a imputabilidade e as repercussões, ou não, que esse comportamento teve na imagem da empresa.

  15. O posicionamento do tribunal deixa claro que, enquanto às testemunhas da R lhes é permitido falar dos procedimentos estabelecidos para toda a comunidade de trabalhadores dos Correios, para as testemunhas do A esse direito é-lhes coartado pelo próprio tribunal, que não pretende ouvir como é que esses “procedimentos” se desenvolvem na prática e quais as implicações para um trabalhador como o A.

  16. A R/Apelada poderia e deveria ter reconvertido o posto de trabalho do A/Apelante permitindo-lhe a reintegração em funções distintas e que ele teria aceitado, mas não, retira-lhe as limitações posiciona-o num giro normal e desconhecido deste e ainda lhe adiciona dobras.

  17. A omissão do A/Apelante deveria ter sido considerada como uma consequência do seu quadro mental. Quadro mental, de onde apenas deve ser retirada a conclusão de inimputável e a culpabilidade da R/Apelada.

  18. Não há um único, dos factos elencados pelo R/Apelado, que nos permitam aferir em que momento a correspondência foi distribuída ao A/Apelante, sendo impossível estabelecer um elo de ligação, entre o número de correspondências não distribuídas apresentado e o A/Apelante.

  19. As eventuais reclamações do ano de 2017 são vagas e genéricas nada dizendo quanto ao momento em que ocorreram e qual o número ou tipo de correspondência em causa ou mesmo se efetivamente ocorreram.

  20. O depoimento da testemunha/reclamante é extremamente esclarecedor, não só é a própria R/Apelada que expressamente lhe diz que sem número de polícia não receberia a correspondência, confirmando-se a certeza de que as chefias sabiam o que se passava, muito antes da instauração do procedimento ao A/Apelante, a certeza de que incitaram a testemunha a reclamar, a certeza ainda de que, sabiam que as instruções deste trabalhador e de todos os outros foi que sem número de polícia teria que devolver a correspondência e ainda de que esse comportamento se perpetuou após a saída do A/Apelante.

  21. Não poderia o tribunal “a quo” dar como provado o vertido no artº 5 porquanto a motivação da denúncia da cliente foi plantada e a Cliente não “constatou que o objeto havia sido dado como entregue, em 3 de Janeiro 2018, e somente em 7 de Fevereiro o carteiro lho entregou, bem como diversas outras cartas em atraso. Facto não provado.

  22. Não resulta minimamente provado o vertido no artº 6, que a participação tenha entrado na Assessoria Jurídica “ no dia 9-03-2018” e muito menos, que a “ ré/empregadora procedeu a averiguações com vista ao apuramento de todas as circunstâncias que rodearam a prática dos factos participados e outros que se viessem a apurar “. Na verdade a única diligência de prova é a visita ao CDP a 21 de Março de 2018. Facto não provado.

  23. O facto 23º dado como provado é falso o A/Apelante não usava a sua viatura automóvel, “No exercício da sua atividade profissional de carteiro, para se deslocar na área do referido giro UB…, não obstante tratar-se de giro UB-Urbano Bicicleta, que previa ser executado com recurso a bicicleta, na verdade fazia-o a pé e o automóvel servia apenas...

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