Acórdão nº 4249/17.9T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 24 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelJORGE TEIXEIRA
Data da Resolução24 de Outubro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.

I – RELATÓRIO.

Recorrente: (…) UNIPESSOAL, LIMITADA.

Recorridos: HERANÇA ILÍQUIDA ABERTA POR ÓBITO (…) E OUTROS (..) UNIPESSOAL, LIMITADA, NIPC (..) , com sede na (..) ..., instaurou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra a HERANÇA ILÍQUIDA ABERTA POR ÓBITO de (…) E MULHER , representada pelos seus filhos e únicos e universais herdeiros (..) todos residentes no (…) ..., pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de € 19.000,00, acrescidas de juros de mora contados desde a citação até integral e efectivo pagamento, que foi paga pela compra da sociedade, e ainda nos prejuízos inerentes ao encerramento do estabelecimento cujo apuramento deve ser relegado para execução de sentença.

Alegou como fundamento e, em síntese, ter celebrado, através de escritura pública, com os falecidos um contrato de arrendamento das três fracções autónomas identificadas no artigo 1º da p.i. e nelas instalou um estabelecimento similar de hotelaria denominado “Restaurante ...”, no qual servia bebidas, refeições e outros.

Como a exploração deste estabelecimento tivesse criado boa clientela e tinha lucros anuais M. J. adquiriu, por cessão, a quota do único sócio da Autora, pelo valor de € 5.100,00, relativo à quota, e € 13.900, relativo ao recheio, tornando-se assim o seu único sócio e gerente e nessa qualidade passou a explorar o negócio; a cessão foi do conhecimento da ré que a aceitou e começou a receber as rendas da aqui Autora, através do seu gerente M. J.; Nesta sequência, continuou a exercer a actividade no locado e a ter boa clientela, sendo que o imóvel apresentava um ar cuidado, limpo e em condições de receber os clientes, sendo que, no entanto, a partir de 2014, o locado começou a apresentar infiltrações de águas que motivaram a criação de verdete e bolores nas paredes do restaurante, casa de bano, cozinha e armazém e começaram a surgir odores estranhos motivado pelo facto de as instalações sanitárias estarem já gastas, com tubagens rotas, o que provocava o retorno de odores das águas residuais.

A Autora reclamou tais anomalias à Ré e por esta razão o estabelecimento começou a ter baixa de rendimentos e a clientela deixou de frequentar o mesmo, o que levou a que a Autora começasse a ter prejuízos.

Não obstante, a Ré não efectuou qualquer obra de fundo no imóvel tendo em vista a eliminação das infiltrações e odores existentes, continuando sempre a receber as rendas.

Em finais de 2015, a Autora foi inspeccionada pela X Consultores, Ldª, empresa de segurança e higiene no trabalho que a ameaçou de que caso não fossem efectuadas as obras no saneamento, sistema de energia eléctrica, limpar e pintar paredes e outras, seria instaurado um processo de fiscalização com aplicação de coima de montante não inferior a € 4.000,00 e imposto o encerramento por falta de condições de funcionamento.

A Autora deu disto conhecimento à Ré através de carta registada com AR, recebida em 12.01.2016, cujo representante se deslocou ao local e constatou a necessidade destas obras com urgência, o que, contudo, nunca fez.

A Autora continuou a exercer a sua actividade sendo que as reclamações dos clientes eram contínuas e inclusivamente recebeu da administração de condomínio uma missiva devido a uma reclamação dos moradores da fracção que fica por cima do restaurante por terem tido uma inundação causada pelo retorno das águas residuais provenientes das caixas de saneamento do restaurante.

A Autora viu-se pressionada pela delegação e saúde no sentido de que ou fazia as obras na parte eléctrica, esgotos e impermeabilização ou tinha de encerrar o estabelecimento, sendo que, interpelou novamente o representante da Ré e este veio a fazer novas pinturas no imóvel, não tendo no entanto efectuado as reparações necessárias na parte eléctrica e no saneamento o que levou a que os problemas subsistissem.

O arrendado foi vistoriado pela Unidade de Saúde ... e pelos Serviços Municipalizados de Saneamento Básico, cujos relatórios foram comunicados ao representante da Ré, sendo que, porque as obras não foram feitas a Autora foi notificada de que foi privada do alvará sanitário para o exercício da sua actividade pelo que teve de encerrar definitivamente; de tal situação deu conhecimento à ré, através do seu cabeça-de-casal.

Regularmente citada, a Ré M. R. apresentou contestação e, defendendo-se por excepção, arguiu a ilegitimidade da ré por preterição de litisconsórcio necessário, e impugnou a factualidade alegada pela Autora.

Nesta sequência, foi requerida pela Autora a intervenção principal provocada dos dois herdeiros que haviam sido preteridos, que foi admitida a fls. 57/58.

Em sede de saneamento dos autos, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 6.º e nos artigos 547.º e 597º, do Cód. Proc. Civil, entendendo-se que o processo se encontrava apto a seguir de imediato para julgamento, veio a ser dispensada a identificação do objecto do litígio, bem como a enunciação dos temas de prova (cf. fls. 41).--- Realizado o julgamento, foi proferida sentença em que, respondendo à matéria de facto controvertida, se decidiu julgar totalmente improcedente a acção.

Inconformada com esta decisão, dela interpôs recurso a Autora, sendo que, das respectivas alegações desse recurso extraiu, em suma, as seguintes conclusões: 1. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pela Mma. Juiz a Quo, nos termos do número 1 do artigo 629º, 637º, 645º e 646º do código de processo civil que julgou a acção totalmente improcedente.

2. Com interesse para o presente recurso deu-se por provado e em suma que a recorrente tinha boa clientela enquanto o imóvel tinha um ar cuidado.

Entretanto, começaram a surgir as anomalias (facto 18, 19) que foram comunicadas à Ré (20). Por tal razão alguma da clientela começou a deixar de frequentar o estabelecimento, acabando o mesmo por encerrar.

3. Ficou igualmente demonstrado que a recorrente fez reclamações à recorrida dos prejuízos que a falta de obras lhe estava a causar.

4.

Concorda a recorrente com a matéria dada por provada, entendendo no entanto que a decisão de facto peca por defeito devendo ser dados por provados o facto w não provado e bem ainda que “O M. J. pagou ao C. S. o valor de € 19.000,00 (dezanove mil euros), referente ao que consideravam recheio e aviamento do estabelecimento” e “O A. deixou parte dos bens adquiridos para a exploração do estabelecimento do imóvel, encontrando-se o restante inutilizado”.

5. Assim sendo, e conforme se demarcará, houve erro na apreciação da prova nos termos da alínea a) do número 2 do artigo 640º 6. Deveriam ser avaliadas as declarações de parte do A. as quais, pela fundamentação não foram apreciadas nem pela positiva nem pela negativa, o que desde logo contraria a jurisprudência do tribunal superior, nomeadamente do Ac. Tribunal da Relação de Lisboa de 26-04-2017.

7. Neste caso com particular importância, uma vez que a matéria em causa (os prejuízos) não é matéria contraditada por falsa, mas apenas impugnada por desconhecimento, pelo que, apenas há a versão da recorrente.

8. Pelo depoimento do M. J.

representante da A. R. & Filhos, Unipessoal, Lda [depoimento com referência à acta do dia 27 de Novembro de 2018 com início 10:50:57 e fim às 11:44:36] tiramos que, o valor pago pelo estabelecimento foi de € 19.000,00, referindo ainda o A. que teve e ainda tem que cumprir e pagar os contratos mesmo já tendo o estabelecimento fechado por causa imputável à recorrida.

9. Também afirma que deixou parte do material no estabelecimento.

10.

  1. R.

[depoimento com referência à acta do dia 27 de Novembro de 2018 com início às 14:00:14 e fim às 14:30:27] confirma que há bens que ficaram no estabelecimento.

11. A testemunha J. M.

[testemunha com referência à acta do dia 09 de Janeiro de 2019 com início 10:03:19 e fim às 10:56:09], lembra-se que o estabelecimento custou ao marido cerca de vinte mil euros, recordando-se de bens que lá ficaram quando saíram.

12. O documento dois junto com a petição inicial demonstram a cessão de quotas, com referência a um valor de cinco mil e cem euros.

13. O documento 3 refere-se precisamente ao montante da quota bem como ainda ao montante dos bens móveis, num total de € 19.000,00 (dezanove mil euros), valores cuja data coincide.

14. Por outro lado, e quanto aos bens até por referência à confissão do representante da R., deveria ser dado por provado que “o A. deixou parte dos bens adquiridos para a exploração do estabelecimento do imóvel, encontrando-se o restante inutilizado”, o que se conjuga com o depoimento da testemunha J. M. e declarações de parte do recorrente.

15. Quanto aos prejuízos, salvo opinião contrária deveria ser dado por provado que: A Autora sofreu prejuízos inerentes ao encerramento do estabelecimento nomeadamente as indemnizações que terá de pagar aos seus funcionários, na perda de lucro que teve e terá, com as despesas inerentes à falta de cumprimento com as várias entidades, nomeadamente fornecedores de café, Telecomunicações, abastecimento de água e electricidade; Em consequência do referido em 18. e 19. o estabelecimento começou a ter baixa de rendimentos; - O que desde logo motivou que a A. tivesse prejuízos. - Acabando o estabelecimento por encerrar, - perdendo o A. o que pagou pela quota e pelos bens. Deixando de ter lucro; 16. Socorremo-nos às regras da lógica e da experiência comum.

17. Avaliados os factos provados 15, 16, 19, 20, 21 e 31, as declarações do A. e o testemunho da J. M. supra identificados somos levados a concluir que a clientela começou a escassear devido aos problemas comunicados pelo recorrente, o que levou a que o estabelecimento começasse a ter baixa de rendimentos encerrando, perdendo o recorrente o que pagou pela quota, pelos bens, e sendo obrigado a cumprir os contratos pendentes. A própria sentença refere-se à indemnização que deveria ser paga à testemunha J. M. em sede de fundamentação.

18. As regras da experiência e...

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