Acórdão nº 4052/18.9T8VNF-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Outubro de 2019
Magistrado Responsável | ALCIDES RODRIGUES |
Data da Resolução | 17 de Outubro de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório Por apenso ao processo de insolvência no qual foi declarada a insolvência de J. M., nos autos de reclamação de créditos o Administrador da Insolvência apresentou a relação definitiva de credores nos termos do disposto no artigo 129.º do C.I.R.E.
*Por despacho datado de 26/22/2018, foi o Administrador da Insolvência notificado para esclarecer o facto deste reconhecer um crédito privilegiado à Caixa ..., S.A., decorrente de hipoteca voluntária incidente sobre imóvel propriedade do Insolvente (Prédio Urbano), quando nos autos não foi apreendido nenhum imóvel, mas apenas o direito à meação (bem móvel) que ao insolvente pertence no património comum com o seu ex-cônjuge, do qual faz parte o referido imóvel.
*Respondeu o Administrador da Insolvência, esclarecendo que, aquando da qualificação do crédito em questão, por mero lapso, o colocou garantido pelo imóvel, quando, na verdade, o mesmo encontra-se garantido (hipoteca voluntária) pelo produto da liquidação correspondente aos direitos, à meação e quinhão hereditário, incidentes sobre o imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Famalicão sob o n.º ... / ... e inscrito na respetiva matriz sob o artigo ….
*De seguida, a Caixa ... requereu, para efeitos de graduação, e pelo produto da venda do prédio urbano descrito na Conservatória de Registo Predial de Vila Nova de Famalicão sob o n.º .../... (produto esse a reverter, em parte, para o presente processo e, em parte, para o processo executivo) seja atendida a garantia real hipotecária de que beneficia o crédito da Caixa ... emergente do empréstimo identificado pelo nº 00352112005154685, reconhecido pelo Sr. Administrador da Insolvência na lista a que alude o art. 129º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
* Foi posteriormente proferida sentença de sentença de verificação e graduação dos créditos, datada de 29/04/2019, que, julgando improcedente a pretensão da Caixa ..., decidiu qualificar o seu crédito como comum.
Mais foi sentenciada a reclamação de créditos (verificação e graduação), com o seguinte dispositivo: «Considerando os princípios atrás expostos, procede-se ao pagamento dos créditos, através do produto da massa insolvente, na seguinte forma: 1) As dívidas da massa insolvente saem precípuas (n.º 1 e n.º 2 do artigo 172.º do CIRE); 2) do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos comuns; 3) os créditos subordinados».
*Inconformada com esta decisão, dela interpôs recurso a credora reclamante Caixa ..., S.A., tendo formulado, a terminar as respetivas alegações, as seguintes conclusões: «1ª) A Caixa ... reclamou nestes autos, pela forma e tempo legalmente previstos, o pagamento (entre outros) de um crédito no valor de € 299.533,68 (duzentos e noventa e nove mil quinhentos e trinta e três euros e sessenta e oito cêntimos).
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) Crédito esse garantido por hipoteca voluntária devidamente registada – através da Ap.02 de 2006.11.23 - sobre o prédio urbano descrito na Conservatória de Registo Predial de Vila Nova de Famalicão sob o n.º .../....
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) Tal crédito foi reconhecido pelo Sr. Administrador de Insolvência, em sede da lista a que alude o art. 129º do CIRE, pela totalidade e com a natureza de crédito garantido, não tendo sido objecto de impugnação alguma.
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) O imóvel supra mencionado e sobre que incide hipoteca voluntária a favor da Caixa ... encontra-se registado, em comum e sem determinação de parte ou direito, em nome do insolvente e de seu filho, J. P..
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) No âmbito dos presentes autos foi apreendido o quinhão hereditário e o direito à meação do insolvente, de que faz parte o aludido prédio.
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) Em face do incumprimento verificado nos financiamentos também aqui reclamados, previamente à declaração de insolvência, a Caixa ... instaurou contra o insolvente e seu filho (mutuários) a execução que corre termos, com o nº 2102/18.8T8VNF, no Juiz 1 do Juízo de Execução de Vila Nova de Famalicão do Tribunal Judicial da Comarca de Braga.
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) Por força do disposto no art. 743º/2 do CPC, aplicável ex vi art. 17º do CIRE, dever-se-á proceder à venda, num só processo, da totalidade do imóvel, distribuindo-se posteriormente o seu produto, na proporção que a cada processo couber, por ambos os processos – executivo e de insolvência.
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) Vendido que seja, o direito de propriedade sobre o prédio em causa – atento o disposto no art. 824º/2 do Código Civil – será transferido livre de quaisquer ónus e encargos.
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) A sentença em crise não procede a graduação específica quanto a esse imóvel, por entender que, tendo sido apreendidos quinhão hereditário e direito à meação, o referido imóvel não será vendido no âmbito da liquidação.
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) E, assim, porquanto a hipoteca é uma garantia que incide sobre um bem em concreto, qualifica os créditos hipotecários da Caixa ... como “comuns” e, em consequência gradua todos os credores rateadamente, 11ª) Descurando a preferência de pagamento que para a Caixa ... decorre em virtude da hipoteca voluntária a seu favor sobre o imóvel em questão e esvaziando de conteúdo o disposto no mencionado art. 743º/2 do CPC (cuja aplicação, sublinhe-se, se crê ser imperativa, assim como se determina, designadamente, no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 22.11.2010, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/8fa42e6 a7f133d1a802577f90030cf84?OpenDocument).
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) Significa isto que, mantendo-se a qualificação e graduação, nestes autos, dos créditos hipotecários da Caixa ... como comuns, a Caixa ... perderá a sua garantia, sem obter o correspectivo pagamento preferencial que lhe confere a hipoteca voluntária registada em seu benefício.
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) Sucede que, goza a Caixa ... – face ao disposto no art. 686º do C.Civil – do direito de ser graduada para pagamento pelo produto da venda desse bem com preferência sobre os demais credores.
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) Assim não se decidindo na sentença em crise, encontra-se a mesma ferida de ilegalidade, por violação do disposto nesse dispositivo legal e sonegação do direito da Caixa ..., que vê excutida a sua garantia sem ver pago o crédito por si reclamado.
TERMOS EM QUE, deve o presente recurso proceder, com as legais consequências e com vista à acostumada JUSTIÇA!».
*Não consta que tenham sido apresentadas contra-alegações.
*O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
*Foram colhidos os vistos legais.
*II. Delimitação do objeto do recurso Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente – artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por CPC), aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho –, ressalvadas as questões do conhecimento...
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