Acórdão nº 1382/18.3T8VNF-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelEDUARDO AZEVEDO
Data da Resolução07 de Março de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães F. C. intentou acção com processo comum contra CV, Delegação de R. da CV e J. A..

Pediu: “1. Ser declarado que os Réus praticaram assédio moral contra a Autora; e, em virtude disso, devem os Réus serem condenados: a) a tratar a Autora de forma igual e não discriminatória relativamente aos seus colegas de trabalho; b) a respeitar o horário de trabalho da Autora, não procedendo a alterações unilaterais e arbitrárias; c) a respeitar o âmbito funcional da categoria profissional da Autora, atribuindo-lhe exactamente as mesmas funções dos colegas de trabalho em idêntica situação; d) pagar, solidariamente, a quantia de 40.000,00 Euros a título de indemnização por danos não patrimoniais causados pela prática de assédio moral no local de trabalho; e) pagar ao A. a quantia de 553,22 Euros a título de danos patrimoniais já liquidados, a que acrescerão aqueles que se vencerão no decurso da presente acção; 2. Serem a 1.ª e 2.ª Rés condenadas a pagar à Autora a quantia de 385,35 Euros a título de crédito de horas de formação profissional devida e não prestada; 3. Serem a l.ª e 2.ª Rés condenadas a pagar à Autora os juros vencidos e vincendos calculados à taxa legal em vigor, sobre cada uma das rubricas em dívida, até efectivo e integral pagamento.”.

Alegou, para tanto: ser trabalhadora da 1ª R desde 02.05.2001; desde há dez anos, altura em que o 3º R passou a ser presidente da 2ª R, tem sido vítima de assédio moral pelos RR, nomeadamente através daquele; tem direito a ser indemnizada por danos patrimoniais e não patrimoniais, computando estes em 40.00,00€ e aqueles em 553,22€; e, não lhe foi assegurada formação profissional pelo que é credora de 385,33€.

Requereu no final da petição inicial, além do mais: Foi deduzida contestação pela 1ª e 3º RR pela qual se alegou, em síntese: a 2ª R não tinha personalidade jurídica e judiciária; o R é parte ilegítima porque actua na qualidade de presidente dessa R, não tendo qualquer interesse directo em contradizer; e no sentido da impugnação da factualidade imputada.

Elaborado saneador, decidiu-se: “(…) Da invocada falta de personalidade judiciária da Delegação de R. da CV: efectivamente, refere o artigo 6º do DL 281/2007 que a CV exerce a sua actividade em todo o território nacional como a única sociedade nacional da CV e, fora do território nacional, no quadro de acção do Movimento Internacional da CV e em qualquer local onde a sua participação seja relevante (n.º 1).

Estabelecendo o nº 2 daquele artigo que a CV assenta a organização territorial em serviços centrais e autónomos, delegações locais e extensões de delegações locais.

De acordo com o disposto 13º do Código de Processo Civil, as delegações podem ser demandadas quando a acção proceda de facto por elas praticado.

Caso a administração principal tiver sede em país estrangeiro, as delegações estabelecidas em Portugal podem ser demandadas, ainda que a acção derive de facto praticado por aquela, quando a obrigação tiver sido contraída por um português ou um estrangeiro domiciliado em Portugal.

Assim, se a administração principal tem sede em Portugal - como é o caso - as suas delegações só terão personalidade jurídica, activa ou passiva, quando a acção proceda de facto por ela praticado.

Ora, tal como a própria autora configura a acção, a sua entidade patronal é a CV, com quem celebrou o contrato junto à petição inicial sob o n.º 4, alegando a autora várias atitudes da sua entidade patronal que configuram a prática de assédio.

Não havendo dúvidas quanto ao facto de a entidade patronal da autora ser a CV e não a Delegação de R. da CV, conclui-se assistir razão às rés na invocada falta de personalidade daquela Delegação, uma vez que a acção não procede de facto pela Delegação praticado.

Consequentemente, absolvo da instância a ré Delegação de R. da CV (artigo 278º, nº 1, c) do CPC).

Custas, nesta parte, pela autora.

Da invocada ilegitimidade do réu J. A.: o réu é parte legítima quando tem interesse directo em contradizer, o qual se mede pelo prejuízo que dessa procedência lhe advenha, sendo ainda que, no silêncio da lei, são considerados como titulares relevantes para o efeito da legitimidade, os sujeitos da relação controvertida, tal como a acção é prefigurada pelo autor - artigo 30º do actual CPC, Assim, e na medida em que legitimidade é determinada em função da titularidade da relação material controvertida, esta deverá ser atendida com a configuração que lhe foi dada unilateralmente na petição inicial, consagrando deste modo o nosso legislador a tese que era defendida pelo Professor Barbosa de Magalhães.

“A legitimidade processual, pressuposto de cuja verificação depende o conhecimento do mérito da causa (art. 288º, nº 1, al. d), do C.Proc.Civi) - que se não confunde com a denominada legitimidade substantiva, requisito da procedência do pedido - afere-se pelo interesse directo do autor em demandar e pelo interesse directo do réu em contradizer (art. 26º, nº 1, do mesmo diploma).

Sendo certo que, na falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor (nº 3 do citado art. 26º).

Assim, ao apuramento da legitimidade interessa apenas a consideração do pedido e da causa de pedir, independentemente da prova dos factos que integram esta" - Acórdão do STJ de 14/10/2004, disponível em www.dgsi.pt.”.

Como acima se referiu, a própria autora configura a acção como sendo emergente da actuação da sua entidade patronal - CV, com quem celebrou o contrato junto à petição inicial sob o n.º 4 - que praticou actos que configuram, no seu entender, assédio.

Quanto ao réu J. A., a autora alega apenas que este é o Presidente da Delegação de R. da CV e que praticou os ditos actos.

Ora, o facto de ser Presidente da Delegação não tem qualquer relevância, desde logo porque a própria Delegação não tem personalidade jurídica. Por outro lado, o facto de ter sido a pessoa que, no entendimento da autora, praticou os factos também não lhe confere no caso legitimidade já que esta apenas pode atribuída à entidade patronal da autora.

Assim, julgo o réu J. A. parte ilegítima e, consequentemente, absolvo-o da instância (artigo 278º, nº 1, d) do CPC).

Custas, nesta parte, pela autora.

(…) Nos termos das disposições conjugadas dos artigos 453.º, n.º 3 e 454.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, pode ser requerido o depoimento da parte contrária, quanto a factos pessoais ou de que ela deva ter conhecimento.

Por não ser crível que o Sr. Presidente da ré tenha conhecimento directo da factualidade alegada pela autora, indefere-se o requerido.” (…).” A A recorreu e concluiu: “1. O despacho de fls., debalde douto, deve ser revogado.

2. Quando ao objecto do presente Recurso, vem este sindicar o despacho proferido pelo Tribunal a quo que i) indeferiu o pedido de depoimento de parte do Sr. Presidente da Ré e que ii) julgou procedente a exceptio de ilegitimidade do Réu J. A..

Concretizando, 3. o Tribunal a quo pronunciou-se pela inadmissibilidade do depoimento de parte do Sr. Presidente da Ré, CV, invocando "não ser crível que o Sr. Presidente da Ré tenha conhecimento directo da factualidade alegada pela autora".

4. No mesmo segmento decisório, absolveu o Réu J. A. da instância por considerar que "o facto de ser Presidente da Delegação não tem qualquer relevância, desde logo porque a própria Delegação não tem personalidade jurídica".

Nesta senda, 5. o Tribunal consignou que "o facto de ter sido a pessoa que, no entendimento da autora, praticou os factos também não lhe confere no caso legitimidade já que esta apenas pode atribuída à entidade patronal da autora".

Isto dito, 6. a Recorrente, sem quebra do respeito sempre devido por douta opinião em contrário, entende que essa decisão é desajustada dos normativos legais positivos aplicáveis in casu.

Ora veja-se: A- QUANTO AO DEPOIMENTO DE PARTE: 7. Refere o n.º 3 artigo 453.º do Código de Processo Civil que "cada uma das partes pode requerer não só o depoimento da parte contrária, mas também o dos seus compartes. " 8. A disposição do artigo 454.º do Código de Processo Civil acrescenta quais os factos sobre que este depoimento pode recair: "1 - O depoimento só pode ter por objeto factos pessoais ou de que o depoente deva ter conhecimento.

9. O douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 11 de Março de 2010 (13 Processo n.º 180/09.0TVLSB-A.Ll-6, disponível em http://www.dgsipt), sumariou que: "1. Destinando-se o depoimento de parte à obtenção de confissão, tem necessariamente que incidir sobre factos desfavoráveis ao depoente, sob pena de se transformar o depoimento de parte em testemunho de parte, à revelia das opções do legislador.

(…) 3. Facto de que a parte deva ter conhecimento é aquele que é de presumir que ela tenha conhecido, pois o deve do artigo tem o sentido de juízo de probabilidade psicológica e não de conduta ética." Ora, 10. de acordo com o artigo 13.º dos Estatutos da CV relativo às competências do Presidente Nacional da Ré, cabe ao Sr. Presidente: "1. O presidente nacional é o responsável máximo da CV, cabendo-lhe assegurar o prestígio, a manutenção, a sustentabilidade, o desenvolvimento e o progresso da instituição, a qual funciona sob a sua orientação e na sua dependência.

2. Sem prejuízo do que esteja ou venha a ser confiado, são competências, obrigações e direitos específicos do presidente nacional: a. Representar, com carácter geral, a CV junto do Governo e de outras entidades públicas e privadas e nas relações com as instituições e os organismos do Movimento Internacional da CV; b. Presidir à direcção nacional e ao conselho supremo; c. Usar do voto de qualidade, em qualquer deliberação em que participe, nos diversos órgãos sociais nacionais; d. Presidir, sempre que os interesses da CV o determinem, às reuniões e sessões dos diversos órgãos locais da instituição em que participe; e. Intervir, no...

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