Acórdão nº 37/16.8T8VRM.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Fevereiro de 2019

Magistrado ResponsávelJOSÉ ALBERTO MOREIRA DIAS
Data da Resolução21 de Fevereiro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

*I. RELATÓRIO.

Recorrente: Américo (…) Recorrida: Maria (…) Américo (…), residente na Rua de (…), n.º …, (..), Maia, instaurou a presente ação declarativa, com processo comum, contra Maria (…), residente na Rua …, (…) Póvoa de Varzim, pedindo que: a- se condene a Ré a reconhecer que o prédio denominado “(…) e (...)”, sito no Lugar da …, na freguesia de (…), concelho de (...), descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o n.º …, e inscrito na matriz predial urbana …º da freguesia de (…), concelho de (...) (sendo certo que à data da escrituras se encontrava omisso à matriz), foi adquirido apenas pelo Autor, e que o Autor construiu a habitação no dito prédio a expensas exclusivamente suas, e que o prédio identificado é da exclusiva propriedade do Autor; b- ordene a notificação da Conservatória do Registo Predial de (...) para que corrija o registo do prédio descrito naquela Conservatória sob o n.º…, da freguesia de (…), o qual foi adquirido apenas pelo Autor, e cuja propriedade é apenas sua; Subsidiariamente; c- se reconheça e condene a Ré a reconhecer o direito do Autor a adquirir a propriedade do terreno ocupado – in casu, a parte da Ré – pagando o valor que o prédio tinha antes das obras, nos termos e para os efeitos do art. 1340º, n.º 1 do Código Civil; Ainda subsidiariamente; d- se condene a Ré a indemnizar o Autor na proporção da metade de que a mesma beneficia ou tem direito no imóvel supra melhor identificado.

Para tanto alega, em síntese, ter casado com a Ré em 13/01/2001, em regime de separação de bens; Em 28/04/2001 celebrou contrato-promessa de compra e venda tendo por objeto o prédio acima identificado, mediante o qual se obrigou a comprá-lo, tendo a escritura de compra e venda sido celebrada em 04/05/2001; Não obstante na escritura de compra e venda figurarem como compradores o Autor e a Ré, foi efetivamente o primeiro que comprou esse prédio, pagou o respetivo sinal e o preço com dinheiro exclusivamente seu, não existindo qualquer intenção daqueles em comprarem esse prédio em comum; Foi também o Autor quem mandou construir nesse prédio uma moradia, contratando para o efeito vários construtores, a quem pagou com dinheiro seu a obra executada, tendo para o efeito contraído, inclusivamente, empréstimos; A Ré nunca contribuiu com qualquer quantia para a aquisição do prédio, sequer para a construção da dita moradia.

A Ré contestou defendendo-se por exceção e impugnação.

Invocou a exceção dilatória da litispendência, sustentando que existe identidade entre a presente ação e a que corre termos no mesmo tribunal sob o n.º 22/15.7T8VRM, que se consubstancia numa ação especial de divisão de coisa comum intentada pela ora Ré contra o ora Autor, em que este alegou os mesmos factos que agora aduz na presente ação e onde lhe foi permitido fazer prova que o prédio e a moradia nele construída é da sua exclusiva propriedade; Invocou a exceção do abuso de direito, alegando que ainda que o capital relativo à aquisição do prédio e da construção da moradia fosse maioritariamente do Autor, o que se não concebe, este doou metade de todo o investimento para que tudo figurasse na aquisição e na construção da casa metade para cada um e como a doação sempre foi realizada em dinheiro, não existe formalidade alguma externa, ao contrário do que acontece com a aquisição do terreno, que, por isso, foi celebrada em nome dos dois; O Autor sempre afirmou que a casa era para a Ré, já que ela não tinha habitação própria e os filhos daquele nunca viriam para Portugal, vindo apenas agora colocar em causa tudo quanto disse e foi executado ao longo de quase quinze anos, de que a casa era um bem comum, em compropriedade, só porque se divorciou daquela.

Impugnou parte dos factos alegados pelo Autor.

Pede que por via da procedência da exceção da litispendência, se absolva aquela da instância e, subsidiariamente, dos pedidos.

Convidou-se o Autor para se pronunciar, querendo, quanto à exceção da litispendência suscitada pela Ré, o que fez, concluindo que os pedidos formulados na presente ação são distintos dos formulados naquela outra ação n.º 22/15.7T8VRM, isto porque nesta aquele pede que se condene a Ré a reconhecer que o prédio denominado “(…) e (...)” foi adquirido apenas pelo Autor e a expensas suas, e que também foi ele que construiu a habitação no dito prédio e a expensas exclusivamente suas, sendo o prédio propriedade exclusiva deste, enquanto naquela outra ação, a ali Autora, aqui Ré, parte do pressuposto errado que é comproprietária do imóvel em crise.

Suscitou-se oficiosamente o incidente do valor da causa e fixou-se o valor desta em 70.710,00 euros.

Consentaneamente com o assim decidido, julgou-se incompetente, em razão do valor, o Juízo de Competência Genérica de (...) para tramitar os ulteriores termos dos autos, e atribuiu-se essa competência ao Juízo Central Cível de Braga, para onde os autos transitaram.

Designou-se data para realização de audiência prévia, onde se ordenou a suspensão da instância até ao trânsito em julgado da decisão a proferir nos autos de ação de divisão de coisa comum n.º 22/15.7T8VRM, a correr termos pela Instância de Competência Genérica de (...), com fundamento em prejudicialidade da presente ação em relação àquela outra.

Transitada em julgado a decisão proferia naquela outra ação, declarou-se cessada a suspensão da instância e designou-se data para a continuação de audiência prévia, onde após suspensão da instância com vista à resolução amigável do presente litígio, gorando-se essa possibilidade, proferiu-se saneador, julgando procedente a exceção dilatória inominada de autoridade de caso julgado e absolveu-se a Ré da instância, constando essa decisão da seguinte parte dispositiva: “Pelos fundamentos expostos e nos termos das disposições conjugadas dos artigos 576º, n.º 1 e 2 e 619º, n.º 1 e 621º do Cód. Proc. Civil, decide-se julgar verificada a exceção dilatória inominada de autoridade de caso julgado e, em consequência, absolver a ré Maria (…) da instância”.

Inconformado com o assim decidido, veio o Autor interpor o presente recurso de apelação, em que apresenta as seguintes conclusões:

  1. Radica a discordância do recorrente - que dá azo ao presente Recurso - precisamente no facto de o Douto Tribunal a quo considerar existir identidade entre o pedido de uma e outra ação judicial (esta e o Processo n.º 22/15.7T8VRM), o que levou o mesmo a decidir existir autoridade de caso julgado.

  2. Da compaginação entre o vertido pelas partes nos presentes autos (especialmente o pedido principal e os pedidos subsidiários formulados pelo Recorrente), e o Doutíssimo Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães no âmbito do Processo n.º 22/15.7T8VRM, verificamos que estão em causa pedidos diferentes.

  3. Atendendo a que em nada se podem confundir os pedidos subsidiários formulados pelo Autor, ora recorrente, com o pedido formulado pela Ré no Processo n.º 22/15.7T8VRM, não é, com o devido respeito, exata a conclusão da existência de caso julgado, ou mesmo de autoridade de caso julgado (figura que nem sequer é consensual na doutrina e jurisprudência portuguesa, atenta a larga amplitude de entendimento que permite).

Termos em que, sempre com o Mui Douto Suprimento de V. Excelências: Deve o presente Recurso ser julgado Provado e Procedente, revogando-se a Sentença recorrida, e considerando não existir autoridade de caso de caso julgado, deverá o Processo ser remetido ao Douto Tribunal a quo para elaboração de Despacho Saneador que contenha o elenco de matéria assente e de factos a provar, com as devidas consequências legais, nomeadamente seguindo o Processo os seus termos até final”.

*Não foram apresentadas contra-alegações.

*Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

*II- FUNDAMENTOS O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do apelante, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cf. artigos 635.º, nº 4 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.

No seguimento desta orientação, a única questão que se encontra submetida pelo apelante ao conhecimento desta Relação consiste em saber se o despacho saneador recorrido padece de erro de direito ao ter julgado procedente a exceção dilatória inominada da autoridade do caso julgado e ao absolver a apelada da instância relativamente a todos os pedidos formulados nos autos pelo primeiro.

*A- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO O tribunal a quo não fixou a matéria de facto, limitando-se, na subsunção jurídica que operou, a respigá-los da prova documental junta aos autos e a considerá-los nessa subsunção jurídica que operou.

Porque nos termos do disposto no n.º 3 do art. 607º do CPC, na decisão a proferir se impõe discriminar os factos que se considera provados, ónus este que é extensível ao presente acórdão atento o preceituado n.º 3 do art. 663º do mesmo Código, tendo em conta a prova documental junta aos autos, os factos a considerar para efeitos de decisão a proferir no âmbito da presente apelação são, para além dos já consignados no relatório acima elaborado (quanto aos contornos da presente ação), os seguintes: A- Maria (…) instaurou ação de divisão de coisa comum contra Américo (…), pedindo que este seja condenado na divisão do prédio urbano, situado no Lugar de …, freguesia de …, concelho de (...), descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o nº …, pondo-se fim à compropriedade existente, pela adjudicação ou venda, seguindo os ulteriores termos dos artigos 925º e seguintes do Código de Processo Civil, alegando, em síntese, que aquela e o Réu foram casados entre si, no regime da separação de bens e, em 04/05/2001, ambos adquiriram um prédio rústico, denominado (…) e (...), com a área de 720 m2, sito no Lugar da …, da freguesia de …, concelho de (...), descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º …, prédio esse no qual, durante a constância do matrimónio e com as poupanças de ambos, construíram uma...

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