Acórdão nº 1035/09.3TBCHV.G3 de Tribunal da Relação de Guimarães, 23 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelFERNANDA PROENÇA FERNANDES
Data da Resolução23 de Maio de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório.

(…) , casados entre si, residentes em (…) em Chaves, intentaram no actual Juízo Local Cível de Chaves, (…) , Comarca de Vila Real, a presente acção declarativa de condenação, agora de processo comum, contra (…) casados entre si, residentes na Rua (…) Chaves;(…) , casados entre si, residentes na Av. (…) em Chaves; (…) solteiro, maior, residente na (…) em Setúbal, e(…) , casados entre si, residentes na R. (…) em Chaves.

Peticionaram se declare o reconhecimento do seu direito de propriedade sobre um quinze avos do prédio rústico inscrito na matriz predial urbana sob o artigo n.º ... e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º ... (freguesia de ...), bem como a consequente ineficácia das vendas posteriores de tal prédio rústico na parte respeitante àquela proporção de que são proprietários, com a alteração em conformidade do registo predial.

Peticionaram ainda, nesta sequência, que os réus se abstenham de realizar qualquer trabalho ou intervenção no imóvel sem autorização dos autores, bem como o pagamento, por parte dos réus, de todos os prejuízos que consideram ter sofrido com a perda das árvores e do mato existentes em tal prédio rústico (cerca de 1.000,00 euros), quer com os honorários e despesas associados ao recurso a juízo que os autores fixam, globalmente, em 2.500,00 euros, bem como no pagamento de juros, à taxa legal, contados desde a citação e até efectivo pagamento.

Fundamentando tais pretensões e em síntese, alegaram os autores que por escritura pública de compra e venda, datada de 29 de Agosto de 1980, outorgada no Cartório Notarial de Chaves, os réus J. R. e M. F. venderam aos autores um quinze avos indivisos do prédio rústico composto de terra de cultivo no lugar de ..., tendo os autores, entretanto e na sequência de buscas efectuadas, tomado conhecimento que em 13 de Janeiro de 2005, foram realizadas duas escrituras de compra e venda no Cartório Notarial de Chaves, entre os primeiros e os segundos réus e entre o terceiro e os quartos réus, onde os primeiros réus declararam vender ao réu A. L. e o terceiro réu R. P. declarou vender ao quarto réu marido, metade indivisa do predito prédio rústico, situado no lugar de ....

Mais alegaram os autores que pelo mês de Outubro de 2008, tomaram conhecimento que o réu G. N., arbitrariamente, realizou trabalhos de terraplanagem no mesmo prédio rústico sem autorização/conhecimento dos autores, apropriando-se das árvores e do mato que ali se encontravam e dando-lhes destino desconhecido, provocando aos autores prejuízo não inferior a € 1.000,00.

Os réus A. L., L. L., G. N. e I. T. contestaram, impugnando os factos alegados pelos autores e pugnando pela improcedência da acção, invocando entre o mais, desconhecer, sem culpa, toda a factualidade inerente à compra invocada pelos autores, designadamente a outorga da escritura pública correspondente.

A fls. 87 a 88 dos autos foi proferido despacho no qual se decidiu julgar verificada a excepção dilatória de falta de personalidade judiciária dos réus J. R. e M. F. e, consequentemente, se indeferiu liminarmente a petição inicial relativamente aos mesmos réus.

Os autores deduziram incidente de intervenção principal provocada das heranças ilíquidas e indivisas abertas por óbito de J. R. e M. F., tendo-se proferido despacho de deferimento do predito incidente e determinado a citação dos intervenientes/chamados.

Por duas vezes foi designada data para realização da audiência prévia, tendo em vista o conhecimento imediato do mérito da causa, tendo sido proferidos os despachos saneadores sentença de fls. 238 e ss. datado de 25/05/2016 e de fls. 302 e ss. datado de 13/06/2017, dos quais houve interposição de recurso pelos autores, tendo sido ambos anulados por acórdãos do Tribunal da Relação de Guimarães de 16/02/2017 a fls. 273 e ss. e 18/01/2018 a fls. 334 e ss., com os fundamentos ali descriminados.

Corrigidos os vícios apontados por tais acórdãos, a fls. 359 e ss. vieram os autores requerer a ampliação do pedido.

Tal requerimento foi indeferido por despacho de fls. 374 e ss. proferido 03/07/2018, com o seguinte teor: “- Da Ampliação do Pedido Notificados para se pronunciar sobre a contestação apresentada pelos RR. vieram os AA. a fls. 359 e ss. proceder à ampliação do pedido.

Alegam em síntese que a venda operada pelos RR. da totalidade do imóvel é nula por se tratar de bens alheios pelo que o registo não pode ser válido. Contudo, caso o Tribunal venha a aceitar que o registo é válido e eficaz e que se sobrepõe à nulidade do contrato que lhe está subjacente, sempre estaríamos em presença de um enriquecimento sem causa, abusivo e ilegítimo, pelo que devem os herdeiros de J. R. e de M. F. e o co-R. R. P., serem condenados a pagar aos AA. o valor correspondente a 1/15 do imóvel, ou seja, se venderam o imóvel, na totalidade, por € 299.278,72, por aplicação de uma regra proporcional, devem ser condenados a entregar aos AA. 1/15 do preço, o que perfaz a importância de €19951,91. Pretendem por isso os AA. a ampliação do pedido, a título subsidiário, e pedem a condenação dos Chamados (herdeiros de J. R. e de M. F.) e do co-R. R. P., no pagamento de 1/15 do preço do imóvel, ou seja, € 19.951,91, acrescidos de juros, à taxa legal, contados de 13 de Janeiro de 2005 e até efectivo pagamento.

Em resposta, vieram os RR. insurgir-se contra a requerida ampliação do pedido uma vez que os AA. pretendem transformar uma acção de natureza real numa acção de natureza obrigacional com pedidos totalmente diferentes, sendo certo que não há propriamente uma ampliação do pedido mas sim a dedução de novos pedidos a título subsidiário. Alegam ainda os RR. que mesmo que se admitam os referidos pedidos, o enriquecimento peticionado já estaria prescrito e nunca teriam os AA. direito ao valor do enriquecimento pelo valor das vendas operadas pelos RR. mas quando muito, tão só pelo valor da compra dos 1/15 pelo preço de 50.000,00 escudos, ou seja, € 250,00.

Vejamos então se é de admitir a ampliação do pedido. Sendo apresentada, a petição inicial é dada a conhecer ao réu através da citação e a partir desse momento a instância torna-se estável quanto às pessoas e quanto ao objecto – artigo 260º do Código de Processo Civil que consagra o princípio da estabilidade da instância.

Este princípio admite, porém, algumas excepções tanto do lado subjectivo (caso dos artigos 311º e segs, 351º e segs do mesmo código) como do lado objectivo.

Dispõe o artigo 264º da lei processual civil que o pedido e a causa de pedir podem ser livremente modificados em qualquer altura desde que não sejam afectadas as boas condições do julgamento da causa quando o autor e réu estejam de acordo.

Não havendo acordo só poderá haver modificações objectivas nos termos estabelecidos no artigo 265º do Código de Processo Civil.

Preceitua o n. º2 (1ª parte) deste normativo que o autor pode em qualquer altura reduzir o pedido e pode ampliá-lo até ao encerramento da discussão em 1ª instância se ampliação for o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo.

Põem-se dois limites á ampliação: um limite de tempo e um limite de qualidade ou de nexo. Limite de tempo: a ampliação é inadmissível depois de encerrada a discussão na primeira instância. Limite de qualidade ou de nexo: a ampliação há-de ser o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo, quer-se dizer a ampliação há-de estar contida virtualmente no pedido inicial.

A ampliação pressupõe que dentro da mesma causa de pedir a pretensão primitiva se modifica para mais (cf. neste sentido Prof. Alberto dos Reis em Com III pp 94 e ss).

No caso dos autos, não existe qualquer desenvolvimento dos pedidos primitivos mas antes a dedução de novo pedido a título subsidiário e para o caso de o primeiros não procederem e com uma causa de pedir completamente distinta, com absoluta convolação da relação jurídica subjacente.

Nos pedidos formulados primitivamente, a causa de pedir assenta na existência de um direito de propriedade dos AA. sobre 1/15 do prédio rústico em causa pretendendo aqueles, além do mais, que o Tribunal reconheça tal direito e declare ineficazes as vendas operadas entre os RR. na parte respeitante a esses 1/15 pertença dos AA. rectificando-se os registos e conformidade. Temos pois que a pretensão formulada pelos AA. nesta acção opera no plano dos direitos reais, levando caso, no plano do mérito da causa, procedam os termos alegados pelos AA. à definição e concretização, do seu direito de propriedade sobre o dito imóvel.

No pedido agora formulado a título subsidiário os AA. invocam a figura ou instituto geral do enriquecimento sem causa, no qual a causa de pedir deixa de ser o direito de propriedade dos AA. para passar a ser a existência de um enriquecimento na esfera dos RR. mediante um empobrecimento na dos AA. sem qualquer causa justificativa, passando assim de um direito real para uma pretensão puramente obrigacional. Tratam-se de vias jurídicas profundamente diversificadas para obter a tutela de determinado interesse patrimonial, implicando, aliás, a formulação de pretensões materiais perfeitamente diversificadas: é que a construção fundada no instituto do enriquecimento sem causa, implica necessariamente a formulação de uma pretensão de natureza creditória ou obrigacional, que é co natural a tal instituto, que apenas pode originar uma obrigação de restituir ao empobrecido aquilo com que injustamente se locupletou, nos termos do art. 473º do C.C.

Em suma: as pretensões materiais formuladas para além de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT