Acórdão nº 1473/17.8T8BGC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 23 de Maio de 2019
Magistrado Responsável | EUGÉNIA CUNHA |
Data da Resolução | 23 de Maio de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I.
RELATÓRIO Apelante: (…) Apelado: (…) (…) residente na Rua (…) Queluz, intentou contra (…) residente na Rua D(…) m B., a presente ação declarativa, sob a forma comum, pedindo que: a) se declarem falsas, por não corresponderem à realidade, as declarações prestadas pelo Réu e, bem assim, pelas testemunhas na escritura notarial lavrada no dia (…) no Cartório Notarial do Dr. (…) , oficial público, na Avenida(…) , B., relativas a metade o prédio rústico correspondente ao artigo matricial ....º da freguesia de ..., nomeadamente as referidas nos artigos 6.º e 7.º da p.i; b) se declare que o Réu não adquiriu a metade indivisa do prédio a que a Autora se refere por usucapião nem de qualquer outra forma; c) se declare impugnada a aquisição por usucapião invocada na referida escritura referida em a), relativa a metade indivisa do prédio nos termos expostos na p.i. e impugnada a própria escritura; d) se declare nula, sem qualquer efeito e ineficaz em relação à Autora, a escritura e o teor da mesma no que toca à metade indivisa em causa; e) se ordene o cancelamento do registo de aquisição a favor do Réu; por falta de correspondência com a verdade, pois que a metade indivisa do prédio rústico que é daquela objeto foi por si adquirida por partilha da herança da sua mãe e que o Réu, seu irmão, apenas dela zelou em representação dela e por mera tolerância..
Regularmente citado, o Réu apresentou-se a contestar, excecionando a ineptidão da petição inicial e deduzindo pedido reconvencional a solicitar: a) se declare que a escritura notarial de justificação lavrada no cartório notarial do Dr. M. B. no dia 13.03.2015, relativa ao prédio rústico ....º da freguesia de ..., é válida e eficaz, com todas as consequências legais; b) se declare que o Réu é dono, proprietário e legitimo possuidor, em exclusivo, de todo o prédio rustico, sito no lugar de ..., freguesia de ..., inscrito na matriz sob o artigo ....º, a confrontar do norte com M. S., Sul com A. F., nascente e poente com caminho; c) se condene a Autora a abster-se de praticar qualquer acto perturbador de posse e de propriedade por parte do Réu e a reconhecer os direitos deste; d) se condene a Autora a pagar ao Réu quantia, que se vier a liquidar em execução de sentença, por litigar de má-fé.
Alega, como fundamento deste pedido, que a Autora litiga contra o direito e, por isso, de má fé, o que lhe provocou despesas e demais danos, a compensar com quantia não inferior a 10.000,00€, a pagar pela Autora ao Réu a título indemnizatório.
A Autora apresentou réplica, onde se pronunciou quanto à invocada exceção e impugnou factos alegados pelo Réu na reconvenção.
Foi proferido despacho saneador, onde se admitiu o pedido reconvencional e se julgou improcedente a exceção de ineptidão da petição inicial.
*Procedeu-se à realização da audiência de julgamento, com observância das formalidades legais.
*Foi proferida sentença com a seguinte parte dispositiva: “Por todo o exposto: A) Julgo totalmente improcedente a presente acção e, em consequência, absolvo o Réu dos pedidos contra si formulados pela Autora; B) Julgo totalmente procedente o pedido reconvencional deduzido pelo Réu e, em consequência: a) Declaro, e condeno a Autora Maria a tal reconhecer, que a escritura notarial de justificação lavrada no Cartório Notarial do Dr. M. B. no dia 13.03.2015, relativa ao prédio rústico ....º da freguesia de ..., é válida e eficaz, com todas as consequências legais; b) Declaro, e condeno a Autora a tal reconhecer, que o Réu L. C. é dono, proprietário e legítimo possuidor, em exclusivo, de todo o prédio rústico sito no lugar de ..., da freguesia e concelho de ..., inscrito na matriz sob o artigo ....º da referida freguesia; c) Condeno a Autora a abster-se da prática de qualquer acto que perturbe os legítimos direitos de posse e propriedade do Réu sobre o dito prédio.
C) Condeno a Autora, por litigância de má-fé, a pagar uma multa de valor equivalente a 2 (duas) U.C.’s e uma indemnização ao Réu no valor de € 1.434,00 (mil quatrocentos e trinta e quatro euros).
*Custas da acção e da reconvenção, na totalidade, a cargo da Autora (cfr. artigos 527.º, n.º 1 e 2, e 607.º, n.º 6, do C.P.C.).
Registe e notifique, sendo ainda a Autora para efeitos do disposto no artigo 543.º, n.º 4, do C.P.C..
*Na medida em que a presente decisão está sujeita a registo (cfr. artigo 3.º, n.º 1, alínea c), do Código do Registo Predial), determino que, após trânsito em julgado, se dê cumprimento ao preceituado nos artigos 8.º-A, n.º 1, alínea b), e 8.º-B, n.º 3, alínea a), e 8.º-C, n.º 3, do Código do Registo Predial.
*Ainda após trânsito: i) extraia cópia certificada da presente decisão e remete-a ao Cartório Notarial identificado em B)a), nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 202.º, alínea c), e 203.º do Código do Notariado; ii) comunique ao Instituto da Segurança Social, I.P. – Centro Distrital de B. para cancelamento da protecção jurídica nos termos do disposto no artigo 10.º, n.º 1, alínea d), da Lei n.º 34/2004, de 29.07”.
*A Autora apresentou recurso de apelação pugnando por que se revogue a decisão recorrida, substituindo-se a mesma por outra que julgue procede a ação.
Formula, para tanto, as seguintes CONCLUSÕES: 1ª A decisão ora em crise julga improcedente a ação, em nossa modesta opinião mal.
-
Não se crê que o tribunal “a quo” tenha valorado correctamente o teor dos documentos juntos pela Autora e pelo Réu, conjugados com a prova testemunhal produzida e as declarações e depoimento de parte.
-
Somos de modesta opinião que existe contradição entre os factos dados como provados e entre estes e os dados como não provados.
-
Nomeadamente, o facto dado como provado em 6. e em 7. parecem estar em contradição porquanto no primeiro (6.) se dá como provado que o Réu administrou o prédio em mérito em seu nome e em nome da sua irmã e; no segundo (7.) esta nunca cultivou ou mandou cultivar o referido prédio e nunca praticou qualquer acto revelador da sua qualidade de comproprietária.
-
Se bem se dá como provado (em 6.) que o Réu administrou o prédio em nome próprio e em nome da irmã, não se pode, no facto seguinte, dar-se como provado que esta última nunca praticou qualquer acto revelador da sua qualidade de comproprietária, já que permitiu ao seu irmão, o Réu, que o cultivasse por si, ou por intermédio de terceiros e, por três (3) ocasiões, foi ao prédio colher maçãs e, ao longo dos anos pagou sempre o IMI.
-
Acresce que o facto dado como provado em 6., parece colidir com o facto não provado de que o Réu tem agido apenas e tão só na qualidade de zelador da sua irmã, em sua representação e por sua mera tolerância.
Com o que concluímos que este facto deveria ter sido igualmente dado como provado.
-
É nosso modesto entendimento que não se deveria ter dado como provado que a Autora se recusou a outorgar a escritura de compra e venda da sua metade indivisa do prédio em mérito ao Réu, porquanto da procuração junta aos autos resulta precisamente que esta (Autora) confere poderes a um Ilustre Advogado para, em sua representação, vender um prédio rústico sito em ....
-
E, também não se fez prova (quer por documentos, quer testemunhal) de que, em algum momento, o Réu solicitou à Autora (pessoalmente ou por intermédio de quem quer que fosse) que ela outorgasse nova procuração para celebrar a escritura e esta o tenha recusado. – neste sentido, vide depoimento de parte do Réu registado entre as 09:56:16 e as 10:41:56, e as declarações de parte da Autora registadas entre as 10:43:15 e as 11:45:18.
-
De facto, a Autora, nas suas declarações, referiu nunca ter recebido qualquer quantia do Réu seu irmão, como pagamento da sua parte do prédio em mérito. Recebeu dele, outrossim, dinheiro referente à venda de um palheiro.– Cfr. declarações registadas entre as 10:43:15 e as 11:45:18.
-
Somos igualmente de modesta opinião que não se pode dar como provado que o Réu praticou todos os actos descritos em 10. sobre o prédio à vista da Autora, porquanto em 6. se deu como provado que esta residia e até hoje reside, longe de ....
-
Finalmente, pugnamos pela não condenação da Autora como litigante de má – fé em multa e indemnização pois, pese embora tenha reconhecido que nunca ocupou o prédio, o cultivou ou mandou cultivar (com excepção da colheita de maçãs por três vezes), não é menos certo que ela nunca o fez precisamente por permitir ao seu irmão que, na qualidade de zelador, praticasse os actos de posse por si e em sua representação.
-
Assim, não deveria o Tribunal ter condenado em multa (embora no mínimo legal) porque desconhecedor da condição económica da Autora, (reformada, com uma pensão no valor de € 307,00 mensais) e 13ª Menos ainda em indemnização no valor global de € 1.434,00, até porque não foi concedida às partes a possibilidade de, nos termos do n.º 3 do Artigo 543º do C.P.C. se pronunciarem.
A sentença impugnada, ao decidir como fez, violou e/ou não interpretou correctamente as seguintes disposições legais: - Código de Processo Civil: Artigo 543º;- Código Civil: Artigo 1251º; Artigo 1256º; Artigo 1257º; Artigo 1259º; Artigo 1260º; Artigo 1260º; Artigo 1261º; e Outros.
*Não foram oferecidas contra-alegações.
*Após os vistos, cumpre apreciar e decidir o mérito do recurso interposto.
*II. FUNDAMENTAÇÃO OBJETO DO RECURSO Apontemos as questões objeto do presente recurso, tendo presente que o mesmo é balizado pelas conclusões das alegações da recorrente, estando vedado ao tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que se imponha o seu conhecimento oficioso, acrescendo que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do ato recorrido – cfr. arts 635º, nº4, 637º, nº2 e 639º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.
Assim, as questões a decidir são as seguintes: 1ª- Do erro na apreciação da prova e, consequentemente, se é de alterar a decisão da matéria de facto fixada pelo Tribunal a quo...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO