Acórdão nº 4959/18.3T8GMR-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Dezembro de 2019
Magistrado Responsável | ALCIDES RODRIGUES |
Data da Resolução | 17 de Dezembro de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório M. F., executada nos autos principais de execução, deduziu oposição à execução, mediante embargos de executado, contra o Banco ..., S.A., pedindo que: I – Seja declarada e reconhecida a satisfação integral do crédito do Banco Exequente por via da aquisição do imóvel hipotecado, sendo então a execução extinta, com as demais consequências legais.
II – Caso assim não seja entendido: a) Ser declarada nula a Cláusula Vigésima Quarta inserta no Documento Complementar à Escritura Pública de Mútuo com Hipoteca e Fiança; b) Ser reconhecida a falta de interpelação dos devedores e da fiadora ora Embargante para os efeitos legais; c) Ser declarada a invocada prescrição das prestações mensais e respetivos juros vencidos até Fevereiro de 2014; d) A condenação do Exequente como litigante de má-fé, em quantia a apurar pelo douto critério do Tribunal, bem como em custas e procuradoria condigna.
Para tanto alegou, em resumo, que: Reconhece que interveio como fiadora da referida escritura de mútuo com hipoteca e fiança, desconhecendo no entanto os termos e condições do contrato de mútuo celebrado entre o Exequente e os restantes Executados, sendo antes estes quem o contrataram e negociaram, nomeadamente o respetivo montante, condições de pagamento e prazo.
Só com a citação para os termos dos presentes autos a Embargante teve conhecimento desta alegada dívida, uma vez que nunca foi interpelada para qualquer pagamento, mora ou incumprimento, por qualquer meio ou por parte de quem quer que seja.
A cláusula vigésima quarta do documento complementar do contrato de mútuo com hipoteca invocada pelo exequente para considerar vencida a dívida por si alegada é nula por permitir ao Banco ora Exequente considerar vencidas todas as prestações num conjunto de situações, conduzindo a um notório desequilíbrio em desfavor dos mutuários.
*Recebidos liminarmente os embargos de executado, a exequente/embargada, apresentou contestação, na qual, alegando que não existe qualquer fundamento para a oposição, concluiu pela improcedência dos embargos (cfr. fls. 16 a 21).
*Dispensada a audiência prévia e elaborado despacho saneador, nele foi afirmada a validade e a regularidade da instância, tendo-se procedido à identificação do objeto do litígio e à enunciação dos temas da prova, bem como foram admitidos os meios de prova (cfr. fls. 90 a 93).
*Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento (cfr. acta de fls. 32 e 33).
*Posteriormente, o Mm.º Julgador “a quo” proferiu sentença, datada de 14/06/2019, (cfr. fls. 34 a 48), nos termos da qual decidiu: - julgar procedentes os presentes embargos de executado e, em consequência, determinou a extinção da instância executiva contra a embargante.
- julgar improcedente o pedido de condenação do banco exequente como litigante de má-fé.
*Inconformada, a embargada/exequente interpôs recurso da sentença (cfr. fls. 52 a 57) e formulou, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões (que se transcrevem): «I – O presente recurso vem interposto da parte da douta sentença sub judice que julgando procedentes, por provados, os embargos de executado apresentados pela Embargante (fiadora), declarou, quanto a esta, extinta a execução, com fundamento na sua falta de interpelação para proceder ao pagamento da dívida reclamada pelo banco Exequente, não lhe sendo esta, ainda, e a existir, exigível.
II - Decisão com a qual o Recorrente não se conforma; porquanto, no seu modesto entendimento, da conjugação do regime jurídico da fiança (artigos 627.º e seguintes do Código Civil) com os artigos 405.º, 270.º e 432.º, n.º 1 do mesmo diploma legal, resulta que as partes convencionaram uma condição resolutiva do contrato que, a verificar-se, seria causa de resolução automática do contrato de mútuo com hipoteca e fiança, sendo desnecessária a interpelação da fiadora; sempre se dizendo que a citação torna vencida a dívida e, consequentemente, exigível, nos termos do artigo 610.º, n.º 2, alínea b) do Código de processo Civil, sem necessidade de interpelação da fiadora.
III – Que a douta sentença sub judice, ao não considerar, violou.
IV – Resultaram provados os seguintes factos: “1.- O Banco ... Crédito, S.A. (que figura como credor no(s) título(s) executivo(s)), extinguiu-se por força da sua incorporação no Banco ..., S.A que assim sucedeu na titularidade da(s) obrigação(ões) exequenda(s) e respetivas garantias, conforme certidão permanente com código de acesso ....-....-...., cujos dizeres se dão aqui por integralmente reproduzidos; 2.- Por seu turno, o Banco ..., S.A. sucedeu ao Banco ..., S.A. na titularidade da(s) obrigação(ões) exequenda(s) e respetivas garantias, por força de deliberação do Conselho de Administração do Banco de Portugal de 3 de agosto de 2014; 3.- No dia 30/01/2002, o Exequente celebrou com os Executados V. S. e F. S. um contrato de mútuo, no montante de € 42.397,82 (quarenta e dois mil, trezentos e noventa e sete euros e oitenta e dois cêntimos), conforme escritura pública junta com o requerimento executivo, cujos dizeres se dão aqui por integralmente reproduzidos; 4.- Para garantia do capital mutuado, respetivos juros e despesas, constituiu(ram) o(s) Mutuário(s) V. S. e F. S. a favor do Exequente, hipoteca sobre o imóvel que veio a ser penhorado e vendido no processo de execução fiscal que correu os seus termos pelo Serviço de Finanças de …, sob o n.º ...10; 5.- A existência da supra referida penhora tornou vencida a dívida, desde 30/08/2005, na sua totalidade, conforme cláusula vigésima quarta do documento complementar à escritura pública junta com o requerimento executivo, cujos dizeres se dão aqui por integralmente reproduzidos; 6.- Nesse processo de execução fiscal, onde o Exequente interveio na qualidade de Credor Reclamante, com o produto da venda do referido imóvel foi liquidada parte do empréstimo; remanescendo, ainda, em dívida o montante de € 31.495,08, (trinta e um mil, quatrocentos e noventa e cinco euros e oito cêntimos); 7.- Que até à presente data não foi pago; 8.- A Executada M. F., constituiu-se fiadora e principal pagadora, com expressa renúncia ao benefício da excussão prévia, por tudo quanto viesse a ser devido ao Exequente em consequência do referido contrato de mútuo identificado em 3; 9.- Com a presente execução pretende o Exequente obter o pagamento coercivo da quantia de € 41.510,43 (quarenta e um mil, quinhentos e dez euros e quarenta e três cêntimos); 10.- A cláusula Vigésima Quarta do documento complementar à escritura pública prevê o seguinte: “A execução, arresto, penhora ou qualquer outra forma de oneração ou alienação do bem ora hipotecado, assim como a falta de pagamento nos respetivos vencimentos, de qualquer das responsabilidades agora garantidas, importarão a imediata exigibilidade de todas as responsabilidades garantidas e, consequentemente a imediata exequibilidade desta escritura.”; 11.- Por carta simples datada de 09 de julho de 2004 remetida para a Avenida ..., o banco exequente interpelou a embargante M. F. de que, nessa data, o valor em dívida respeitante ao contrato de mútuo identificado em 3., era do valor total de 315,02 euros, conforme missiva junta com a contestação como documento n.º 1, cujos dizeres se dão aqui por integralmente reproduzidos; 12.- Por carta simples datada de 16 de novembro de 2004 remetida para a Avenida da ..., o banco exequente interpelou a embargante M. F. de que, nessa data, o valor em dívida respeitante ao contrato de mútuo identificado em 3., era do valor total de 158,96 euros, conforme missiva junta com a contestação como documento n.º 2, cujos dizeres se dão aqui por integralmente reproduzidos.” V – Assim, tendo ocorrido a penhora do imóvel hipotecado a favor do Recorrente – facto provado n.º 5 - em processo de execução fiscal – facto a que o Recorrente é totalmente alheio - desta resultou o automático vencimento antecipado da totalidade da obrigação – cfr. cláusula 24ª do documento complementar à escritura.
VI – Ou seja, contrariamente ao que resulta da douta sentença, o vencimento antecipado da obrigação não decorreu do incumprimento mas da penhora inscrita sobre o imóvel pelo devedor dado de hipoteca, determinando, como convencionado na referida clausula, a imediata exigibilidade de todas as responsabilidades garantidas e, consequentemente, a imediata exequibilidade da dívida.
VII - Dispõe o artigo 270.º do Código Civil “As partes podem subordinar a um acontecimento futuro e incerto a produção dos efeitos do negócio jurídico ou a sua resolução; no primeiro caso, diz-se suspensiva; no segundo, resolutiva.”; Mais dispondo o artigo 432.º, n.º 1 do mesmo diploma legal que “É admitida a resolução do contrato fundada na lei ou em convenção.” VIII - Convencionaram, assim, as partes uma condição resolutiva que, a verificar-se, seria causa de resolução automática do contrato; Pelo que o vencimento antecipado da obrigação tornou a dívida imediatamente exigível, na sua totalidade, pelo credor Exequente à fiadora Embargante.
IX- Consequentemente, tendo ocorrido o facto objetivo da penhora, em sede de execução fiscal – ao qual o Exequente é totalmente alheio – deu-se o vencimento antecipado da totalidade da dívida (capital e juros), respondendo a fiadora na mesma medida que o devedor principal.
X - Porém, não tendo o Exequente conseguido demonstrar a boa receção, pela fiadora, da interpelação para pagamento que lhe dirigiu – cfr. factos provados n.ºs 11 e 12 - a outra conclusão não se poderá deixar de chegar que não seja a de responsabilizar a fiadora pelo pagamento do capital vencido e de juros, a contar apenas desde a citação até efetivo e integral pagamento.
XI - Nem de outro modo poderia ser, por força da aplicação do disposto no artigo 610.º, n.º 2, alínea b) do CPC; Logo, a citação tornaria exigível a dívida, independentemente da falta de interpelação da fiadora.
XII- Pelo exposto deve a douta sentença sub judice ser revogada e...
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