Acórdão nº 1261/17.1T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 26 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelALDA MARTINS
Data da Resolução26 de Setembro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

APELAÇÃO - PROCESSO N.º 1261/17.1T8VCT.G1 1.

Relatório Nos presentes autos de acção declarativa de condenação, com processo especial emergente de acidente de trabalho, veio A. P.

pedir a condenação de X, Unipessoal, Lda.

a pagar-lhe uma pensão anual e vitalícia de € 5. 968,01, subsídio de elevada incapacidade de € 4 802,13, indemnização por incapacidades temporárias no valor de € 11 393,50, despesas com deslocações no valor de € 398,41, despesas médicas e medicamentosas no valor de € 863,82 e juros de mora.

Para tanto alegou, em síntese, que exercia a actividade de carpinteiro sob as ordens, direcção e fiscalização da Ré, auferindo um salário anual de € 9 800,00, e que no dia 25 de Fevereiro de 2016 sofreu um acidente de viação quando, ao serviço da entidade empregadora, se deslocava da sua residência para o local de trabalho.

A Ré veio contestar, alegando, em síntese, que o Autor era trabalhador por conta própria na arte da carpintaria e foi nessa qualidade que foi contratado para, com autonomia e sem exclusividade, prestar serviços em obras concretas e por determinado período de tempo, deslocando-se àquelas em viatura própria e usando ferramentas de trabalho que eram suas. Mais alegou que o acidente ocorreu por culpa exclusiva do Autor, que violou de forma gravosa e grosseira as regras estradais.

Foi elaborado despacho saneador e fixadas a matéria de facto assente e a base instrutória, tendo o Autor apresentado reclamação que foi deferida.

Procedeu-se a julgamento, no termo do qual foi proferida decisão sobre a matéria de facto constante da base instrutória, sem reclamações.

Seguidamente, pelo Mmo. Juiz a quo foi proferida sentença, que terminou com o seguinte dispositivo: «Pelo exposto, o Tribunal julga parcialmente procedente a presente acção e, em consequência, decide; 1 - Condenar a ré “X, Unipessoal, Lda” a pagar ao autor as seguintes prestações reparatórias: 1.1 - a pensão anual e vitalícia de Euros 4 993,64, com início em 8 de Outubro de 2017, sendo actualizada em 2018 para o valor de Euros 5 083,53 e em 2019 para o valor de Euros 5 164,87; 1.2 - a título de subsídio de elevada incapacidade, o valor de Euros 4 778,35; 1.3 - a título de incapacidade temporária absoluta, o valor de Euros 9 549,55; 1.4 - a título de despesas com consultas, medicamentos, exames e internamentos decorrentes do acidente objecto dos autos, o valor de Euros 913,64; 1.5 - a título de despesas com deslocações para a realização de consultas, exames, operações, fisioterapia e outros tratamentos decorrentes do acidente objecto dos autos, o valor de Euros 398,41; 1.6 - aos juros de mora contados à taxa civil legal em vigor sobre: - a pensão anual e vitalícia nos termos do artigo 72º do RRATDP; - o montante do subsídio de elevada incapacidade desde a data da alta até à entrega efectiva deste; - o montante das despesas com consultas médicas, exames, medicamento e deslocações desde a data da citação até à entrega efectiva deste; Custas pela R. e pelo A. na proporção de 85% para a primeira e 15% para o segundo.» A Ré, inconformada, interpôs recurso, formulando as seguintes conclusões: «I - Na douta sentença proferida e ora recorrida julgou-se parcialmente procedente a acção, declarando-se que a Ré não logrou provar a descaracterização do acidente.

II – Porém e em conformidade com o ora alegado e provado, deveria aquela sentença ter dado como provada a descaracterização do acidente nos termos do artigo 14.º, n.º1 da Lei n.º 98/2009, de 04 de Setembro, não cabendo à ora Ré qualquer responsabilidade, julgando-se totalmente improcedente a acção.

III – Resulta da Prova documental, constituída pela Auto de Participação de Acidente de Viação, que não só Autor é o único e exclusivo responsável pelo acidente de que foi vítima, bem como a sua actuação é ilícita, altamente irresponsável e temerária.

IV – Resulta do depoimento prestado pelo condutor do autocarro, que este e os demais condutores tudo fizeram para evitar o sinistro e que o Autor nada fez para o evitar o embate no autocarro.

V – Logo, não foi devidamente valorada a prova pelo tribunal “a quo”, que desvaloriza o grau de culpa do Autor, devendo no mínimo considerar que o Autor, ao actuar como actuou, agiu no mínimo negligência grosseira.

VI - Aliás, a forte imprudência do Autor pôs não só em risco a sua integridade física e a sua vida, como as dos demais utilizadores da via, designadamente a do condutor do autocarro e seus ocupantes. VII – Pelo que a actuação do Autor configura um caso, no mínimo, de negligência grosseira e, por conseguinte, se encontra descaracterizado o acidente de trabalho.

VIII - O Autor sabia, analisada a prova, que o acidente que veio a ocorrer poderia ser uma consequência imediata do seu comportamento, mas conformou-se com essa circunstância e nada fez para a evitar.

IX - Na verdade não se trata de uma simples ultrapassagem mal calculada ou inábil, uma vez que ficou provado o Autor teve tempo e condições bastantes para evitar o acidente.

X – Acresce ainda que o entendimento, como defende PEDRO ROMANO MARTINEZ, que a lei não fez depender tal descaracterização do acidente do grau de culpa do sinistrado, antes optou por considerar que a simples violação, sem causa justificativa, das condições de segurança é razão suficiente para a operar.

XI – Assim, impunha-se a absolvição da Ré, não lhe sendo devida a reparação dos danos emergentes do acidente.» O Autor respondeu ao recurso da Ré, pugnando pela sua improcedência.

O recurso foi admitido como apelação, com efeito meramente devolutivo.

Recebidos os autos neste Tribunal da Relação, pelo Senhor Procurador-Geral Adjunto foi emitido parecer no sentido da improcedência do recurso.

Colhidos os vistos dos Exmos. Desembargadores Adjuntos, cumpre decidir.

  1. Objecto do recurso Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente – arts. 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1 do Código de Processo Civil –, as questões que se colocam a este Tribunal são as seguintes: - Impugnação da decisão sobre a matéria de facto; - Descaracterização do acidente de trabalho.

  2. Fundamentação de facto Estão provados os seguintes factos: 1. O Autor nasceu a - de - de 1973.

  3. O Autor, para o exercício da sua actividade de carpinteiro, utilizava ferramentas suas: fita métrica, lápis e martelo.

  4. No dia 25 de Fevereiro de 2016, pelas 7.40 horas, na EN 13, ao Km 76,00, em …, o Autor quando se deslocava em viatura automóvel embateu noutro veículo que circulava em sentido contrário.

  5. O Autor, em resultado do acidente de viação ocorrido em 25 de Fevereiro de 2016, ficou com uma incapacidade permanente parcial de 54,4904% e com incapacidade permanente absoluta para a actividade profissional habitual, sendo que teve alta médica a 8 de Outubro de 2017.

  6. O Autor ficou ainda com ITA entre 26 de Fevereiro de 2016 e 8 de Outubro de 2017.

  7. O Autor foi admitido ao serviço da Ré X, Unipessoal, Lda., para exercer a actividade de carpinteiro mediante retribuição.

  8. O local habitual de trabalho do Autor era nas instalações da Ré, sitas na Estrada …, Lugar do …, Vilar de Mouros, onde se situa a oficina de carpintaria.

  9. O Autor...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT