Acórdão nº 3676/19.1T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelEVA ALMEIDA
Data da Resolução15 de Abril de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I – RELATÓRIO T. F. instaurou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra J. S. e P. F., pedindo, que seja declarado anulado o contrato de compra e venda celebrado entre autor e réus e, consequentemente, serem os réus condenados solidariamente na restituição ao autor do montante de €9.000,00 (nove mil euros), bem como, solidariamente, a indemnizarem o autor em montante nunca inferior a €4.000,00 (quatro mil euros), ou, caso assim não se entenda, ser o 2.º réu condenado a restituir ao autor a quantia de €9.000,00 (nove mil euros) bem como a indemnizar o autor em montante nunca inferior a €4.000,00 (quatro mil euros).

Para tanto alegou, em suma, que necessitava de um veículo automóvel e tendo sido informado de que o 1.º réu importava veículos directamente, o que ficava mais barato, recorreu aos seus serviços em Novembro de 2016. Depois de encontrar um veículo, que o 1º réu lhe garantiu estar em óptimas condições, o autor aceitou pagar por ele a quantia de €12.500, adiantando a quantia de €9.000 para que o 1.º réu o fosse buscar ao estrangeiro. O 1.º réu havia-lhe exigido a entrega dessa quantia em numerário, mas como o autor se negou a fazê-lo, o 1º réu forneceu-lhe o IBAN do 2.º réu, que identificou como seu sócio, a fim de o autor transferir a referida quantia para a respectiva conta, o que fez em Fevereiro de 2017.

Aquando da entrega do veículo, o autor verificou que o mesmo não apresentava as condições acordadas, pois estava amolgado e com os interiores degradados. Uma vez que não foi possível repará-lo convenientemente, autor e 1º réu acordaram dar sem efeito o negócio. Contudo os réus recusam-se a devolver-lhe a quantia que transferiu para a conta do 2º réu, que é quem agora circula com o veículo. Por seu turno o autor ficou sem o veículo e sem o dinheiro, tendo de recorrer a empréstimo de terceiros para poder adquirir um veículo.

Subsidiariamente invoca o enriquecimento sem causa porquanto o montante de €9.000,00 saiu do seu património, que assim se viu empobrecido, enriquecendo nessa exacta medida o património do 2º réu, em cuja conta bancária deu entrada.

*Os réus contestaram, arguindo a nulidade de todo o processado por ineptidão da P.I. e excepcionando o caso julgado, relativamente ao 2.º réu, que já tinha sido absolvido da instância numa outra acção, não tendo sido alegados outros factos.

Mais alegam, que, relativamente ao 1.º réu, também não se verificam os pressupostos da anulabilidade por erro e que, de qualquer forma já decorreu o prazo para propor a pertinente acção.

Por último, impugnam a factualidade alegada na P.I., sustentando que o 1.º réu, como combinado, propôs-se entregar ao autor um veículo com as condições pretendidas, mas que este se arrependeu, tendo recusado receber a viatura e a entregar o complemento do valor correspondente à totalidade do preço do veículo, que se cifrou em €12.750,00.

*O autor respondeu à matéria das excepções.

*Realizada audiência prévia, foi proferido despacho saneador, em que se decidiu pela validade da instância e do processado, julgando-se improcedentes as invocadas excepções dilatórias. Identificou-se o objecto do litígio e elencaram-se os temas da prova.

Foi junta aos autos a informação de que o veículo se encontra registado em nome do 2.º réu desde 02-10-2018, com reserva de propriedade a favor do Banco ..., S.A.

*Realizou-se audiência de discussão e julgamento e proferiu-se sentença em que se decidiu: «Face ao exposto, julgo a presente ação intentada por T. F. parcialmente procedente, por provada, e condeno os Réus J. S. e P. F., solidariamente, na restituição ao Autor do montante de €9.000,00 (nove mil euros).

Condeno ainda o Réu J. S. no pagamento ao Autor T. F., da quantia de € 1.000 (mil Euros).

Custas pelos Réus, que deram causa à ação (artigo 527.º, n.º1 do Código de Processo Civil).»*Inconformados, os réus interpuseram o presente recurso, que instruíram com as pertinentes alegações, em que formulam as seguintes conclusões: «PRIMEIRA: Dando-se por reproduzidas as considerações vertidas no corpo destas alegações, e tendo o tribunal de 1ª Instância julgado procedente o pedido formulado a título principal, não poderia ter conhecido e decidido do pedido subsidiário formulado pelo autor.

SEGUNDA: Ainda que assim não fosse, sempre se haveria de constatar que a sentença proferida incorre em manifesta e gritante contradição e erro de raciocínio lógico, que poderá consubstanciar a nulidade da sentença, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 615º do CPC, o que, por dever de patrocínio, se invoca.

TERCEIRA: Isto porque não pode o 1º Réu ser condenado a restituir a quantia de 9.000,00€ que lhe foi entregue pelo autor, ainda que por depósito na conta do 2º Réu; e, ao mesmo tempo, o 2ª Réu ser condenado a restituir os mesmos 9.000,00€ por, afinal, não haver prova de que este valor tivesse saído da sua conta bancária.

QUARTA: Sem prescindir, a verdade é que em nenhum passo da petição inicial se indicia ou se suscita a hipótese do valor depositado pelo autor na conta do 2º réu – a pedido e solicitação do 1º réu – e sem que aquele 2º réu tivesse tido qualquer intervenção no negócio em questão – não ter sido utilizado pelo 1º réu para a aquisição, no estrangeiro, do veículo que este trouxe para o autor; ou se quisermos, que tivesse sido o 2º réu quem tivesse beneficiado ou enriquecido com este quantitativo.

QUINTA: E não se extrai isto, nem na petição inicial que deu origem aos presentes autos, nem na petição inicial que tinha dado origem ao processo que antecedeu a este, conforme decorre da análise daquela petição inicial que os réus juntaram a estes autos com a sua contestação, no qual viria o Tribunal Judicial de Santo Tirso a concluir pela ineptidão da petição inicial.

SEXTA: Pelo contrário, o que resulta alegado pelo autor é que o 1º Réu lhe terá dado o número da conta bancária do 2º Réu para fazer o pagamento (agora sob a forma de adiantamento e não já de sinal) do negócio; que procedeu à transferência bancária dessa quantia para a conta indicada pelo 1º réu e que, após isso, convencionou com o primeiro réu a entrega do veículo, que este 1º réu viria a trazer para a oficina. – sic. artigos 64º a 70º da petição inicial.

SÉTIMA: Mais refere o autor, por diversas vezes, que aquela quantia de 9.000,00€ destinou-se à aquisição do veículo – para ir buscar o carro -, agora sob a forma de adiantamento e antes sob a forma de sinal e que o remanescente do preço seria pago com a entrega do veículo. – sic. artigos 47º e 48º da petição inicial.

OITAVA: Tanto assim que, nos dizeres do autor, acertou com o 1º Réu o cancelamento do negócio e que este se prontificou a restituir tal montante ao autor num prazo máximo de 03 (três dias). – sic. artigos 89º a 92º da petição inicial.

NONA: Logo, não subsistiram dúvidas de que, não obstante ter sido depositada na conta do 2º réu, por indicação do 1º réu, aquele quantitativo destinou-se a este último, tendo sido ele quem se terá locupletado ou enriquecido em tal montante.

DÉCIMA: Pelo que, também por inexistir causa de pedir quanto ao segundo réu também quanto ao pedido subsidiário formulado, deverá reconhecer-se a ineptidão da petição inicial, que expressamente se invoca e se requer venha a ser reconhecida, com o que deverá ser revogada a decisão que, em sede de saneador, julgou não verificada esta exceção.

DÉCIMA PRIMEIRA: Sem prescindir, e como acima se deixou dito, sempre o 2º réu teria de ter sido absolvido do pedido subsidiário que o autor formulou, por não ter ficado demonstrado que o 2º Réu se enriqueceu com qualquer quantitativo pelo simples facto do autor ter depositado o montante de 9.000,00€ numa conta da sua titularidade.

DÉCIMA SEGUNDA: Pelo contrário, o que ficou abundantemente demonstrado da prova testemunhal produzida e das declarações prestadas pelas partes foi que este valor serviu para o 1º réu adquirir o carro no estrangeiro que depois trouxe para Portugal para o entregar ao autor: DÉCIMA TERCEIRA: Aliás, é isso mesmos que também decorre do segmento factual dado como provado pelo Tribunal de 1ª Instância e vertido nos pontos 13 a 18 dos Factos Provados.

DÉCIMA QUARTA: Não pode, por isso, concordar-se com a afirmação vertida na sentença de que Não foi feita qualquer prova do dinheiro a sair da conta do 2º Réu, nomeadamente para ser utilizado na compra do veículo, nem nas despesas, o que impõe seja expressamente impugnada a decisão proferida sobre a matéria de facto e relacionada com esta concreta questão.

DÉCIMA QUINTA: Pois que, como acima se viu, a prova testemunhal produzida foi inequívoca na demonstração de que o dinheiro que o autor depositou na conta do 2º Réu foi por este entregue ao 1º Réu, tendo sido com este valor que o 1º Réu adquiriu o carro no estrangeiro e o trouxe para Portugal para o entregar ao autor.

DÉCIMA SEXTA: Impõe-se, pois, que esta concreta factualidade seja levada à matéria dos Factos Provados, aditando-se o seguinte: 36. A quantia de €9.000,00 (nove mil euros) que o autor depositou na conta do 2º Réu foi por este entregue ao 1º Réu, tendo este último com este quantitativo adquirido o carro no estrangeiro e trazido o carro para Portugal para o entregar ao autor.

DÉCIMA SÉTIMA: Não obstante, e em todo o caso, não era ao 2º Réu que incumbia fazer a prova de que a quantia de 9.000,00€ saiu da sua conta para ser utilizada pelo 1º réu na compra do veículo ou nas despesas, mas antes ao autor, por força do consignado no artigo 342º, n.º 1 do C.C., o que este não logrou demonstrar.

DÉCIMA OITAVA: Ainda sem prescindir, subentende-se da sentença proferida que o Tribunal fundou a decisão da figura do enriquecimento sem causa na circunstância do 2º Réu ter ainda registado em seu nome a viatura, que o 1º Réu e família utilizam.

DÉCIMA NONA: E aqui reside também uma...

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