Acórdão nº 795/20.5T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 08 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelROSÁLIA CUNHA
Data da Resolução08 de Abril de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES RELATÓRIO INVESTIMENTOS IMOBILIÁRIOS X, S.A.

intentou a presente ação declarativa sob a forma de processo comum contra GRUPO Y, S.A.

pedindo: a) a declaração da cessação, a 31 de agosto de 2019, mediante oposição à renovação deduzida pelo senhorio, do contrato de arrendamento celebrado entre autora e ré; b) que seja decretado o despejo e a ré condenada a entregar, de imediato, à autora o imóvel livre e desocupado e no estado de conservação e limpeza que se encontrava à data da celebração do contrato de arrendamento; c) a condenação da ré no pagamento à autora do valor de € 4 337,03, a título de indemnização referente aos meses de setembro de 2019 a fevereiro de 2020; d) a condenação da ré no pagamento de todas as rendas, elevadas ao dobro, nos termos do estatuído no n.º 2 do artigo 1045.º do Código Civil, que, entretanto, se vencerem até efetiva restituição à autora do locado cuja entrega é peticionada; e) a condenação da ré no pagamento dos juros vincendos, contados desde a data da entrada em juízo da petição, sobre as quantias de que é devedora e até efetivo e integral pagamento à autora.

Como fundamento dos seus pedidos, alegou, em síntese, que é dona e legítima proprietária do prédio urbano sito na Rua ..., n.º .., em ..., Vila Nova de Famalicão, que arrendou à Y Charcutaria - ..., S.A., através de contrato com prazo certo, celebrado pelo período de dois anos, sucessivamente renovável por períodos de um ano, que teve o seu início em 1 de setembro de 2014, mediante o pagamento da renda de € 700, anualmente atualizável, e que atualmente se cifra em € 719,84.

A ré incorporou a arrendatária Y Charcutaria - ..., S.A. pelo que sucedeu na posição de arrendatária desta última.

Em 8 de maio de 2019, respeitando a antecedência de 60 dias prevista no contrato de arrendamento, a autora enviou à ré uma carta comunicando a sua oposição à renovação automática do contrato, o qual, consequentemente, cessaria em 31 de agosto de 2019, data em que o imóvel deveria ter sido entregue à autora.

Contudo, até ao presente, a ré não procedeu à entrega do imóvel, continuando a ocupá-lo sem qualquer título.

*Regularmente citada, a ré contestou alegando, em síntese, que a oposição à renovação do contrato de arrendamento formulado pela autora é ineficaz por não ter sido enviada para o local arrendado, tal como prescrevia a cláusula terceira do contrato em causa, e por não ter observado os prazos legais de comunicação previstos no art. 1097.º, n.º 1, do Código Civil, que considera que são de natureza imperativa. Por outro lado, tendo a ré continuado a proceder ao pagamento das rendas devidas pela ocupação do locado para além do prazo em que a autora considerava extinto o contrato de arrendamento, ou seja, para além de 31.8.2019, e não tendo a autora procedido à sua devolução, tal representa um reconhecimento da existência do contrato de arrendamento, pelo que a atuação da autora deve ser enquadrada no instituto do abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium.

Em consequência do alegado, pugnou pela improcedência da ação.

Em reconvenção, a ré pediu a declaração de renovação automática do contrato de arrendamento, pelo período de 3 anos, com início em 01.09.2019 e termo em 31.08.2022, alegando, em síntese, que, sendo reconhecida a ineficácia da oposição à renovação automática do contrato de arrendamento e tendo em conta a divergência entre as partes quanto ao período temporal da renovação, o contrato deve ser considerado renovado pelo período de 3 anos em face da aplicação do atual art. 1096.º, n.º 1, do Código Civil.

*A autora apresentou réplica, pugnando pela improcedência das exceções, tendo alegado que a oposição à renovação automática do contrato é eficaz por a respetiva comunicação ter sido enviada para a sede da ré, que dela teve efetivo conhecimento, além de ter sido observado o prazo contemplado no contrato de arrendamento. Mais alegou não ter reconhecido a existência de qualquer contrato de arrendamento após a sua cessação, limitando-se a receber o valor devido pela ocupação do imóvel por parte da ré, a qual ali permaneceu após 31.08.2019, inexistindo, assim, qualquer abuso de direito da sua parte.

Relativamente à reconvenção, para além de pugnar pela sua inadmissibilidade, invocou ainda a ineptidão do pedido reconvencional, por não terem sido expostos pela ré os factos essenciais que constituem a causa de pedir. Caso assim não se entenda, defendeu a improcedência da reconvenção, por discordar da interpretação que é feita do art. 1096.º do Código Civil.

*Foi exercido o contraditório quanto à exceção invocada na réplica.

*Foi dispensada a realização da audiência prévia.

*Foi fixado à causa o valor de € 45 527,43.

*Foi admitida a dedução do pedido reconvencional.

*Foi proferido despacho de saneamento do processo, tendo sido julgada improcedente a arguida ineptidão do pedido reconvencional.

*Considerou-se que o processo já continha todos os elementos necessários ao conhecimento de mérito quer da ação, quer da reconvenção, pelo que se efetuou a sua apreciação que culminou com a seguinte decisão: “Face ao exposto, julgo a presente acção totalmente improcedente, e, em consequência, absolvo a Ré “GRUPO Y, S.A.” dos pedidos formulados pela Autora “INVESTIMENTOS IMOBILIÁRIOS X, S.A.”.

Mais julgo a reconvenção procedente, e, em consequência, declara-se o contrato de arrendamento celebrado entre Autora e Ré e referido em C. dos factos provados renovado pelo prazo de 3 (três) anos com início em 01.09.2019 e termo em 31.08.2022.”*A autora não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões: “I. A sentença de primeira instância julgou totalmente improcedente a presente ação, absolvendo a Ré dos pedidos formulados pela Autora, mais julgando a reconvenção daquela procedente, tendo declarado, em consequência, o contrato de arrendamento celebrado entre Autora e Ré renovado pelo prazo de 3 (três) anos com início em 01.09.2019 e termo em 31.08.2022; II. Salvo o devido respeito que o Tribunal a quo nos merece, estamos em crer que erradamente se decidiu; III. Entendeu o Tribunal a quo que [n]o caso dos autos, a Autora pretendendo opor-se à renovação do contrato, deveria ter remetido à Ré a comunicação de oposição à renovação automática do contrato com a antecedência de 120 dias, nos termos do artigo 1097.º, n.º 1 alínea b), pelo que, tendo a comunicação em apreço sido enviada pela Autora em 8 de Maio de 2019, verifica-se não ter sido cumprida a antecedência exigida.

IV. Tendo por base o princípio da liberdade contratual, Recorrente e Recorrida estabeleceram contratualmente um prazo diverso do previsto na lei, prevendo a cláusula 3.ª do contrato de arrendamento que a Recorrente podia impedir a renovação automática deste contrato mediante a comunicação escrita, enviada através de carta registada com A.R. (…) com uma antecedência mínima de 60 (sessenta) dias relativamente ao termo do período inicial do contrato ou de qualquer das suas renovações.

V. Tendo sido enviada a aludida comunicação a 08/05/2019, a qual foi rececionada pela Recorrida, a 09/05/2019, a Recorrente cumpriu o que vinha estabelecido no contrato de arrendamento celebrado com a Recorrida; VI. Não era exigido à Recorrida o cumprimento do prazo previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 1097.º do Código Civil; VII. O artigo 1080.º do Código Civil indica quais as normas que versando sobre as diversas formas de cessação do contrato de arrendamento, tem natureza imperativa, nele não se incluindo o artigo 1097.º do Código Civil; VIII. A comunicação enviada pela Recorrente à Recorrida deveria, por isso, ter sido declarada eficaz, declarando o Tribunal a quo a oposição à renovação como validamente efetuada e com base na mesma decretar o despejo da Recorrida por falta de título para a ocupação do locado desde a 31/agosto/2019 e, consequentemente, condenar a mesma no pagamento das rendas devidas elevadas ao dobro até à desocupação, tal como peticionado no libelo inicial.

IX. Por outro lado, dando provimento à reconvenção apresentada pela Recorrida, concluiu o tribunal a quo que o contrato de arrendamento em causa nos presentes autos deveria considerar-se renovado em 1 de Setembro de 2019, pelo período de 3 anos, ou seja, com termo a 31 de Agosto de 2022.

X. Salvo o devido respeito, mal andou o Tribunal recorrido a admitir a aludida reconvenção pois para que a mesma fosse admissível, a pretensão da Ré tinha de ser formal e substancialmente distinta do pedido principal deduzido nos autos pela Autora, aqui Recorrente, o que, efetivamente, não ocorreu; XI. A reconvenção deduzida causa não se reconduz, claramente, a qualquer das circunstâncias previstas nas alíneas do n.º 2 do artigo 266.º do Código do Processo Civil; XII. Com o pedido reconvencional a Recorrida mais não pretende do que a consequência da improcedência da ação proposta, inexistindo, por isso, autonomia do pedido reconvencional em relação ao pedido formulado na ação - cfr. recente acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, datado de 28-11-2019, e proferido no âmbito do processo que com o n.º 627/19.7T8BRG-A.G1 correu termos pela 2ª Secção Cível daquele egrégio Tribunal; XIII. A reconvenção não poderia, por isso, ter sido admitida, todavia, a sê- lo, sempre seria de julgar inepto o pedido reconvencional, com a consequente absolvição da instância da aqui Recorrente, já que na sua reconvenção, a Recorrida, limitou-se a formular conclusões, não expondo os factos essenciais que constituem a causa de pedir tal como exigido pelos artigos 5.º, n.º 1, 583.º, n.º 1 e alínea d) do n.º 1 do artigo 552.º, todos do Código de Processo Civil; XIV. Por fim, e sem prescindir, se este tribunal vier a confirmar a decisão da primeira instância, confirmando a ineficácia da oposição à renovação levada a cabo pela aqui Recorrente e se admitir e não julgar inepta a reconvenção apresentada pela aqui Recorrida...

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