Acórdão nº 4708/19.9T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelMARIA DA CONCEI
Data da Resolução15 de Junho de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I - M. R., contribuinte fiscal n.º ………, com domicílio nos Estados Unidos da América em …, e em Portugal na Rua …, em Vila Verde, intentou a presente acção de divórcio sem consentimento do outro cônjuge, contra M. C., residente em …, nos Estados Unidos da América, alegando, em suma, que casou com a R. em 16/12/1989, no regime de comunhão geral de bens; que são ambos emigrantes nos Estados Unidos da América, país onde residem e trabalham; que, em inícios de 2015, o A. e a R., resignados com o fim do seu casamento, acordaram entre si em separar-se e dividir o espaço na moradia do casal sita em …, fazendo desde então vidas completamente separadas e sem qualquer actividade em comum; e que, em Maio de 2015, a R. levantou das contas do casal nos Estados Unidos metade do respectivo saldo e em Agosto desse mesmo ano fez o mesmo em Portugal, dessa forma retirando a sua meação nesse bem comum.

Concluiu pedindo que seja decretado o divórcio entre o A. e a R., ao abrigo do disposto no art.º 1781º, alíneas a) e d) do Código Civil.

Foi realizada a tentativa de conciliação a que alude o art.º 1779.º do CC, mas não houve reconciliação dos cônjuges ou conversão do divórcio sem consentimento em divórcio por mútuo consentimento.

A R. apresentou contestação, na qual se defendeu por excepção, suscitando a excepção da incompetência dos tribunais portugueses para conhecer da presente acção de divórcio sem o consentimento do outro cônjuge e a excepção da litispendência.

No decurso da audiência de julgamento, foi oficiosamente suscitada a questão da determinação da lei aplicável ao divórcio requerido pelo A., face à residência das partes no Estado da Virgínia, nos E.U.A., e o disposto no regulamento (UE) 1259/2010 de 20/12, mormente no seu artigo 8.º, e ordenada a notificação das partes para se pronunciarem sobre a mesma.

O A. e a R. pronunciaram-se nos termos que constam dos respectivos requerimentos de 03/12/2020: o A. no sentido de que, se se entender aplicável o Code of Virginia, deve ser decretado o divórcio com fundamento na separação dos cônjuges há mais de um ano; a R. no sentido de que deve ser aplicada a mesma lei americana.

Os autos prosseguiram e foi proferida sentença na qual se decidiu: Atento o exposto, julgo procedente, por provada, a presente acção e, em consequência, decreto o divórcio entre M. R. e M. C., com a consequente dissolução do seu casamento.

Inconformada a ré interpôs recurso, cujas alegações terminam com as seguintes conclusões: 1- Vem o presente recurso interposto da sentença que julgou procedente a ação e em consequência decretou o divórcio entre A. M. R., e a aqui Apelante M. C., salvo o devido respeito, relatar que, o Tribunal recorrido não fez justiça.

2-Pelas razões já expendidas em sede de Contestação que desde já a Apelante reitera o alegado, designadamente que a R. aqui Apelante e A. são casados entre si e que ambos são emigrantes no Estado da Virgínia, nos Estados Unidos da América, onde ambos, há mais de trinta anos, residem, trabalham, constituíram família, e onde ocorreu a rutura do casamento e corre termos processo de divórcio sem o consentimento do outro cônjuge.

3-Tendo o A. sido devidamento notificado e se pronunciado, junto aos autos de processo de divórcio sem o consentimento do outro cônjuge, que corre termos pelo Estado da Virgínia nos Estados Unidos da América. Encontrando-se este processo a espera do reconhecimento de competência internacional, para que possa ser decretado divórcio entre a R. aqui Apelante e o A. M. R., uma vez que ambos são residentes no Estado da Virgínia nos EUA, e lá constituíram família e o património de uma vida de trabalho.

4-Vem o presente recurso interposto da sentença que julgou procedente a ação e em consequência decretou o divórcio entre R. aqui Apelante e A M. R., salvo o devido respeito, relatar que, o Tribunal recorrido não fez justiça.

5-Pelas razões já expendidas em sede de Contestação que desde já a Apelante reitera o alegado 6-A R. aqui Apelante, casou com o A. em 16/12/1989, no regime da comunhão geral de bens.

7-São ambos emigrantes nos Estados Unidos da América, onde residem há mais de trinta anos, onde constituíram família, onde trabalham e construíram o património de uma vida.

8-A R. aqui Apelante e A. encontram-se separados de facto desde 2015, encontrando-se ambos resignados com o fim do casamento, continuando por acordo a viver na mesma moradia do casal em …, Virgínia, nos Estados Unidos da América.

9-Para o efeito e por acordo, A. e R. decidiram dividir o espaço da moradia anteriormente mencionada, transformando-a em dois espaços autónomos, já que ambos dispõe de saída própria para a via pública.

10-Passando o A. a viver no primeiro andar e a R. no Rés-do-chão onde sempre fizeram e continuam a fazer a vida.

11-Mantendo esta como a morada dos aqui A. e R, que são emigrantes nos Estados Unidos da América, país onde residem e trabalham, 12-A.e R. constituíram família nos Estados Unidos da América, sendo certo que do casal nasceram dois filhos que na presente dada são maiores de idade.

13-O agregado familiar do A. e R. são residentes nos Estados Unidos da América onde trabalham, tem a vida estruturada, estão perfeitamente integrados aos hábitos e costumes locais, possuem amigos, bem como o património de uma vida de trabalho e esforço pessoal.

14- A. e R. aqui Apelante são proprietários de uma moradia em Vila Verde, sendo certo que a mesma foi adquirida e construída a título de investimento no país de origem, visto que nunca, mas nunca foi colocada a hipótese de voltar a residir em Portugal.

15-As viagens a Portugal, quer pelo A. quer pela R. aqui Apelante são situações esporádicas, sem nenhum padrão regular e quando acontecem correspondem a período de férias (a título de recreio).

16-Com efeito, A. e R. são ambos emigrantes nos Estados Unidos da América, país onde residem, trabalham, apresentam Declaração de Imposto de Renda, sendo a residência de ambos que permite fundamentar todo e qualquer exercício de direitos ou cumprimento de deveres de cariz pessoal.

17-A única e efetiva residência de ambos é em ..., Virgínia, nos Estados Unidos da América.

18-Não se pode sequer pensar em residência alternada do A, nos termos do artigo 83º , visto que A. e R. aqui Apelante possuem residência e morada em ..., Virgínia, nos Estados Unidos da América, onde ambos recebem as notificações dos presentes autos, enquanto as vindas a Portugal são situações esporádicas sem nenhum padrão regular, tratando-se apenas de férias, que tanto podem ser gozadas em Portugal ou não.

19-Para além de A. e R aqui Apelante possuírem residência e morada nos EUA, o facto que deu origem a causa de pedir, ou seja a rutura do casamento ocorreu na Virgínia, nos Estados Unidos da América.

20-Assim sendo e nos termos conjugados dos artigos 62º, 72º, 96º al. a), 97º ambos do Código de Processo Civil, 8º da Constituição da República Portuguesa, e artigo 8º do Regulamento UE 1259/2010 de 20 de 12 os Tribunais Portugueses não são competentes para decidir o Divórcio Sem o Consentimento do Outro Cônjuge do A. e R, aqui Apelante.

21-Como não existe qualquer convenção ou tratado do qual Portugal e os Estados Unidos da América sejam subscritores, que assegure a eficácia da sentença de divórcio que eventualmente venha a ser proferida neste processo junto ao Estado da Virgínia nos EUA, os Tribunais Portugueses são internacionalmente incompetentes.

22-A competência para decidir o Divórcio Sem o Consentimento do Outro Cônjuge do A. e R. pertente aos tribunais da Virgínia, que é onde, possuem residência Habitual, moradia e onde ocorreu a rutura do casamento.

23-De salientar a existência de Litispendência, uma vez que corre termos pelos Tribunais da Virgínia, nos Estados Unidos da América, que é onde A. e R. aqui Apelante possuem residência, moradia e onde ocorreu a rutura do casamento, um Processo de Divórcio sem o Consentimento do Outro Cônjuge, tendo o aqui A. sido notificado e tendo se pronunciado.

24-Com efeito, foi requerido uma suspensão quanto ao direito de A. e R. aqui Apelante, poderem dispor dos bens na pendência do Processo de divórcio que corre termos pelo Estado da Virgínia, até que seja decidida a incompetência internacional dos Tribunais Portugueses.

25-Entretanto o A. M. R. já tratou da liquidação de uma Sociedade (nos EUA) em que era Sócio, bem como procedeu a venda do estaleiro e escritório da referida sociedade. Sendo certo que a R. aqui Apelante não tem conhecimento do destino destes valores.

26-De salientar que a R. ora Alegante, será prejudicada quanto a direitos sociais e quanto a pensão de alimentos que terá direito na sequência do divórcio, caso o mesmo seja concluído pela ordem Jurídica Portuguesa.

27-Isto porque, não existe qualquer convenção ou tratado do qual Portugal e os Estados Unidos da América sejam subscritores , que assegure a eficácia da sentença de divórcio que eventualmente viesse a ser proferida neste processo junto ao Estado da Virgínia nos EUA, 28-Sendo essa situação de impasse que a R. aqui Apelante, pretende evitar, considerando que ao ser decretado o divórcio pelos Tribunais Portugueses, este não será reconhecido na Virgínia, visto que são residentes legais naquele país, mas que não tendo adquirido a nacionalidade Americana, não terá garantido os direitos sociais daquele pais, onde trabalhou uma vida, cumprindo com os impostos e assim não será feita uma boa administração da justiça e estaremos perante uma má aplicação do direito, questão que se pretende evitar 29-Em contrapartida, o divórcio de A. e R. aqui Apelante ao ser decidido pelos Tribunais da Virgínia/EUA, levando-se em consideração o critério da residência habitual de ambos, nos termos conjugados dos artigos 62º, 72º, 96º al. a), 97º ambos do Código de Processo Civil, 8º da Constituição da República...

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