Acórdão nº 4504/16.5T8VNF-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Junho de 2021
Magistrado Responsável | PAULO REIS |
Data da Resolução | 15 de Junho de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. Relatório M. M.
e F. L.
deduziram oposição por embargos de executado à execução para pagamento de quantia certa que lhes foi movida por em 05-07-2016 pelo Banco ..., S.A., na qual é apresentado como título executivo um contrato de compra e venda e mútuo com hipoteca e fiança outorgado por escritura pública celebrada em 24-04-1995.
Para fundamentar a oposição os embargantes invocam a extinção, por caducidade ou renúncia, da fiança, a nulidade da convenção de renúncia ao benefício da excussão prévia, a nulidade do acordo relativo às alterações contratuais sem intervenção dos fiadores, o benefício da divisão inerente à pluralidade de fiadores, a inexigibilidade dos juros reclamados - por incorreta liquidação da quantia enunciada no requerimento executivo a título de juros vencidos, por exceder os limites do título executivo sendo a taxa aplicada pelo exequente usurária e por se encontrarem prescritos os alegados juros vencidos há mais de cinco anos, nos termos do artigo 310.º, al. d), do Código Civil -, e o abuso do direito, pedindo se declare extinta a execução.
Recebidos os embargos, o exequente apresentou contestação, na qual peticiona a respetiva improcedência.
Realizada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador, após o que se delimitou o objeto do litígio e se selecionou os temas da prova.
Realizada a audiência final, foi proferida sentença, na qual se decidiu o seguinte: «Pelo exposto, decide-se: a) julgar parcialmente procedente a oposição à execução, determinando a extinção da execução, relativamente a ambos os executados, no que diz respeito aos juros vencidos até 13/07/2016, e o prosseguimento no demais.
Custas na proporção dos decaimentos.
Registe e notifique.
Comunique ao (à) Sr.
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AE».
Inconformados com a sentença proferida vieram os embargantes interpor recurso, pugnando no sentido da revogação da sentença, terminando as alegações com as seguintes conclusões (que se transcrevem): «Dos Factos: 1. Os ora Recorrentes consideram, que houve erro na apreciação da prova nos presentes autos, e por conseguinte determinados pontos de facto incorretamente julgados, aliados a uma falta de pronúncia sobre questões relativamente às quais aquele tribunal se devia pronunciar, a uma incorreta conformidade com o direito aplicável, violação das normas jurídicas contidas no DL n.º 446/85 de 25 de Outubro, concretamente os artigos 1.º, 5.º e 6.º e ainda artigos n.º 236.º, 9.º, 1146.º do Código Civil e artigos 265.º/2, 579.º, 573.º/2, 487.º/2, 493.º/3, 496.º, 608.º/2 e 716.º, do Código de Processo Civil.
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Mostra-se, pois, fundamental proceder-se a uma reapreciação da decisão sobre a matéria de facto.
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Considera-se que o Tribunal “a quo” julgou incorretamente os fatos não provados nas alíneas e); f); e h), os quais deverão passar a ser considerados como PROVADOS.
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Considera-se igualmente que devem ser aditados dois factos alegados pelos Embargantes ao rol de factos julgados provados, mais concretamente, deverá ser incluído entre os factos julgados provados 8 e 9 que “Mais ficou estipulado que o capital mutuado venceria juros calculados à taxa de juro contratual nominal e variável, indexada à variação da “Taxa de Referência Imobiliária “X”.”, e ainda, deverá ser aditado o facto provado com a seguinte redação: “A certa altura no decurso do referido processo executivo n.º 614/2000, foi celebrado um acordo entre os devedores originários e o Banco Exequente, o qual levou à extinção da execução por falta de impulso processual do Exequente, conforme acordado.” 5. Assim, entendem os Recorrentes que o facto não provado e) deve dar-se como PROVADO, atenta a prova documental e a prova testemunhal produzida e supra explanada e ainda considerando que o contrato que serve de título executivo é um contrato de adesão, conforme facto provado n.º 28.
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Resulta da prova testemunhal arrolada pelo Embargado/Recorrente, mais concretamente, do depoimento de F. F., a partir de 01m00s, e do depoimento da testemunha C. F., a partir de 00m53s, que o Exequente não logrou provar que a participação dos Recorrentes nas negociações tenha ocorrido nem que a cláusula relativa à renúncia ao benefício da excussão prévia lhe tenha sido comunicada com a antecedência e disponibilidade para esclarecimento adequadas à complexidade do seu teor, como era ónus do Exequente.
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De igual modo, entendem os Recorrentes que o facto não provado f) deve dar-se como PROVOADO, tendo o Tribunal “a quo” errado na apreciação da prova existente pois é evidente, tendo em conta as profissões e estilo de vida dos Recorrentes, que estes não têm formação jurídica nem financeira além dos conhecimentos razoáveis do homem médio, trabalhador por conta de outrem sem atividade comercial – o Recorrente marido era um funcionário operacional de eletricidade na ... e a Recorrente mulher era uma trabalhadora indiferenciada sem qualquer qualificação especial.
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E o mesmo resulta da prova testemunhal produzida neste ponto, porquanto, do depoimento da testemunha J. A., a partir de 01m12s se retira, resumidamente, que os Recorrentes vivem uma vida simples, que o Recorrente era “um homem não instruído nesse ponto [questões financeiras]” e que não teriam “um conhecimento total, se calhar, do que será um aval ou uma livrança, ou uma coisa assim. É capaz de não ter esse conhecimento, penso eu, na minha opinião”; e no mesmo sentido foi o declarado pela, testemunha A. L., a partir de 01m55s, referindo igualmente que os aqui Recorrentes vivem uma vida simples, sustentando-se apenas com o seu vencimento de trabalhadores por conta de outrem.
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No sucedâneo do que vem a ser dito até aqui, pelos mesmos fundamentos e outros se alegarão em seguida, deve ainda o facto julgado não provado h), de onde decorre que “As expressões “principais pagadores”, “benefício da excussão prévia” e “renúncia ao benefício da excussão prévia”, com o importante significado técnico-jurídico que envolvem, eram-lhes desconhecidas”, ser julgado como PROVADO.
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Pois à data da celebração do contrato, os Recorrentes desconheciam o verdadeiro significado daquelas expressões, sendo tal facto facilmente percetível, segundo as regras da experiência, tendo em consideração a formação e os conhecimentos gerais dos Embargantes/ Recorrentes.
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Pois na verdade, a expressão «com expressa renúncia ao benefício da excussão prévia», tem carácter técnico-jurídico, não sendo facilmente apreensível a não juristas. É, aliás, o que resulta da jurisprudência, retirando-se do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 14.06.2016, que “IV - Já a expressão «renúncia ao benefício da execução prévia» é de pendor técnico-jurídico, carecendo de ser explicada. V - Seria contrário à boa fé excluir a vinculação como fiador quando resulta da prova que ele já tinha tido contacto com o instituto da fiança. VI - Nessa conformidade é adequado excluir apenas o segmento «com renúncia do benefício da excussão prévia» do contrato, mantendo a fiança a característica da acessoriedade.” 12. Ademais, entendem os Recorrentes dever ser julgado provado o seguinte, a incluir entre os factos julgados provados 8 e 9: “Mais ficou estipulado que o capital mutuado venceria juros calculados à taxa de juro contratual nominal e variável, indexada à variação da “Taxa de Referência Imobiliária “X”.” 13. Pois, pese embora esta matéria tenha sido alegada no Requerimento de Embargos (e supra transcrita, para a qual se remete na integra) e escrutinada em sede de julgamento, da douta sentença recorrida, nada consta, em matéria de facto, sobre o alegado, pelo que deve considerar-se nula, nesse ponto, por omissão de pronúncia, nos termos do 615.º/1/d) CPC – salvo melhor opinião, saber se a taxa de juro fixada contratualmente foi uma taxa fixa ou uma taxa variável é matéria de facto e parece ser controvertida nos presentes autos, pelo que deve ser sujeita a decisão de facto na sentença.
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Vejamos: consta da cláusula terceira do documento complementar à escritura pública de mútuo com hipoteca (documento que serve de título executivo e se encontra junto ao requerimento executivo – para o qual se remete na íntegra) que a taxa de juro aplicável seria uma taxa variável, cuja redução ou aumento obedeceria à variação de uma taxa de referência, denominada “Taxa de referência do “X”, também referida no contrato como “taxa nominal variável”.
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Assim, atenta a prova documental e a prova testemunhal produzida, impunha-se que o Tribunal “a quo” tivesse dado como provado que o capital mutuado venceria juros calculados a uma taxa de juro nominal e variável.
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Como último ponto da matéria de facto, entendem os Recorrentes dever ser aditado um outro facto, ao elenco de factos julgados provados, com a seguinte redação: “A certa altura no decurso do referido processo executivo n.º 614/2000, foi celebrado um acordo entre os devedores originários e o Banco Exequente, o qual levou à extinção da execução por falta de impulso processual do Exequente, conforme acordado.
” 17. Ora, em estrita conexão com o facto que os Recorrentes pretendem ver provado, o Tribunal “a quo” julgou como provados os factos n.º 17, 18, 19, 20 e 21 – porém, para surpresa dos Recorrentes, porquanto o alegaram no Requerimento de Embargos nos articulados 12.º, 13.º e 14.º, a douta sentença recorrida não apresenta qualquer decisão de matéria de facto sobre o acordo entre o Exequente e os devedores principais.
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Este entendimento dos Recorrentes é apoiado em prova documental, testemunhal e das regras da experiência. Senão vejamos: retira-se do depoimento da testemunha A. L., a partir de 03m45s, vizinho e amigo do Recorrente, que o mesmo teve conhecimento do mesmo que os Embargantes/Recorrente souberam, há cerca de 15 anos: que tinha havido um acordo entre o Banco e os devedores principais, o qual pressupunha o pagamento das prestações em atraso, e que tinha o problema resolvido, retirando-se do seu depoimento, com interesse neste tópico, o seguinte excerto...
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