Acórdão nº 980/21.2TBVRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07 de Outubro de 2021
Magistrado Responsável | JOSÉ AMARAL |
Data da Resolução | 07 de Outubro de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO A sociedade M. C., Douro, Ldª, com sede em … [autora], intentou, em 11-05-2021, no Tribunal de Vila Real, abrigando-se expressamente no disposto no artº 1055º, do CPC, processo de destituição e suspensão imediata de titular de órgão social contra [réus]: 1ª - SOCIEDADE TURÍSTICA E HOTELEIRA ...
, S.A.; 2ª-X – GESTÃO, ADMINISTRAÇÃO DE BENS E IMÓVEIS, S.A., ambas com sede em Peso da Régua; 3ª - IMOBILIÁRIA TERRAS ..., S.A., com sede em ...
; 4ª - Y – IMOBILIÁRIA, S.A.; 5ª - R. VINHOS, INTERNACIONAL, S.A.; 6ª-SOCIEDADE TURÍSTICA E HOTELEIRA QUINTA ..., LDA; 7ª - RESIDENCIAL C., LDA, estas quatro com sede em Peso da Régua; 8ª - A. P.; e 9ª - F. S., ambos também residentes em Peso da Régua.
Formulou o seguinte pedido: “…requer-se a V.Exa. ao abrigo do disposto no artigo 1055.º do Código de Processo Civil, se digne decretar: I) A suspensão imediata dos requeridos de A. P. e F. S. dos cargos de gerentes e administradores das sociedades requeridas; II) Em conformidade com a decretamento da suspensão requerida no ponto I), requer-se a V.Exa. se digne nomear como gerente e administrador das sociedades requeridas, a(s) pessoa(s) idónea(s) e com competência reconhecida por este tribunal para o efeito; III) Requer-se ainda a V. Exa. se digne ordenar que sejam os requeridos A. P. e F. S., notificados para entregar ao(s) gerente(s) e administrador(es) que vierem a ser nomeados, por Protocolo, todos os arquivos contabilísticos e documentais das Sociedades requeridas, incluindo nestes os que se encontrarem em suporte informático, designadamente, os documentos de suporte da contabilidade, computadores e outros documentos e ainda os Livros em uso na sociedade, cheques, etc., e todos os bens pertença das sociedades requeridas; IV) A destituição dos requeridos A. P. e F. S. do cargo de gerentes e administradores das sociedades requeridas;”.
Alegou, para desde logo fundamentar a sua legitimidade e, depois, como fundamentos da sua pretensão [1], que, age com vista a proteger os seus direitos e interesses, sendo este o único meio de evitar a dissipação dos bens que estão na esfera das sociedades requeridos e à mercê dos 8ª e 9º requeridos A. P. e F. S.. O seu intuito é apenas e tão só garantir que o património das sociedades requeridas não se “esfumace”, como tem vindo a ocorrer, e evitar a “delapidação” das respectivas contas bancárias.
É detentora de um crédito, no valor de 5.752.401,30€, sobre a Sociedade Agrícola Quinta do R., Ldª., por si adquirido, com todas as garantias (nomeadamente uma hipoteca e o aval prestado pelos 8º e 9º requeridos) e demais acessórios, à “C.
…” mediante contrato de cessão de 20-12-2019 e que a esta fora cedido, em 04-10-2018, pela Caixa ...
, crédito aquele resultante de valores que, por aberturas de crédito e por empréstimo, tal Banco disponibilizou à aludida devedora (Sociedade Agrícola…) e cujas obrigações inerentes (restitutivas e remuneratórias) esta deixou de cumprir a partir de inícios de 2012, tendo, aliás, entretanto, sido declarada insolvente por sentença de 12-10-2015 – “sendo assim parte legítima por força dor créditos de que é detentora”.
Historiando a constituição das demandadas sociedades e descrevendo a distribuição formal dos respectivos capitais sociais, acrescentou que os 8ª e 9º requeridos A. P. e F. S. (maxime depois do falecimento de seu pai) sempre detiveram, de modo aparente ou através de outrem, o capital social delas e são quem as controla e gere como bem entendem, explorando-as e repartindo entre si as respectivas despesas e lucros.
Sempre eles (e seu pai) exerceram, repartida e conjuntamente, a respectiva administração e gerência.
Ambos os 8ª e 9º requeridos (tal como, antes, o pai) foram declarados insolventes, apesar do que aqueles sempre se mantiveram na gerência e administração das sociedades.
Sucedeu que, por volta de 2008, pai e filhos encontravam-se em dificuldades financeiras e em situação generalizada de incumprimento com os seus credores relativamente a várias das sociedades por si detidas e geridas e, entre elas, a referida devedora Sociedade Agrícola Quinta de R., Ldª (insolvente).
Entre 2010 e 2011, aqueles (pai e filhos), fizeram constar dos livros de actas das sociedades requeridas, e registar, que venderam as participações sociais que nelas detinham a duas offshores, sedeadas nos EUA. Fizeram-no apenas para esconder dos seus credores a existência de tal património, sem que tenha sido essa a sua vontade real (nem a das ditas sociedads offshores), pois que continuaram a dominar a gestão e administração das mesmas, assim enganando o Estado e os credores com o intuito de evitarem a penhora e/ou apreensão das referidas participações sociais nos processos e em relação a créditos de que a autora é actualmente detentora para assim poderem continuar a dispor do respectivo património.
Para o efeito, sempre agindo conluiados, de modo a não suscitar a desconfiança dos serviços fiscais e tributários, indicaram ainda os netos e filhos (alguns, então, de menor idade) como beneficiários/accionistas da 1ª, 2ª, 3ª e 4ª requeridas, sendo que nada a estes venderam as ditas offshores e nada aqueles lhes quiseram comprar ou compraram, não havendo o pagamento/recebimento de qualquer preço, nem o pai e filhos fizeram qualquer doação aos aludidos descendentes (nem poderiam ter feito posto que já insolventes).
A requerimento da aqui autora, em providência cautelar, foi decretado (com dispensa de contraditório) o arresto dos bens móveis e (na sequência de recurso) dos imóveis detidos pelas sociedades requeridas, bem como dos móveis e “benefício” junto do … – para tal se invocando, na respectiva decisão, o instituto da desconsideração da personalidade jurídica – e, mesmo após dedução de oposição, foi a providência mantida (salvo quanto a bens móveis que não sejam veículos), embora desta última decisão penda recurso.
Não obstante, através de actos de gestão das sociedades que continuaram a ser por si praticados, os 8ª e 9º requeridos A. P. e F. S. têm vindo a esvaziar as contas bancárias delas, a onerar os bens imóveis arrestados com contratos de arrendamento rural e a dispor pessoalmente de valores pertencentes ao património societário e não àqueles requeridos.
Entre os créditos e respectivas garantias cedidas pela Caixa à C.
e, após, por esta à aqui autora, constavam as garantias por hipoteca sobre a Sociedade Agrícola Quinta do R., Ldª, de onde se destaca a hipoteca sobre a Quinta ...
constituída por escritura de 16-05-2003.
No entanto, esta Quinta encontra-se actualmente na posse da 6ª sociedade requerida Quinta de … mediante negócio simulado formalizado em 10-01-2012 entre esta e a devedora (Quinta de R., Ldª), detida pela família C., na qual intervieram os 8ª e 9º requeridos (e ainda o seu pai) simultaneamente em representação das supostas vendedora e adquirente, nada realmente sendo querido pelas partes como declarado e nenhum preço tendo sido pago, apenas tendo como propósito dissipar o património da aludida sociedade Quinta de R.
, Ldª (declarada insolvente em 12-10-2015), embora com tal transmissão encapotada se tenha mantido a hipoteca a favor da Caixa e, fruto das descritas cessões, a favor da ora autora, sendo que tal crédito hipotecário está a ser executado em juízo.
Neste contexto, a aqui 6ª requerida QUINTA ...
instaurou, em 04-02-2020, um procedimento cautelar contra a aqui demandante (ali exequente), baseado na alegada propriedade e posse da Quinta ...
, pretendendo assumir o exercício livre e pleno do seu alegado direito sobre ela, mas que foi julgada improcedente.
Além disso, a 3ª requerida Imobiliária TERRAS ...
, no mesmo dia em que a aqui autora instaurou o já aludido arresto, em escritura pública, declarou vender à sociedade “S. S. – Wine Export, Ldª” a Quinta ...
, sendo que o cheque de um milhão de euros que capeava metade do preço declarado foi depositado na conta da vendedora (3ª requerida) mas de que ora restarão pouco mais de 10%, questionando-se o destino de tal dinheiro.
Ainda a 4ª requerida “Y…”, representada pelo 9º requerido F. S. (como seu administrador único), em 30-01-2020, celebrou, por escritura pública, um contrato promessa de compra e venda com eficácia real de 13 prédios rústicos por 300.000€, metade deste preço pago nessa data e a outra metade em prestações anuais de 5.000€ (30 anos), sem que, apesar de se tratar de vinhas do Douro, nada conste convencionado sobre a respectiva gestão e exploração ao longo desse prédio.
Os 8º e 9º demandados quiseram alienar e onerar os bens imóveis das sociedades requeridas (suspeitando a demandante que existem outros negócios idênticos) e, apesar de arrestados, nada os impede de esvaziar as contas bancárias dessas sociedades como bem entenderem e diminuírem o valor das respectivas quotas bem como a sua sustentabilidade.
Acresce também que o 9º requerido F. S., em 22-01-2020, transferiu 90.000€ de uma conta titulada pela 4ª requerida “Y” para a sua conta pessoal e, confrontado com a apreensão de tal quantia no âmbito do seu processo de insolvência, apresentou-se a justificar, em representação daquela sociedade beneficiária, que tal foi motivado pela necessidade de efectuar em numerário o pagamento do sinal de uma obra em muros à respectiva construtora, assim procurando apenas reverter a apreensão daquele valor.
Tudo quanto consta, nos Relatórios juntos aos processos de insolvência dos 8ª e 9º requeridos, ter sido apurado pelo respectivo Administrador a respeito dos seus rendimentos, actividades, despesas e património, não corresponde à verdade, resultando de aparências criadas e declaradas sem correspondência com a realidade e incompatíveis com o seu modo e estilo de vida.
No Balancete da 7ª requerida “RESIDENCIAL C.
”, por exemplo, constam registados valores, a título de remuneração dos gerentes (8ª e 9º requeridos), muito díspares dos apurados pelo Administrador e transferências para C. M. e C. R., filhos do 9º.
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