Acórdão nº 3545/18.2T8BCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelALDA MARTINS
Data da Resolução07 de Outubro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães: 1.

Relatório J. R.

intentou acção declarativa de condenação, com processo comum, contra Centro de Artes e Ofícios X, pedindo a condenação do réu: a) no pagamento dos créditos laborais elencados na petição inicial, no valor total de 92.062,51€ (noventa e dois mil e sessenta e dois euros e cinquenta e um cêntimos); b) no pagamento de uma indemnização por danos no montante que corresponda aos impostos que venha a ter que pagar em face do valor a receber na presente acção; c) no pagamento do montante indemnizatório de 20.000,00€ (vinte mil euros) em virtude do assédio moral e violação do princípio da igualdade; d) no pagamento do montante a liquidar em sede de execução de sentença, correspondente aos valores que se vençam desde o mês da entrada da acção (Dezembro de 2018) até efectiva e integral reconstituição da situação profissional anterior da autora, bem assim como os valores relativos aos danos patrimoniais apontados; e) na reposição das demais condições de trabalho e remuneratórias de que beneficiava a autora até Julho de 2017; f) na reposição, conforme contratualmente acordado, da declaração de tempo de serviço da autora ou, subsidiariamente, no pagamento de uma indemnização de um valor a liquidar em sede de execução de sentença; g) no pagamento, sobre todas as quantias, de juros de mora, calculados à taxa legal, que se venceram desde o respectivo vencimento até efectivo pagamento das mesmas ou, caso assim não se entenda, desde a citação até ao efectivo pagamento das mesmas.

Alega, em síntese, que é trabalhadora do réu desde 01/09/2003, ali exercendo inicialmente as funções de professora de música. No final do ano lectivo de 2009/2010, o réu convidou-a para exercer as funções de directora pedagógica, o que aceitou, passando a acumular as mesmas com as de professora e tendo passado a auferir uma retribuição mensal de 2.415,93€, posteriormente revista. A partir do ano de 2013, o réu começou a não cumprir o acordado quanto à retribuição, alegando que esta seria composta por prémios e bónus pelo exercício da direcção pedagógica, e começou a praticar actos tendentes a denegrir a competência e reputação da autora, não respeitando sequer o período de licença parental que gozou aquando do nascimento do seu filho, marcado por constantes interpelações e importunações, tendo inclusivamente havido uma tentativa de realizar uma reunião secreta entre alguns trabalhadores do réu, com vista a discutir assuntos relacionados com a direcção pedagógica. A conduta do réu pautou-se sempre pela tentativa de a rebaixar e humilhar, discriminando-a relativamente aos demais trabalhadores, o que continuou mesmo após o regresso da licença de maternidade, com vários episódios que descreve, tudo a tendo levado a manifestar a sua indisponibilidade para continuar como directora pedagógica a partir do ano lectivo de 2017/2018, situação que o réu aproveitou para mais uma vez a humilhar, numa carta que enviou a todos os trabalhadores. Alega ainda ter prestado trabalho suplementar que o réu não remunerou, ter o réu desde Agosto de 2017 unilateralmente reduzido a sua retribuição mensal, deixando de lhe pagar os 2.600,00€ devidos, ter apenas recebido formação profissional numa ocasião (em 2014) e ter o réu deixado de lhe pagar o subsídio devido pelas deslocações efectuadas, créditos cujo pagamento reclama, a par de indemnizações por danos patrimoniais e não patrimoniais pelo assédio moral sofrido.

O réu contestou, admitindo a existência do contrato de trabalho alegado pela autora (negando embora a data de admissão) e o exercício posterior por esta das funções de directora pedagógica, dizendo que, por força da não profissionalização dos membros da direcção do réu, é a direcção pedagógica quem na prática faz a gestão diária do conservatório de música. Nega os factos alegados pela autora quanto à sua retribuição mensal, dizendo que era constituída inicialmente por retribuição base de 1.143,67€ e um acréscimo pelas restantes horas lectivas, sendo depois o acréscimo justificado pelo exercício das funções de directora pedagógica. Nega que alguma vez tenha importunado a autora no período de licença parental, tanto assim que quem a substituiu nesse período (por sua sugestão) foi a sua irmã, o que fez na perspectiva de continuar ela própria a controlar a forma como essas funções eram exercidas. Quanto à reunião alegada pela autora, afirma ser alheia à mesma, por ter sido organizada por docentes, e não ter sido de forma alguma secreta, de tal modo que a autora nela compareceu. Nega que tenha havido qualquer tratamento vexatório ou discriminatório e diz que os factos alegados pela autora a esse respeito são falsos ou distorcidos. Recusa o pagamento de qualquer quantia a título de trabalho suplementar, pois a autora geria o seu tempo conforme entendia e os registos que efectuou não são fidedignos, tal como as verbas de deslocação apenas seriam devidas quando as mesmas fossem efectuadas em contexto de formação. Não aceita ter ocorrido qualquer redução ilícita de retribuição e recusa a existência de assédio moral, pelo qual a autora tenha de ser compensada. Termina pedindo a improcedência da acção e a sua absolvição dos pedidos.

Tendo os autos prosseguido, veio a ser proferido despacho a indeferir a prestação de depoimento de parte da legal representante do réu e de declarações de parte da autora, despacho do qual a autora interpôs recurso, que veio a ser julgado improcedente por Acórdão desta Relação de 17 de Dezembro de 2019, transitado em julgado.

No início do julgamento, a autora veio apresentar requerimento de liquidação do pedido genérico (posteriormente rectificado), alegando ter o contrato de trabalho cessado em 31/08/2019 e pedindo a condenação do réu no pagamento das quantias de: - 9.690,89€ (nove mil, seiscentos e noventa euros e oitenta e nove cêntimos), a título de diferenças retributivas devidas até ao final do contrato de trabalho; - 625,25€ (seiscentos e vinte e cinco euros e vinte e cinco cêntimos), a título de despesas de deslocação devidas até ao final do contrato de trabalho.

O réu veio contestar a liquidação apresentada, admitindo apenas a cessação do contrato de trabalho em 31/08/2019.

Concluído o julgamento, foi proferida sentença, que terminou com o seguinte dispositivo (após rectificação): «Assim e nos termos expostos, julgo a ação parcialmente procedente por provada e, consequentemente, condeno o réu Centro de Artes e Ofícios X: a) a pagar à autora J. R. as seguintes quantias: a. 1.118,18€ (mil, cento e dezoito euros e dezoito cêntimos) a título de parte em falta da retribuição do mês de agosto de 2017; b. 1.813,00€ (mil, oitocentos e treze euros) a título de compensação por formação profissional não prestada; c. 1.074,53€ (mil e setenta e quatro euros e cinquenta e três cêntimos) a título de reembolso de despesas de deslocação; sendo todas as quantias acrescidas de juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento, contados à taxa legal de 4% desde 31/08/2017 (em relação à quantia referida em a.), 31/08/2019 (em relação à quantia referida em b.) e desde o respetivo mês a que se reportem as deslocações (em relação à quantia referida em c.); b) a retificar a declaração de tempo de serviço da autora relativa aos anos letivos de 2017/2018 e 2018/2019, das mesmas devendo a passar a constar a prestação de um horário completo.

Custas da ação por autora e réu, na proporção do respetivo decaimento, que se fixa em 96,78% para a primeira e 3,27% para o segundo – art.º 527.º, n.os 1 e 2 do Código de Processo Civil.» A autora interpôs recurso da sentença, formulando conclusões, designadamente as seguintes: «(…) 3ª Não obstante a Autora discorde da sentença na parte da improcedência dos demais pedidos, porque há mesmo que escolher quais as batalhas que pode (financeiramente) travar, reduz o seu recurso à impugnação de facto e de direito da decisão proferida quanto aos pedidos sob as alíneas al. a) d) e e) da inicial, na parte referente à redução unilateral da retribuição da Autora num total de 22.785,78 €; do pedido sob a alínea c) da inicial, quantificado em 20.000€ e que aqui se reduz a 1.214,22 €, cifrando-se no pedido de condenação da Ré ao pagamento de uma indemnização em virtude da prática dos factos descritos nos arts. 313º a 358º da inicial, cujo enquadramento jurídico, como se verá, sempre poderia ter sido diferente, sendo o valor total do presente recurso de 24.000,00 euros.

4ª A recorrente argui expressamente nulidade da decisão recorrida nos termos do art. 615.º, n.º 1, als. b) e c) do CPC: falta de fundamentação de facto e de direito que justifiquem a decisão e ambiguidade que torna decisão ininteligível, já que a sentença recorrida diz que “fez o réu prova de que foi acordada com a autora a remuneração prevista para a sua categoria e para as 22 horas letivas (horário a tempo completo a que correspondia 1.143,67€) à qual acresceu provisoriamente, devido às funções de direção pedagógica, mais 11 horas de presença no Conservatório e uma remuneração adicional, tudo alcançando os 2.600,00€ alegados”, mas tal prova não resulta motivada em qualquer lado da sentença, sendo certo ademais que nem sequer podia tal meio de prova ser produzido, atendendo a que se tratava de matéria que só por confissão poderia ter sido demonstrada, confissão que não ocorreu, na medida em que nem a autora nem qualquer legal representante da Ré foram ouvidos.

5ª A nulidade ocorre ainda quando o tribunal reconhece que “as partes não discordam quanto à veracidade dos recibos de vencimento juntos a fls. 55 e ss”, que são de 2009, um ano em que a Autora não exercia funções de direção pedagógica, e dos mesmos já constava a distinção entre “vencimento” e “acumulação”, mas adiante, na pág. 72, afirma que à Autora teria sido paga uma “remuneração adicional” que teria em vista “compensar a autora pelas funções específicas que passou a exercer a partir de determinado momento – as funções...

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