Acórdão nº 1984/17.5T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 28 de Janeiro de 2021
Magistrado Responsável | AFONSO CABRAL DE ANDRADE |
Data da Resolução | 28 de Janeiro de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I- Relatório M. T.
, viúva, residente no Complexo Habitacional da …, Bloco .., …, em …, V. N. de Famalicão, intentou contra X – COMPANHIA DE SEGUROS, S. A., com sede na Rua …, …, em Lisboa, a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, pedindo a condenação da Ré a: “
-
Pagar à A. a quantia de € 18.410,24, a título de reembolso das despesas já suportadas, até Março de 2017, com o internamento em lares de terceira idade, quantia essa que deverá ser acrescida de juros de mora calculados à taxa legal e contados desde a citação até ao efectivo e integral pagamento daquela soma; b) Pagar à A. a quantia de € 3.743,36, a título de reembolso das despesas já suportadas, até Março de 2017, com internamentos, cirurgias, medicação, consultas médicas e transportes, quantia essa que deverá ser acrescida de juros de mora calculados à taxa legal e contados desde a citação até ao efectivo e integral pagamento daquela soma; c) Pagar à A. a quantia de € 202,46 a título de reembolso com a aquisição da roupa destruída no acidente, de televisor para utilização na Unidade de Cuidados Continuados ... e de sapatos de rede “nursing”, quantia essa que deverá ser acrescida de juros de mora calculados à taxa legal e contados desde a citação até ao efectivo e integral pagamento daquela soma; d) Pagar à A. a indemnização de € 288.343,80, a título de ressarcimento das despesas que terá de suportar até aos 83 anos de idade com o internamento em Lares de terceira idade e com medicamentos, quantia essa que deverá ser acrescida de juros de mora, calculados à taxa legal e contados desde a citação até ao efectivo e integral pagamento daquela soma; e) Pagar à A. a importância de € 50.000,00€, a título de indemnização por danos não patrimoniais, quantia essa que deverá ser acrescida de juros de mora calculados à taxa legal e contados desde a citação até ao efectivo e integral pagamento daquela soma; f) Pagar à A. a importância de € 50.000,00, a título de indemnização pelo dano biológico, quantia essa que deverá ser acrescida de juros de mora calculados à taxa legal e contados desde a citação até ao efectivo e integral pagamento daquela soma.
g) Pagar à A. a quantia que se vier a liquidar para suportar os tratamentos de fisioterapia.” Alegou, para o efeito, que no dia 3 de Novembro de 2016, pelas 18h30, na Avenida ..., em ..., Vila Nova de Famalicão, desta Comarca de Braga, foi atropelada, na passadeira, pelo veículo com a matrícula BV, seguro na Ré e por culpa da respectiva condutora, o que lhe causou danos vários que descreve, de cariz patrimonial e não patrimonial.
Regular e pessoalmente citada, a Ré contestou alegando que o acidente é imputável apenas à Autora, pois que iniciou a travessia daquela artéria, fora da passadeira que ali existia a cerca de 12 metros e sem se assegurar que o podia fazer em segurança. Mais alegou que a Autora sofria, já antes do acidente, de várias patologias do foro cognitivo e psiquiátrico, nomeadamente, da doença de Alzheimer, necessitando também já então de acompanhamento médico e de terceiros.
Por fim, considerou exagerados os montantes peticionados e pugnou pela sua absolvição do pedido.
Foi citado o I.S.S., I.P., o qual não deduziu pedido de reembolso.
Foi proferido despacho saneador, com fixação do objecto do litígio e elaboração dos temas da prova.
Teve lugar a audiência de discussão e julgamento.
A final, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou a Ré X – Companhia de Seguros, S.A: a) a pagar à Autora a quantia de € 72.500,00 (setenta e dois mil e quinhentos euros) acrescida de juros moratórios, às taxas legais sucessivamente emergentes do disposto no artº. 559º/1 do Código Civil, contados desde a data da presente sentença e até integral pagamento; b) a pagar ao Centro Hospitalar do Médio Ave, EPE., a quantia de € 3.629,23 (três mil, seiscentos e vinte e nove euros e vinte e três cêntimos) acrescida de juros moratórios, às taxas legais sucessivamente emergentes do disposto no artº. 559º/1 do Código Civil, desde 24 de Janeiro de 2019 e até integral pagamento; c) absolveu a Ré do mais que vinha peticionado.
Inconformadas com esta decisão, a ré dela interpôs recurso independente, e a autora recurso subordinado, que foram recebidos como de apelação, a subir nos próprios autos (art. 645º/1,a) do Código de Processo Civil) e com efeito meramente devolutivo (art. 647º/1 CPC).
Terminam a respectiva motivação com as seguintes conclusões: Recurso interposto pela ré: 1ª.
A ora Recorrente não pode conformar-se com a douta sentença recorrida, uma vez que, esta não teve na devida conta a matéria de facto provada e posta à discussão, nem o resultado das perícias de especialidade de psiquiatria e neurocirurgia bem como o resultado da segunda perícia, devendo proceder-se à alteração da matéria de facto dada como provada, não tendo fundamento a atribuição da ajuda de terceira pessoa. Por conseguinte, o valor atribuído de €37.500,00 a título de ajuda de terceira pessoa não deve ser mantido.
-
Em segundo lugar, os valores fixados como indemnização, a título de danos não patrimoniais no montante de €35.000,00 (neste se incluindo o DF de 3 pontos sem esforços acrescidos), deveriam necessariamente ser inferiores.
-
Por último, ainda que se entenda não ser de alterar a matéria de facto dada como provada nem tão pouco revogada a sentença no que respeita à atribuição de ajuda de terceira pessoa, o que só por mera hipótese se admite, sempre a quantia arbitrada a esse título, no montante de €37.500,00, se mostra exagerada, devendo a mesma ser manifestamente reduzida.
-
No que respeita à decisão da matéria de facto, a ora Recorrente pugna pela alteração da sentença no sentido de serem eliminados dos Factos Provados a matéria constante dos arts. 37º e 45º dos Factos Provados, uma vez que esses factos estão em contradição com a documentação junta aos autos, nomeadamente a documentação clínica.
-
Além disso, o Facto Provado nº 53 deverá ser alterado no sentido de passar a constar que “53. À data do acidente a Autora necessitava de supervisão de tarefas e de terceiros para a toma regular de medicação de acordo com a prescrição médica”.
-
Por fim, deve ser incluído nos Factos Provados o Facto Não Provado nº 28, embora parcialmente, fazendo constar dos factos Provados que “À data do atropelamento, a Autora sofria de demência”.
-
A Autora, com 66 anos, antes do acidente, estava reformada por invalidez, sofrendo de défice neurocognitivo, predominantemente de memória, com patologia pré-existente de demência, encontrando-se inclusive medicada para o efeito.
-
O défice funcional de 3 pontos (facto provado nº 31) atribuído na primeira perícia pela sequelas de fractura do cúbito esquerdo e fractura perna direita por analogia (facto provado nº 30) ou mesmo o défice funcional de 4 pontos atribuído na segunda perícia por essas mesmas sequelas, que nem sequer impedem a mobilidade da Autora tanto do membro superior esquerdo como do membro superior direito, estão em contradição com a matéria de facto provada sob os Factos Provados nºs 37º e 45º e jamais poderiam dar lugar a atribuição de uma indemnização a título de ajuda de terceira pessoa, não existindo nexo de causalidade entre a ajuda de terceira pessoa de que a Autora pode necessitar e as sequelas do acidente.
-
Resulta do exame da especialidade de neurocirurgia que não foi atribuída à Autora qualquer incapacidade ou sequela derivada do acidente e, a existir, tal apenas poderá ser valorado e quantificado pela especialidade de psiquiatria.
-
Por sua vez, submetida a Autora à avaliação pericial da especialidade de psiquiatria, também não foi atribuída por esta especialidade qualquer incapacidade, concluindo o perito que não é observável qualquer psicopatia ou perturbação psíquica actual, que se possa atribuir ao evento em apreço.
-
Assim, não tendo os peritos da especialidade de neurologia e psiquiatria atribuído qualquer incapacidade à Autora decorrente do acidente e tendo em conta que o perito que realizou a primeira perícia apenas atribuiu sequelas à autora do foro ortopédico, avaliado em 3 pontos, sem esforços acrescidos, é totalmente descabido e destituído de fundamento a atribuição de ajuda de terceira pessoa na sequência do acidente descrito nos autos.
-
Pelo que mal andou o tribunal em atribuir a ajuda de terceira pessoa, ajuda essa que foi infundada e coerentemente afastada pela segunda perícia, tendo o perito que a realizou fundamentado e explicado a razão pela qual a ajuda de terceira pessoa que a Autora actualmente necessitava não é consequência do acidente, o que não sucedeu no relatório da primeira perícia, mesmo após terem sido solicitados os devidos esclarecimentos.
-
Além disso, na resposta aos quesitos formulados pela Ré foi respondido afirmativamente no sentido de que a Aurora, antes do acidente, já necessitava de supervisão de tarefas e que iria necessitar sempre de ajuda de terceira pessoa, independentemente da ocorrência do acidente, atento os seus antecedentes e as patologias prévias de que era portadora.
-
Assim, não se pode confundir o que são as lesões e sequelas do acidente com o estado em que a Autora se encontra em virtude da doença que sofria e sofre e as consequências da evolução natural dos seus problemas psiquiátricos e da demência de que já era portadora.
-
Pelo que deve ser revogada a sentença na parte que atribuiu à Autora a quantia de €37.500,00 a título de ajuda de terceira pessoa com base na equidade e alterada a matéria de Facto Provada no sentido de serem eliminados dos Factos Provados a matéria constante dos arts. 37º e 45º dos Factos Provados, o Facto Provado nº 53 deverá ser alterado no sentido se passar a constar que ““53. A data do acidente a Autora necessitava de supervisão de tarefas e de terceiros para a toma regular de medicação de acordo com a prescrição médica”. Além disso, deve ser incluído nos Factos Provados o...
-
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO