Acórdão nº 6704/18.4T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelHELENA MELO
Data da Resolução04 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES: I – Relatório A.

J.

, M. I.

e marido B. R., M. O.

e marido, J. A., C. C.

e marido E. C., M. J.

e mulher I. J.

, instauraram acção de processo comum contra J. P.

e sua mulher E. J.

, peticionando que o tribunal :

  1. Se digne reconhecer e declarar que os AA., enquanto únicos e universais herdeiros da Herança Ilíquida e Indivisa aberta por óbito de M. F., são os legítimos proprietários e possuidores do prédio rústico identificado no item 2º da petição inicial, designado por Campo ..., inscrito na matriz rústica sob o n.º .. da União das Freguesias de ... e ... (proveniente da matriz rústica n.º .. da extinta freguesia de ...), do concelho de Braga, e descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º …; b) Se digne condenar os RR. a reconhecer os AA. como legítimos possuidores e proprietários do prédio identificado no item 2º da petição inicial e a absterem-se de praticar quaisquer actos que impeçam, perturbem ou diminuam a utilização, por parte dos AA. da referida parcela de terreno; c) Se digne declarar e reconhecer aos AA. o direito de deter, usar e fruir da água do designado Ribeiro ...

    em benefício do prédio identificado no item 2º da petição inicial durante pelo menos dois dias por semana, e caso se venha a demonstrar que os AA. e os RR. são os únicos consortes que usam e fruem da referida água, deverá o respectivo uso e fruição da água ser equitativamente dividido entre ambos em iguais períodos de tempo; d) Se digne declarar e reconhecer que os prédios dos RR. identificados no item 8º da petição inicial se encontram onerados com uma servidão de aproveitamento e utilização das águas que correm no Ribeiro ...

    a favor do prédio dos AA. identificado no item 2º da petição inicial para fins de lima e rega do mencionado prédio durante pelo menos dois dias por semana; e) Se digne reconhecer e declarar o direito de propriedade, em comum, a favor dos AA. sobre as obras de captação, condução, acompanhamento e limpeza do caudal de água, incluindo sobre a represa, a caixa de visita e depósito de derivação de água, e todas as tubagens de captação, condução e derivação dessa água, incluindo a tubagem que se encontra construída e colocada no subsolo dos prédios dos RR. identificados no item 8º da petição inicial; f) Se digne condenar os RR. a reconhecer que se encontra constituída, por usucapião, uma servidão de passagem ou condução de águas por rego ou aqueduto que onera os prédios dos Réus identificados no item 8º da petição inicial em benefício do prédio dos AA. identificado no item 2º do mesmo articulado, e que abrange o acompanhamento e condução da água proveniente do Ribeiro ...

    até ao aludido prédio dos AA. para lima e rega do referido terreno destinado ao lavradio e produção agrícola, através detubos ou rego que, atravessando os prédios dos Réus, transportam a água desde o Ribeiro ...

    até ao prédio dos Autores; g) Se digne condenar os RR. a permitir aos AA. o livre acesso dos mesmos ao Ribeiro ...

    , à caixa de visita e derivação, aos tubos e ao trajecto percorrido pelas tubagens ou aqueduto nos dias em que têm direito ao uso e fruição da referida água, bem como a manterem desimpedido todo o trajecto que os AA. terão que percorrer, a pé e sobre o prédio dos RR. desde o portão de acesso até ao designado Ribeiro ...

    , e ainda a absterem-se de praticar qualquer acto que impeça ou perturbe os AA. de direcionarem a água do Ribeiro ...

    para o respetivo prédio; h) Se digne condenar os RR. a reconhecer e respeitar os direitos supra mencionados dos AA., abstendo-se de praticar quaisquer atos que impeçam, perturbem ou prejudiquem o seu exercício pelos Autores; i) Sejam os Réus condenados ao pagamento, a título de sanção pecuniária compulsória, da quantia de € 500,00 por cada violação do dever de facto negativo previsto na alínea anterior, sem prejuízo da indemnização pelos danos que a sua conduta venha eventualmente a causar; j) Sejam os Réus condenados ao pagamento aos 2ºs AA. a quantia de 6.500,00 € (seis mil e quinhentos euros), dos quais 5.000,00 € a título de danos patrimoniais e 1.500,00 € a título de danos não patrimoniais, conforme supra aludido nos itens 72º a 80º da petição inicial.

    Alegaram para tanto e em síntese: .Que são donos dos prédios que identificam no artº 2º da p.i., onde, há mais de 50 anos, que fruem da água, para fins de rega e lima, pelo menos dois dias por semana, água essa provinda do Ribeiro ..., através de obras de captação e condução efectuadas.

    .Que essa água é também usada pelo prédio hoje pertencente aos RR, havendo ainda, outro prédio, entre o Ribeiro ... e o prédio dos RR.

    .Que desde tempos imemoriais que a água foi canalizada no sentido norte/sul através de rego a céu aberto e em terra batida, que segue em direcção ao prédio dos AA, passando no prédio dos RR, tendo havido, entretanto, obras de encanamento, as mais recentes em 2017, pelo que presentemente a condução da água até ao prédio dos AA é subterrânea, através de tubos enterrados no solo, existindo uma caixa de derivação e de visita no prédio dos RR, que permite alternar o destino da água, ora para um tanque existente no prédio dos RR ora para o prédio dos AA.

    .Que sempre acederam ao prédio hoje dos RR para inspecionar aquela condução da água, através de um portão entre os prédios, precisamente em cima do local onde a água desagua do prédio dos RR para o dos AA, portão do qual os AA tinham chave.

    .Que toda a situação supra aludida ocorreu sempre à vista de todos, sem oposição de ninguém, mormente dos RR e seus antepossuidores, actuando sempre na convicção que exerciam um direito próprio e legítimo sem prejudicar terceiros.

    .Que em agosto de 2018, quando se preparavam para aceder à caixa de derivação, constataram a colocação de um cadeado no portão, tendo ficado impedidos de se deslocar à caixa de derivação para direcionar a água para o seu prédio.

    .Que acabaram por aceder àquela caixa, invadindo prédios vizinhos, tendo constatado a colocação de um pijeiro em madeira e de terra e pedras nos tubos, por forma a que a água não mais corresse para o seu prédio.

    .Que face a essa situação intentaram procedimento cautelar, no qual transigiram com os RR no sentido de, até decisão final nesta ação, lhes ser garantida a possibilidade de uso da água.

    .Que tiveram prejuízos patrimoniais e não patrimoniais decorrentes da impossibilidade de usar a água, pretendendo ser indemnizados em conformidade.

    Os RR contestaram, aceitando a propriedade dos AA sobre o prédio, negando, no entanto, a existência de qualquer direito onerando o seu prédio. O prédio dos AA. confronta também com o referido Ribeiro ..., podendo os AA captar a água directamente e com facilidade, sem grandes custos e sem necessidade de passar por prédios de terceiros.

    Acrescentam que há mais de 30/40 anos, que o seu prédio não é utilizado para condução das águas do Ribeiro ... para o prédio dos AA, razão pela qual, mesmo a existir tal servidão extinguiu-se pelo seu não uso.

    Finalizam, aludindo às obras efectuadas pelos AA, com sua autorização, em 2017 para condução da água através do seu prédio, afirmando que acederam a tal apenas por mera tolerância, jamais aceitando a constituição ou existência de qualquer ónus sobre o seu prédio, tanto mais, que quando os AA se negaram a assinar declaração nesse sentido, logo puseram termo à situação de uso da água através do seu prédio, que frisam, apenas tinha por base um favor, mera cortesia.

    Foi realizada audiência prévia, onde se fixou o valor da acção, se proferiu despacho saneador, se identificou o objecto do litígio, se enunciaram os temas da prova, admitida a prova e designada data para o julgamento.

    Realizou-se a audiência final de julgamento, tendo o tribunal efectuado deslocação ao local objecto de litígio e procedido a inspeção judicial cujo resultado exarou em ata.

    A final foi proferida sentença que julgou “parcialmente procedente a acção, nos seguintes termos: - declarando que os AA., enquanto únicos e universais herdeiros da Herança Ilíquida e Indivisa aberta por óbito de M. F., são os legítimos proprietários e possuidores do prédio rústico identificado no item 2º da petição inicial, designado por Campo ..., inscrito na matriz rústica sob o n.º .. da União das Freguesias de ... e ... (proveniente da matriz rústica n.º .. da extinta freguesia de ...), do concelho de Braga, e descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º …; - condenando os RR. a reconhecer os AA. como legítimos possuidores e proprietários do prédio identificado no item 2º da petição inicial e a absterem-se de praticar quaisquer actos que impeçam, perturbem ou diminuam a utilização, por parte dos AA. da referida parcela de terreno; - no mais, julga-se totalmente im procedente por não provada a acção absolvendo os RR. dos restantes pedidos formulados pelos AA.

    Custas por AA e RR, na proporção de 95% para os AA e 5% para os RR.

    “ Os AA. não se conformaram e interpuseram o presente recurso de apelação, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões: I.

    Vem o presente recurso interposto da sentença que antecede, a qual julgou a acção parcialmente procedente, condenando os RR./Recorridos nos termos das alíneas a) e b) do pedido formulado na petição inicial e absolvendo-os do demais peticionado.

    II.

    Salvo o devido respeito pela opinião e ciência jurídica vertida na sentença e que conduziu à decisão em crise, entendem os Recorrentes que a factualidade considerada provada impunha uma diferente solução jurídica, com a consequente procedência da ação em diferentes moldes dos acolhidos na sentença que antecede.

    III.

    A sentença que antecede padece da nulidade prevista alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º, do Código de Processo Civil.

    IV.

    Sob a alínea f) do pedido formulado na petição inicial, os AA./Recorrentes suscitaram a condenação dos RR. a reconhecer que se encontra constituída, por usucapião, uma servidão de passagem ou condução de águas por rego ou aqueduto que onera os...

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