Acórdão nº 171/15.1T8PRG-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelALCIDES RODRIGUES
Data da Resolução11 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório M. G. e marido A. R. propuseram ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra 1º) A. F. e Mulher C. F., 2°s) R. F. e mulher M. P., e 3°s) P. V. e marido D. R., pedindo que: - se declare que os prédios identificados nos artigos 1º e 2º se encontram divididos em substância e que deram origem aos prédios individualizados e autonomizados referenciados nos artigos 8º, 9º e 10º; - se declare que à data das escrituras indicadas nos artigos 40º a 42º, os AA, os 2º e os 3ºs RR. eram legítimos proprietários, por via da usucapião, dos prédios rústicos identificados nos artigos 8º, 10º e 9º, respectivamente, condenando-se todos os RR. no reconhecimento desses direitos; - se declare que os contratos de doação enunciados nos artigos 40º a 42º nulos, por simulados; - se declare a validade e existência dos contratos de compra e venda dissimulados, com o preço relativo a cada prédio que se vier a provar; II) - A título subsidiário

  1. Mantendo-se os pedidos das als. C), D) e E) do pedido principal, se declare que, à data das doações referidas nos arts 40° a 42°, os AA, os 2°s e os 3°s RR eram legítimos comproprietarios dos prédios identificados nos arts 1° e 2°.

*Na parte final da petição inicial, em sede de meios de provas, os autores requereram, entre outros, o seguinte: «B) POR CONFISSAO (Arts 452º n° 2 e 456° CPC) Depoimento de parte dos 1ºs, 2°s e 3°s RR aos factos dos arts 3°, 5° a 19°, 39° e 77° a 79°, e dos 1ºs e 3°s RR aos factos dos arts 43°, 45° a 53°, 62°, 68° e 82° da p.i.

».

*Citados, apenas os co-Réus C. F. e marido A. F. apresentaram contestação (Ref.ª 20442878).

*Realizada a audiência prévia (Ref.ª 34208187), foi proferido despacho saneador, no qual foi julgada procedentes a exceção dilatória de ilegitimidade passiva dos 2ºs. co-RR. M. P. e R. F., com a sua consequente absolvição da instância; no mais, foi afirmada a validade e regularidade da instância.

Foi definido o objeto do litígio, nos termos seguintes: «1- A existência de simulação relativa.

(…)».

E enunciados os seguintes temas da prova: «1. A vontade real dos réus de celebrarem contratos de compra e venda, e não de doação.

(…)».

E, relativamente aos requerimentos probatórios, o tribunal “a quo” proferiu o seguinte despacho (na parte que ora releva): «Prova por confissão I - Admito o depoimento de parte dos réus C. F. e A. F..

II - Os autores requereram a prestação do depoimento de parte dos réus P. V. e D. R., que não apresentaram contestação nem tomaram posição no âmbito do presente processo.

O depoimento de parte é um meio processual destinado a provocar a confissão judicial, ou seja, o reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária. Ora, não tendo os réus P. V. e D. R. contestado a acção, não assumiram posição contrária à dos autores. Por conseguinte, as declarações que eventualmente prestassem não lograriam atingir aquele desiderato. Assim sendo, indefiro o requerido».

*Datado de 18-02-2020 foi proferido o seguinte despacho (Ref.ª 34210938): «Tendo sido indeferida a prestação de depoimento de parte pelos réus que não apresentaram contestação nem de qualquer forma tomaram posição sobre o objecto do processo, os autores pretendem a sua inquirição como testemunhas.

De acordo com o artigo 496.º do Código de Processo Civil, estão impedidos de depor como testemunhas os que na causa possam depor como partes. Ora, se aqueles réus não podem produzir prova por confissão, tão só e apenas em virtude da postura por si assumida no âmbito deste processo, sempre poderão prestar, como parte, declarações não confessórias, em conformidade com o disposto no artigo 466.º do Código de Processo Civil. E se assim é, encontram-se impedidos de depor como testemunhas.

Em consequência do exposto, indefiro o pedido de inquirição na qualidade de testemunhas dos réus P. V. e D. R.».

*Em 10/03/2020, os AA. requereram, ao abrigo do disposto nos arts 411º e 452º, n.º 1, “ex vi” do art. 466º, n.º 2 do CPC, que aos RR. P. V. e D. R. sejam tomadas declarações de parte, a prestar em sede de audiência de julgamento, aos factos dos arts 43º, 45º, 46º, 47º, 48º, 49º, 50º, 51º, 52º, 53º, 62º, 63º, 68º e 82º da P.I. (Ref.ª 35122549).

*Em resposta, os RR. pugnaram pelo indeferimento do aludido requerimento que requereu a tomadas declarações de parte aos 3ºs RR. (Ref.ª 35326896).

*Datado de 11-05-2020, foi proferido o seguinte despacho (Ref.ª 34383721): «(…) REFª: 35122549 Os autores requereram a prestação de declarações de parte pelos réus P. V. e D. R..

A prestação de declarações de parte nos termos previstos no artigo 466.º do Código de Processo Civil é um meio de prova pessoalíssimo, em que é a parte que se autopropõe a prestar tais declarações, tendo em vista escopo diverso daquele que subjaz ao depoimento de parte.

Não obstante a divergência jurisprudencial existente sobre esta matéria, é nosso entendimento que poderá, todavia, justificar-se a prestação de declarações de parte por iniciativa do juiz, ainda que a requerimento de alguma das partes, quando existam motivos para tanto, no âmbito dos seus poderes inquisitórios (artigos 411.º e 452.º, n.º 1, ex vi artigo 466.º, nº 2, do CPC).

Os motivos aduzidos pelos autores no seu requerimento em referência, relacionados com a dificuldade da prova dos factos simulatórios por si alegados na ausência daquelas declarações, parecem-nos fundados.

Assim sendo, defiro o requerido.

(…)».

*Inconformados com este despacho, dele interpuseram recurso os RR., A. F. e mulher C. F. (Ref.ª 34454111), tendo formulado, a terminar as respetivas alegações, as seguintes conclusões (que se transcrevem): «I. O presente recurso vem interposto do despacho de 11-05-2020 que admitiu, a requerimento dos Autores as declarações de parte dos RR P. V. e marido D. R., com carácter não confessório á matéria dos artigos 43º,45º a 53º, 62,.

  1. Transitou em julgado a decisão que indeferiu o depoimento de parte dos Réus não contestantes à matéria dos artigos 43,45 a 53, 62, 68 e 82, todos da p.i.

  2. Transitou em julgado a decisão que indeferiu a inquirição como testemunhas dos Réus não contestantes relativamente à mesma matéria IV. Foi deferido o pedido de prestação de declarações de parte com carácter não confessório, dos RR não contestantes à mesma matéria.

  3. Esta decisão de que se recorre viola o caso julgado e a autoridade do caso julgado formados anteriormente.

  4. Se os RR não podem ser ouvidos em declarações de parte com efeito confessório por ter sido indeferida a prestação de depoimento de parte também não podem sê-lo com o caráter que foi por também ter sido indeferida a sua audição como testemunhas.

  5. O poder inquisitório do juiz, embora amplo, é um poder vinculado.

    VIII.O princípio do inquisitório, cujos parâmetros não poderão deixar de ser também seguidos quando se faça apelo ao disposto no artº 452 do CPC não poderá ser invocado de forma automática designadamente para superar eventuais falhas de instrução que sejam de imputar a alguma das partes, designadamente quando esteja precludida a apresentação de meios de prova.

  6. As declarações de parte só podem ser desencadeadas pela própria parte X. O tribunal quando indeferiu o depoimento de parte dos RR e a sua intervenção como testemunhas, na posse dos mesmos elementos que tem hoje, não julgou necessário usar do seu poder inquisitório.

  7. E, agora só deferiu as declarações de parte á mesma matéria, a pedido dos AA, pois os elementos que tinha quando indeferiu são os mesmos que agora tem quando deferiu.

  8. Só no decurso da produção de prova é que poderia ajuizar se era necessário ou não usar do seu poder inquisitório.

  9. Este poder tem de respeitar o princípio do dispositivo e só pode ser utilizado quando se constata a sua necessidade concreta e não de forma abstrata.

  10. Não é isto que resulta dos autos pois demonstram e o despacho recorrido confirma, que a decisão foi tomada, apenas em resposta a um pedido concreto dos AA.

  11. Os quais até indicam os concretos factos articulados na petição inicial, a que pretendam que os RR respondam agora em declarações de parte, exatamente os mesmos que indicaram quando requereram o seu depoimento de parte ou quando os arrolaram como testemunhas.

  12. Atenta a matéria objeto da prova, que contende com atos pessoais, as declarações de parte terão que ter necessariamente objetivos confessórios.

  13. E é isto precisamente que os AA pretendem com o argumento de que poderão ter dificuldades de prova da por si invocada simulação das doações.

  14. Por isso, apesar de no despacho recorrido se afirmar que as declarações de parte têm escopo diverso do depoimento, naturalmente que tendo em vista a confissão, está em contradição com o primeiro despacho.

  15. Está-se a deixar entrar pela janela aquilo que se disse não ser possível entrar pela porta.

  16. Por conseguinte, o despacho recorrido viola o caso julgado e a autoridade do caso julgado, pois que, a prestação de declarações de parte é também um meio de obtenção da confissão.

  17. E é esta confissão que o despacho recorrido pretende obter dos RR, apesar de ter indeferido o seu depoimento de parte, apesar de ser esse o instrumento legal por excelência para a obtenção da confissão judicial relativamente a factos que lhe são desfavoráveis XXII. Por outro lado, a atividade oficiosa do tribunal não pode suprir a falta de diligência das partes.

  18. E aquilo que os AA pretenderam e o despacho recorrido sancionou foi obter por via oficiosa aquilo que, por sua iniciativa, oportunamente não pugnaram, em desrespeito por um dos princípios do processo civil que é precisamente o da autorresponsabilidade das partes, segundo o qual estas sofrem as consequências jurídicas prejudiciais da sua negligência ou inépcia na condução do processo, que fazem a seu próprio risco XXIV. De modo que o despacho recorrido premeia a inércia dos AA e, conforme entendimento jurisprudencial “o exercício do dever de diligenciar pelo apuramento da...

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