Acórdão nº 55067/19.8YIPRT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelAFONSO CABRAL DE ANDRADE
Data da Resolução11 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I- Relatório M. F., Lda., intentou contra X, Revestimentos e Isolamentos, Lda., a presente acção declarativa especial para cobrança de obrigações pecuniárias emergentes de contratos através da apresentação de requerimento de injunção, na qual reclama o pagamento da quantia de € 9.016,18, a título de capital, acrescida de € 976,96 de juros de mora vencidos, de € 102,00 correspondentes à taxa de justiça paga, e de € 450,00 referentes a “outras quantias”.

Alega, em síntese, o seguinte: -A Requerente dedica-se à construção civil; -No exercício desta actividade prestou serviços à Requerida, a seu pedido, em 16.11.2017, que consistiram no revestimento de um piso, referidos na factura abaixo indicada; -O valor dos serviços prestados foi de € 11.016,18, tendo a Requerida apenas pago a quantia de € 2.000,00, apesar de várias vezes instada para pagar a restante quantia em dívida, ou seja, a quantia de € 9.018,16; -São devidos juros de mora desde 17.11.2018 até integral pagamento; -A Requerida é, ainda, devedora das despesas judiciais com este procedimento, nomeadamente, taxa de justiça e com a constituição de mandatário judicial, que computa em € 450,00, nos termos do artigo 7.º do DL 262/2013 de 10 de Maio.

A Ré contestou, impugnando os fundamentos da acção, alegando em síntese que: -No exercício da sua actividade, a Requerida foi contratada pela sociedade comercial Y - GELADARIA TRADICIONAL, Ldª, para realizar uma empreitada num pavilhão industrial desta última, sito na Rua ..., n.º …, na cidade do Porto; -Empreitada essa que, em suma e relativamente à Requerente, se resumia ao enchimento na zona das câmaras frigoríficas e zona fabril com camada de betão e uma rampa onde somente era colocada betão, tendo a Requerida contratado a Requerente em regime de subempreitada para lhe executar tais serviços, o que veio acontecer; -Acordaram previamente Requerente e Requerida que o pagamento da subempreitada seria liquidado quando a Requerida recebesse do dono da obra o preço da mesma, facto este que ainda não aconteceu e como tal ainda não se venceu tal factura; -Após a conclusão dos trabalhos, a referida sociedade Y reclamou alegados defeitos e anomalias da obra à Requerida em 03 de Julho de 2017 -Em 06 de Julho de 2017 a Requerida reclamou à Requerente os supra alegados defeitos -Em resposta, a Requerente prontificou-se a verificar os referidos defeitos, mas veio a declinar os mesmos, tendo a Requerida transmitido que também só liquidaria o preço se se provasse que não haveria qualquer defeito e quando o dono da obra lhe pagasse; -Requerente e Requerida acordaram que esta ultima proporia a competente injunção contra a sociedade Y, e ambas aguardariam o desenlace judicial, sendo que o sócio gerente da Requerente Sr. M. F. seria testemunha e refutaria em tribunal os alegados defeitos apresentados; -A Requerida propôs a competente injunção contra a sociedade Y, para receber aquilo a tem que direito pela empreitada executada e depois pagar à aqui Requerente, processo esse que actualmente se encontra a correr termos sob o n.º 15617/19.1YIPRT, no Juízo Local Cível de Vila Nova de Famalicão – J2, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga; -Aquela sociedade opôs-se à injunção, invocando os defeitos da obra; -Entretanto, contrariando o acordo assumido, foi intentada esta injunção; -A Requerente agiu de má-fé, violando o dever de lealdade e confiança, e como tal deve ser condenada em competente multa ao tribunal e ainda numa adequada indemnização à Ré; -Verifica-se uma situação de abuso de direito na pretensão que a Requerente pretende fazer valer na acção e, havendo abuso de direito a acção tem irremediavelmente de improceder, pois, na acção já proposta de acordo com a Requerente, se irá discutir se a empreitada levada a cabo por esta, foi portadora dos supra alegados defeitos ou não; -Estamos perante uma situação fáctica que configura a exceptio non rite adimpleti contratus, não assistindo assim razão à Requerente nesta questão; -Nos termos do artigo 272º do CPC, os presentes autos devem ser suspensos, até decisão final do referido processo, pois, em nome da economia processual e da adequação formal seria despiciendo repetir provas em processos diferentes e sobre a mesma questão jurídica; A Autora exerceu o contraditório relativamente à defesa por excepção e ao pedido de suspensão da instância, alegando, em síntese, que: -A requerente é totalmente alheia ao litígio existente entre a requerida e a sua cliente Y, pelo que não faz sentido a suspensão dos presentes autos; -O que foi efectivamente acordado entre as partes foi que a requerente procederia à elaboração dos trabalhos contratados e aqueles seriam pagos no prazo acordado, ou seja, no mencionado na factura; -Quem actua em claro abuso de direito é a requerida; -Mesmo que tivessem existido defeitos na obra, o que não se aceita nem concede, sempre estes estariam caducos, pois decorreram mais de dois anos desde que a obra foi entregue pela requerente à requerida; -A requerida não entregou à requerente qualquer reclamação em mão, mas mesmo que o tivesse feito, tal como a própria refere, teria sido em 6 de Julho de 2017; -Em momento algum da sua oposição, a ré referiu quais os defeitos provocados pela requerente, limitando-se a referir a existência de defeitos, mas não refere exactamente quais os actos, omissões ou condutas da requerente, que provocaram defeitos; Por despacho de fls. 73 e 74 foi indeferida a suspensão da instância requerida pela Ré.

Realizou-se a audiência de julgamento, e a final foi proferida sentença que julgou parcialmente procedente a acção e, em consequência:

  1. Condenou a Ré a pagar à Autora a quantia de € 7.917,50, acrescida de juros vencidos desde 8.06.2017 e vencidos até efectivo e integral pagamento, sobre o capital de € 7.917,50, às taxas resultantes da Portaria n.º 277/2013, de 16 de Agosto; b) Condenou a Ré a pagar à Autora a quantia de € 40,00, acrescida de juros vencidos desde a data da notificação do requerimento de injunção e vencidos até efectivo e integral pagamento, sobre o capital de € 40,00, às taxas resultantes da Portaria n.º 277/2013, de 16 de Agosto; c) Condenou a Ré a pagar à Autora a quantia que se venha a liquidar oportunamente, a título de preço pela realização dos trabalhos referidos nos pontos 10 e 12 dos Factos Provados, acrescida de juros vencidos desde a data da liquidação até efectivo e integral pagamento, às taxas resultantes da Portaria n.º 277/2013, de 16 de Agosto.

    Inconformada com esta decisão, a ré dela interpôs recurso, que foi recebido como de apelação, com subida imediata e nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo – artigos 549º,1, 629º,1, 631º,1, 638º,1,7, 644º1,a), 645º,1,a), e 647º,1 do Código de Processo Civil.

    Termina a respectiva motivação com as seguintes conclusões: I.

    A recorrida propôs requerimento de injunção onde solicitava o pagamento global de 10.545,14 €uros, contra a aqui recorrente.

    II.

    Acontece que, após audiência de discussão e julgamento, o Exmº Juiz “a quo” julgou a acção parcialmente provada procedente, condenando a Ré aqui recorrente no seguinte: “

  2. A pagar à Autora, “M. F., Lda.”, a quantia de € 7.917,50, acrescida de juros vencidos desde 8.06.2017 e vencidos até efectivo e integral pagamento, sobre o capital de € 7.917,50, às taxas resultantes da Portaria n.º 277/2013, de 16 de Agosto; b) A pagar à Autora, “M. F., Lda.”, a quantia de € 40,00, acrescida de juros vencidos desde a data da notificação do requerimento de injunção e vencidos até efectivo e integral pagamento, sobre o capital de € 40,00, às taxas resultantes da Portaria n.º 277/2013, de 16 de Agosto; c) Condeno a Ré, “X, Revestimentos e Isolamentos, Lda.”, a pagar à Autora, “M. F., Lda.”, a quantia que se venha a liquidar oportunamente, a título de preço pela realização dos trabalhos referidos nos pontos 10 e 12 dos Factos Provados, acrescida de juros vencidos desde a data da liquidação até efectivo e integral pagamento, às taxas resultantes da Portaria n.º 277/2013, de 16 de Agosto.”, sendo que a recorrente, salvo o devido respeito, não pode concordar.

    III.

    Isto porque, observando-se os factos dados como provados e como não provados, resulta que, como infra veremos, no presente processo, a justiça não aconteceu.

    IV.

    Antes de mais, foi dado como provado nos itens 15, 16 e 17 dos ”Factos Provados” que a empreitada realizada pela recorrida foi clamorosamente defeituosa.

    V.

    Mas, mesmo assim, pela sentença em crise, a recorrente foi condenada a pagar à recorrida tal empreitada defeituosa e, ainda (mal, diga-se) condenada igualmente, noutra quantia a liquidar em execução de sentença, onde como infra se aferirá também está ligada a empreitada defeituosa.

    VI.

    Segundo o princípio do processo equitativo, na dimensão de "justo processo" ("fair trial"; "due process"), os interessados não podem sofrer limitação ou exclusão de posições ou direitos processuais em que legitimamente confiaram, nem podem ser surpreendidos por consequências processuais desfavoráveis com as quais razoavelmente não poderiam contar: é o princípio da confiança na boa ordenação processual, que com altíssimo respeito não aconteceu.

    VII.

    Para não dar azo a estas injustiças, é que a jurisprudência tem atendido que o processo injuntivo não é o próprio para dirimir estes tipos de situações. Deste modo e a título meramente exemplificativo e, porque o tema a dirimir é também o da empreitada, indica-se o Ac. da Relação de Lisboa n.º 73674/18.4YIPRT.L1, de 24/04/2019, «in www.dsgi.pt, assim como o Processo n.º 184887/14.1YIPRT.L1-8, in www.dgsi.pt.

    VIII.

    Assim, referiu o dito acórdão: “(…) apesar do concreto preenchimento dos pressupostos objectivos exigidos para a utilização do procedimento de injunção – cumprimento de obrigação pecuniária emergente de contrato, concretamente contrato de empreitada/gestão de obra ;obrigação pecuniária de valor inferior a 15.000,00 €, estando em causa concretamente o valor de...

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