Acórdão nº 5112/19.4T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelJOSÉ FLORES
Data da Resolução18 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES 1.

RELATÓRIO A Recorrente S. A.

deduziu procedimento cautelar de suspensão de deliberação social contra a Recorrida Y, Lda., o qual culmina com o pedido de suspensão da deliberação tomada na, por si alegada, assembleia geral realizada em 19/08/2019 e pela qual se nomeou o Sr. A. C., para gerente, e, consequentemente, a declaração da suspensão de todos os seus efeitos e todos os actos praticados em resultado daquela deliberação.

Citada a Requerida, apresentou oposição que termina com o seguinte pedido: Nestes termos e nos melhores de direito, que V. Exa. Doutamente suprirá, deve a presente contestação com reconvenção ser admitida e em consequência:

  1. Ser conhecida a incompetência territorial do douto tribunal, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do art. 577.º do CPC, e por consequência ser a presente acção remetida para o tribunal competente, o douto tribunal judicial da comarca de Aveiro, nos termos e para os efeitos do n.º 2 do art. 576.º do CPC; B) Ser a presente acção julgada improcedente por não provada, com todas as consequências legais; (…).

    Em resposta, a Requerente apresentou novo requerimento em questiona o patrocínio da Requerida.

    Foi deferido contraditório sobre a questão da incompetência.

    Entretanto a Requerida suscitou a questão da caducidade da providência cautelar, nos termos do art. 59º, nº 2, do C.S.C., e a sua inutilidade.

    A Requerente respondeu arguindo a inaplicabilidade dessa norma ao caso.

    Em saneamento de 22.10.2019, foi julgada improcedente a excepção de incompetência territorial, bem como a relacionada com a alegada irregularidade do patrocínio da requerida. Decidiu-se ainda que a lide não era inútil, ao contrário do que pretendia a Requerida na sua oposição e no requerimento avulso.

    A requerida impugnou esta decisão em recurso.

    Esse recurso não foi admitido, por ser intempestivo.

    Após instrução foi proferida decisão final com o seguinte dispositivo: “Nestes termos e pelos fundamentos expostos:

    1. Julgo inverificada a excepção do abuso de direito; b) Julgo manifestamente improcedente a presente providência cautelar quanto ao pedido de suspensão da deliberação de nomeação de gerente, por não terem sido invocados factos consubstanciadores de dano apreciável, absolvendo a Requerida desse pedido.

    2. Indefiro o pedido de inversão do contencioso.

    Custas pela requerente.” Inconformada com essa decisão, a Requerente, acima identificada, apresentou recurso da mesma, que culmina com as seguintes Conclusões.

    1. A. A Recorrente entende que a decisão da matéria de facto é incorrecta quanto aos pontos a) e b) da matéria de facto não provada; que deverão ser PROVADOS.

  2. Esta alteração deverá ser feita com base no depoimentos de parte de J. F. transcrito no corpo das alegações e de acordo com o disposto no art. 607º nº 4 do Código de Processo Civil e no art. 347º do Código Civil “à prova que for produzida pela parte sobre quem recai o ónus probatório pode a parte contrária opor contraprova a respeito dos mesmos factos, destinada a torna-los duvidosos: se o conseguir, é a questão decidida contra a parte onerada com a prova.” C. A sentença erra quando entende não foram alegados factos concretos consubstanciadores de que a execução da deliberação acarretará, com certeza, ou com uma probabilidade muito forte e séria, prejuízo apreciável.

  3. Seria muito difícil (se não impossível) que nos 10 dias posteriores à deliberação (prazo de proposição da providência), a Requerente tivesse conhecimento de concretos actos praticados pelos gerentes causadores de prejuízos apreciáveis. Por outro lado, após a citação da Requerida, a execução da deliberação impugnada ficou suspensa, nos termos do art. 381º/3 do CPC.

  4. A prova do “dano apreciável não tem que ser afecta de factos e comportamentos concretos da Requerida praticados em data posterior à deliberação impugnada.

  5. Acresce que mesmo que se entendesse que não tinha sido alegados factos consubstanciadores do dano (o que não se concede). Impunha-se o convite ao aperfeiçoamento do requerimento inicial.

  6. Tendo sido alegados (e provados) os factos essenciais dos quais resultava a nulidade da deliberação, a causa de pedir estava identificada.

  7. À luz do novo CPC impunha-se o convite ao aperfeiçoamento.

    … Em resposta a Recorrida/Requerida alegou, em suma… A. A sentença recorrida que julga improcedente a providência cautelar quanto ao pedido de suspensão da deliberação de nomeação de gerente e ainda improcedente o pedido de inversão de contencioso foi notificada às partes no dia 12.11.2020.

  8. Ora, nos termos conjugados dos artigos 369º, nº 3 e 373º nº 1 a) do CPC, a Requerente/Recorrente não intentou a acção principal no prazo de 30 dias a contar da data da notificação da sentença, prazo esse substantivo.

  9. Assim, salvo melhor opinião que os Venerandos Juízes Desembargadores suprirão, a providência cautelar em crise caducou.

    Caso assim não se entenda: D. Consideramos que, a matéria de facto dada como não provada constante das alíneas a) e b) deverá ser mantida por este Tribunal, não se vislumbrando qualquer censura àquela.

  10. Porquanto, apesar do J. F. ser gerente da Requerida não cabe à Requerente indicar quem será ouvido na qualidade de representante daquela.

  11. E, conforme a certidão permanente da sociedade Requerida e do pacto social juntos aos autos, J. F. não vincula a sociedade Requerida, não podendo representá-la em juízo.

  12. Para o efeito necessitaria de estar devidamente mandatado pela gerência, porquanto a Requerida vincula-se com a intervenção de dois gerentes.

  13. Deste modo, a representação da sociedade Requerida em juízo há de ser feita por dois gerentes ou pela pessoa que a gerência designar para o efeito, nos termos do artigo 453.º, n.º 2, 2.ª parte do CPC, dos artigos 260.º e 261.º do CSC e do artigo 163.º do Código Civil I. Ademais, J. F. além de gerente da Requerida é unido de facto com a Requerente.

  14. E, em conluio com aquela, de tudo tem feito para bloquear a actividade da sociedade, designadamente, bloqueio ao acesso às contas bancárias e não pagam a fornecedores, ao escritório de contabilidade, à via verde, os leasings dos autocarros, à Telecomunicaçãoes …, rigorosamente nada.

  15. Assim, salvo melhor opinião que os Venerandos Juízes Desembargadores douta mente suprirão, não estamos perante um caso de depoimento de parte admissível.

    L. Porquanto, o regime do depoimento de parte está inserido numa secção subordinada à epígrafe "Prova por confissão das partes", definida na lei substantiva como "o reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária", nos termos do artigo 352.º do cc.

  16. Assim como, considera a Recorrida que o tribunal a quo andou bem ao julgar manifestamente improcedente a presente providência cautelar quanto ao pedido de suspensão da deliberação de nomeação de gerente, por não terem sido invocados factos consubstanciadores de dano apreciável, não merecendo censura tal decisão.

  17. Confundindo, parece-nos, a Recorrente o "dano apreciável" com toda ou qualquer possibilidade de prejuízo que a deliberação ou a execução em si mesmas comportam.

  18. Olvidando que o "periculum in mora" visa acautelar a utilidade prática da sentença de anulação da deliberação social contra o risco da duração do respectivo processo.

  19. Decorre do requerimento inicial a inexistência da alegação de qualquer dano apreciável.

  20. Acresce que, em sede de audiência de discussão e julgamento a Requerente não logrou provar qualquer facto consubstanciador de dano apreciável.

  21. Assim, a decisão recorrida não merece censura. Sem prejuízo, S. Pretende a Recorrida ver esclarecidas por este Venerando Tribunal as seguintes questões: a) Pode apenas um dos gerentes de uma sociedade comercial com gerência plural prestar depoimento de parte sem estar mandatado para o efeito, nos termos do artigo 453.º, n.º 2, 2.ª parte do CPC, dos artigos 260.º e 261.º do CSC e do artigo 163.º do CC? b) Poderá a audição do gerente J. F. ser entendida como depoimento de parte quando aquele tem o mesmo interesse da parte contrária no processo? Isto é, quando não se verifica o pressuposto do artigo 352.º do CC de que "o reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária"? c) Pode o tribunal de 1.ª instância convidar a Requerente a aperfeiçoar o requerimento inicial da providência cautelar de suspensão de deliberações sociais quando aquele requerimento não contém qualquer alegação de factos concretos que consubstanciem dano apreciável? Nestes termos e com o douto suprimento de Vossas Excelências, requer-se que: i) seja declarada procedente a invocada caducidade da providência cautelar, subsidiariamente ii) seja o presente recurso seja julgado não provado e totalmente improcedente, mantendo-se na íntegra a Decisão recorrida,… Na mesma data, deduziu recurso subordinado, onde conclui nos seguintes termos: A. Dando aqui por reproduzido tudo quanto anteriormente se disse, ao abrigo do princípio da economia processual, cumpre-nos balizar o presente recurso.

  22. Isto é, naturalmente, que este ambiciona satisfazer a pretensão da Recorrente em ver o despacho proferido, no que concerne à não verificação da caducidade do direito de propor acção de anulação de deliberações sociais da Recorrida, revogado e substituído por outro que defira a verificação da dita caducidade.

  23. Sem prejuízo, pretende, ainda, ver esclarecidas por este Venerando Tribunal as questões levantadas pelo despacho proferido pelo tribunal a quo, designadamente: i. A previsão do artigo 56.º, n.º 1, alínea a) do CSC é aplicável apenas à falta de convocatória prévia dos sócios para a realização de assembleia geral, isto é, falta de expedição da convocatória por parte da sociedade para as moradas conhecidas dos sócios da mesma, ou, também é aplicável à falta de recepção da convocatória (efectivamente expedida) por algum dos sócios? ii. Quando um dos sócios não recepciona a...

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