Acórdão nº 73/15.1T8VNF-G.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelFERNANDA PROENÇA FERNANDES
Data da Resolução18 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I. Relatório.

Por apenso ao processo de insolvência nº 73/15.1T8VNF, da Sociedade X Investimentos, Lda, pendente no Juízo de Comércio de Vila Nova de Famalicão, J4, Comarca de Braga, veio O. P., Lda., com sede no Parque Industrial de ..., Pavilhão ..., Braga intentar acção para verificação ulterior de direito à separação e efectiva restituição de bens contra X Investimentos, Lda, seus credores e sua Massa Insolvente, formulando o seguinte pedido: a) ser verificado o direito de propriedade da Requerente relativamente ao saldo bancário no valor que existe na conta bancaria da Massa Insolvente decorrente do reembolso operado pela Administração Tributária e a sua insusceptibilidade de apreensão para a massa.

  1. ser ordenada a restituição da referida quantia à Requerente, mediante ordem de transferência directa ordenada pelo Exmo. Senhor Administrador de Insolvência nomeado nos autos da conta da massa insolvente para a conta bancaria da Requerente.

    Apenas apresentou contestação Massa Insolvente da Sociedade X Investimentos, Lda, em suma, defendendo a improcedência do pedido.

    *A 9/9/2020 foi proferida a seguinte decisão: “Na sua contestação, vem a R. Massa Insolvente da Sociedade X Investimentos, Lda invocar erro na forma do processo, alegando que a reclamação de créditos é o meio processual que se afigura adequado para a pretensão manifestada pela Requerente.

    Respondeu a A., defendendo a improcedência da excepção invocada.

    Cumpre apreciar e decidir.

    O Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, através dos arts. 141º e ss., permite àqueles que por força de apreensão de determinado bem em processo de insolvência se sintam lesados na sua posse ou propriedade, obter a restituição ou a separação de bens que tenham sido indevidamente apreendidos para a massa insolvente.

    Como ensina o senhor Desembargador Salazar Casanova (cfr. Ac. da Relação de Lisboa, de 19/10/2006, proc.7566/2006-8, disponível na internet em www.dgsi.pt) “Todo aquele que se sinta lesado na sua posse ou propriedade pela apreensão de bens efectivada pelo administrador da insolvência na sequência de sentença declaratória de insolvência que decretou a apreensão dos bens do insolvente (artigo 36.º/1, alínea g) do C.I.R.E.) terá de recorrer aos procedimentos para restituição e separação de bens previstos no artigo 141.º e seguintes do mesmo diploma”.

    O facto atentatório da propriedade do requerente é a apreensão de determinado bem a este pertencente pelo senhor Administrador da Insolvência, no âmbito da insolvência e com vista à sua liquidação em favor dos credores.

    Aquele que se sente lesado pela apreensão do senhor Administrador da Insolvência deve intentar acção prevista nos arts. 141º e ss. por apenso ao processo de insolvência, pedindo a separação do bem em causa do auto de apreensão de bens.

    Como se diz no Ac. Relação de Coimbra (Proc. n.º 472/11.8TBTMR-L.C1, Relator Fonte Ramos “A lei permite àqueles que pela apreensão se sintam lesados na sua posse ou propriedade obter a restituição ou a separação de bens que tenham sido indevidamente apreendidos para a massa insolvente por via do procedimento a que aludem os art.ºs 141º e seguintes, do CIRE, defendendo-se e acautelando-se, dessa forma, os direitos do reclamante e o procedimento de apreensão para a massa insolvente e sua (adequada) repercussão na fase da liquidação. Tal reclamação para restituição ou separação constitui o único meio de reacção legalmente previsto, logo que decretada a apreensão dos bens e porventura ainda antes da sua materialização (posse material) pelo administrador da insolvência” – ac. do TRL de 20/11/2014, in www.dsgi.pt.

    Na petição inicial, a A. O. P., LDA. deduz o seguinte pedido: a) seja verificado o direito de propriedade da Requerente relativamente ao saldo bancário no valor que existe na conta bancaria da Massa Insolvente decorrente do reembolso operado pela Administração Tributária e a sua insusceptibilidade de apreensão para a massa.

  2. Seja ordenada a restituição da referida quantia à Requerente, mediante ordem de transferência directa ordenada pelo Exmo. Senhor Administrador de Insolvência nomeado nos autos da conta da massa insolvente para a conta bancaria da Requerente.

    Ora, facilmente se compreende que (não obstante ser isso que alega expressamente), não é o direito de propriedade do saldo bancário no valor que existe na conta bancária da Massa Insolvente que a A. pretende.

    Dito de outra forma, a A. não pretende reivindicar o seu direito de propriedade sobre as notas e as moedas que foram transferidas pela Administração Tributária para a insolvente.

    O que a A. pretende (compreende-se pelo que diz nos artigos da sua petição inicial) é ser reembolsada de tal valor, pelo que o que está em causa é um eventual direito de crédito da A. sobre tal valor e não um direito de propriedade sobre o saldo bancário, como invoca.

    Direito de crédito é o direito de exigir de outrem a realização de uma prestação, seja de caráter patrimonial, isto é, em dinheiro ou suscetível de avaliação em dinheiro, seja caráter não patrimonial, exigindo-se, contudo, neste caso, que a prestação corresponda a um interesse do credor digno de proteção legal.

    Por isso, a forma de processo utilizada pela A. não é a própria, pois não estamos perante uma Acção de Restituição e Separação de Bens.

    Tem razão, nesse aspecto, a R..

    A acção própria para A. fazer valer o seu direito de crédito é a Verificação Ulterior de Créditos, prevista nos arts. 146º e ss. do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.

    Há claramente um erro na forma do processo utilizado pela A..

    Conforme dispõe o art. 193º, nº 1 do Código de Processo Civil ex vi art. 17º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, “O erro na forma do processo importa unicamente a anulação dos atos que não possam ser aproveitados, devendo praticar-se os que forem estritamente necessários para que o processo se aproxime, quanto possível, da forma estabelecida pela lei”, o que não constitui obstáculo maior, pois o regime do art. 146º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas tanto se aplica à Acção de Restituição e Separação de Bens, como à de Verificação Ulterior de Créditos.

    Contudo, a norma invocada contém uma exigência de tempestividade especifica para esta última acção, pois “O direito à separação ou restituição de bens pode ser exercido a todo o tempo, mas a reclamação de outros créditos, nos termos do número anterior:

  3. Não pode ser apresentada pelos credores que tenham sido avisados nos termos do artigo 129.º, excepto tratando-se de créditos de constituição posterior; b) Só pode ser feita nos seis meses subsequentes ao trânsito em julgado da sentença de declaração da insolvência, ou no prazo de três meses seguintes à respetiva constituição, caso termine posteriormente”.

    Cumpre, assim, corrigir a presente acção para Acção de Verificação Ulterior de Créditos e apreciar a sua tempestividade.

    Tratando-se de uma questão nova, sobre a qual as partes ainda não tiveram a oportunidade de se pronunciar (pois só agora o tipo de acção será corrigido), deverão ser convidadas a pronunciar-se, a fim de evitar qualquer decisão surpresa.

    Termos...

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