Acórdão nº 506/21.8T8CHV-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02 de Dezembro de 2021

Magistrado ResponsávelJORGE TEIXEIRA
Data da Resolução02 de Dezembro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.

I – RELATÓRIO.

Recorrente: N. S..

Recorrido: J. M. e o Mº Pº.

Tribunal Judicial da Comarca de Vila Real - Juízo Local Cível de Chaves, Juiz 2.

Na presente acção de divórcio sem consentimento do outro cônjuge instaurada por J. M., Juiz, em exercício de funções no Tribunal de Chaves contra N. S.

, Advogado, com escritório em …, por falta de acordo quanto à regulação do poder paternal, depois de ouvidos os progenitores, decidiu-se fixar regime provisório, em conformidade com o disposto no artigo 38.º do RGPTC nos seguintes termos: “1ª Quanto aos menores S. C. e M. C., os progenitores exercem em conjunto as responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância, sendo as questões de vida corrente a cargo do progenitor com quem no momento se encontrarem.

  1. A guarda dos menores S. C. e M. C.

    é atribuída semanal e alternadamente aos progenitores do seguinte modo: 2.1- Passarão alternadamente cada semana de segunda-feira a segunda-feira com cada um dos progenitores, iniciando-se a corrente semana com a mãe.

    2.2- Este regime mantém-se igualmente em vigor durante o período de férias de verão, Natal e Páscoa.

  2. A menor C. C.

    fica entregue à guarda e cuidados da mãe, fixando-se a sua residência junto desta.

    3.1- As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância da vida da menor (v.g. alteração de residência, escolha de estabelecimento de ensino, intervenções médicas de risco, deslocação ao estrangeiro) são exercidas de comum acordo por ambos os progenitores.

    3.2- O exercício das responsabilidades parentais, relativamente aos atos da vida corrente do menor, cabe ao progenitor com quem estiver de momento.

  3. O progenitor poderá estar com o menor C. C. um fim-de-semana de 15 em 15 dias, devendo recolher a menor à sexta-feira em casa da mãe depois de jantar e entregá-la na segunda-feira de manhã na escola, ou em casa da mãe quando não esteja em período escolar, pelas 09:15 horas.

    4.1- A menor irá iniciar este regime de imediato, passando com o progenitor o fim-de-semana de 16 a 19 de julho.

  4. Durante a semana, o progenitor poderá pernoitar um dia com a menor C. C., o que deverá acontecer às quartas-feiras (sem prejuízo dos progenitores poderem alterar esse dia por acordo), devendo para tal o progenitor ir buscar a menor à escola pelas 17:30 horas, ou quando a menor não estiver em período escolar em casa da mãe, e entregá-la no dia seguinte na escola ou na casa da mãe tendo em conta se está em período escolar ou não.

  5. Durante o próximo mês de Agosto e parte de Setembro (enquanto vigorarem as férias escolares), e nos anos seguintes durante os períodos de férias de verão, a menor C. C. passará com o progenitor os mesmos períodos temporais que os menores S. C. e M. C..

    Regime a vigorar para os três menores: 7ª Quanto ao período de férias de Natal e ao Ano Novo, será passado alternadamente com cada um dos progenitores, sendo que este ano de 2021, será repartido do seguinte modo: a) 22, 23, 24 de Dezembro com o pai; b) 25 a 29 de Dezembro com a mãe; c) 30 de Dezembro a 3 de Janeiro com o pai, d) E o remanescente, caso exista, com a mãe.

    Alternando nos anos subsequentes.

  6. Quanto ao período de férias da Páscoa, será passado alternadamente com cada um dos progenitores, sendo o ano de 2022 será repartido do seguinte modo: a) Do domingo de ramos até quinta-feira santa, com o pai; b) De sexta-feira santa até ao dia posterior ao domingo de Páscoa com a mãe.

    Alternando nos anos subsequentes.

  7. Os menores passarão com o respectivo progenitor o dia do seu aniversário, o dia da mãe e o dia do pai.

  8. Nos dias dos aniversários dos menores, o menor aniversariante almoçará com um dos progenitores e jantará com o outro.

  9. Relativamente aos três menores, os progenitores prescindem reciprocamente de alimentos, sendo que suportam a totalidade das despesas dos menores em partes iguais.

    Cada um dos progenitores assegura as despesas que sejam necessárias no período em que os menores estão à respectiva guarda.

    O acerto de contas entre os progenitores é realizado mensalmente até ao dia 8 de cada mês. Para o efeito, cada um dos progenitores remete ao outro através de correio electrónico (pai: ....-....@adv.oa.pt; mãe: ....@sapo.pt) as despesas suportadas, devendo até à mesma data ser efectuado o pagamento ao progenitor que no período considerado tiver suportado maior despesa, através de transferência bancária para os seguintes IBAN: Pai- PT50 ............. 70; Mãe: PT50 ............. 52.

  10. Cada um dos progenitores assegura as despesas de alimentação dos menores no período em que os mesmos lhes estiverem confiados.

  11. Durante o período em que os menores estiverem com cada um dos progenitores, o progenitor em causa fica desde já autorizado a deslocar-se para o estrangeiro com os menores.

    (…)” Inconformada com tal decisão, apela o Requerido, e, pugnando pela respectiva revogação, formula nas suas alegações as seguintes conclusões: 1. O despacho recorrido viola o art. 1906º, n.ºs 5, 7 e 8, do Código Civil.

    1. A dimensão interpretativa assumida pela Tribunal “a quo” na aplicação daquele preceito – este enquanto concretização do primado do interesse do menor e do direito à família – viola os art. 36º, nº 3 e 6, 67º, nº 1 e 69º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa, dando lugar a uma inconstitucionalidade material por violação daqueles princípios.

    2. O despacho recorrido viola o art. 8º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos, que consagra o direito à vida familiar, na medida em que separa menor do seu progenitor – sendo certo que tal separação não é motivada pelo superior interesse daquela.

    3. O despacho impugnado viola o art. 615º do Código de Processo Civil, conquanto a decisão nele vertida está devoluta de qualquer fundamentação, de facto ou de direito.

    4. Como tal, o despacho impugnado deve ser declarado nulo, o que desde já se peticiona para ser declarado com todas as consequências legais.

    5. Toda a matriz do regime das responsabilidades parentais está adstrita ao princípio do superior interesse do menor (art. 37º da CRP, art. 1887 do CC) 7. Em caso de divórcio ou separação dos progenitores, o exercício das responsabilidades parentais, em relação às questões de maior consequência para vida do menor, cabe conjuntamente a ambos os progenitores (art. 1906º, n.º 1 do CC); 8. O legislador presume, portanto, que o exercício conjunto das responsabilidades parentais em relação aos aspectos de maior importância da vida do menor é aquele que, salvo prova em contrário, melhor acautela o interesse do menor, como é aquele que respeita a igualdade material entre os progenitores.

    6. Não divergindo quanto a este ponto, a fixação de residência do menor, em caso de divórcio ou separação dos progenitores, obedece também ao critério do superior interesse do menor (art. 1906º, n.º 2 do CC) 10. O art. 1906º, n.º 6 do CC, prevê expressamente a possibilidade de o Tribunal fixar a residência do menor alternadamente com cada progenitor, sempre que tal corresponda ao interesse do menor e as circunstâncias do caso em concreto não o impeçam.

    7. Ao modelo de residência alternada são objectivamente reconhecidas várias vantagens, entre elas a manutenção da dinâmica familiar préseparação e a conservação dos vínculos afectivos com ambos os progenitores.

    8. À luz de todas essas vantagens, que contam com vasto suporte empírico, o modelo de residência alternada, é afirmado pelos autores mais autorizados (tanto no campo da pedopsiquiatria como no campo do direito) como aquele que, em abstracto, melhor permite assegurar o são desenvolvimento físico, emocional e comportamental do menor, e assim salvaguardar o seu superior interesse.

    9. Com base nas concepções mais actuais e isentas na matéria da psicologia infantil, da parentalidade e da família, assistiu-se, no plano internacional, a uma verdadeira mudança de paradigma: o regime de residência alternada tornou-se preferível ao regime de residência única exclusivamente com um dos progenitores, por ser aquele que – em condições normais – melhor concorre para salvaguardar o interesse do menor; 14. Da mesma forma que obsta à diferenciação dos papeis dos progenitores na vida familiar em função do género.

    10. No encalço desta mudança de paradigma, a Resolução 2079 (2015) do Conselho da Europa instou os Estados-Membros, “[…] introduzir na sua legislação o princípio de residência alternada depois da separação, limitando as excepções aos casos de abuso infantil ou negligência, ou violência doméstica, ajustando o tempo em que a criança vive na residência de cada progenitor em função das suas necessidades e interesses.” 16. Conforme se concluiu, a mais recente alteração legislativa introduzida no art. 1906º do Código Civil, apesar de incompreensivelmente não ter consagrado o modelo de residência alternada como regime-regra, ou sequer como regime preferencial, estabelece que o Tribunal pode (deve!) determinar a residência alternada com os dois progenitores, sempre que tal corresponda ao superior interesse do menor e as circunstâncias que rodeiam o caso não o desaconselhem, não sendo perceptível na decisão impugnada quais são as circunstâncias que no caso possam obstar à residência alternada, tal como fixou para os restantes menores.

    11. Contudo, enquanto dever ser que é, o Direito não pode permanecer impávido ao progresso sociológico da última década, designadamente no campo da parentalidade e das relações familiares.

    12. Como tal, é seguro afirmar, atento tudo que se deixou alegado, que é apenas uma questão de tempo até o legislador actualizar novamente o seu pensamento, consagrando a residência alternada como o regime preferencial, por ser aquele que melhor acautela o superior interesse do menor, reservando a residência única com um dos progenitores para situações em que tal, concretamente, não se verifique, seja porque circunstâncias for – não se olvide que não há muito o tempo a lei estabelecia que o exercício das responsabilidades...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT