Acórdão nº 70877/20.5YIPRT-C.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02 de Dezembro de 2021
Magistrado Responsável | JORGE SANTOS |
Data da Resolução | 02 de Dezembro de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I – RELATÓRIO Por via de Requerimento de Injunção, a Requerente Y- Textil, Lda, vem pedir a condenação da Requerida X, S.A., a pagar lhe a quantia de 193 054, 08 Euros, correspondente ao valor das faturas nº FT .../0185, vencida em 02/09/2020, no valor de 191 955, 28 Euros e FT .../0141, vencida em 09/07/2020, no valor de 829, 14 Euros, relativas as fornecimentos de mercadorias, acrescidas de juros vencidos e vincendos.
A Requerida X, S.A., veio deduzir oposição com reconvenção, sustentando que a fatura no valor de 191 955, 28 Euros não diz respeito ao fornecimento de mercadorias pela Requerente à Requerida, explicando que essa fatura não é devida e, por isso, foi devolvida e que, além do mais, a outra fatura no valor de 829, 14 Euros, a Requerida a aceita o seu valor, que pretende compensar com o contra-crédito que irá deduzir.
Explica então que as relações comerciais entre a Requerente e a Requerida se iniciaram em março de 2020, num contexto de pandemia, altura em que a Requerida entrou numa nova área de negócios confeção de equipamentos de proteção individual e batas cuja produção subcontratou a diversas empresas, entre as quais a Requerente, tendo celebrado um acordo cujos contornos estão descritos no ponto 13º da Oposição, do qual resultava, além do mais, que como contrapartida pela gestão do projeto, a Requerida pagaria à Requerente fees de gestão, na forma de um montante fixo por peça, sendo certo que pela fatura nº .../0096, liquidada em 14/05/2020, foram faturados e pagos todos os fees de gestão referente à , apesar da Requerente ter abusivamente emitido mais duas faturas, que a Requerida acabou por pagar, o que determinou o agastamento das relações comerciais. A fatura reclamada na injunção foi, por isso, abusivamente emitida, já que a rojeto Têxtil não ficou a cargo da Requerente e não foram acordados fees de gestão para esta fase e a Requerente não prestou à Requerida os correspondentes serviços de gestão de projeto de que sempre dependeria o direito a tais fees.
Todavia, para a produção da 1ª fase de encomendas, a Requerida contratou de facto os serviços da Requerente para a gestão do projeto, nos termos referidos no ponto 13º da Oposição, gestão que veio a revelar-se insatisfatória, dada a incapacidade da Requerente em manter as parcerias inicialmente angariadas ou angariar outras, a não transmissão de diretrizes corretas às empresas confecionadoras, gerando prejuízos à Requerida, designadamente ao nível das medidas das batas, obrigando a requerida, a partir de meados/fim de Maio, a constituir uma equipa interna para o acompanhamento do projeto.
Ora, na economia do acordo celebrado, eventuais derrapagens que se viessem a verificar nos custos de produção inicialmente estimados pela Requerente seriam descontados aos fees de gestão a que a Requerente teria direito. Visto que a Requerida suportou custos adicionais no valor de 452 913, 30 Euros, que são superiores aos fees que pagou à Requerente (285 574, 39 Euros), entende que é titular de um crédito sobre a requerente correspondente ao valor dos fees que pagou deduzido do crédito de 829, 14 Euros, titulado pela fatura nº .../0141, devendo a Requerente ser condenada a pagar à Requerida o valor de 284 745, 25 Euros.
Ademais, a título de danos não patrimoniais reclama uma indemnização de 10 000,00 euros.
Conclui pugnando pela improcedência da ação, e absolvição da Requerida do pedido contra si formulado, pela condenação da Requerente como litigante de má fé, em multa e indemnização adequadas; pela procedência do pedido reconvencional pugnando pelo reconhecimento do crédito da Requerida sobre a Requerente no valor de 285 574, 39 Euros; compensar parcialmente esse crédito com o montante de 829, 14 euros devido pela Requerida à Requerente; condenando a Requerente a pagar à Requerida a quantia de 284 745, 25 Euros, bem como no pagamento da quantia de 10 000, 00 euros, a título de indemnização por danos morais.
Por despacho de fls. 833, foi fixado à ação o valor de 484 628, 47 Euros e ordenada a remessa dos autos para os Juízos Centrais Cíveis de Guimarães.
A Autora veio deduzir Réplica no articulado de fls. 838 e ss e ampliar o pedido e causa de pedir, sustentando que afinal, a relação contratual existente entre as partes nada tinha a ver com o fornecimento de bens ou serviços, mas com uma alegada sociedade irregular, negando que tenha sido estabelecida qualquer penalização que pudesse incidir sobre os fees de gestão devidos à Reconvinda por eventuais derrapagens que viessem a verificar-se nos custos de produção, impugnando a reconvenção deduzida.
Concluí pedindo além do mais: a) que a oposição seja julgada totalmente improcedente por não provada, condenando-se a Reconvinte no pagamento da quantia peticionada no pedido injuntivo, no valor de 192 784, 42 Euros, acrescido de juros vencidos e vincendos até integral pagamento.
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que o pedido reconvencional seja julgado improcedente, bem assim como o pedido de condenação da Reconvinda como litigante de má fé; c) que a ampliação do pedido e da causa de pedir sejam julgados procedentes, sendo a Reconvinte condenada a pagar à autora os fees de gestão do valor global fixado de 2 460 000,00 euros para a produção de batas e factos em tecido técnico, num valor de 12 milhões de peças, deduzido o montante de 195 451,08 Euros, já faturado e recebido, correspondente ao montante pedido no requerimento de injunção; d) que a ampliação do pedido e da causa de pedir sejam julgados procedentes, sendo a Reconvinte condenada a título de lucros obtidos com a criação da sociedade irregular celebrada com a Autora, do qual se apropriou silenciosamente e de forma indevida em consequência da cisão da sociedade irregular constituída entre as partes e da não entrega à autora do montante relativo à percentagem estimada que lhe caberá (40%) sobre o montante dos lucros da Ré em 2020, a apurar em sede de peritagem à contabilidade da Ré, para apuramento do montante das vendas das batas e fatos em tecido técnico, sabendo-se desde já que o montante de lucros conhecido é de 8 254 677, 99 Euros, no âmbito das atribuições e responsabilidades da Autora na sequencia do contrato de sociedade celebrado entre ambos, ou seja, fixando-se tal valor mínimo em 3 301 471, 19 Euros ( 40% sobre 8 254 677, 99 Euros), podendo ser reduzido ou ampliado em função do resultado da perícia à contabilidade da Ré.
No requerimento de fls. 995 e ss, a Ré/Reconvinte pugna pela inadmissibilidade legal da ampliação do pedido e da causa de pedir, considerando ainda existir um obstáculo legal à cumulação de pedidos por erro na forma de processo e violação das regras de competência material dos tribunais.
Foi proferida decisão que rejeitou, por manifestamente inadmissíveis, a alteração da causa de pedir e dos pedidos formulados pela Autora.
Mais decidiu que, para além da alteração da acusa de pedir e pedidos serem legalmente inadmissíveis, verifica-se ainda um obstáculo legal à cumulação dos pedidos em virtude da incursão em erro na forma do processo e violação das regras de competência material dos tribunais art. 555º/1 e 37º/1 do CPC., que sempre geraria a absolvição da reconvinte da instância quanto aos novos pedidos formulados.
Inconformada com tal decisão dela veio recorrer a Requerente formulando as seguintes conclusões: 1. No despacho de que se recorre cometeram-se erros na apreciação e aplicação da matéria de direito, impondo-se, por isso, uma solução inversa à decidida no despacho ora impugnado, competindo, assim, a este Tribunal ad quem usar dos seus poderes/deveres (funcionais) de censura.
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O artigo 265.º n.º 2 do Código de Processo Civil, estabelece que, na falta de acordo das partes, qualquer tipo de modificação do pedido é legalmente admissível desde que seja o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo.
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A doutrina tem defendido que a ampliação está contida virtualmente no pedido inicial, pelo que, pressupõe que, dentro da mesma causa de pedir, a pretensão primitiva se modifica para mais, podendo, no entanto, envolver a formulação de um pedido diverso, desde que tal pedido e o pedido primitivo tenham essencialmente causas de pedir integradas no mesmo complexo de factos.
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No artigo 582.º n.º 4 do Código de Processo Civil, o legislador adotou a teoria da substanciação para definir o conceito de causa de pedir, segundo a qual, a causa de pedir é o próprio facto jurídico genérico do direito, ou seja, o acontecimento concreto, correspondente a qualquer fattispecie jurídica que a lei admita como criadora de direitos, abstração feita da relação jurídica que lhe corresponde.
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Deste conceito de causa de pedir resulta que não basta invocar em relação aos mesmos factos um novo fundamento jurídico para se concluir pela alteração da causa de pedir, pois, a causa de pedir nada tem que ver com a qualificação jurídica do facto ou factos submetidos à apreciação do tribunal; a causa de pedir está no facto...
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