Acórdão nº 223/18.6T8BCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 16 de Dezembro de 2021

Magistrado ResponsávelMARIA LUÍSA RAMOS
Data da Resolução16 de Dezembro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães J. R. e esposa R. B., instauraram a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra S. M. e marido M. J., pedindo que:

  1. Se declare que os autores são donos e legítimos proprietários e possuidores do prédio urbano identificado no item 1º da petição inicial, correspondente ao Lote n.º 4, composto por casa de rés do chão e andar, sito no Lugar de …, da freguesia de ..., concelho de Barcelos, com a área de 732m2, a confrontar do Norte com estrada municipal, do Sul, Nascente e Poente com J. F., inscrito na matriz predial urbana sob o n.º … e descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o n.º …/..., e condenar os réus a reconhecer tal direito de propriedade; b) Se declare que o limite poente do lote n.º 5, propriedade dos réus, encontra-se deslocado em 2,20 mts para o interior do lote n.º 4, ocupando deste uma porção de terreno com a área de 65 m2, com a configuração de um rectângulo e que se encontra devidamente assinalada e delimitada no documento n.º 12 supra junto (planta que ilustra a faixa de desajuste dos limites entre os lotes 4 e 5, constante da resposta dos peritos ao ponto 35), e condenar os réus a reconhecer que a dita parcela de terreno, com a área de 65 m2, faz parte integrante do prédio dos autores identificado no item 1º da petição inicial; c) Se condene os réus a restituir aos autores a referida parcela de terreno, com a área de 65 m2, com a configuração de um rectângulo e que se encontra devidamente assinalada e delimitada no documento n.º 12 supra junto (planta que ilustra a faixa de desajuste dos limites entre os lotes 4 e 5, constante da resposta dos peritos ao ponto 35), livre de pessoas e bens; d) Se condene os réus a pagar aos autores, a título de sanção pecuniária compulsória, a quantia de 50,00 € (cinquenta euros) diários por cada dia de atraso que se venha a verificar na restituição aos autores da referida parcela de terreno, com a área de 65 m2, a contar desde a citação e até à efectiva restituição da parcela de terreno livre de pessoas e bens; e) Se condene os réus a absterem-se, no futuro, da práctica de quaisquer actos que impeçam ou diminuam o exercício do direito de propriedade dos autores sobre a referida parcela de terreno com a área de 65 m2; f) Se condene os réus a pagar aos autores a quantia de € 2.500,00 a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros moratórios, contados à taxa legal desde a data da citação e até efectivo e integral pagamento.

    Alegam os Autores, em síntese, que são proprietários de um prédio urbano que corresponde ao lote n.º 4, o qual adquiriram por partilha por óbito de J. F., pai do autor marido e avô da ré mulher.

    A adjudicação na partilha apenas visou a formalização da transmissão do direito de propriedade que havia ocorrido anos antes, por doação verbal dos pais do autor marido, sendo que por causa disso os autores, em 1994, já tinham licenciado e edificado uma moradia em tal parcela, na posse da qual já estão há mais de 30 anos.

    O prédio dos autores confronta, do lado nascente, com o lote n.º 5, propriedade dos réus, e que adveio à sua posse por doação dos pais da ré mulher à mesma, em escritura outorgada em 19.02.1998.

    Ambos os lotes resultaram da operação de loteamento levada a cabo por J. F. a que foi atribuído o alvará de loteamento n.º 49/97 e no qual foram criados 7 lotes.

    Já no ano de 1988, o falecido J. F. e mulher tinham procedido à divisão física do prédio originário, com a colocação de marcos, sendo que logo nesse ano, cada um dos 7 filhos ficou a saber qual era a parcela de terreno que lhe cabia.

    Quando os pais do autor marido e avós da ré mulher quiseram formalizar a transmissão das 7 parcelas, para os 7 filhos, foi necessário executar uma operação de loteamento.

    As construções já existentes nas parcelas 1, 2 e 4 não permitiam o respeito pelas normas legais aplicáveis, pelo que, o falecido J. F., para obviar a tal situação e viabilizar a operação de loteamento, ordenou que o loteamento fosse instruído com planta topográfica na qual foram ficcionadas linhas divisórias distintas da divisão física existente no prédio desde 1988, o que foi feito com o acordo de os 7 filhos continuarem a respeitar a divisão originária efectuada no ano de 1988 e de respeitar as distâncias com as construções já existentes nas parcelas 1, 2 e 4.

    Sucede que até os réus decidirem construir a sua habitação, todos os proprietários dos respectivos lotes respeitaram a divisão originária realizada em 1988. Contudo, os réus projectaram a construção da sua habitação com total desconsideração pelos limites fixados por J. F.. Assim, a parcela de terreno dos réus, de acordo com a demarcação física realizada por J. F. em 1988, ocupava uma área de 629m2, mas de acordo com o loteamento resultante do alvará n.º 49/97, a mesma tinha uma área de 715m2.

    Os aqui réus instauraram a acção n.º 3007/11.9TBBCL, contra os aqui autores e os proprietários dos demais lotes, onde se concluiu que os (aqui) réus eram proprietários e possuidores do prédio que se acha descrito na Conservatória do Registo Predial de Barcelos sob o n.º .../19970925-... e de todas as benfeitorias executadas por estes nesse mesmo prédio e que a parcela de terreno com a área de 86 m2, com a configuração de um rectângulo, delimitada a vermelho na planta topográfica fls. 25 e incorporada no interno do lote n.º 6, faz parte integrante do prédio dos aqui réus. Os autores, na qualidade de proprietários do lote n.º 6, na sequência do trânsito em julgado de tal decisão, restituíram aos aqui réus a parcela de terreno de 86m2.

    Mas nessa acção, foi também dado como provado que o limite poente do lote n.º 5 acha-se deslocado 2,20 metros para o interno do lote n.º 4 e distanciado 2,80 metros da casa existente neste, ocupando a área de 65 m2 de terreno do lote n.º 4, tal como este surge delimitado na planta de síntese integrante do alvará de loteamento n.º 49/97, ou seja, o lote n.º 4 de que os autores são proprietários ocupa uma área inferior à que lhe foi atribuída no processo de loteamento, área essa com 65m2, que é ocupada pelo lote n.º 5 de que os réus são proprietários.

    Os autores têm sofrido danos de natureza não patrimonial por estarem privados da posse e fruição da dita parcela e por não poderem legalizar os anexos que edificaram, o que lhes causa tristeza, desgosto, desanimo e revolta, danos esses que merecem a tutela do direito.

    *Os réus, válida e regularmente citados, contestaram a acção.

    A ré S. M. apresentou a contestação de fls. 117 a 199, onde se defende por excepção e por impugnação. A título de excepção, a ré invoca o caso julgado, defendendo que os pedidos formulados nas als. a) a c) já foram decididos na acção n.º 3007/11.9TBBCL, pelo que, quanto aos mesmos, verifica-se a excepção de caso julgado, o que implica a absolvição do pedido.

    No mais, a ré aceita parte da factualidade alegada e impugna a restante, defendendo que o prédio dos autores tem, como sempre teve, apenas a área de 672m2, que se encontra confinada entre os muros divisórios existentes a nascente e poente, pelo que a presente acção tem de improceder.

    Defende ainda que os autores litigam com má fé, por deduzirem pretensão cuja falta de fundamento estavam perfeitamente conscientes.

    Termina pedindo que:

  2. A excepção de caso julgado arguida, seja julgada procedente por provada, com a consequente absolvição dos réus dos pedidos formulados; ou caso assim não se entenda, b) Deverá a presente acção ser julgada improcedente por não provada, com a consequente absolvição da ré dos pedidos formulados, e c) Os autores sejam condenados como litigantes de má fé em multa adequada e no pagamento de uma indemnização a favor da ré, a fixar nos termos do art. 543.º, n.º 3 do Código de Processo Civil.

    *Por sua vez, o réu M. J. apresentou a contestação de fls. 144 e ss., defendendo-se por excepção e por impugnação. Defende o réu que se verifica a excepção de caso julgado, havendo a repetição de uma causa anterior já decidida, pelo que os réus devem ser absolvidos da instância. No mais, aceita parte da factualidade alegada pelos autores e impugna a demais e alega ainda que conforme decorre da sentença proferida no processo n.º 3007/11.9TBBCL, os réus há mais de 20 anos que exercem a posse sobre o lote n.º 5, à vista de todos, de forma contínua, sem oposição de ninguém e na convicção de que exercem um direito próprio e, por isso, sempre teriam adquirido a propriedade do lote n.º 5 por usucapião. A actual área e configuração do lote n.º 5 encontra-se abrangida pelo caso julgado da sentença proferida no processo n.º 3007/11.9TBBCL. Já os actos de posse sobre o lote n.º 4 invocados pelo autor apenas e só incidiram sobre a área de 672m2, confinando-se no seu limite nascente ao muro divisório existente. Assim, a acção tem de improceder.

    Foi proferido despacho saneador tendo sido conhecida a invocada excepção de caso julgado, julgando-a improcedente.

    Foi fixado o “Objecto do litígio” e “Temas de prova”.

    Realizado o julgamento veio a ser proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, nos seguintes termos: “Pelo exposto, o Tribunal decide julgar a acção parcialmente procedente e, em consequência: A. Declara-se que os autores J. R. e R. B. são proprietários do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Barcelos sob o n.º …/... e inscrito na matriz predial urbana sob o n.º …, composto por casa de rés do chão e andar, anexos e logradouro, sito em ..., da freguesia de ..., concelho de Barcelos.

    1. Condena-se os réus S. M. e M. J. a reconhecer que a parcela de terreno com a área de 65 m2, com a configuração de um rectângulo e que se encontra assinalada a fls. 66 dos autos, integra o prédio referido em A).( cfr. rectificação de erro de escrita a fls.534 ).

    2. Condena-se os réus S. M. e M. J. a restituir aos autores a parcela de terreno referida em B. livre de pessoas e bens.

    3. Condena-se os réus S. M. e M. J. a absterem-se da prática de quaisquer...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT