Acórdão nº 177/18.9T8FLG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 09 de Julho de 2020

Magistrado ResponsávelHELENA MELO
Data da Resolução09 de Julho de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório C. M.

, propôs acção declarativa sob a forma de processo comum contra “X SEGUROS S.A.

”, actualmente “COMPANHIA DE SEGUROS Y, S.A.”, pedindo a condenação desta no pagamento da quantia de € 29.250, 87 (vinte e nove mil duzentos e cinquenta euros e oitenta e sete cêntimos), acrescida dos juros de mora desde a data da citação até integral e efetivo pagamento, bem como do montante diário de € 30,00 (trinta euros) a título de privação de uso do veículo GT, desde a data da citação até integral e efectivo pagamento da indemnização devida pela perda total do mesmo.

Alega para o efeito e, em síntese, que celebrou com a Ré um contrato de seguro para cobertura de danos próprios, incluindo os riscos de incêndio, do veículo com a matrícula QT marca Renault, modelo Laguna III Diesel 1.5 DCI Dynamic S, de sua propriedade, e que este veículo, em 27 de Fevereiro de 2016 incendiou-se, ficando totalmente destruído e impossibilitado de circular.

Mais alega que, na sequência do processo de averiguação de sinistro efectuado pela Ré, esta apurou que a reparação do veículo era excessivamente onerosa face ao seu valor de mercado, tendo colocado condicionalmente à sua disposição a quantia de € 20.125,87 que resultava da dedução ao valor atribuído pela seguradora ao veículo QT à data do sinistro (€ 20.445,87) do valor da proposta de aquisição do mesmo (€ 320,00) da parte de A. S., valor este que o Autor aceitou, mas que a Ré não pagou por, posteriormente, ter vindo a comunicar que o sinistro não ocorreu conforme participado.

Mais alega que a Ré nunca lhe atribuiu qualquer veículo de substituição, não obstante tal estar contratado, tendo ficado privado do seu veículo desde a data do sinistro até à presente data, estando impedido de se deslocar.

Pretende, assim, ser ressarcido da quantia proposta pela Ré, na sua comunicação de 22 de março de 2016, bem como pela falta de disponibilidade do veículo de substituição durante o período de 15 dias e pela paralisação do mesmo até à data do pagamento da indemnização correspondente.

Devidamente citada, a Ré apresentou contestação, admitindo a celebração do seguro em causa, bem como a participação do sinistro em apreço.

Impugnou, no entanto, a dinâmica do acidente descrita na petição inicial (designadamente, a sua ocorrência), antes alegando que o mesmo foi dolosamente provocado pelo Autor com vista à obtenção de uma vantagem patrimonial ilegítima, à custa da Ré.

Invocou, ainda, que o veículo se encontrava, à data do alegado sinistro, numa situação de sobresseguro, uma vez que ao objecto seguro estava atribuído um valor seguro muito superior ao seu real valor, havendo, assim, uma desproporção entre o interesse seguro e o valor do capital pelo qual o mesmo se encontra contratualmente seguro, alegando que à data do alegado sinistro, o mesmo tinha uma cotação de mercado de € 12.000, pelo que, a demonstrar-se a ocorrência do sinistro alegado na petição inicial, o valor da indemnização não poderá ser superior. Mais invocou que o A. prestou falsas declarações relativas aos extras que o veículo possuía.

Se assim, não se entender, o limite da responsabilidade da Ré não poderá ser superior a € 19.972,30 correspondente ao capital seguro à data dos factos, já que foi contratualizado que tal capital sofreria uma desvalorização mensal de acordo com a tabela de desvalorização que consta da página 3 das Condições Particulares da Apólice nº 3803492, no caso 3%, uma vez que o sinistro ocorreu no segundo mês.

Por fim, impugnou que o Autor tenha sofrido quaisquer prejuízos decorrentes da privação do uso do veículo, cuja responsabilidade não estava, porém, transferida para a Ré, e que o Autor tenha solicitado qualquer veículo de substituição, condição sine qua non de accionamento dessa garantia/cobertura.

Pugnou, assim, pela improcedência da acção.

Respondeu o Autor à contestação, afirmando, designadamente, não ter prestado falsas declarações aquando da subscrição do seguro, já que o mesmo foi formalizado através do mecanismo/aplicação disponibilizada na página de internet www.x.pt, a que o Autor acedeu e preencheu o formulário digital aí disponibilizado pela Ré, nomeadamente, com os dados pedidos pela Ré, relativos ao veículo, respectiva marca, modelo, ano de matrícula, os seus dados relativos à idade, anos de habilitação legal para conduzir, número de sinistros anteriores, e no tocante aos estofos em pele e jantes de liga leve ou alumínio, o Autor limitou-se a preencher os dados do formulário online uma vez que resulta da referida aplicação online a configuração dos estofos de pele e jantes de alumínio ou de liga leve como extras, assim como resulta da mesma aplicação online o valor atribuído aos mesmos, bem como é a Ré que atribuiu o valor do veículo, não resultando o mesmo de qualquer indicação do Autor, sendo automaticamente atribuído, pela aplicação, sem qualquer indicação ou interferência do Autor.

Acresce que o veículo QT, quando foi adquirido pelo Autor, vinha equipado com o revestimento dos bancos num misto de tecido e couro, tendo o Autor procedido à aplicação de revestimento em couro na sua totalidade, bem como à aplicação de novas jantes no veículo.

Por fim, refere que na apólice em causa o que ficou consignado foi o do valor do interesse seguro em caso de sinistro, acordado pelas partes, não configurando os presentes autos uma situação de sobresseguro.

Por despacho de 14.06.2018 foi apreciada a excepção de incompetência territorial do Juízo Local Cível de Felgueiras do Tribunal da Comarca de Porto Este que, julgada procedente, determinou a remessa dos presentes autos ao Tribunal competente.

Dispensada a audiência prévia, e fixado o valor à causa, foi proferido despacho saneador, fixado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova, após o que, instruída a causa, se designou data para a audiência final.

Realizada a audiência final foi proferida sentença com o seguinte teor dispositivo: “Face ao exposto, julga-se a presente acção parcialmente procedente, e, em consequência, condena-se a Ré COMPANHIA DE SEGUROS Y, S.A.” a pagar ao Autor C. M. a quantia de € 14.841 (catorze mil oitocentos e quarenta e um euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação até integral pagamento, absolvendo-se do demais peticionado.

Custas da acção a suportar pelo Autor e pela Ré na proporção do respectivo decaimento (Cfr. Artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil). “ Ambas as partes recorreram.

São as seguintes as conclusões do A.

  1. Salvo o devido respeito, a douta sentença, ao julgar apenas parcialmente procedente a acção interposta pelo Autor, aqui Apelante, constitui um clamoroso erro de julgamento no que respeita à fixação da matéria de facto assim como uma errada subsunção dos factos ao direito.

  2. Se, por um lado não merece qualquer crítica ou censura a douta decisão do tribunal a quo que considerou provado que o incêndio do veículo QT no dia 27 de Fevereiro de 2016, pelas 13 horas e 30 minutos, ao Km 62,500 da Auto-Estrada 11 sita na freguesia de ..., concelho de Felgueiras, configura uma situação de risco coberta pelo contrato de seguro de danos próprios celebrado pelo Autor junto da Apelada e com a apólice n.º .........2, 3. Por outro lado não pode o aqui Apelante concordar com a decisão do Tribunal a quo relativamente à obrigação de indemnização a cargo da Ré Apelada e respectiva medida, nomeadamente quanto ao valor do veículo QT, o qual foi fixado de forma muito inferior ao devido, assim como quanto ao indeferimento da indemnização peticionada a título de privação de uso.

  3. O presente recurso incide, assim, sobre os seguintes pontos 1) Impugnação de matéria de facto constante do ponto “DD” dos “Factos Provados” ao qual o Tribunal a quo deu a seguinte redação “Em Fevereiro de 2016, um veículo com as mesmas características do QT ascendia a € 15.161” 2) Determinação do valor a indemnizar pela Apelada ao Apelante pela perda total do veículo de matrícula QT no âmbito das cláusulas de danos próprios (que cobria o risco de “incêndio, raio e explosão”) subscrita no contrato de seguro com a apólice .........2 3) Da Indemnização pela Privação de uso do veículo QT 5. No tocante ao ponto 1) o Tribunal a quo assentou a sua decisão quanto ao ponto DD da matéria de facto por contraposição ao ponto 7 da matéria de facto dada como não provada da seguinte forma: “Sobre a factualidade constante do ponto 7., a mesma resultou não provada em função dos documentos constantes de fls. 124-125, de onde resulta desde logo que, em Fevereiro de 2016, a W avaliava um veículo como o do Autor em € 15.161 (motivo pelo qual se deu como provada a factualidade constante da Alínea DD.), ou seja, superior a 12.000, sendo certo que, só em Outubro de 2018, é que o mesmo passa a ser avaliado em € 10.974 (cfr. Fls. 12 6-127). É certo que a testemunha F. F., comerciante de automóveis, referiu que terá tido um anúncio de um veículo como o do Autor para venda pelo preço de € 12.500, admitindo poder valer € 14.000/€ 15.000, o que fez de forma espontânea e imparcial. Todavia, é a opinião de um vendedor de automóveis, desconhecedor do concreto estado do veículo comprado pelo Autor e muito menos dos termos do negócio em que foi realizado. (nosso sublinhado) 6. Sucede que nem o documento a fls 126/127 – avaliação W – nem o depoimento da testemunha F. F., de per se ou em conjugação, permitem concluir que um veículo com as características do veículo de matrícula QT valeria somente € 15.161,00, antes permitiam concluir que o valor deste seria bastante superior uma vez que, designadamente, tal montante não leva em consideração o valor dos extras do veículo QT do A, nomeadamente dos estofos em pele no montante de € 1.136,00 e jantes em liga leve/alumínio € 852,00 - cfr ponto C da matéria de facto dada como provada.

  4. A W Portugal procedeu à junção de dois documentos denominados “Avaliação”, numa indicando o montante de € 15.161,00 e noutra um...

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