Acórdão nº 611/18.8T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 09 de Junho de 2020
Magistrado Responsável | RAQUEL BAPTISTA TAVARES |
Data da Resolução | 09 de Junho de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I. Relatório J. L.
, residente na Rua …, em ...
, Espanha, intentou a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra Hotel X – Y, Ldª, com sede na EN.., freguesia de ...
, concelho de Vila Nova de Cerveira e Seguradora ..., SA, com sede na Avenida …, da cidade de Lisboa, pedindo a condenação solidária das Rés a pagar-lhe a quantia de €73.214,20, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação e até ao integral pagamento.
Alega, para tanto e em síntese, que sofreu danos patrimoniais e não patrimoniais decorrentes do sinistro que descreve, ocorrido nas instalações da 1ª Ré, do qual resultaram lesões corporais e prejuízos materiais para o Autor e cuja ocorrência imputa à conduta ilícita e culposa da 1ª Ré, sendo que esta, à data, havia transferido a sua responsabilidade civil extracontratual por danos ocorridos na unidade hoteleira em questão para a Ré Seguradora.
Regularmente citada, a Ré Seguradora ..., SA apresentou-se a contestar, invocando as condições da apólice de seguro em causa e impugnando a versão do sinistro e ainda os danos e os montantes alegados, tendo alegado que a queda do Autor se deveu a conduta do próprio; terminou pedindo a improcedência parcial da presente acção.
A Ré Hotel X-Y, Ldª também contestou, impugnando as circunstâncias do sinistro, bem como os danos e valores peticionados; terminou pedindo a improcedência da acção.
Foi dispensada a realização da audiência prévia e, na sequência, proferido despacho saneador, tendo ainda sido fixado o objecto do litígio e enunciados os temas de prova.
No entanto, foi requerida a realização da audiência prévia ao abrigo do disposto no artigo 593º n.º 3 do Código de Processo Civil, à qual se procedeu.
Produzida a prova pericial requerida, o Autor veio ampliar o pedido, pedindo a condenação das Rés a pagar ao Autor, para além do pedido formulado na petição inicial, a quantia adicional de €10.000,00 para compensação da IPP de que ficou portador e dos danos não patrimoniais sofridos e a importância que vier a ser liquidada em momento ulterior, relativamente às dependências permanentes de ajudas medicamentosas e tratamentos médicos regulares.
Veio a efetivar-se a audiência de discussão e julgamento com a prolação de sentença nos seguintes termos, no que concerne à parte dispositiva: “Pelo exposto, julgo parcialmente procedente a presente acção e, em consequência: - condeno solidariamente as rés Hotel X – Y, Lda e Seguradora ..., SA, a pagar ao autor J. L. a quantia de € 56.442,78 (cinquenta e seis mil, quatrocentos e quarenta e dois euros e setenta e oito cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, contados desde a citação até integral pagamento; - condeno a ré Hotel X – Y, Lda a pagar ao autor J. L. a quantia de € 6.271,42 (seis mil duzentos e setenta e um euros e quareta e dois cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, contados desde a citação até integral pagamento; - condeno solidariamente as rés na quantia que se vier a liquidar relativa aos danos futuros aludidos no ponto 45 do elenco dos factos provados, deduzida quanto à ré seguradora da respectiva franquia de 10%; - absolvo as rés do restante pedido.
Não existem sinais evidentes de litigância de má-fé.
As custas serão provisoriamente suportadas na proporção de metade pelo autor e metade pelas rés, procedendo-se a rateio definitivo após liquidação (art.º 527º, nºs 1 e 2, do NCPC).
Registe e notifique”.
Inconformada, apelou a Ré Seguradora ..., SA concluindo as suas alegações da seguinte forma: “Conclusões: 1.ª A ora Apelante não se conforma com a mui douta sentença, por entender que não há qualquer violação de norma legal, dever de cuidado ou obrigação contratual.
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Os fatos considerados provados sob os itens 7 e 8 deverão ser considerados não provados, atentos os testemunhos de S. S., gravado no ficheiro 28771824, cuja transcrição se encontra a folhas 175 a 212, F. P., gravado no ficheiro 2871824, D. P., gravado no ficheiro 2871824 e das declarações de parte do próprio Apelado, vide minuto 00.05.07 das aludidas declarações.
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Ninguém viu a queda do Apelado e consequentemente não pode haver prova da causa, do mecanismo e das circunstâncias da mesma, sendo certo que, nem o próprio Apelado disse que o chão estava molhado, imaginando, ou supondo apenas que estava húmido, o que é manifestamente insuficiente para se determinar a causa da queda.
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O Apelado apenas refere que escorregou assim que abriu a porta da piscina, não tendo por isso sequer, atravessado ou percorrido o corredor, pelo que, na ausência de quem tenha assistido à queda, não pode haver prova dos factos 7 e 8 da douta fundamentação de fato.
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Independentemente do ângulo jurídico pelo qual se analise o objecto do litígio, seja ele do ponto de vista contratual, ou extracontratual, não vislumbra a Apelante que haja culpa ou violação de um dever de cuidado por parte do seu segurado, por não ter sido produzida prova nesse sentido.
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Não corresponde à verdade da prova que não houvesse sinalética adequada no local do alegado risco, vide pontos 12 e 13 dos fatos provados, pelo que, há, segundo crê a Apelante um equívoco, na douta fundamentação, quanto à imputação da causa do sinistro ao segurado da ora Apelante nos termos que vêm decididos na douta fundamentação de Direito.
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Verifica-se a violação do disposto nos art.s 799° do CC e 483° e sego do CC, o que se alega para todos os devidos e legais efeitos”.
Pugna a Ré pela procedência do recurso e consequente revogação da sentença recorrida.
Também inconformada com a sentença proferida veio a Ré Hotel X – Y, Ldª apelar concluindo as suas alegações da seguinte forma: “III. CONCLUSÕES DO RECURSO: A. O presente recurso vem interposto da sentença proferida pela Secção Cível – J3, do Juízo Central Cível de Viana do Castelo, que julgou parcialmente procedente a acção, e, em consequência, condenou, solidariamente, as rés Hotel X – Y, Lda e Seguradora ..., SA, a pagar ao autor J. L. a quantia de € 56.442,78 (cinquenta e seis mil, quatrocentos e quarenta e dois euros e setenta e oito cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, contados desde a citação até integral pagamento e a aqui, Recorrente (doravante) Hotel X a pagar ao autor a quantia de €6.271,42 (seis mil duzentos e setenta e um euros e quarenta e dois cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, contados desde a citação até integral pagamento.
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Mais condenou, solidariamente, as Rés na quantia que se vier a liquidar relativa aos danos futuros aludidos no ponto 45 do elenco dos factos provados, deduzida quanto à ré seguradora da respetiva franquia de 10%.
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A decisão de condenação, parcial, das aqui Rés no pedido formulado pelo Autor teve, essencialmente, como fundamento a procedência da matéria invocada pelo Autor, nomeadamente que a queda do autor só ocorreu porque “o corredor se encontrava molhado (…).” D. O tribunal considerou provado que “No momento em que o autor circulava em tal corredor, o pavimento encontrava-se molhado ou humedecido e escorregadio” e que “O autor escorregou e caiu no mencionado corredor pelo facto daquele se encontrar molhado ou humedecido e escorregadio”. (cf. quesitos 7 e 8 dos factos provados).
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Quanto a esta concreta questão do piso se encontrar ou não molhado no momento em que o Autor circulava no corredor e, bem assim, no que se refere aos procedimentos de limpeza do Spa, o Tribunal incorreu, salvo o devido respeito, num erro de apreciação e valoração da prova produzida quer a nível documental, quer quanto às testemunhas ouvidas em sede de audiência de julgamento.
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Quanto à alegada condição do piso no momento da queda do Autor dos procedimentos de limpeza do Spa a Recorrente impugna a resposta dada aos factos provados nºs 7, 8 e 9.
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O Tribunal, nos factos n.ºs 7 e 8 afirma ter resultado provado que “No momento em que o autor circulava em tal corredor, o pavimento encontrava-se molhado ou humedecido e escorregadio”, e que “O autor escorregou e caiu no mencionado corredor pelo facto daquele se encontrar molhado ou humedecido e escorregadio”.
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Acontece que a factualidade vertida nestes factos n.ºs 7 e 8 não corresponde à verdade e inexiste nos autos um qualquer elemento, documental ou depoimento de uma qualquer testemunha, que permita extrair semelhante conclusão.
I. Bem ao invés, quer a testemunha, F. P., que exercia as funções de terapeuta no Spa, quer a testemunha D. P., gerente do Hotel X, à data dos factos, negaram, expressamente, que o piso em questão estivesse com água, molhado ou humedecido.
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Não se trata sequer de aferir da razão por que o Tribunal decidiu atribuir maior credibilidade a uma/s testemunha/s e menor crédito a outra/s testemunha/s, mas antes de aferir da (in)existência de um qualquer meio de prova que possa ter suportado a formação da convicção do Tribunal.
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O Tribunal apenas pode decidir sobre a prova efetiva de um determinado facto se existir nos autos algum elemento de suporte para a tomada de decisão, pois que se inexistir qualquer elemento probatório, a decisão terá de ser necessariamente de “não prova”.
L. Foi do depoimento destas testemunhas que se serviu o Tribunal “a quo” para fundamentar a decisão quanto à concreta questão do piso estar ou não molhado e no que respeita aos procedimentos de limpeza do espaço em questão.
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Todavia, resulta de forma clara das declarações prestadas por cada uma destas testemunhas - que não mereceram por parte do Tribunal nenhuma censura ou dúvida sobre a respetiva credibilidade – que no momento da queda, o pavimento do corredor não se encontrava com água, molhado ou humedecido.
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Estas testemunhas, como salientou o Tribunal, foram ainda decisivas para a demonstração dos procedimentos de limpeza do spa que, como se demonstrou, o Hotel X revelou fazer cumprir.
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A testemunha, F. P., explicou no seu depoimento - (prestado na sessão da audiência de julgamento de 11.07.2019, gravado no sistema...
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