Acórdão nº 5908/18.4T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelAFONSO CABRAL DE ANDRADE
Data da Resolução15 de Outubro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I- Relatório A. G.

, menor, representada por seus pais, P. M. e P. C., residente na Rua …, freguesia de ..., concelho de Barcelos, instaurou acção declarativa de condenação materializada sob a forma de processo comum contra a Companhia de Seguros X Portugal, S.A. pedindo que a ré seja condenada pagar-lhe: a) € 15.000,00 pelos danos não patrimoniais por ela sofridos, desde a data do acidente até ao momento da instauração da presente acção.

  1. Os juros de mora, que sobre tais quantias, se vencerem, a contar da sua citação.

  2. A indemnização correspondente aos danos patrimoniais e não patrimoniais que sofreu e vai continuar a sofrer, por via das lesões sofridos no acidente em mérito e das sequelas definitivas que lhe vierem a ser fixadas em exame médico a realizar na sua pessoa, cuja dimensão, grau ou valor, neste momento, não conhece, indemnizações a tal título, a liquidar em execução de sentença Alegou em síntese que no dia 19.11.2015 ocorreu um acidente de viação quando seguia como passageira no motociclo conduzido por J. S., que seguia em excesso de velocidade, e que ao descrever uma curva entrou em derrapagem e tombou. O acidente ficou a dever-se à culpa exclusiva do condutor do motociclo, cuja responsabilidade por acidentes estava transferida para a ré.

    Do referido acidente resultaram ferimentos para a Autora, que foi levada para o Hospital de ambulância, onde ficou internada. Daí os danos patrimoniais e não patrimoniais cuja reparação agora pretende.

    A ré contestou (fls. 23), impugnando a descrição do acidente e os alegados danos sofridos pela Autora.

    Termina defendendo a procedência parcial da acção.

    Os autos seguiram os seus termos, a Autora apresentou requerimento no qual veio ampliar o pedido formulado inicialmente e liquidá-lo definitivamente, no valor total de € 80.000,00, correspondendo € 50.000,00 a danos patrimoniais e € 30.000,00 aos danos não patrimoniais.

    Realizou-se a audiência de julgamento, conforme decorre das respectivas actas de fls. 117, 118 e 126 dos autos.

    A final foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência condenou a ré a pagar à autora a quantia de € 48.000,00 (quarenta e oito mil euros) acrescida de juros de mora vencidos desde 26.10.2019 sobre a quantia de € 23.000,00 (vinte e três mil euros) e sobre o restante (ou seja, € 25.000,00 euros) desde a presente data e vincendos até efectivo e integral pagamento.

    Inconformada com esta decisão, a autora dela interpôs recurso, que foi recebido como de apelação, com subida nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (arts. 627º,1, 629º,1, 631º,1, 637º,1,2, 638º,1, 639º, 641º,1, 644º,1,a, 645º,1,a e 647º,1, todos do Código de Processo Civil.

    Termina a respectiva motivação com as seguintes conclusões: Relativamente aos danos patrimoniais A- Tendo a Autora feito nos autos prova bastante de que aos 21 anos concluiria - como refere a sentença recorrida, o seu Curso de Técnica Oficial de Contas, no concelho de sua residente, no conhecido e reconhecido IPCA, da cidade de Barcelos - fez igualmente prova bastante de que, no exercício de tal profissão, auferirá de um vencimento de cerca de € 1.250,00, TENDO EM CONTA OS DEPOIMENTOS DAS TESTEMUNHAS J. S., acima transcrito a fls. 8, 9 e 10, A. F., a fls. 10 e 11 e J. B., a fls. 11.

    Por esta razão e pelas que a seguir se elencar até L, a matéria dada por NÃO PROVADA”, em d), dos “factos não provados”, deverá dela ser retirada, passando a integrar os factos da matéria de facto PROVADA.

    B.

    A mesma Conclusão se tira, pois que, é facto público e notório, do conhecimento comum de qualquer cidadão, meio de prova, que qualquer técnico de contas, também conhecido por “contabilista” aufere, por regra, de um rendimento médio mensal muito superior ao salário mínimo nacional, classe profissional que se integra na chamada classe média alta, ou média alta, da sociedade portuguesa.

    C.

    Tal prova, quanto ao valor médio mensal de uma Técnica de Contas, não foi posta em causa por nenhum outro meio de prova.

    D.

    A sentença recorrida, no cálculo da indemnização em causa, sustenta-se num Acórdão proferido no ano de 2005, em alguns do ano de 2009, em vários de 2010 e a um ou outro dos anos de 2012, 2013 e 2014, quando bem podia e devia apoiar-se em Acórdãos bem mais recentes, proferidos praticamente em todas as instâncias, arbitrando indemnizações mais actualizadas e especialmente, mais justas e adequadas.

    E.

    Tendo o acidente em mérito, ocorrido no final do ano de 2015, é a partir desse ano e até a Autora perfazer 83 anos de idade (tinha 13 anos à data do acidente) que o Tribunal deverá ponderar, na atribuição da justa indemnização.

    F.

    Tendo a partir do ano de 2015, melhorado a situação económica e financeira, Portugal incluído, com taxas de desemprego muito mais baixas, com o crescimento em número e qualidade das empresas cresceram, contribuindo para o manifesto reforça da nossa economia e das nossas exportações, do turismo, etc, os gestores de empresas e técnicos de contas viram os seus empregos crescendo, em número e melhores remunerações.

    Impõe-se, por essas razões, concluir que a Autora tem trabalho garantido na sua área profissional.

    G.

    Com o aproveitamento escolar comprovado documentalmente nos autos, a Autora é uma das jovens do nosso país que contribuiu e contribui, para uma cada vez maior/mais alta escolaridade alcançada pela juventude portuguesa, o que ainda não ocorria nos anos de 2005, 2006, 2010…, sucedendo-se os casos de atribuição de prémios internacionais a Alunos e a Escolas do nosso país.

    F.

    Considerando que o Supremo Tribunal de Justiça e, posteriormente, todos os demais Tribunais, desde há cerca de 8 anos que, para efeitos do cálculo a fazer das indemnizações o que conta é a esperança média de vida das mulheres – que actualmente é de 83 anos - e não apenas a esperança de vida activa, era essa a idade que o Tribunal Recorrido deveria ter em conta no cálculo da indemnização a que a Autora tem direito, a título de danos patrimoniais decorrentes do défice funcional de que está afectada, de forma permanente.

    G.

    Chegando a Autora à vida profissional activa aos 22 anos, tem ela mais, pelo menos - porque a mesma vai-se alargando com o passar dos anos - 63 anos de esperança de vida, sendo esse número a considerar no cálculo da referida indemnização e não 49 anos, como considera a sentença recorrida.

    F.

    Atenta a prova testemunhal e documental produzida nos autos, mormente o facto de a Autora ter tido - sempre - bom aproveitamento escolar, mau grado o acidente em mérito, a sentença recorrida deu - e bem - por assente, que a Autora terminará o seu Curso de TOC - Técnica Oficial de Contas -, quando perfizer 21 anos.

    G.

    Tendo em conta que o muito provável rendimento que a Autora vai lograr/obter com a sua profissão de Técnica Oficial de Contas, a quantia de € 50.000,00, a título de dano patrimonial decorrente da redução da sua capacidade de trabalho/défice funcional permanente, é justa e adequada, indo minimamente ao encontro à mais recente Jurisprudência.

    ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Proc. nº 282/09.2TCGMR-A1.G1) de 30.05.2019 - Unanimidade Em causa um menor de 17 anos à data do acidente, em 2009, com uma incapacidade de 14% ou seja, o dobro à da ora Autora, a quem o Acórdão atribuiu uma indemnização, a título de danos patrimoniais, decorrente do défice funcional permanente, do valor de € 80.000,00.

    ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Proc. nº 954/13.7T8BPMS-C1S1 – 7ª Secção) - Unanimidade em 28.03.2019: em causa uma menor de 12 anos à data do acidente, com 18 anos à data da sentença e com uma incapacidade de 8,95%, ou seja, superior em 1,95% à da ora Autora, a quem o Acórdão atribuiu uma indemnização, decorrente do défice funcional permanente, a título de danos patrimoniais de € 80.000,00.

    H.

    Mesmo em casos de pessoas que, vítimas de acidentes de viação, caídas no desemprego e a receber o respectivo subsídio, de valor bem inferior ao salário mínimo nacional, a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça calcula tal tipo de indemnizações com base num rendimento superior ao do dito subsídio.

    ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Proc. nº 1585/12.4 TBGDNM.P1S1) - 7ª Secção - Unanimidade em 20.11.2019: Em causa um homem, com 39 anos à data do acidente, desempregado, com uma incapacidade de 10%, ou seja, superior em 3% da ora Autora, a quem o Acórdão atribuiu uma indemnização, decorrente do défice funcional permanente a título de danos patrimoniais, de € 33.000,00, não obstante tal sinistrado ter já 39 anos de idade, à data do acidente.

    Recorda-se que a sentença recorrida arbitra à ora Recorrente uma indemnização, a tal título de apenas € 23.000,00.

    I.

    O cálculo da indemnização a arbitrar à Autora, tendo em conta as razões acima elencadas em 1ª a 14ª, deverá o Tribunal considerar os seguintes elementos: Idade da Autora na data na vida profissional activa = 22 anos Esperança média de vida = 83 - 22 anos de idade = 61 anos Défice funcional = 7 pontos.

    Salário anual = € 17.500,00 Ora, Feitas as contas = € 1.250,00 x 14 meses = 17.500,00. € 17.500,00 x 7% = € 1.225,00/ ano € 1.225,00 x 61 anos = € 74.725,00 J.

    O Supremo Tribunal de Justiça, em aresto inovador, proferido já em 06.10.2011, decidiu não concordar com a redução de ¼ do valor global da indemnização por haver o sinistrado recebido a totalidade da indemnização, com a seguinte fundamentação. Ora, a justificação que o Tribunal Supremo assume é que não é exigível essa possível correcção, já que “ compete apenas ao lesado escolher a forma como irá fazer uso da indemnização arbitrada (gastando o montante indemnizatório de uma só vez ou dispondo dele ao longo da sua vida) ... e não lhe confere qualquer enriquecimento, pois se dissipar o capital que lhe foi atribuído nem por isso terá direito a qualquer outro recebimento futuro.

    Porém, para além desse argumento existe outro, que temos como perfeitamente atendível.

    É que, na realidade e em bom...

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