Acórdão nº 1083/19.5T8VCT-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 29 de Outubro de 2020
Magistrado Responsável | FIGUEIREDO DE ALMEIDA |
Data da Resolução | 29 de Outubro de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO
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A autora J. K.
veio intentar ação declarativa com processos comum contra Banco ... – Sucursal em Portugal, onde peticiona que seja declarada sem efeito a subscrição da aplicação financeira denominada X Global Outubro de 2017, no montante de €200.000,00, concretizada em novembro de 2014 e, em consequência, que seja o banco réu condenado na restituição à autora da referida quantia, mais juros de mora até efetivo e integral pagamento.
A ré Banco ... – Sucursal em Portugal apresentou contestação e veio deduzir a intervenção principal provocada de J. M. e da seguradora Y – Sucursal em Portugal.
No que se refere ao chamado J. M., que é companheiro da autora, refere a ré que o chamado prestou o seu consentimento à celebração dos contratos de mútuo e assumiu pessoal e diretamente as responsabilidades assumidas pela autora no âmbito do contrato de mútuo nº 830017942 outorgado em 29.07.2016, pelo que é cotitular dos direitos que a autora pretende fazer valer por via desta ação, devendo ser admitido a intervir nos termos do disposto no artigo 316º nº 3 b) do Código de Processo Civil, pelo que requereu a sua intervenção provocada.
No que se refere à seguradora Y – Sucursal em Portugal, refere a ré que a autora funda a sua pretensão na responsabilidade civil do réu emergente dos atos praticados pelos ex-promotores da Agência de Ponde de Lima, no âmbito do contrato de promoção celebrado com o ora réu e no âmbito da atividade de intermediação financeira, promoveram os negócios sub judice e, por via do contrato de seguro titulado pela apólice numero PA17FI0044, o ora réu, transferiu a sua responsabilidade civil emergente da prestação de serviços financeiros ou profissionais pelos promotores por si designados, para a seguradora Y – Sucursal em Portugal, pelo que o sinistro sub judice, encontra-se abrangido pelo objeto da referida apólice a qual cobre temporalmente os factos em discussão nos presentes autos, motivo pelo qual a seguradora Y – Sucursal em Portugal, responde, solidariamente com o réu, pelos danos que na presente ação lhe são imputados pela autora, constituindo-se na obrigação de ressarcir a autora, nos mesmos termos em que o réu o tenha de fazer, pelo que é manifesto o interesse da seguradora em contradizer a pretensão deduzida pela autora nos presentes autos, razão pela qual, ao abrigo do artigo 316º do CPC, se provocou a intervenção principal da seguradora Y – Sucursal em Portugal.
*B) Foi proferido o despacho de fls. 103 e seg., onde consta: “No seu articulado de contestação o réu veio suscitar a intervenção principal provocada da Y.
Alega o réu que por via do contrato de seguro titulado pela apólice número PA17FI0044 transferiu a sua Responsabilidade Civil emergente da prestação de serviços financeiros ou profissionais pelos promotores por si designados, para a seguradora Y – Sucursal em Portugal.
O sinistro sub judice encontra-se abrangido pelo objeto da apólice número PA17FI0044, a qual, sendo de base de reclamação (“claims made”) cobre temporalmente os factos em discussão nos presentes autos.
Além disso, por via do contrato de seguro titulado pela apólice número C03140004, o réu transferiu a sua responsabilidade civil emergente da atividade por si exercida, de novo, para a seguradora Y – Sucursal em Portugal.
O sinistro sub judice encontra-se abrangido pelo objeto da apólice C03140004, a qual, encontrando-se vigente à data dos atos e omissões imputadas aos promotores externos que colaboravam com o réu, cobre temporalmente os factos em discussão nos presentes autos.
Por força dos contratos de seguro que abrangem o réu, a seguradora Y – Sucursal em Portugal, responde, solidariamente com o mesmo, pelos danos que na presente ação lhe são imputados pela autora, constituindo-se na obrigação de ressarcir a autora, nos mesmos termos em que o réu o tenha de fazer.
Defende o réu que é manifesto o interesse da Seguradora em contradizer a pretensão deduzida pela autora nos presentes autos.
Não foi deduzida oposição.
Estando em causa seguros de carácter facultativo e tendo em conta que nos mesmos não está previsto o direito de demandar diretamente o segurador e considerando que não se verifica a situação de o segurado ter informado a autora com o consequente início de negociações diretas entre esta última e o segurador, é de admitir a intervenção da seguradora, mas apenas como parte acessória. O Tribunal acompanha a jurisprudência consagrada nos Acs. da RP de 12/07/2017 e da RG de 19/10/2017 (in, www.dgsi.pt).
Decide-se assim admitir a requerida intervenção, mas na qualidade de parte acessória do réu.
Assim sendo, defere-se parcialmente o incidente, admitindo-se a intervir nos autos a Y – Sucursal em Portugal, mas como parte acessória do réu (art. 321º do CPC).
Custas pelo réu.
Notifique.
Cumpra o disposto no art. 323º nº 1 do CPC.”*C) Inconformado com a decisão proferida, veio o réu Banco ... – Sucursal em Portugal, interpor recurso, o qual foi admitido como sendo de apelação, a subir imediatamente, em separado, com efeito devolutivo (fls. 10).
*C) Nas alegações de recurso do apelante e réu Banco ... – Sucursal em Portugal, são formuladas as seguintes conclusões:
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O recurso do douto despacho que não admite a intervenção principal provocada passiva da seguradora Y – Sucursal em Portugal admitindo-a a título de intervenção acessória é recorrível, uma vez que, nos termos do artigo 322º, nº 2 do CPC, apenas a parte do despacho que admite a intervenção acessória da seguradora é irrecorrível.
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O incidente de intervenção de terceiros é um incidente processado autonomamente, pelo que, há a possibilidade de recurso de apelação autónoma, nos termos da última parte da alínea a) do nº 1 do artigo 644º do CPC.
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O douto despacho recorrido pôs termo ao incidente de intervenção de terceiros, e fê-lo não admitindo a intervenção principal da seguradora, tal como tinha sido deduzido pelo ora apelante na sua contestação, apenas admitindo a intervenção acessória da seguradora (através de convolação), sendo assim recorrível, nos termos e para os efeitos da alínea a) do nº 1 e h) do nº 2 do artigo 644º do CPC, na parte não deferida.
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Com o devido respeito que o Tribunal a quo merece, salvo melhor opinião, o douto despacho recorrido violou o disposto nos artigos 316º e 317º do CPC, designadamente no que respeita à não admissão da intervenção principal provocada da seguradora, devendo, consequentemente, ser substituído por outro que admita o incidente de intervenção principal provocada da seguradora.
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Nos artigos 420º e seguintes da sua contestação o recorrente alegou ter celebrado contratos de seguro, nos termos dos quais transferiu para a seguradora a responsabilidade civil em que possa incorrer em consequência de atos, omissões e erros imputados aos promotores por si designados, sendo que, por efeito dos aludidos contratos de seguro, a seguradora responde pelos valores que o autor reclama na presente ação, por estes se incluírem no âmbito da respetiva cobertura dos seguros.
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A seguradora com a qual o réu celebrou contratos de seguro de responsabilidade civil facultativos deverá ser considerada titular da mesma relação jurídica invocada pelo autor, devendo ser aceite que a seguradora seja admitida a intervir como parte principal, defendendo um interesse igual a do réu e parte na relação material controvertida.
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Resulta da vasta maioria da doutrina e jurisprudência (no qual se inclui a Veneranda Relação de Guimarães) tratar-se o contrato de seguro de responsabilidade civil (incluindo o facultativo) dum contrato a favor de terceiro, nos termos dos artigos 443º e 444º do CC, podendo, por essa razão, o lesado demandar diretamente a seguradora ou o segurado, ou ambos em litisconsórcio voluntário, nos termos do artigo 32º do CPC.
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Atenta a faculdade de que goza o lesado de demandar diretamente a Seguradora, a intervenção desta deverá ser admitida a título principal, seja em virtude da natureza do contrato de seguro de responsabilidade civil facultativo como contrato a favor de terceiro (artigo 444º do CC), seja devido ao facto de, perante o lesado, segurado e seguradora, serem solidariamente responsáveis (artigo 497º do CC).
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A intervenção principal provocada (artigo 316º do CPC), em litisconsórcio passivo, da seguradora e do segurado, assegurará uma defesa conjunta contra o credor, bem como, acautelará um eventual direito de regresso (nº 1, do artigo 317º do CPC), já que, o contrato de seguro de responsabilidade civil transforma a seguradora, enquanto obrigada ao pagamento do quantum indemnizatório, em titular da relação material controvertida, com um interesse principal.
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Em face do exposto, salvo o devido respeito, o Tribunal a quo ao decidir do modo como decidiu, violou as normas legais previstas nos artigos 32º, 316º e 317º do Código de Processo Civil.
Termina entendendo dever ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se o douto despacho proferido, e determinando-se a sua substituição por outro que admita a intervenção principal provocada da seguradora Y – Sucursal em Portugal.
*Não foi apresentada resposta.
*D) Foram colhidos os vistos legais.
E) A questão a decidir no recurso é a de saber se deverá ser admitida a intervenção principal provocada da chamada ou se a sua intervenção deverá ser acessória, tal como decidiu o tribunal a quo.
*II. FUNDAMENTAÇÃO
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Os factos a atender são os que constam do relatório que antecede.
*B) O objeto dos recursos é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, não podendo o tribunal conhecer de outras questões, que não tenham sido suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o...
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