Acórdão nº 951/19.9YIPRT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 29 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelMARIA CRISTINA CERDEIRA
Data da Resolução29 de Outubro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO P. S., Unipessoal Lda.

instaurou procedimento de injunção contra M. M.

, pedindo a condenação desta no pagamento da quantia total de € 5.753,81, sendo € 5.504,03 a título de capital, acrescido de juros de mora vencidos entre 18/04/2018 e 18/12/2018 no montante de € 147,78 e de € 102,00 de taxa de justiça paga.

Alega, em síntese, que prestou à requerida determinados serviços de electricidade e pichelaria para o restauro da sua habitação, em conformidade com os orçamentos dados pela requerente, conforme valor constante da factura nº. 18/14, no montante de € 11.664,03.

A requerida apenas efectuou o pagamento de € 6.160,00 para abatimento da quantia acima referida, pelo que está em dívida o montante de € 5.504,03 que a requerida não pagou, apesar da factura se encontrar vencida e das diversas interpelações da requerente.

A requerida deduziu oposição nos seguintes termos: - a única factura que a requerente entregou à requerida é a factura nº. 18/13, datada de 10/04/2018, referente a painéis solares, não lhe tendo sido entregue mais nenhuma factura, nem nunca foi interpelada para efectuar qualquer pagamento em dívida; - há cerca de 12 anos, a requerida solicitou a um picheleiro um orçamento para a realização na casa que, na altura, estava em construção, de todos os trabalhos de pichelaria e de electricista, tendo sido celebrado com aquele um contrato verbal de empreitada no valor de cerca de € 10.000,00; - durante a execução dos trabalhos, o referido picheleiro decidiu emigrar, e dado terem ficado alguns trabalhos por concluir, era necessário arranjar um outro picheleiro; - a requerida e o seu marido falaram, então, com o sócio-gerente da requerente, que já conheciam há mais de 20 anos e com o qual tinham uma relação de amizade, no sentido de saber se estaria interessado em realizar os trabalhos em falta e face à sua aceitação, solicitaram-lhe um orçamento; - todavia, o sócio-gerente da requerente argumentou que não o podia fazer por desconhecer o estado em que se encontrava a obra em termos de pichelaria e de electricidade, tendo, por isso, sido acordado que o pagamento seria efectuado em função do número de horas realizadas; - após mencionar os trabalhos que já estavam realizados na obra e os que faltavam realizar, excepcionou o pagamento da quantia total de € 6.660,00 para pagamento dos trabalhos, para além dos € 3.600,00 entregues para os painéis solares, afirmando, por isso, nada dever à requerente; - enunciou, ainda, os trabalhos que foram mal executados e aqueles que não foram sequer executados.

Mais alega que a requerente litiga de má-fé, por saber que a requerida nada lhe deve, que não executou trabalhos nem comprou material correspondentes ao valor alegadamente indicado na factura mencionada no requerimento de injunção, que nunca entregou a referida factura à requerida, que o marido da requerida lhe pediu inúmeras vezes as facturas de todos os montantes pagos e que nunca entregou e que todo o material foi comprado pela requerida.

Conclui, pugnando pela improcedência da acção e sua absolvição do pedido, pedindo, ainda, a condenação da requerente por litigância de má fé, em multa e numa indemnização a seu favor não inferior a € 2.500,00.

Distribuídos os autos como acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato, a Autora veio responder à matéria da excepção, alegando, quanto ao pagamento, ser verdade o afirmado pela Ré, correspondendo o valor peticionado nos autos à quantia que não foi paga relativamente à factura indicada, que já teve em consideração os pagamentos alegados pela Ré e por si aceites, refutando, ainda, o pedido de condenação por litigância de má-fé.

Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, com observância do legal formalismo, nomeadamente com indicação e produção de prova testemunhal, documental e declarações de parte.

Após, foi proferida sentença que decidiu: - julgar a presente ação parcialmente procedente e, em consequência, condenar a ré a pagar à autora a quantia que vier a apurar-se em incidente de liquidação, correspondente ao preço da obra executada por esta e ainda em dívida, que eventualmente exceda aquela quantia de € 6.660,00 (seis mil seiscentos e sessenta euros) e até ao limite máximo do capital de € 9.482,95 (nove mil quatrocentos e oitenta e dois euros e noventa e cinco cêntimos) (acrescido de IVA), acrescida de juros, vencidos desde a citação, à taxa de 4%, até efetivo e integral pagamento; - julgar o pedido de condenação por litigância de má fé da autora improcedente.

Custas pela autora e ré, em partes iguais, por não estar liquidada ainda a quantia em dívida – artigos 527º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil.

Inconformada com tal decisão, a Ré dela interpôs recurso, extraindo das respectivas alegações as seguintes conclusões [transcrição]: 1.

Na sentença recorrida, a acção foi julgada parcialmente procedente e, em consequência disso, foi a recorrente condenada “a pagar à autora a quantia que vier a apurar-se em incidente de liquidação, correspondente ao preço da obra executada por esta e ainda em dívida, que eventualmente exceda aquela quantia de € 6.660,00 (seis mil seiscentos e sessenta euros) e até ao limite máximo do capital de € 9.482,95 (nove mil quatrocentos e oitenta e dois euros e noventa e cinco cêntimos) (acrescido de IVA), acrescida de juros, vencidos desde a citação, à taxa de 4% até efectivo e integral pagamento” tendo ainda condenado em “custas pelas autora e ré, em partes iguais, por não estar liquidada ainda a quantia em dívida – artigos 527º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil”; 2.

Discordamos da sentença recorrida por considerar que a mesma deveria ter sido julgada totalmente improcedente; 3.

A alínea d) nº 8 da Lei nº 24/96 de 31 de Julho estabelece que “o fornecedor de bens ou prestador de serviços deve, tanto nas negociações como na celebração de um contrato, informar de forma, clara, objetiva e adequada, o consumidor, nomeadamente, sobre as características, composição e preço do bem ou serviço, bem como sobre o período de vigência do contrato, garantias, prazos de entrega e assistência após o negócio jurídico”; 4.

Prevê o nº 1 do artigo 227 do Cód. Civil que “quem negoceia com outrem para conclusão de um contrato deve, tanto nos preliminares como na formação dele, proceder segundo as regras da boa fé, sob pena de responder pelos danos que culposamente causar à outra parte”; 5.

Neste caso concreto, estamos perante um contrato de empreitada de consumo; 6.

Devendo, por isso, aplicar-se a Lei de Defesa do Consumidor; 7.

Os factos provados nº 1 e 2 demonstram o preenchimento dos requisitos necessários para a qualificação do contrato aqui em apreço, de empreitada de consumo; 8.

A recorrida foi contratada, na qualidade de profissional de uma actividade económica lucrativa, pela recorrente, para a realização de uma obra, mediante um preço, na casa de habitação desta; 9.

Não há qualquer dúvida que estamos perante um prestador de serviço profissional e um consumidor abrangido pelo direito do consumo e pela Lei nº 24/96 de 31 de Julho; 10.

Sendo a recorrente, consumidora, deverá presumir-se que se encontra numa posição de inferioridade, carente de protecção, perante o profissional informado. O ónus de prova recaía por isso sobre a recorrida, profissional devidamente informada; 11.

Cabendo assim, a esta provar que cumpriu o dever de informação previsto no referido artigo 8 da Lei de Defesa do Consumidor; 12.

O consumidor, neste caso, a recorrente, deveria ter sido devidamente esclarecida de todos os termos que fazem parte do contrato de empreitada nomeadamente, da obra, do preço, do prazo, das garantias e da assistência após o negócio; 13.

Este dever de informação não foi por isso, cumprido; 14.

Facilmente se constata haver divergência entre a recorrente e a recorrida no que concerne ao orçamento apresentado no banco ... em 10 de Abril de 2017 tendo sido este, o único orçamento entregue à recorrente uma vez que o de fls. 79 e 80 foi criado apenas e somente para ser apresentado nos presentes autos; 15.

A recorrente tomou conhecimento do mesmo, no dia em que foi junto pela recorrida; 16.

Para a recorrente, o orçamento apresentado no banco ... inclui todos os trabalhos de pichelaria e electricidade realizados e a realizar na sua casa de habitação; 17.

Para a recorrida, o documento de fls. 79 e 80 corresponde aos trabalhos que faltavam fazer; 18.

Nesse mesmo dia, a recorrente juntou aos autos, a proposta que foi, efectivamente, entregue no banco ... em 10 de Abril de 2017; 19.

Documento este que não obstante ser semelhante ao de fls. 79 e 80 não se trata, porém, do mesmo documento; 20.

A proposta junta aos autos a fls. 79 e 80 nunca foi entregue à recorrente; 21.

Não pode ser valorado um documento que não corresponde ao que foi entregue à recorrente; 22.

Entendemos que não pode ser valorizado o documento de fls. 79 e 80 por não corresponder ao orçamento que foi entregue pela recorrida à recorrente destinado ao Banco ...; 23.

Nem este corresponde aos trabalhos que faltavam fazer aquando da contratação da recorrida; 24.

Deve considerar-se facto provado que: 3. Como parte dos trabalhos da arte de instalação elétrica e de pichelaria na referida casa já haviam sido começados por outrem, autora e ré acordaram que ficaria a cargo da autora a conclusão de tais trabalhos; 4. No âmbito do acordo referido, a autora, entre maio de 2017 e março de 2018, não realizou na obra da ré, os seguintes trabalhos: a) Colocação de todas as tomadas elétricas em todos os compartimentos da casa; b) Colocação de todos os disjuntores; c) Ligação dos dois quadros elétricos, do ATI e das tomadas de telecomunicações; d) Ligação da banheira; e) Passagem dos fios da aspiração central; f) Passagem de fios nas paredes exteriores; g) Colocação dos espelhos dos autoclismos; h) Colocação de silicone nas louças sanitárias; i) Colocação das tampas das...

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