Acórdão nº 1195/13.9TBEPS.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 23 de Janeiro de 2020
Magistrado Responsável | RAMOS LOPES |
Data da Resolução | 23 de Janeiro de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães(1) RELATÓRIO Apelantes (réus): A. R. e mulher, R. M..
Apelados (autores): A. C. e mulher, M. J.
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Juízo de competência genérica de Esposende (lugar de provimento de Juiz 2) – T. J. da Comarca de Braga.
*Intentaram os autores (em 24 de Outubro de 2013) a presente acção comum alegando ter adquirido (com recurso a crédito hipotecário) em 30/12/2010 aos réus, que se dedicam à edificação e comercialização de imóveis, prédio urbano (moradia) que identificam, o qual vem revelando defeitos que elencam e que impedem a utilização para o fim a que se destina (a habitação), não visíveis na data da celebração do contrato de compra e venda. Continuam alegando ter denunciado tais defeitos e exigido a sua eliminação, tendo o réu verificado a respectiva existência e reconhecido a responsabilidade, procedendo a algumas reparações, insuficientes para a sua completa eliminação, vinculando-se a repará-los e eliminá-los todos e a reparar os danos, o que não fez. Alegam, por fim, ter sofrido, em consequência, outros danos (designadamente incómodos e desconforto) resultantes dos alegados defeitos da moradia, os quais se manterão até completa eliminação destes.
Com tais fundamentos peticionaram a condenação dos réus a reparar e eliminar todos os defeitos de construção de que enferma o imóvel e a nele efectuar todas as obras necessárias à sua total irradicação ou supressão, bem como a ressarci-los de todos os danos que constituem a consequência adequada da existência dos defeitos no mesmo imóvel, sejam de natureza patrimonial ou não patrimonial, e, assim pagarem-lhes a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença.
Contestaram os réus por impugnação e por excepção – impugnaram a existência dos invocados defeitos ou desconformidades, os quais, alegam, a existir já se verificavam no imóvel à data da compra e venda, tendo os autores aceitado o imóvel no estado em que se encontrava após o inspeccionarem; impugnaram também qualquer denúncia dos defeitos e bem assim o reconhecimento deles pelo réu marido (assim como a assumpção de responsabilidade pela respectiva reparação). Por excepção invocaram a caducidade da propositura da acção, alegando mostrar-se ultrapassado o prazo estabelecido no art. 917º do CC, alegando não ter efectuada a construção da moradia objecto dos autos em vista da sua comercialização.
Cumprido o contraditório quanto à invocada matéria de excepção (tendo os autores alegado que os réus se dedicam à edificação e comercialização de imóveis, tendo edificado e construído todas as moradias existentes na zona, sendo que ademais reconheceram a existência dos defeitos e se comprometeram a repará-los, constituindo o invocado por eles abuso de direito), foi proferido saneador, identificado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova.
Em Abril de 2016 apresentaram os autores articulado superveniente, liminarmente admitido após cumprido o contraditório, alegando defeitos entretanto surgidos.
Efectuada a prova pericial requerida e realizado o julgamento (no decurso do qual foi realizada inspecção judicial) foi proferida sentença que julgou procedente a acção e condenou os réus: - a reparar e eliminar todos os defeitos de construção de que enferma o imóvel e que resultaram provados e bem assim a nele efectuar todas as obras necessárias à sua total erradicação ou supressão, - a ressarcir os autores de todos os danos que constituem a consequência adequada da existência dos defeitos no mesmo imóvel, sejam de natureza patrimonial ou não patrimonial e assim, pagarem-lhe a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença.
Irresignados, apelam os réus, terminando as suas alegações formulando as seguintes conclusões: a- Os factos que impõem decisão diversa da recorrida são os constantes dos pontos 4°), 5°), 6°), 7°), 8°), 9°), 10°), 11°), 12°), 13°), 14°), 15°), 16°), 17°), 18°), 19°), 20°), 21°), 22°), 23°), 24°), 25°) e 41°) dos factos provados, e do ponto d) dos factos não provados.
b- Os meios de prova que impunham decisão diversa da recorrida são a prova pericial, a prova documental, a prova por inspecção, os depoimentos de parte de ambos os AA. e o depoimento das testemunhas B. R., P. M., Arq. C. R., Eng. A. F. e J. C..
c- Ficou suficientemente provado que o negócio a que alude o ponto 2°) dos factos provados não foi celebrado pelos RR. no âmbito da actividade exercida pelo 1 ° R. marido.
d- A A. mulher referiu claramente que aquando do negócio o R. marido lhe havia dito que a casa havia sido construída para ele.
e- Tal afirmação foi corroborada pelas testemunhas B. R., P. M., Arq. C. R., Eng. A. F. e J. C..
f- É referido na motivação da fundamentação de facto que a testemunha J. C. afirmou que na ficha técnica de habitação consta o nome da sua empresa porque o R. marido não tinha alvará, quando na realidade o que a testemunha disse é que a sua empresa não tinha alvará que por essa razão consta da ficha técnica de habitação outra empresa, que não a dele.
g- O R. marido não construiu aquela habitação com o objectivo de a vender, mas sim com a finalidade de a ter para si e de nela habitar.
h- o ponto 4°) dos factos provados deveria ter a seguinte redacção: - Pese embora o R. marido se dedique à edificação e comercialização de moradias e edifícios, a casa de dois pavimentos descrita em 1°) não foi construída e vendida no âmbito dessa actividade.
i- O relatório pericial contraria alguns factos julgados provados pelo Tribunal a quo.
j- Nos pontos 6°), 12°), 14°), 16°), 21º) e 22°) dos factos provados, o Tribunal a quo dá como provada a existência de defeitos que a perícia realizada nos autos nega claramente.
k- O Tribunal a quo na motivação da decisão de facto não justifica as razões pelas quais deu como provada a existência de defeitos que o perito considerou não se verificarem.
l- Nos pontos 7°), 8°), 10°), 13°), 14°), 15°), 17°), 19°) e 20°) dos factos provados o Tribunal a quo não respeitou integralmente os resultados da perícia realizada nos autos.
m- O Tribunal a quo foi muito além do constatado em sede de perícia.
n- O auto de inspecção ao local nada acrescenta em relação à perícia e as testemunhas Eng. A. M. e C. A. foram ambas contratadas pelos AA., pelo que, sem pôr em causa a sua isenção, não existem razões para que os seus depoimentos prevaleçam sobre a prova pericial.
o- Conforme resulta do depoimento de parte dos AA. e do depoimento da testemunha B. R., os AA., antes de formalizarem o negócio inspeccionaram a moradia, tendo ido lá por duas vezes e tendo circulado por onde entenderam, quer pelo interior, quer pelo exterior.
p- Relativamente ao muro a norte descrito no ponto 25°) dos factos provados, o A. marido declarou no seu depoimento de parte que, quando foi ver a casa, reparou que o mesmo já estava um bocadinho inclinado, mas como gostou tanto da casa deixou passar.
q- Tal anomalia, aquando da celebração do negócio, era assim perfeitamente visível.
r- As desconformidades elencadas nos pontos 6°), 11°), 14°), 18°), 22°) e 23°) dos factos provados, tinham, pela sua natureza, que ser visíveis aquando da venda, não se tratando de patologias apenas verificáveis com o decurso do tempo.
s- Trata-se de situações que revelam trabalhos incompletos ou inacabados, aplicação errada ou não aplicação de materiais, ou seja, factos que naturalmente existiam aquando da venda da casa.
t- Atenta a sua natureza, tratam-se de desconformidades facilmente detectáveis.
u- Tendo os AA. inspeccionado a moradia, como resulta da prova produzida, é de todo impossível que os mesmos não tenham visto tais desconformidades.
v- O teor do ponto 41º) dos factos provados encontra-se em contradição com o vertido no ponto a) dos factos não provados.
w- Tal contradição deve ser sanada a favor do teor do ponto a) dos factos não provados, dado ter sido realizada perícia ao betão e o respectivo relatório, junto aos autos, não apontar qualquer deficiência no betão x- Face aos concretos meios probatórios acabados de enunciar, os concretos pontos de facto enunciados em A), ao serem considerados provados, e o concreto ponto de facto enunciado em B), ao ser considerado não provado, consubstanciam um julgamento incorrecto e um claro erro da apreciação da prova.
y- A não correspondência entre a prova invocada pelo Tribunal e a decisão sobre a matéria de facto que sobre ela assentou traduz uma violação e uma interpretação inconstitucional do preceituado no artigo 607°, n° 3 do Código de Processo Civil e viola o artigo 205° da Constituição da República Portuguesa.
z- Deveriam considerar-se não provados os factos constantes dos pontos 4°), 5°), 6°), 7°), 8°), 9°), 10°), 11°), 12°), 13°), 14°), 15°), 16°), 17°), 18°), 19°), 20°), 21°), 22°), 23°), 24°), 25°) e 41°) dos factos provados, e provado o facto constante do ponto d) dos factos não provados.
aa) - De acordo com o disposto nos artigos 1°-A e 1°-B, alíneas a) e c) do D.L. n.º 67/2003, de 8 de Abril, para que seja aplicável este diploma não basta que o vendedor exerça uma actividade profissional, sendo ainda necessário que o contrato de compra e venda seja realizado no âmbito dessa mesma actividade.
ab- Do elenco dos factos provados consta apenas a menção à actividade profissional do R. marido, nada sendo dito quanto à qualidade em que o mesmo interveio no negócio celebrado com os AA..
ac- Ficou suficientemente demonstrado que a habitação em causa não foi edificada pelo R. marido com vista a ser comercializada, ou seja não foi construída e vendida no âmbito da sua actividade profissional.
ad- Ao contrato de compra e venda objecto dos autos não é aplicável o D.L. n.º 67/2003, de 8 de Abril.
ae- À pretensão dos AA. aplica-se sim o regime da venda de coisas defeituosas, previsto nos artigos 913º e seguintes do Código Civil.
af- Nos termos do artigo 917º do Código Civil, a acção destinada a fazer valer os direitos do comprador deve ser instaurada no prazo de 6 meses após a denúncia.
ag- Decorre da matéria de facto provada que os AA. denunciaram...
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