Acórdão nº 2615/18.1T8VRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 30 de Janeiro de 2020

Magistrado ResponsávelRAQUEL BATISTA TAVARES
Data da Resolução30 de Janeiro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I. Relatório T. G., casada, e M. V., solteira, ambas residentes no lugar da …, Vila Real, intentaram a presente ação declarativa sob a forma de processo comum contra … – VIDA COMPANHIA DE SEGUROS, S. A., com sede na Avenida …, Lisboa, pedindo que se declare o contrato de seguro resolvido, e, em consequência, se condene a Ré a pagar às Autoras, a quantia de €75.000,00 (setenta e cinco mil euros), acrescida de juros de mora à taxa lega, contados desde a citação até integral pagamento.

Alegam para tanto e em síntese que a primeira Autora como tomadora do seguro celebrou um contrato de seguro com a Ré mediante o qual segurou a segunda Ré, sua filha, tendo sido convencionado o capital garantido em caso de morte ou invalidez absoluta e definitiva ou invalidez total e permanente da segunda autora, o montante de €75.000,00.

Que a segunda Autora sofreu, entretanto, um surto psicótico, tendo-lhe sido diagnosticada esquizofrenia paranóide, e tendo-lhe sido deferida a pensão de invalidez, pelo Centro Nacional de Pensões, com início em 9 de abril de 2008.

Mais alegam que o processo de pensão de invalidez da segunda Autora foi remetido para a Ré, com o pedido de acionamento da cobertura de invalidez absoluta e definitiva, mas que a Ré não deu qualquer resposta.

Regularmente citada a Ré, como, entretanto foi decidido na sequência da arguição da nulidade da citação, não apresentou contestação no prazo legal, pelo que, nos termos do disposto no artigo 567º n.º 1 do Código de Processo Civil, foram considerados confessados os factos articulados pelas Autoras.

Notificadas nos termos do nº 2 do mesmo preceito legal, as Autoras apresentaram alegações.

Foi proferido despacho que convidou as Autoras a virem completar a petição inicial, por o tribunal entender que não se mostravam alegados factos suficientes para ser proferida decisão.

As Autoras corresponderam ao convite.

A Ré veio pronunciar-se quanto aos novos factos alegados, concluindo pela improcedência da acção; veio, ainda, apresentar requerimento probatório, nomeadamente arrolando testemunhas e requerendo se proceda a prova pericial, o que não foi admitido.

Foi proferida sentença nos seguintes termos, no que concerne à parte dispositiva: “Por tudo quanto exposto fica, julgo a presente ação improcedente, por não provada e, consequentemente, absolvo a ré do pedido.

Custas a cargo das autoras.

Registe e notifique”.

Inconformadas, apelaram as Autoras da sentença concluindo as suas alegações da seguinte forma: “CONCLUSÕES 1.º Vem o presente recurso interposto da douta sentença de 1ª instância e o mesmo apresentado na firme convicção de que o despacho de 15/05/2019, que ordenou o aperfeiçoamento da petição, bem como a decisão proferida por sentença violaram o disposto no artigo 567.º n.º 1 e n.º 2, do CPC, bem como uma incorreta aplicação do Direito aos factos dados como confessados, por falta de contestação da Ré.

  1. As ora Apelantes entendem que o Tribunal a quo fez uma incorreta aplicação do Direito aos factos articulados que foram dados confessados por falta de contestação da Ré (despacho de 19/02/2019, notificada às partes em 21/02/2019).

  2. Relativamente: e) Aos efeitos da revelia, por falta de contestação da Ré, regularmente citada para o efeito, e suas consequências legais; f) A incorreta aplicação e interpretação do regime geral das cláusulas contratuais, mormente, as gerais e especiais reguladas no Decreto-Lei nº 446/85, de 25/10, alterado pelos Decretos-Lei nºs 220/95, de 31-08 e 249/99, de 07 de julho.

    1. A invalidez absoluta da Autora M. V., que lhe foi reconhecida pela Segurança Social.

    2. A falta de comunicação por parte da Ré às Autores, do teor das condições gerais e especiais da apólice.

  3. O despacho proferido em 19/02/2019,considera os factos confessados, articulados pelas Autoras, fez referência ao n.º 2, do artigo 567.º, para alegações das partes.

  4. A Ré notificada do supra referido despacho, em 20/02/2019, para alegar nos termos do nº 2, daquele preceito, conforme evidenciam os autos, apresentou contestação dissimulada nas alegações, apenas em 20/03/2019, concluindo-se de forma inequívoca a extemporaneidade das alegações, uma vez que, há muito tempo havia decorrido o prazo legal de 10 dias, para a sua apresentação, ainda que acrescida do prazo de multa do artigo 139.º n.º 5 do CPC.

  5. Ou seja, verifica-se que a Ré tentou aproveitar o mecanismo previsto no artigo 567.º nº 2, para apresentar contestação que não havia apresentado.

  6. Para além de ser absolutamente inadmissível, configura, por isso, uma ocorrência anómala da normal tramitação da lide.

  7. Pelo que, se deverá considerar como não escrita tal alegação, e ser desentranhada por extemporânea.

  8. Todavia, dever-se-ia ter dado êxito total às Autoras, porque o pedido é sustentável, e por muitas alegações que existam contrariando os factos peticionados, não foi apresentada contestação, logo a sentença deveria ser sempre de condenação da Ré, a menos que as Autoras venham pedir um direito impossível (caducidade do direito), o que no caso em apreço não se verifica.

  9. O Tribunal a quo considerou e tratou as alegações da Ré, apresentadas fora de prazo, como uma autêntica contestação.

  10. Preceitua o artigo 567.º n.º 2, o que: “O processo é facultado para exame pelo prazo de 10 dias, primeiro ao advogado do autor e depois ao advogado do réu, para alegarem por escrito, e em seguida é proferida sentença, julgando o caso conforme de direito.” (sublinhado nosso).

  11. Ora, com o devido respeito por opinião contrária, o processo termina após a alegação das Autoras e da Ré, sendo de seguida proferida sentença.

  12. O Tribunal a quo ignorou tal preceito, fazendo “tabua rasa” do mesmo, e por despacho datado de 23/04/2019, notificou as Autoras para no prazo de 10 dias, se pronunciar quanto à nulidade da citação invocada pela Ré, que diga-se em abono da verdade, em articulado de alegações da Ré apresentado fora de prazo, ainda que com multa.

  13. No dia 09/05/2019, as Autoras deduziram oposição ao requerido pela Ré, e consequentemente, requereram o respetivo indeferimento.

  14. Por despacho datado de 15/05/2019, o Tribunal a quo, considerou que, não tinha ocorrido a falta ou irregularidade da citação e julgou improcedente a alegada irregularidade da citação.

  15. Ainda no referido despacho, parte final, o Tribunal a quo convidou as Autoras para no prazo de 10 dias, completar o seu articulado.

  16. As Apelantes ficaram muito surpreendidas, com tal despacho, uma vez que os efeitos da revelia plasmados no artigo 567.º do CPC, terminam com o processo após as alegações se forem apresentadas.

  17. Atento o exposto, pode-se inferir daqui que os referidos despachos consideraram e trataram as alegações da Ré (que diga-se em abono da verdade, fora de prazo), como uma autêntica contestação.

  18. Conforme resulta do artigo 567.º do CPC, uma vez notificadas as partes para querendo, no prazo de 10 dias, examinar o processo e apresentar alegações escritas, de seguida é proferida sentença, julgando a causa conforme for de direito (sublinhado nosso).

  19. Assim, na presente ação, em relação à qual a Ré não apresentou qualquer contestação, inexiste quaisquer razões para que o tribunal, não valorize os documentos devidamente assinados pelas Autores (proposta, cláusulas da apólice e as designadas CONDIÇOES PARTICULARES), isto é, aquelas que as partes acordam e estabeleceram direta e pessoalmente, e em segundo lugar as designadas “ CONDIÇÕES GERAIS E ESPECIAIS” aplicáveis e não excluídas pelas partes, que constituem as cláusulas genéricas deste tipo de seguro.

  20. No caso em apreço, a sentença em crise, na parte final, transcreveu na íntegra o ponto 4.1, das Condições Especiais dos Seguros Complementares, sugeridas pela Ré nas suas alegações (apresentadas fora do prazo).

  21. Ora, antes de mais, e sempre com o máximo respeito por diverso entendimento, importa analisar o ponto 4, das CONDIÇÕES ESPECIAIS que infra se transcreve: 23.º “ Se o segurado vier a invalidar-se absoluta e definitivamente em consequência de acidente ou doença não referida no ponto 5, a seguradora garante a antecipação de 100% do capital garantido pelo seguro principal, cessando automaticamente o contrato.” 24.º Este parágrafo termina com um ponto final, logo esta cláusula não faz depender de qualquer percentagem para fazer funcionar as coberturas contratadas.

  22. O que equivale por dizer que o ponto 4.1, transcrito na sentença em crise, é apenas uma definição da INVALIDEZ ABSOLUTA E DEFINITIVA, conforme a epígrafe do próprio número 4.1.

  23. A sentença em crise pôs em causa o grau de incapacidade igual ou superior a 85% da 2ª Autora M. V..

  24. Neste conspecto, as Autoras alegaram e provaram as condições do contrato de Seguro, Universal Vida, juntando à petição inicial o Doc.1, cuja proposta e “CONDIÇÕES PARTICULARES” são atendidas em primeiro lugar, e tais condições particulares não fazem referência a qualquer grau, e foi nessa perspetiva que as Autoras acordaram com a Ré.

  25. Assim, cabe, aqui, analisar a questão da invalidez da 2ª Autora M. V., uma vez que a Ré questionou, por desconhecimento, que se verifique a situação que dá lugar à sua responsabilidade, por força do contrato de seguro em causa.

  26. Ora, não há dúvidas de que foi deferida à 2ª Autora M. V., pelo Instituto da Segurança Social, Centro Nacional de Pensões, a pensão de INVALIDEZ ABSOLUTA, com início em 09/04/2008, e embora tal documento junto à petição inicial, sob a designação de Doc. 4, não resulte qual o grau de incapacidade da 2ª Autora M. V., o mesmo está subentendido, já que lhe foi atribuída a INVALIDEZ ABSOLUTA, o que não acontece se a mesma não sofresse um grau de incapacidade superior a 85%, uma vez que a M. V., está reformada por invalidez absoluta.

  27. Provada está, assim, a situação de invalidez da Autora M. V., a qual por força do dito contrato de seguro (condições particulares), determina o pagamento pela Ré da quantia peticionada, a qual, contudo, deverá ser paga apenas à 2ªAutora...

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