Acórdão nº 94/17.0T8VCT-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Março de 2020

Magistrado ResponsávelJOSÉ FLORES
Data da Resolução19 de Março de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Recorrente(s): A. S.; Recorrido(s): A. C. e J. L..

* 1. RELATÓRIO L. R.

, representada por R. T.

, desencadeou contra a aqui Recorrente providência cautelar de arrolamento relativamente aos bens móveis e imóveis discriminados no seu requerimento inicial.

Após produção da prova, foi proferida a decisão que deferiu parcialmente o presente procedimento cautelar e, em consequência decretou em 9.12.2016 o arrolamento de determinados bens móveis e imóveis referenciados no seu dispositivo de fls. 109.

Inconformada com a decisão que ordenou o arrolamento dos bens imóveis, móveis e contas bancárias identificadas na decisão respectiva, veio a Recorrente/Requerida, deduzir a sua oposição.

Invoca, em síntese, que a procuração notarial mediante a qual a Requerente conferiu poderes ao Dr. R. T. para instaurar o presente procedimento cautelar padece de grave vício que inquina a sua validade, em virtude da mandante no momento da sua outorga se encontrar incapacitada de entender e querer, pelo que a referida procuração de 1.9.2016, referida no item 29. do requerimento inicial da providência, é falsa, o que arguiu nos termos do art. 372º, do Código Civil, não tendo o Dr. R. T. poderes, para, em representação da Requerente, vir propor o presente procedimento cautelar, nem para constituir mandatário.

No mais, impugna os factos alegados na petição inicial.

Essa oposição foi notificada à Autora com registo de 14.3.2017, que nada disse, nomeadamente para os efeitos do art. 447º, do Código de Processo Civil.

Entretanto, a Autora faleceu em -.2.2018.

Após requerimento incidental de 17.7.2018, foi proferida em 9.10.2018 decisão que declarou habilitados para prosseguir os presentes autos na qualidade de sucessores da Autora L. R., a sua filha A. C. e o seu sobrinho J. L. (cf. apenso C).

Procedeu-se a produção de prova, após o que foi proferida sentença de 22.9.2019, que julgou improcedente a oposição deduzida e manteve a providência decretada.

Inconformada com essa decisão, a Recorrente acima identificada apresentou recurso da mesma, que culmina com as seguintes conclusões.

  1. Considerando a prova documental, referida em alegações, e a prova testemunhas produzida em audiência de discussão e julgamento, identificada em alegações, sempre deveria a MM Juiz a quo ter dado por provados os seguintes factos: a. A. C., S. B. e R. T. fizeram imputar à Requerente na procuração identificada na alínea b) dos factos provados, incapacidade de assinar que não tinha e declarações que não proferiu, com o intuito declarado de destruir os poderes que esta conferiu à requerida pelas procurações que outorgou a seu favor no Brasil em 27/02/2003 e 05/05/2015, bem como os poderes que lhe conferiu em 12/07/2000, através de procuração outorgada em Portugal.

    1. A referida L. R. nunca manifestou, nem mesmo no dia 01/09/2016 vontade de constituir seus procuradores A. C., S. B. e R. T.: c. A Requerente não indigitou E. J. nem nunca manifestou qualquer vontade para que assinasse por ela a referida procuração.

    2. A Requerente não interveio pessoalmente na procuração emitida a favor de S. B. e R. T. em 23 de Maio de 2016.

  2. Em face dos factos a considerar provados, é inelutável concluir que na procuração em questão foram atestados factos que não foram objecto da percepção do oficial público que a autenticou, designadamente, a alegada incapacidade da D. L. R. em assinar e o alegado pedido desta a E. J. para que assinasse por si, a rogo, o referido instrumento notarial; 3. A conclusão vertida no antecedente número 2, decorre das declarações do próprio Tabelião que autenticou a procuração e do Rogado que nela interveio; 4. Encontra-se, assim, a procuração ferida de falsidade, nos termos e com os efeitos do artigo 372º do CC, falsidade que se arguiu e argui; 5. Ainda que assim não fosse, e sem prescindir, decorre da prova produzida, que a D. L. R., à data da realização do instrumento notarial em crise, padecia de Parkinson, Alzheimer e demência e encontrava-se, por isso, num estado de diminuição das suas capacidades mentais, que a impossibilitavam de entender e querer o vertido na procuração em causa, intercalado com raros períodos de consciência.

  3. Ora, sendo o estado “normal” da D. L. R., o de confusão mental, sempre incumbiria aos Recorridos a prova de que, na data da outorga da procuração, a mesma estava num período de consciência, prova que não lograram, tanto mais que a testemunha E. J., declarou que, nesse dia, a sua alegada rogante se encontrava num estado de prostração, decorrente de doença.

  4. Assim, ainda que o instrumento notarial em questão não estivesse ferido de falsidade, sempre a declaração de vontade ínsita no documento não corresponde a qualquer manifestação de vontade da alegada declarante, não produzindo, por isso, qualquer efeito.

  5. Não produzindo a procuração em questão qualquer efeito, seja por ser falsa, seja por se não poder imputar à D. L. R. as declarações nela vertidas, por manifesto vício da vontade, nos termos do artigo 246º do CC, é ilegítima a intervenção do Dr. R. T. nestes autos de providência cautelar (e nos autos principais), dado que intervém, assim, sem poderes de representação da D. L. R..

  6. Decretada a ilegitimidade do Dr. R. T. nos presentes autos, sempre tal facto precludirá tudo o tramitado, designadamente a posterior habilitação, por morte da D. L. R., que não sana o vício originário dos presentes autos.

    A Recorrida não apresentou alegações.

    Entretanto foi proferida decisão incidental em que se considerou existir uma excepção inominada, com efeitos similares aos da falta de representação de incapazes, à irregularidade da representação, à falta, insuficiência ou irregularidade do mandato judicial por parte do mandatário que propôs a acção (cf. arts. 278º, nº 1, als. e), 577º, al. c) e h), do C.P.C.).

    Decidiu-se então (cf. despacho de 31.1.2020) convidar os habilitados na posição da Requerente L. R., a parte relativamente à qual existiria tal falta, a expressarem nos autos, no prazo de 10 dias, a sua vontade de ratificarem os actos praticados anteriormente à sua directa intervenção nessa qualidade, ou seja, a intervenção dessa Requerente enquanto alegadamente representada pelo referido R. T., sob pena de se absolver a Requerida da instância providência em curso.

    Em 14.2.2020, A. S. veio aos autos ratificar o processado anterior à sua intervenção nos autos, protestando juntar declaração do outro habilitado e pedindo prorrogação de prazo.

    Em 16.2.2020, este outro habilitado, J. L., juntou procuração nos autos e veio declarar que não ratifica os actos praticados anteriormente a sua directa intervenção nos autos. Mais considera que existe litisconsórcio necessário nessa ratificação e, portanto, a Requerida deve ser absolvida da instância.

    Em 18.2.2020, reagindo a esta posição, a habilitada A. S. veio requerer a suspensão da instância tendo em vista a obtenção de suprimento de consentimento do habilitado em causa para essa ratificação, por via do processo especial do art. 1000º do Código de Processo Civil...

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