Acórdão nº 3617/19.8T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelVERA SOTTOMAYOR
Data da Resolução21 de Maio de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães.

I – Relatório: Na sequência de acção inspectiva levado a cabo pela Autoridade para as Condições do Trabalho, no âmbito da qual se deparou com indícios de utilização indevida do contrato de prestação de serviço por parte da ASSOCIAÇÃO EMPRESARIAL DE X, Y E W, relativamente a C. C., deu entrada no Tribunal da Comarca de Braga, Juízo do Trabalho de Guimarães, a respectiva participação.

Após o recebimento de tal participação, o MINISTÉRIO PÚBLICO intentou a presente ação especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho, nos termos previstos no art.º 186.º-K, n.º 1 do CPT, contra ASSOCIAÇÃO EMPRESARIAL DE X, Y E W pedindo que se declare e reconheça como de trabalho subordinado, o contrato celebrado a 24 de Setembro de 2007 e ainda vigente, com C. C..

*Citada a Ré apresentou contestação defendendo-se por excepção (invoca a impossibilidade originária da lide, a falta de interesse em agir do Ministério Público, o uso inadequado da forma de processo, a ilegitimidade do Ministério Público e a nulidade de actos praticados pelo Ministério Público) e por impugnação, alegando em resumo, que atualmente a C. C. mantêm consigo um contrato de trabalho subordinado, sendo certo que até 31 de Dezembro de 2018, a relação contratual que manteve com aquela não tinha a natureza de trabalho subordinado, mas sim de prestação de serviços, como atestam os respectivos contratos celebrados.

O Ministério Público veio responder à matéria das excepções e nulidade invocadas pela ré, concluindo pela sua improcedência.

*Notificada a C. C. de que poderia aderir ao articulado apresentado pelo Ministério Público, apresentar articulado próprio e constituir advogado, nada veio dizer.

*Procedeu-se à realização de audiência de julgamento e por fim foi proferida sentença da qual consta o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, julgo a presente acção provada e procedente nos termos sobreditos e, em consequência: Condeno a ré, “Associação Empresarial de X, Y e W”, a reconhecer a existência de contrato de trabalho com início desde 24 de Setembro de 2007 em diante, relativamente à trabalhadora C. C.

.

Custas a cargo da ré, tendo a acção o valor de € 30.000,01.

Notifique e faça menção no registo informático.

Oportunamente, comunique à ACT e ao Instituto da Segurança Social, I.P. nos termos e para os efeitos previstos no art. 186º-O, nº 9, do C.P.T. e do art. 15º-A, nº 4, da Lei nº 107/2009, de 14-9.

Oportunamente, dê conhecimento à trabalhadora sobre o disposto no art. 186º-R do C.P.T. em conjugação com o art. 7º, al. a), do mesmo diploma.

D.n.” Comunique à A.C.T. (Autoridade Para as Condições do Trabalho).

Registe e notifique.”*Inconformada com a decisão dela veio a Ré “ASSOCIAÇÃO EMPRESARIAL DE X, Y E W “ interpor recurso de apelação, pugnando pela revogação da decisão recorrida.

O recurso foi admitido com o modo de subida e efeitos próprios.

Nas alegações apresentadas foram formuladas as seguintes conclusões: “INTRÓITO I. Por participação que deu entrada no Juízo de Trabalho de Guimarães, Tribunal da Comarca de Braga, a ACT deu conta da alegada existência de indícios de utilização indevida do contrato de prestação de serviços por parte da Recorrente ASSOCIAÇÃO EMPRESARIAL DE X, Y E W, relativamente à formadora C. C..

  1. Como resultado, o MINISTÉRIO PÚBLICO instaurou a competente acção declarativa sob a forma de processo especial de reconhecimento da existência de Contrato de Trabalho, nos termos do disposto no art.º186.º-K,n.º1 do Código de Processo do Trabalho, peticionando a declaração de existência do contrato de trabalho relativamente à prestadora C. C. desde o “ano lectivo de 2007/2008”.

  2. Citada para, querendo, contestar, nos termos do disposto no art.º 186.º-L, n.º 2 do Código de Processo do Trabalho, a Recorrente contestou a acção, arguindo várias excepções, tais como a) inominada apelidada de impossibilidade originária da lide; b) falta de interesse em agir do Autor; c) uso inadequado do processo; d) ilegitimidade do Autor; e) nulidade dos actos praticados pelo Autor; peticionando a absolvição da instância.

  3. Além disso, alegou a Recorrente, em suma e entre outras, que a relação contratual que mantinha com a pretensa trabalhadora era de efectiva prestação de serviços, impugnando grande parte dos factos alegados e as conclusões retiradas pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, afirmando ainda que a prestadora C. C. não mantinha qualquer relação subordinada de foro laboral.

    DO ENQUADRAMENTO FACTUAL E DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO V. O presente recurso versa sobre matéria de Facto e de Direito, nos termos infra consignados, incidindo sobre a Sentença proferida na parte em que julgou a acção totalmente procedente e em que considerou improcedentes as excepções arguidas pela Recorrente, VI. Sem quebra do devido respeito, entende a Recorrente que a Sentença proferida pela Meritíssima Juiz é desajustada dos normativos legais positivos aplicáveis in casu.

  4. A principal questão a decidir-se na Sentença prendia-se com a qualificação jurídica do contrato que a prestadora C. C. celebrou com a Recorrente.

  5. A Meritíssima Juiz julgou procedente a Acção e, consequentemente, reconheceu que entre a prestadora C. C. e a Recorrente existia um contrato de trabalho “com início desde o ano lectivo de 2007/2008 em diante”.

  6. A matéria de facto dada como provada encontra-se desfasada dos depoimentos prestados em sede de Audiência de Julgamento e da prova documental carreada para os autos e cuja validade e/ou autenticidade não foi impugnada.

  7. Não pode deixar de se mencionar que ao Autor competia apresentar prova de todos os indícios plasmados no Código de Trabalho na versão aprovada pela Lei n.º 9/2006, de 20 de Março [vigente na data em que iniciou a relação jurídica entre Recorrente e C. C.], tal como será exposto infra. O que não fez, não cumprindo o ónus probatório que sobre si impendia, e que o Tribunal a quo preferiu ignorar XI. O julgamento do Tribunal a quo afigura-se, na óptica da Recorrente, profundamente errado, infundado e injusto, no que contende com a apreciação do Direito.

    DA NULIDADE DA SENTENÇA A QUO POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA XII. Segundo a al. d) do nº 1 do art.º 615.º do C.P.C., a sentença é nula “quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar (…)”.

  8. O Tribunal a quo não apreciou grande parte da factualidade descrita pela Recorrente na sua Contestação, onde constavam factos essenciais à boa e justa composição do litígio, ao apuramento da verdade material e, inerentemente, à decisão da causa.

  9. Agiu como se o contraditório exercido pela Recorrente fosse inexistente e letra-morta para a boa apreciação da causa, desconsiderando-o de forma atroz, atropelando para esse efeito os mais basilares princípios do Direito.

  10. No que tange à omissão de pronúncia invocada, e na esteira do estabelecido no n.º 2 do artigo 608.º C.P.C., o Tribunal a quo «deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação», impondo-se-lhe uma pronúncia acerca das pretensões deduzidas pelas partes que representam as controvérsias centrais que este deverá dirimir.

  11. Como bem descreve a Relação de Coimbra no seu Aresto de 15 de Outubro de 2008, «O vício processual de omissão de pronúncia reconduz-se a uma ausência de emissão de um juízo apreciativo sobre uma questão processual ou de direito material-substantivo que os sujeitos tenham, expressamente, suscitado ou posto em equação perante o tribunal e que este, em homenagem ao princípio do dever de cognoscibilidade, deva tomar conhecimento.» XVII. Tendo em conta as considerações expostas supra nas Alegações, facilmente se conclui que ocorreu nulidade por omissão de pronúncia sobre a vasta factualidade invocada e trazida aos autos pela Recorrente através da sua Contestação, tendo a decisão recorrida violado o disposto no art.º 615.º, n.º 1, al. d) CPC, impondo-se a declaração desta nulidade e a reabertura da audiência para julgamento e decisão da matéria controvertida e relevante para a boa decisão da causa.

    DA NULIDADE DE DECISÃO POR SUSPEIÇÃO XVIII. Pela Recorrente foi apresentado em 12 de Dezembro de 2019, no seio do processo 3642/19.7T8GMR, que corre termos no mesmo Juiz 2 do Juízo de Trabalho de Guimarães – Tribunal Judicial da Comarca de Guimarães, incidente de suspeição da Meritíssima Juiz a quo (cfr. Documento n.º 1).

  12. Em tal incidente, foi também suscitada a suspeição da Meritíssima Juiz a quo para os presentes autos, bem como para todos os processos nos quais existia identidade de sujeitos [Ministério Público (Autor) e Associação Empresarial de X, Y e W (Ré)], e identidade de mandatários da Ré.

  13. Estando esse incidente de suspeição a correr termos, e revestindo uma causa prejudicial à prolação de sentença final dos presentes autos, por estarem causa a independência e imparcialidade da Meritíssima Juiz a quo, foi requerido nos presentes autos pela Recorrente a suspensão da instância, nos termos e ao abrigo do artigo 272.º C.P.C. e 125.º C.P.C., enquanto não fosse proferida decisão final do incidente de suspeição arguido pela Ré e pelo seu Mandatário.

  14. Além de não ordenar a suspensão da instância, a Meritíssima Juiz a quo proferiu sentença enquanto se encontrava a decorrer o incidente da sua suspeição promovido pela Recorrente e pelo seu Mandatário, cujo resultado visaria o afastamento fundamentado dos presentes autos, atenta a falta de imparcialidade e de isenção revelada e sustentada por uma vasta factualidade já exposta junto do Tribunal da Relação.

  15. A pendência de um incidente de suspeição e a sua possível procedência à data da prolação da sentença ora em crise fragilizam a independência e imparcialidade da Meritíssima Julgadora na decisão da presente lide, minando justificadamente a confiança pública na administração da justiça.

  16. Por esse mesmo motivo é que o artigo 125.º do Código Processo Civil refere que«(…)nemo despacho saneador nem a decisão final são proferidos enquanto não estiver...

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