Acórdão nº 130145/17.5YIPRT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelMARIA DOS ANJOS NOGUEIRA
Data da Resolução14 de Maio de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I – Relatório A Autora instaurou acção declarativa sob a forma de processo comum, iniciada como injunção, pedindo a condenação da Ré no valor de € 32.287,97, sendo € 31.619,60 relativamente ao valor do capital, € 515,37 quanto a juros de mora vencidos e € 153 de taxa de justiça.

Alegou, em síntese, que no exercício da sua actividade, em 12 de Julho e 28 de Agosto de 2016 apresentou à Ré, a solicitação desta, duas propostas de prestação de serviços, uma de consultoria estratégica em processos de negócios e outra de acções e orçamento de informática, que a mesma aceitou; passou a prestar os serviços mencionados em primeiro lugar e à implementação de software “Silex”, tendo emitido e enviado onze facturas, com vencimento a 30 dias, no valor global de € 32.619,60, que a Ré recebeu, mas devolveu apenas tendo pago o montante de € 1.000 por conta de uma delas; instou-a diversas vezes, sem resultado.

*A Ré contestou contrapondo que, em Junho de 2016, solicitou à Autora uma proposta de serviços para “digitalização da empresa”, a fim de modernizar os processos de fabrico, introduzir maior automação nas linhas de produção, reduzir custos, maximizar procedimentos administrativos no fabrico e dar maior celeridade às entregas, o que era essencial para a sua actividade devido ao seu crescimento e necessidades; em Julho, a Autora apresentou uma proposta de projeto que deveria estar desenvolvido e instalado até 12 meses, a contar da data da sua adjudicação, prevendo que os desenvolvimentos seriam implementados de forma a que cada bloco de funcionalidade não demorasse mais de 8 semanas entre a concepção e a disponibilização para os utilizadores, mediante o pagamento da quantia de € 1.470/mês, acrescida de IVA, durante 12 meses, o que aceitou em 2 de Setembro seguinte; em 29 de Agosto do mesmo ano, no seguimento de um relatório, em complemento da anterior proposta, por ser essencial à sua execução, a Autora enviou um email com uma outra proposta, a executar de imediato, para implementar medidas de eliminação de erros de stock, definir política de gestão destes, com estabelecimento de datas de entrega, elaboração de planos de manutenção autónoma e preventiva, lista de pendentes, avaliação de dependências estratégicas de pessoas e máquinas, entre outros, a executar em 12 meses, com mensalidade de € 2.580 durante 18 meses.

Porém, apesar de ter pago as facturas mensais até Abril de 2017, no valor de € 33.505, o projecto para desenvolvimento de software não estava a ser implementado, apenas foi apresentado em 21 de Junho de 2017, tendo constatado que o programa “Silex” não executa os pontos referidos no “relatório do projeto de consultoria estratégica em processos de negócios”, nem na respetiva proposta, aos níveis da interface do utilizador e das funcionalidades, não apresenta possibilidades de ser utilizado sem graves danos à sua atividade, não apresenta quadro ou relatório que permita efetuar um controlo operacional ou de gestão dos processos e a sua utilização implicaria um retrocesso na sua operacionalidade e modernização; conclui que a Autora não chegou a executar qualquer desenvolvimento informático nem cumpriu os prazos.

Dando por reproduzidos os factos alegados, deduziu reconvenção pedindo a condenação da Autora a pagar-lhe a importância de € 25.128,75, acrescida dos juros de mora vencidos e vincendos, à taxa de juros comerciais, desde a notificação do articulado até integral e efectivo pagamento ou, caso venha a determinar-se que os serviços prestados pela Autora correspondem a mais de 25% do valor que lhe foi pago por si, que aquela seja condenada a pagar-lhe a importância que se vier a apurar, correspondente aos serviços contratados, que não foram prestados, a liquidar em execução de sentença.

Acrescentou que aquele montante corresponde aos serviços contratados que a Autora não executou e que lhe pagou, que estima em 75%.

*A Autora replicou argumentando que a proposta solicitada pela Ré visava a digitalização dos processos de negócios da empresa e que a introdução de maior automação das linhas de produção nunca esteve no âmbito dos objetivos do projeto; a disponibilização do servidor e dos componentes e a rede informática eram da responsabilidade da Ré, o primeiro, que era essencial para o desenvolvimento do projecto, apenas foi disponibilizado em 28 de Fevereiro de 2017, tendo a 9 de Março seguinte feito a apresentação, que seguiu o que lhe fora solicitado e não mereceu qualquer reparo; durante Abril e Maio desenvolveu a componente de planeamento e deu formação em várias componentes do sistema, que lhe foi solicitado de forma repentina; as acções deveriam ser executadas pela Ré, com a sua colaboração, com o objectivo de melhorar a prestação operacional e preparar o desenvolvimento do projecto e instalação do sistema informático, mas a Ré não implementou a recepção de materiais em tempo real, apesar de ter condições para o fazer desde Setembro de 2016; a definição da política de gestão de stocks iniciou-se em Setembro de 2016 e durou até Julho de 2017; refere que a Ré falhou na sua tarefa de transmissão de informação do seu negócio e a validação da mesma, tendo aceitado as fichas técnicas em 10 de Julho de 2017, assim como o planeamento, sem qualquer nota de reparo, pedindo desculpas pelo atraso.

*Dispensada a realização de audiência prévia, foi proferido despacho saneador que definiu o objecto do litígio, com enunciação dos temas da prova, após o que se procedeu a julgamento com a subsequente prolação da sentença que julgou a acção parcialmente provada e procedente, condenando a Ré X – Material Eléctrico, Ld.ª a pagar à Autora Y – Consultores, Ld.ª a quantia de € € 25.272,80, acrescida de juros à taxa legal resultante da aplicação do artigo 2º nº 2 da Portaria nº 277/2013 de 26 de Agosto, por referências às datas de vencimento das faturas identificadas no ponto 23) b) a i) da fundamentação de facto e ao montante de € 808,19 relativamente à data de vencimento da factura F 2017A/37, identificada em 23) a), até integral e efectivo cumprimento, e improcedente a reconvenção, absolvendo a Reconvinda Y – Consultores, Ld.ª do pedido formulado pela Reconvinte X – Material Eléctrico, Ld.ª.

* II. O Recurso Não se conformando com a decisão proferida veio a Ré/reconvinte apresentar recurso, nele formulando as seguintes conclusões: 1. A sentença sob recurso rejeitou a defesa por exceção invocada pela recorrente, porquanto considerou que esta, ao resolver o contrato, “limitou-se a informar que o fazia ao abrigo da cláusula do contrato de consultoria que lhe permitia desvincular-se em qualquer momento”.

  1. O facto de a recorrente não ter invocado fundamento para pôr termo à relação contratual, não pode, no entender da recorrente, ser impedimento para que esta possa alegar, em sua defesa e como justificação para o não pagamento das faturas reclamadas pela recorrida, a excepção de não cumprimento e, muito menos, para que o Tribunal não tome conhecimento dessa mesma excepção, como se impunha que tivesse feito.

  2. Entende a recorrente ser legítima a invocação, em sua defesa, da excepção de não cumprimento, e o consequente dever do Tribunal dela tomar conhecimento, o que manifestamente não fez, razão pela qual a sentença recorrida enferma da nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), primeira parte do Código de Processo Civil.

  3. Para além de não existir qualquer disposição legal que obrigue a recorrente, aquando a rescisão do contrato, a invocar os motivos que determinaram o não pagamento das facturas emitidas pela recorrida, a rescisão e a excepção de não cumprimentos são, de facto e de direito, questões distintas.

  4. Uma traduz-se na possibilidade da recorrente, voluntariamente, poder rescindir o contrato em qualquer momento da sua vigência, sem necessidade de invocar qualquer razão ou motivo para o efeito.

  5. Outra, na possibilidade de se opor ao pagamento, invocando, de acordo com a lei e em sua defesa, a exceptio non adimpleti contractus, em caso de incumprimento ou cumprimento defeituoso por parte da recorrida.

  6. Ficou provado nos autos que: - A interface do utilizador do software desenvolvido pela recorrida deveria ser de fácil utilização e intuitivo de modo a permitir agilidade na sua utilização, o que não sucedeu no software que foi apresentado pela recorrida; - A interface apresentada pelo software desenvolvido pela recorrida implicava a utilização de dispositivos com ecrãs de grandes dimensões para a execução do programa para o respetivo visionamento de forma legível em ecrã completo ou a realização de skroll para aceder à totalidade da informação, nada consentâneo com a realidade tecnológica atual, na qual as aplicações informáticas são preparadas para poderem ser utilizadas em qualquer dispositivo, nomeadamente, smartphones, tablets, computadores portáteis, entre outros; - A interface desenvolvida pela recorrida era inadequada à utilização pelos funcionários do sector produtivo da recorrente; - A Aplicação desenvolvida pela recorrida não apresenta qualquer descrição aquando da selecção do código num universo de 11.000 artigos, o que implicaria a memorização dos descritivos correspondentes a cada código pelos utilizadores ou a execução dos comandos copiar a partir da base de dados e colar no software quando estivesse em causa uma operação de planeamento; 8. Ficou igualmente provado que a recorrente necessita de software que permita efectuar de forma intuitiva, prática, eficaz, rápida e eficaz as seguintes operações: - plano de abastecimento; - planeamento; - ordens de produção; - execução de produção; - gestão de compostos; - gestão de produções; - gestão de armazéns/logística; - gestão de stocks; - manutenção; - montagem.

  7. Resultou também demonstrado que os administradores da recorrente chegaram à conclusão que a introdução do software desenvolvido pela recorrida, constituiria um retrocesso na operacionalidade, obstaria à modernização de empresa...

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