Acórdão nº 2580/20.5T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelMARIA DOS ANJOS NOGUEIRA
Data da Resolução17 de Dezembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I. Relatório A executada/embargante X – Torraplenagens, Lda, devidamente identificada nos autos, por apenso à execução para pagamento de quantia certa que a exequente S. V., também devidamente identificada nos autos, lhe instaurou, veio deduzir embargos de executado.

Para o efeito, alegou, em síntese, a inexequibilidade do título dado à execução – confissão de dívida – por padecer de irregularidades que comprometem a sua exequibilidade.

A embargada pronunciou-se, pugnando pela sua improcedência.

*Em sede de despacho saneador, foi proferida decisão nos seguintes termos: “Da (in)exequibilidade do título dado à execução:-- Alega a Embargante que o título dado à execução – confissão de dívida – padece de irregularidades que comprometem definitivamente a exequibilidade do mesmo.— A Embargada pronunciou-se, pugnando pela improcedência da excepção.— Cumpre apreciar e decidir.---- O processo executivo destina-se a dar realização material coactiva às providências judiciárias que dela careçam e a comportam.--- Pode instaurar-se um processo executivo sem precedência de processo declaratório sempre que o autor, embora não tendo a sua pretensão reconhecida por uma sentença, esteja munido de um documento que a lei considere susceptível de servir de base à execução - o título executivo (cfr. Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 1979, págs. 56/58).--- Os títulos executivos são documentos de actos constitutivos ou certificativos de obrigações a que a lei reconhece a eficácia de servirem de base ao processo executivo.- O título é condição necessária do processo executivo.

A questão que se coloca prende-se com a exequibilidade do documento dado à execução, sustentando a Executada/Embargante que a falta de observância dos procedimentos de autenticação – concretamente a falta de assinatura da embargante no termo de autenticação - lhe retirou tal condição.-- À execução só podem servir de base os títulos taxativamente elencados no artigo 703º do Cód. Proc. Civil.-- Resulta do art. 703º nº 1, alínea b), do Cód. Proc. Civil, que à execução podem apenas servir de base os documentos exarados ou autenticados, por notário ou por outras entidades ou profissionais com competência para tal, que importem constituição ou reconhecimento de qualquer obrigação.--- Nos termos do art. 35º do Cód. Notariado, “1 - Os documentos lavrados pelo notário, ou em que ele intervém, podem ser autênticos, autenticados ou ter apenas o reconhecimento notarial.

2 - São autênticos os documentos exarados pelo notário nos respectivos livros, ou em instrumentos avulsos, e os certificados, certidões e outros documentos análogos por ele expedidos.

3 - São autenticados os documentos particulares confirmados pelas partes perante notário.

4 - Têm reconhecimento notarial os documentos particulares cuja letra e assinatura, ou só assinatura, se mostrem reconhecidas por notário.”- O processo de autenticação dos documentos particulares encontra-se disciplinado nos arts. 150.º e ss. do Código do Notariado, exigindo-se assim que as partes confirmem o seu conteúdo perante o advogado (art. 150º nº 1 do Cód. Notariado), o qual deve lavrar termo de autenticação (art. 150º nº 2) e obedece aos requisitos previstos nos arts. 150º e 151º do Cód. Notariado, devendo ainda ser efectuado o registo informático, previsto na Portaria 657-B/2006, de 29 de junho.-- Segundo o art. 153º, nº 1 do Código do Notariado, os reconhecimentos notariais podem ser simples ou com menções especiais. O reconhecimento simples respeita à letra e assinatura, ou só à assinatura, do signatário de documento (n.º 2 do referido preceito).- O art. 38º do Decreto-Lei nº 76-A/2006, de 29 de Maio, procedeu à extensão do regime dos reconhecimentos de assinaturas e da autenticação e tradução de documentos, além de outras entidades ou profissionais, aos advogados. Sem prejuízo da competência atribuída a outras entidades, as câmaras de comércio e indústria, reconhecidas nos termos do Decreto-Lei n.º 244/92, de 29 de Outubro, os conservadores, os oficiais de registo, os advogados e os solicitadores podem fazer reconhecimentos simples e com mençõesespeciais, presenciais e por semelhança, autenticar documentos particulares, certificar, ou fazer e certificar, traduções de documentos nos termos previstos na lei notarial (nº 1)---.

Os reconhecimentos, as autenticações e as certificações efectuados pelas entidades previstas no número anterior conferem ao documento a mesma força probatória que teria se tais actos tivessem sido realizados com intervenção notarial (n.º 2).--- Para que os actos referidos no n.º 1 se considerem validamente praticados pelas câmaras de comércio e indústria, advogados e solicitadores tem de ser efectuado e registo em sistema informático, cujo funcionamento, respetivos termos e custos associados são definidos por portaria do Ministro da Justiça (nº 3).--- Vertendo ao caso que nos ocupa, sustenta a Embargante a nulidade do termo da autenticação, como já se disse, na falta da assinatura no mesmo da própria embargante, chamando à colação o art. 70º, nº 1, do Cód. do Notariado, que prevê a nulidade do acto quando faltar a assinatura do outorgante.— Ora, para nós parece evidente que a Embargante não podia nem devia ter aposto a sua assinatura no termo de autenticação, pela mera circunstância de não ser outorgante do mesmo. Com efeito, quem autentica é a entidade à qual a lei confere poderes para o efeito – no caso, a Srª Advogada – pelo que apenas esta é a outorgante e, como tal apenas esta podia, devia, e efectivamente apôs no termo a sua assinatura.

A Embargante – representada pelo respectivo legal representante – apenas foi outorgante do documento denominado “Declaração de Reconhecimento de Dívida”, pelo que o assinou.— Em suma, inexiste qualquer irregularidade no documento dado à execução, mormente na respectiva autenticação, que obedece às formalidades legalmente exigidas, pelo que se julga improcedente a excepção invocada de falta de título executivo.—“.

*II-Objecto do recurso Não se conformando com a decisão proferida, veio a executada/embargante interpor recurso, juntando, para o efeito, as suas alegações, e apresentando, a final, as seguintes conclusões: 1.

Vem o presente recurso interposto da, aliás, douta decisão proferida em 06/10/2020 a fls. …, que julgou improcedente a exceção invocada de falta de título executivo.

  1. No douto despacho de que agora se recorre, a Meritíssima Juiz a quo, considerando que, in casu, inexiste qualquer irregularidade no documen-to dado à execução, mormente na respetiva autenticação, considerou que o mesmo obedece às formalidades legalmente exigidas.

  2. Vem, assim, a Requerente recorrer de tal decisão, pretendendo mostrar, por diversos ângulos de observação, que o julgado em apreço não pode subsistir.

  3. Salvaguardando sempre o devido respeito – que é muito - e admiração que nos merece o Tribunal a quo, ficou incorretamente decidida a ques-tão respeitante à (in)exequibilidade do título dado à execução nos autos de que os presentes são apenso.

  4. Conforme resulta dos autos, o Tribunal recorrido sufragou o entendimen-to que o documento particular apresentado pela Exequente/Embargada, como título executivo pode valer como tal, considerando que, no caso, foram cumpridos os requisitos legais relativos à sua autenticação.

  5. A Meritíssima Juiz do Tribunal a quo, considerou que sociedade Embar-gante, ora Recorrente, não podia nem devia ter aposto a sua assinatura no termo de autenticação, pela mera circunstância de não ser outorgan-te do mesmo.

  6. Ainda de acordo com o teor da decisão ora em crise, quem autentica é a entidade à qual a lei confere poderes para o efeito – no caso Advogado -, pelo que, apenas este é outorgante e, por conseguinte, apenas este podia, devia, e apôs no termo a sua assinatura.

  7. Discorda, porém, a aqui Recorrente, de tal entendimento vertido no douto despacho ora em crise.

  8. Conforme resulta do requerimento executivo, os autos de execução em apreço fundam-se num documento ao qual foi atribuída a designação de “Declaração de Reconhecimento de Dívida”, datado de 28 de Março de 2014.

  9. Tal documento mostra-se assinado por M. R. na qualidade de sócia gerente da aqui Recorrente.

  10. A Exequente/Embargada, invoca, assim, como título executivo, o documento autenticado “Declaração de Reconhecimento de Dívida”.

  11. Do mencionado “Termo de Autenticação” que acompanha a supra alu-dida “Declaração de Reconhecimento de Dívida”, emitido pelo Ex.mo Senhor Dr. F. O., Ilustre Advogado, também datado de 28 de Março de 2014, apenas consta, conforme se extrai do seu teor, a assinatura do próprio e encontra-se aposto o respetivo carimbo profis-sional.

  12. Quem elaborou a mencionada “Declaração de Reconhecimento de Dívi-da” e o termo de autenticação que se lhe seguiu foi o Ilustre Advogado, acima identificado, e não a representante legal da Embargante, ora Recorrente.

  13. A sócia gerente da Recorrente - M. R. -, não par-ticipou nem assinou o mencionado termo de autenticação.

  14. Como se verifica, contrariamente ao entendimento vertido no douto despacho ora em crise, o Ilustre Advogado foi a entidade autenticadora e não o outorgante do documento em causa nos autos.

  15. Ora, como é consabido, a ação executiva carateriza-se pela necessida-de de uma base documental, ou seja, a ação executiva não pode ser ins-taurada sem o exequente se encontrar munido de um título executivo.

  16. Nessa medida, toda a execução deve, assim, ter por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da ação executiva (Art. 10.º, N.º5 do CPC).

  17. O título executivo apresenta-se como requisito essencial da ação exe-cutiva e há de constituir instrumento probatório suficiente da obrigação exequenda, isto é, terá de ser um documento suscetível de, por si só, revelar, com um mínimo aceitável de segurança, a existência do crédito em que assenta o pedido exequendo.

  18. O título é efetivamente condição necessária do processo...

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