Acórdão nº 494/09.9GAFLG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 09 de Maio de 2011

Magistrado ResponsávelMARIA JOSÉ NOGUEIRA
Data da Resolução09 de Maio de 2011
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam em conferência os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório 1. No âmbito do processo comum n.º 494/09.9GAFLG do 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Felgueiras, mediante acusação pública, acompanhada pela assistente/demandante Maria F..., foi submetido a julgamento, com a intervenção do tribunal singular, o arguido/demandado Joaquim P...

, melhor identificado nos autos, sendo-lhe imputada a prática como autor material, de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152.º, n.º 1, al. a) do Código Penal, na redacção introduzida pela Lei n.º 59/2007, de 04.09.

  1. Realizado o julgamento, por sentença de 30.11.2010, veio o arguido a ser condenado pela prática do sobredito crime na pena de 13 [treze] meses de prisão, suspensa na respectiva execução pelo período de 13 [treze] meses, subordinada às regras de conduta na mesma definidas, a saber: proibição de contactar ou aproximar-se da assistente; pagar à Associação Portuguesa de Apoio à Vitima, no prazo estipulado, a quantia de € 500,00.

    Mais foi condenado, a título de indemnização civil por danos não patrimoniais, a pagar à demandante a quantia de € 1.000,00 [mil euros], acrescida de juros à taxa legal, desde a notificação do pedido até integral pagamento.

  2. Inconformado com o assim decidido recorreu o arguido, extraindo da respectiva motivação as seguintes conclusões: 1.º O presente recurso reporta-se à sentença proferida nos presentes autos e que condenou o arguido na prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo artº 152º nº 1 al. a) do C. Penal na pena de 13 meses de prisão.

    1. O arguido, ora recorrente não tem antecedentes criminais.

    2. Tem 73 anos de idade e é reformado.

    3. Na sentença em análise, ora recorrida, o Tribunal a quo não apreciou nem valorou correctamente a matéria fáctica produzida, nem tão pouco fez uma adequada subsunção da mesma às normas jurídicas, bem como desconsiderou o princípio norteador do processo penal, “in dubio pro reo”.

  3. º O Tribunal a quo na sentença ora recorrida incorreu em erro de julgamento, logo fez uma incorrecta aplicação do direito.

    1. A prova produzida em julgamento foi manifestamente insuficiente para dar como provados determinados factos. Houve por assim dizer insuficiência de provas produzidas para alicerçar a convicção do Tribunal acerca de determinados factos. O Tribunal a quo tirou uma conclusão ilógica, arbitrária, tendo realizado uma incorrecta apreciação da prova.

    2. O recurso versa sobre matéria de facto, cuja prova consta toda dos autos uma vez que tem por base os depoimentos testemunhais que foram gravados. Ora, de acordo com o artº 127º do C.P.P., salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é produzida segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.

    3. A propósito do princípio da livre apreciação da prova o Professor Figueiredo Dias ensinou na obra “Direito Processual Penal”, 1.º vol. pags 203/207, “o princípio não pode de modo algum querer apontar para uma apreciação imutável e incontornável – e portanto arbitrária – da prova produzida.” E acrescenta que tal discricionariedade tem limites inultrapassáveis: “a liberdade de apreciação da prova é, no fundo, uma liberdade de acordo com um dever – o dever de perseguir a chamada verdade material – de tal sorte que a apreciação há-de ser, em concreto, reconduzível a critérios objectivos e, portanto, em geral susceptível de motivação e controlo”.

    4. Ainda segundo o Professor “a livre ou íntima convicção do juiz não poderá ser uma convicção puramente subjectiva, emocional e portanto imotivável. Embora não se busque o conhecimento ou apreensão absolutos de um acontecimento, nem por isso o caminho há-de ser o da pura convicção subjectiva. E se a verdade que se procura é uma verdade prático jurídica, e se, por um lado, uma das funções primaciais de toda a sentença (maxime da penal) é a de convencer os interessados do bom fundamento da decisão, a convicção do juiz há-de ser, é certo, uma convicção pessoal – até porque nela desempenha um papel de relevo não só a actividade puramente cognitiva mas também elementos racionalmente não explicáveis (v. g. a credibilidade que se concede a certo meio de prova) e mesmo puramente emocionais – mas, em todo o caso, também ela uma convicção objectivável e motivável, portanto capaz de se impor aos outros. Uma tal convicção existirá quando e só quando o tribunal tenha logrado convencer-se da verdade dos factos para além de toda a dúvida razoável, isto é, quando o tribunal tenha logrado afastar qualquer dúvida para a qual pudesse haver razões, por pouco verosímil que ela se apresentasse.

    5. Na sentença ora posta em crise, a matéria dada como provada e relativamente ao crime de violência doméstica, salvo melhor opinião, encontra-se erradamente julgada.

    6. Com efeito em toda a audiência de julgamento as declarações da assistente bem como os depoimentos das testemunhas da acusação não lograram demonstrar que o arguido, ora recorrente, tenha praticado o supra referido tipo legal.

    7. E ainda que assim não entendesse, deveria o tribunal a quo, por referência ao principio basilar do processo penal “in dubio pro reo” ter absolvido o arguido da prática do mesmo, atenta a insuficiência da prova testemunhal produzida em sede de audiência de julgamento quanto aos factos concretamente vertidos na acusação.

    8. Não resulta do texto da sentença recorrida prova suficiente e necessária para a condenação do arguido no tipo legal “violência doméstica”. O arguido negou a prática dos factos de que vem acusado, sendo certo que o Tribunal a quo se baseou unicamente nas declarações da assistente, nitidamente parcial por ter interesse na condenação do arguido, para prova dos factos alegadamente ocorridos em Outubro de 2009 em dia não concretamente apurado.

    9. Nenhuma das testemunhas de acusação presenciou os factos alegadamente ocorridos no dia 17 de Dezembro de 2008, nem sequer os pretensamente ocorridos depois do mês de Agosto de 2008 e concretamente em Outubro de 2009 tal como fora alegado em sede de audiência de julgamento.

    10. Da transcrição dos depoimentos das testemunhas de acusação nenhuma delas foi capaz de testemunhar os factos imputados ao arguido no libelo acusatório, ou porque nunca tivessem assistido a qualquer desentendimento entre a assistente e o arguido ou porque naquelas circunstâncias de tempo nada presenciaram.

    11. À testemunha Sérgio P... no decurso da audiência de julgamento não lhe foram feitas perguntas sobre os factos imputados ao arguido e ocorridos depois de Agosto de 2008. O mesmo testemunhou factos alegadamente ocorridos antes de ele próprio se ter casado e quando vivia em casa dos pais, ou seja, factos ocorridos há cerca de 20 anos atrás. Questionado sobre os factos alegadamente ocorridos no dia 17 de Dezembro de 2008 o mesmo disse nada ter assistido.

    12. As testemunhas Maria da G... e Maria J... no seu testemunho foram peremptórias ao afirmar que nunca assistiram a qualquer discussão entre ofendida e arguido e que desconheciam a situação alegadamente ocorrida no dia 17 de Dezembro de 2008 bem como as pretensamente ocorridas depois de meados do mês de Agosto de 2008.

    13. A testemunha Joaquim T... prestou mesmo um testemunho indirecto, de ouvir dizer, logo proibido por lei, não obstante o Tribunal a quo o ter valorado e vertido na sentença recorrida.

    14. As declarações da ofendida/assistente, apesar da natureza parcial das mesmas, atento o seu interesse na condenação do arguido, levam a crer que as alegadas palavras “puta”, “vaca” e “tens amantes” a terem sido ditas pelo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT