Acórdão nº 3035/21.6T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Janeiro de 2023

Magistrado ResponsávelMARIA EUGÉNIA PEDRO
Data da Resolução19 de Janeiro de 2023
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam o Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO M... - Invest – Mediação I..., Lda., com sede na Avenida ..., ..., ..., intentou a presente acção declarativa de condenação contra: F... - Tecelagem, Lda., com sede na Rua ..., em ..., peticionando a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de 125.000,00 € acrescida de IVA, à taxa legal em vigor ( correspondente a 5% do valor de 2.500.000,00 € proposto para a venda/cessão de posição contratual) ou, em alternativa, a quantia que se vier a apurar atenta a comissão de 5% fixada no contrato de mediação imobiliária e o valor efectivo da compra e venda/cessão da posição contratual, em qualquer dos casos acrescida de juros desde a data da celebração da venda/cessão da posição contratual até efectivo e integral pagamento.

A fundamentar tal pretensão alegou, em síntese: - Em Maio de 2020 a autora celebrou com a ré um contrato de mediação imobiliária, relativo a um prédio urbano e a um prédio misto propriedade do Banco 1..., S.A., de que a ré era locatária financeira, pelo prazo de 3 meses, renovável por igual período, no regime de exclusividade, tendo em vista a angariação de clientes interessados na compra desses imóveis ou na cessão da posição contratual que a ré detinha no aludido contrato de locação financeira; - A autora promoveu os referidos imóveis junto dos seus clientes e publicitou-os por diversas vias, tendo surgido vários clientes interessados, nomeadamente AA, representante legal da sociedade H... - Fábrica de Algodão Hidrófilo, S.A., que visitou os imóveis em 03.06.2020 e ficou de apresentar uma proposta depois de reunir com os demais sócios, o que foi comunicado ao gerente da ré, BB, que ficou igualmente de reunir com os demais sócios e ponderar a redução do preço solicitada pela H...; - Em 20.07.2020 a ré denunciou o contrato de mediação imobiliária com efeitos a 20.08.2020; - Tendo chegado ao seu conhecimento, em Outubro de 2020, que a referida H... iria adquirir os prédios em causa, a autora reforçou junto da ré que aquela sociedade era sua cliente e que, caso lhe transmitisse a sua posição contratual ou a propriedade dos imóveis, a autora teria direito à comissão acordada; - A ré cedeu a sua posição contratual de locatária financeira dos referidos imóveis à sociedade H... - Fábrica de Algodão Hidrófilo, S.A.; - Com a denúncia do contrato de mediação imobiliária, a ré pretendeu “esquivar-se” ao pagamento devido e acordado com a autora.

Finalizou, formulando o pedido supra enunciado.

Citada, a ré apresentou contestação, impugnando a factualidade descrita na petição inicial e alegando, em suma: - O contrato de mediação imobiliária foi celebrado por BB em seu próprio nome e não da ré; - O referido contrato é nulo, pois: na data em que foi celebrado a autora não entregou ao referido BB ou à ré qualquer fotocópia do mesmo, o que só sucedeu mais tarde; dele não constam as características do imóvel que tem por objecto, os ónus e encargos que sobre este recaem, a identificação do negócio visado com a mediação, as condições de remuneração da autora, a forma de pagamento nem a identificação do angariador; do documento em causa não resulta tratar-se de um modelo validado pela Direção Geral do Consumidor; as cláusulas inseridas no referido contrato não foram previamente negociadas com a ré, configurando cláusulas contratuais gerais, os espaços em branco só foram preenchidos posteriormente pelo agente da autora e não foi prestada qualquer informação ou comunicação sobre as referidas cláusulas.

- A autora nunca desenvolveu qualquer actividade de publicitação do imóvel e promoção da sua venda e nunca comunicou à ré ou ao seu gerente a existência de interessados na aquisição do mesmo, razão pela qual a ré denunciou o referido contrato; - Em Julho de 2020 a ré foi contactada pela H... - Fábrica de Algodão Hidrófilo, S.A., que se mostrou interessada na sua aquisição, sem nunca ter mencionado que já havia visitado o imóvel, tendo sido acordada, após negociação, a cessão da posição contratual da ré no contrato de locação financeira celebrado com o Banco 1..., S.A. pelo preço de 817.100,54 €, negócio que acabou por ser concretizado em 12.10.2020 sem qualquer intervenção da autora; - O negócio inicialmente pretendido pela ré era a venda dos imóveis, mediante liquidação da totalidade do crédito do banco, nunca tendo sido aventada pela autora a possibilidade de cessão da posição contratual, solução apenas equacionada nas diversas reuniões mantidas entre a ré e a H....

Concluiu pugnando pela improcedência da acção.

*A autora respondeu às excepções arguidas na contestação, pugnando pela sua improcedência, acrescentando que BB se apresentou como “dono da empresa” e celebrou o contrato em nome da ré, que lhe foi entregue uma cópia do mesmo, que o formulário utilizado foi previamente submetido à aprovação do I...,IP e que o teor do contrato foi negociado, nomeadamente o regime de contratação, remuneração e prazo de duração, e explicado à ré na pessoa do seu gerente. Mais alegou que a arguição da nulidade do contrato sempre configuraria um abuso de direito, pois a ré apenas pretende furtar-se ao pagamento da comissão devida à autora, e que, de todo o modo, a eventual nulidade do contrato teria como consequência a obrigação da ré restituir à autora o equivalente aos serviços por esta prestados, ou seja, o valor da comissão acordada.

Foi proferido despacho saneador, onde se julgou válida a instância nos seus pressupostos objectivos e subjectivos, se identificou o objecto do litígio e se enunciaram os temas da prova, o que não foi alvo de qualquer reclamação.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, com observância das formalidades legais, foi proferida sentença como seguinte dispositivo : “ Pelo exposto, o tribunal julga a acção parcialmente procedente e, consequentemente, condena a ré F... - Tecelagem, Lda. a pagar à autora M... - Invest – Mediação I..., Lda. a quantia de 40.855,03 €, acrescida do IVA devido à taxa legal, acrescida ainda de juros de mora, contados à taxa aplicável aos créditos de que sejam titulares empresas comerciais, desde 30.3.2021 até integral pagamento.

Custas por autora e ré, na proporção dos respectivos decaimentos (cfr. artigo 527.º, n.º 1 e 2, do Código de Processo Civil).

Registe e notifique.”*Inconformada, a R. interpôs o presente recurso, finalizando as sua alegações, com as seguintes Conclusões ( transcrição) 1. Considerou o Meritíssimo Juiz a quo que, perante a matéria de facto dada como provada, estavam preenchidos os pressupostos quer quanto à existência do contrato, quer quanto ao nexo de causalidade, e consequente direito à remuneração da Autora o que não se aceita.

  1. A Ré na sua contestação invocou nos seus artigos 17 e 18 ” Desde logo também não resulta do referido documento se são modelos validados pela Direção Geral do Consumidor, sendo que a falta dessa menção determina a nulidade do referido contrato, cfr. art. 16º da Lei 15/2013 de 08/02.

    Pelo que é o referido contrato nulo o que desde já se invoca.” 3. Na douta sentença recorrida refere o Meritíssimo juiz a quo acerca da invocada nulidade do contrato, “Nos termos do artigo 16.º, n.ºs 4, do referido diploma legal, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 102/2017, de 23 de Agosto, «[o]s modelos de contratos com cláusulas contratuais gerais de mediação imobiliária só podem ser utilizados pela empresa após aprovação prévia dos respetivos projetos pelo Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção, I. P. (I...,IP)».

  2. Acrescenta o n.º 6 do mesmo artigo que «[s]empre que a empresa utilize o modelo de contrato com cláusulas contratuais gerais aprovado por portaria dos membros do Governo das áreas da justiça, do imobiliário e da defesa do consumidor, está dispensada da aprovação prévia prevista no n.º 4, devendo depositar o modelo de contrato, por via preferencialmente eletrónica, junto do I...,IP» 5. O n.º 7, do mesmo artigo 16.º, sanciona com nulidade a omissão desta formalidade, com as especificidades já antes analisadas.” 6. E prosseguindo na leitura da aliás douta sentença consta o seguinte: “No caso em apreço, a nulidade decorrente da utilização de um modelo de contrato não validado pelo I...,IP, nem depositado nesse Instituto, é inteiramente imputável à autora, nada permitindo afirmar que a ré – que pretende prevalecer- se dessa nulidade – tenha de alguma forma contribuído para a mesma, desconhecendo-se mesmo se esta se apercebeu desse vício antes de ter sido chamada a esta acção.” 7. De seguida a decisão analisa os demais vícios arguidos pela Ré, aqui recorrente quanto às demais cláusulas insertas no contrato, e em relação a essas considera que existirá abuso de direito, e que a Ré não as pode invocar como causa de nulidade do contrato.

  3. Mas como já se referiu em relação à falta de comunicação ao I...,IP expressamente considera que a Ré em nada contribuiu para gerar confiança na Autora, e em como não iria invocar a referida nulidade como fez, mas acaba por daí não retirar qualquer decisão, ou seja a nulidade não foi decretada, apesar de se verificarem todos os pressupostos legais para o efeito.

  4. A sentença na fundamentação confere inteira razão à Ré, e à nulidade por ela invocada, mas de seguida abstém-se de decidir em conformidade.

  5. O dever de fundamentar as decisões nos termos do art. 154.º do CPC impõe-se por razões de ordem substancial – cabe ao juiz demonstrar que, da norma geral e abstrata, soube extrair a disciplina ajustada ao caso concreto – e de ordem prática, posto que as partes precisam de conhecer os motivos da decisão a fim de, podendo, a impugnar.

  6. Assim verifica-se a nulidade prevista no artº615 na alínea c) do nº 1 do CP Civil, ou seja a oposição entre os fundamentos e a decisão, o que constitui um vício da estrutura da decisão.

  7. Padece assim a sentença recorrida de nulidade nos termos do artº 615 al. c) do C.P. Civil 13. Assim além da nulidade por falta da utilização de um modelo de...

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