Acórdão nº 171/22.5T8BCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02 de Fevereiro de 2023

Magistrado ResponsávelFRANCISCO SOUSA PEREIRA
Data da Resolução02 de Fevereiro de 2023
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães Apelante: Z... - Sistemas Electrónicos, Lda Apelado: AA I – RELATÓRIO AA, com os demais sinais nos autos, intentou a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra Z... - Sistemas Electrónicos, Lda, também nos autos melhor identificada, pedindo: i) seja declarada a nulidade do reconhecimento presencial da assinatura do Autor aposta na declaração de denúncia do contrato; ii) seja declarada válida e eficaz a revogação da denúncia; iii) subsidiariamente, para a eventualidade, que só por mera cautela se admite, de improcederem os pedidos formulados em A e B, ser declarada a anulação da declaração de denúncia do contrato, por ter sido produzida mediante coacção moral; iv) seja declarada a ilicitude do despedimento do Autor; v) seja a Ré condenada a pagar ao Autor: 1) € 9.956,71 de indemnização de antiguidade, sem prejuízo do montante que resultar à data do trânsito em julgado da sentença que vier a ser proferida; 2) € 1.367,86 a título de retribuições intercalares vencidas desde o dia seguinte ao seu despedimento até à presente data, a que acrescem as que se vencerem até à data do trânsito em julgado da sentença que vier a ser proferida; 3) € 485,78 a título de retribuição e subsídio de alimentação, correspondente ao serviço prestado no mês de Outubro de 2021; 4) € 1.500,00 a título de comissões de vendas, respeitante ao ano de 2021; 5) € 480,00 a título da retribuição do remanescente de férias não gozadas e vencidas no dia 1 de Janeiro de 2021, e correspondente subsídio de férias; 6) € 1.867,40 a título da retribuição de férias e respetivo subsídio de férias proporcional ao tempo de trabalho prestado no ano de 2021; 7) € 933,70 a título do subsídio de Natal proporcional ao trabalho prestado no ano de 2021; 8) € 56,56 de juros de mora vencidos; 9) juros de mora vincendos até efetivo e integral pagamento.

Alega para tanto, e em síntese, que o autor foi admitido ao serviço da ré no dia .../.../2016, através de contrato de trabalho escrito, para desempenhar as funções da categoria profissional de engenheiro eletrotécnico, com a retribuição base mensal de € 1.200,00, no ano de 2021, acrescida de comissões, recebendo ainda o montante de € 7,63, a título de subsídio de refeição por cada dia útil de trabalho, com o período normal de trabalho diário de 8 horas, entre as 9-13 e as 14-18 horas.

Mais alega o autor que se manteve ininterruptamente ao serviço da ré até ao dia 11 de Outubro de 2021, já que no dia 30 de Setembro de 2021, pelas 15 horas, a ré, através dos seus advogados, imputou-lhe factos que no entender da ré constituiriam fundamento para participar criminalmente dele e para lhe instaurar um procedimento disciplinar e instou o autor a assinar de imediato uma declaração escrita de denúncia do contrato de trabalho, ao abrigo do disposto no art. 400.º, n.º 1, do Código do Trabalho, previamente elaborada, advertindo-o que caso não a subscrevesse iria ser instaurado procedimento criminal e disciplinar contra a sua pessoa, com imediata suspensão das suas funções; que, surpreendido e perplexo com a situação exposta, o autor solicitou um prazo de 24 horas para refletir sobre o assunto, prazo que não lhe foi concedido.

Apesar das imputações efetuadas serem descabidas, receoso com a iminência de concretização do procedimento penal e disciplinar, e a gravidade das consequências que poderiam advir para a sua pessoa, o autor viu-se obrigado a assinar a referida declaração escrita de denúncia do contrato de trabalho, o que fez contrariado, e com a vontade perturbada pela intimidação de que foi alvo, e que foi compelido, nas mesmas circunstâncias, a permitir que a sua assinatura aposta na declaração de denúncia do contrato de trabalho fosse objecto de reconhecimento presencial por Advogada aí presente, reconhecimento presencial cujo significado e alcance não apreendeu suficientemente, por força do condicionalismo que rodeou a assinatura da declaração de denúncia do contrato de trabalho.

Alega ainda que no dia 6 de Outubro de 2021, para remediar os efeitos perversos da declaração de denúncia do contrato, revogou tal denúncia, mediante carta registada com aviso de recepção, e por carta de 11 de Outubro de 2021, a ré comunicou ao autor que relevou a denúncia do contrato com efeitos a partir do dia 30 de Setembro de 2021, por considerar que a declaração revogatória da denúncia do contrato de trabalho não obedecia aos pressupostos legais, uma vez que a assinatura da denúncia tinha sido reconhecida presencialmente. Alega, ainda, que nos dias 7 e 11 de Outubro de 2021, pelas 9 horas, se apresentou nas instalações da ré, para desempenhar as suas funções, tendo sido impedido de o fazer pelo respectivo sócio-gerente, BB, que lhe recusou a entrada.

Alega por fim que a ré não lhe pagou a retribuição correspondente ao trabalho prestado no mês de Outubro de 2021, nem o valor devido por comissões de vendas, respeitante ao ano de 2021; que no ano de 2021, o Autor apenas gozou dezasseis dias úteis de férias, vencidas no dia 1 de Janeiro de 2021 e que a ré não pagou a retribuição de férias não gozadas, nem o correspondente subsídio; que a ré não pagou ao autor a retribuição de férias proporcional ao tempo de trabalho prestado no ano de 2021 nem o respectivo subsídio, como não pagou o proporcional do subsídio de Natal; e que mercê da revogação da denúncia, o autor devolveu à ré os montantes pagos com o recibo do mês de Setembro de 2021, relativos a férias não gozadas, subsídio de férias e subsídio de Natal.

Tendo-se realizado audiência de partes, malogrou-se, nessa sede, a conciliação entre elas.

Notificada para o efeito, a ré apresentou contestação, admitindo a existência do contrato de trabalho, a remuneração e as suas componentes, e o horário de trabalho alegado.

Refutou, contudo, as pretensões contra si formuladas, alegando/sustentando, em resumo, que, apesar de esclarecido sobre a situação, foi o autor que na reunião de 30 de setembro de 2021, em que estavam presentes os Advogados da ré, tomou livremente a opção de denunciar o contrato de trabalho, tendo até aceite ver a sua assinatura reconhecida.

Alega que o autor, confrontado com factos que sabia irem dar origem a um procedimento disciplinar, optou por denunciar o contrato de trabalho, tendo, posteriormente dado o dito por não dito, inviabilizando, deste modo, que a ré pudesse instaurar um procedimento disciplinar e, eventualmente, consumar um despedimento por justa causa, atuação que só poderá ser descrita como abuso de direito e que deve o autor ser condenado enquanto litigante de má-fé em indemnização a favor da Ré.

A ré aproveitou ainda para se opor, fundamentando, por entender impossível a manutenção do vínculo laboral, a uma, eventual, reintegração.

Concluiu, pugnando pela respectiva absolvição.

O autor apresentou resposta em que, no fundamental, reafirma a posição já vertida no articulado inicial, rebatendo que esteja a agir em abuso de direito.

Prosseguindo os autos, veio a realizar-se a audiência final e, após, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, julgo a ação parcialmente procedente e: I) Declaro ilícito o despedimento do A. AA.

II) Condeno a Ré Z... - Sistemas Electrónicos, Lda a pagar ao A. AA as retribuições que deixou de auferir desde 30 dias antes da propositura da acção (17.12.2021), à razão de € 1.200,00/mês até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento, sem prejuízo das eventuais deduções nos termos do artigo 390º, nº 2 do CT.

III) Condeno a Ré Z... - Sistemas Electrónicos, Lda a pagar ao A. AA a indemnização prevista no artigo 391º do CT correspondente a 30 dias de retribuição base, por cada ano completo ou fracção de antiguidade à razão de €1200/mês até ao trânsito em julgado da decisão, e que se cifra no montante de € 7,500,00.

IV) Condeno a Ré Z... - Sistemas Electrónicos, Lda a pagar ao A. AA a quantia de € 3.739, 88 (458,78 +480,00 +1867,40 +933,70) a título de créditos salariais: retribuição, férias não gozadas, férias e proporcionais de subsidio de férias e de natal.

V) Juros vencidos, à taxa legal de 4%, contados desde o dia seguinte à decisão de despedimento até efectivo e integral pagamento, absolvendo no mais peticionado.” Inconformada com esta decisão, dela veio a ré interpor o presente recurso de apelação para este Tribunal da Relação de Guimarães, apresentando alegações que terminam mediante a formulação das seguintes conclusões (transcrição): “I. Não ficou provado o Autor tenha sido alvo de qualquer intimidação ou coação por parte da Ré ou dos seus mandatários, pelo contrário, o próprio Autor declarou que os mandatários da Ré foram cordiais e simpáticos.

Mais declarou que se ausentou da sala pelo tempo que entendeu tendo voltado posteriormente para assinar a revogação com contrato de trabalho por iniciativa sua! II. Ficou provado que o douto Tribunal a quo desconsiderou os testemunhos produzidos pelas testemunhas da Ré meramente por preconceito relativamente à profissão de Advogado.

III. salvo o devido respeito por melhor opinião em contrário, andou mal o Tribunal a quo ao concluir que o reconhecimento presencial da assinatura do A. na denúncia do contrato de trabalho, porque não foi feita notarialmente, mas perante advogado, não obsta à revogação, pelo A., dessa denúncia, pelo que nada o impedia de a revogar! IV.A faculdade de os Advogados poderem fazer reconhecimentos presenciais e autenticações resulta expressamente do preâmbulo do o Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29 de março, sendo o objetivo do legislador ao introduzir no ordenamento jurídico tal possibilidade foi o de no domínio da autenticação e do reconhecimento presencial de assinaturas em documentos, permitir que tanto os notários como os advogados, os solicitadores, as câmaras de comércio e indústria e as conservatórias passem a poder fazê-las; logo, e com o devido respeito, que é muito, o entendimento sufragado na douta...

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