Acórdão nº 1218/07-1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Dezembro de 2007
Magistrado Responsável | ANSELMO LOPES |
Data da Resolução | 19 de Dezembro de 2007 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Após conferência, acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: TRIBUNAL RECORRIDO Tribunal Judicial de Guimarães – 2º Juízo Criminal – Pº nº 826/06.0TAVNF ARGUIDO José RECORRENTE O Ministério Público RECORRIDO O arguido OBJECTO DO RECURSO Ao arguido foi imputada a prática de um crime de descaminho ou destruição de objectos colocados sob o poder público, p. e p. pelo art.º 355º do Código Penal.
Porém, o Mmº Juiz, no despacho a que se refere o artº 311º do C.P.Penal, rejeitou a acusação nos seguintes termos: Nos presentes autos de processo comum singular, vem imputada ao arguido a prática de um crime de descaminho, p. e p. pelo art. 355°, do Cód. Penal.
Segundo o enunciado fáctico contido na acusação pública, no âmbito da execução comum 492/04.9TBVNF do 2° juízo criminal de Famalicão foram penhorados os objectos descritos a fls. 9 (e na referida acusação), com os valores ali citados e que esses bens ficaram depositados na casa do arguido, executado e fiel depositário, na Rua dos Salgueirinhos, n.° 3, Moreira de Cónegos, Guimarães. Essa penhora foi realizada em 12.10.2004; o arguido foi nomeado fiel depositário e citado nos termos constantes a fls. 11; o arguido foi ainda notificado, no dia 6.3.2006, para no prazo de cinco dias, indicar onde se encontravam os bens penhorados e coloca-los à ordem do encarregado da venda, facto que nunca veio a realizar, nem justificando a sua atitude.
O arguido bem sabia que, como fiel depositário, tinha a obrigação de entregar tais bens quando lhe fosse exigido e indicar ao tribunal o respectivo paradeiro.
O arguido bem sabia que tais bens apreendidos e penhorados não podiam ser vendidos ou dar-lhes outro destino.
Mesmo assim, tudo indica face às regras da experiência, o arguido alienou, vendendo ou doando ou cedeu a outro título esses bens, de forma não apurada, retirando-os do lugar onde se encontravam depositados, encerrando as portas de tal casa, recusando a entrega-los ao tribunal, prejudicando totalmente a finalidade a que se destinava a penhora.
O arguido actuou livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta violava a lei.
Ora, em conformidade com o disposto no art . 355° do Cód. Penal, comete o crime de descaminho aquele que destruir, danificar, inutilizar ou - no que para o presente caso particularmente interessa - por qualquer forma subtrair ao poder público a que esta sujeito documento ou outro objecto móvel, bem como coisa que tiver sido arrestada, apreendido ou objecto de providência cautelar.
A incriminação da conduta acima descrita representa mais um momento de tutela da autonomia intencional do Estado, aqui concretizada através de uma ideia de inviolabilidade das coisas sob custódia pública {cfr. Comentário Conimbricense do Cód. Penal, V.III, pg.420 e ss.}.
Sendo inquestionável, face aos documentos juntos aos autos, mormente o auto de penhora de fls. 8 a 10, que, através de uma legítima manifestação de um poder de império, os bens ali descritos e penhorados foi fixado um preciso destino, simbolicamente sinalizado através da respectiva entrega ao arguido, assim oficialmente investido na qualidade de seu mero depositário, já a falta de prova da actuação imputada impede o reconhecimento da acção típica em qualquer uma das modalidades previstas, designadamente na de descaminho, directamente tida em vista pela hipótese acusatória.
Desde logo, quando o arguido foi investido na qualidade de fiel depositário não foram ao mesmo comunicados os deveres de tal cargo, nomeadamente os deveres de guardar os bens depositados e de os apresentar, quando tal lhe fosse ordenando, sem prejuízo de procedimento criminal contra o mesmo -cfr. fls. 8 - nem o foram comunicados posteriormente.
Por outro lado, resulta dos autos que foi promovida a notificação pessoal ao arguido, enquanto fiel depositário e executado, para, no próprio acto, indicar onde se encontravam os bens penhorados e, para, em cinco dias, colocar os mesmos à ordem do encarregado da venda cuja identidade, morada e contacto telefónico lhe deveria ser, também, comunicado - cfr. fls. 21 - tendo sido ordenada por despacho judicial tal notificação - cfr. fls. 22 - ; todavia, a notificação feita não cumpriu o ordenado, i. é, não foi no acto de notificação o arguido notificado para, nesse acto, dizer onde estavam os bens - cfr. fls. 32 .
Posteriormente foi tentada nova notificação, nos mesmos termos, a qual não foi efectuada nos termos expendidos a fls. 32 -, porquanto o Sr. Funcionário chegado ao local de domicílo do arguido ali encontrou "as portas encerradas" mais exarando que o notificando estava ausente e junto de vizinhos foi informado que o mesmo se encontraria algures na Suíça.
Do teor de tais documentos não resulta que o arguido não tivesse apresentado os referidos bens ao Sr. Encarregado da venda para assim os subtrair ao poder público, nem...
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