Acórdão nº 1865/07-1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 03 de Dezembro de 2007

Magistrado ResponsávelCRUZ BUCHO
Data da Resolução03 de Dezembro de 2007
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em audiência, no Tribunal da Relação de Guimarães: *I- RelatórioNo 2º Juízo do Tribunal Judicial de Esposende, no âmbito do Processo Comum Singular nº 364/04.7TAEPS, por sentença de 4 de Janeiro de 2007, o arguido M... Lima, com os demais sinais dos autos, foi condenado, pela prática de: a) um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de cento e vinte dias (120) de multa à taxa diária de oito euros (€ 8); b) um crime de ameaça, p, e p. pelo pelo artigo 153.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de cinquenta (50) dias de multa à taxa diária de oito euros (€ 8); e c) dois crimes de injúrias, p. e p. pelo artigo 181.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de quarenta (40) e quinze (15) dias de multa, à taxa diária de oito euros (€ 8), para cada um deles Em cúmulo jurídico, o arguido foi condenado na pena única de cento e sessenta e cinco (165) dias de multa à taxa diária de oito euros (€ 8), num total de mil trezentos e vinte euros (€ 1 320).

O pedido cível deduzido pela assistente Maria M... foi julgado parcialmente procedente por provado e, em consequência, o demandado/arguido M... Lima foi condenado a pagar-lhe a quantia de quinhentos euros (€ 500);*Inconformado com tal decisão, o arguido dela interpôs recurso, rematando a sua motivação com as seguintes conclusões que se transcrevem: «1. Ao proferir o douto despacho de tis. 239 dos autos e ao não ouvir a testemunha H... Oliveira, o Tribunal violou o art. 323ºdo CPP, aplicou indevidamente o art. 316º do mesmo diploma, violou as normas que disciplinam o direito de defesa do arguido; 2. Além disso, ao não fundamentar a sua decisão, designadamente nada dizendo relativamente ao interesse de não ouvir tal testemunha para a descoberta da verdade e para a boa decisão da causa, quando tal testemunha presenciou os factos ocorridos no dia 5 de Setembro de 2004, o Tribunal incorreu no vicio de falta ou, pelo menos, deficiente fundamentação da decisão, previsto nos artigos 374º/2 e 379º o do CPP.

  1. Ao proceder à alteração não substancial dos factos alterando a qualificação jurídica dos factos depois de ter sido produzida toda a prova, depois de produzidas as alegações orais e quando estava já designado o dia para a leitura da sentença, o Tribunal aplicou indevidamente o art. 357º do CPP e praticou um acto que a lei não admite, sendo nulo tal acto e a consequente decisão condenatória do arguido pelos factos alterados; 4. Pelas razões vertidas na motivação, não deveria o Tribunal ter julgado provado que o arguido proferiu as expressões "és uma puta de uma mentirosa" no dia 5/9/2004 e "canalha" e "criança" no dia 3/10/2004.

  2. Além disso, ao aplicar ao arguido uma pena pela prática de um crime de injuria por ter proferido as expressões "canalha" e "criança" no dia 3/10/2004, e ao não isentar de pena o arguido, sempre o Tribunal violou o art. 186.ºdo Cód. Penal.

  3. Pelo que, sempre as penas aplicadas ao arguido deveriam ser reduzidas.»*O recurso foi admitido, para o Tribunal da Relação de Guimarães, por despacho constante de fls. 263.

*O Ministério Público junto do tribunal recorrido, bem como a assistente Maria M... responderam ao recurso, pugnando pela manutenção do julgado.

*Nesta Relação, o Exmo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer pronunciando-se igualmente no sentido de o recurso não merecer provimento.

*Cumprido o disposto no art. 417º, n.º2 do CPP, foram colhidos os vistos legais.

Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento com o formalismo aplicável.

* II- Fundamentação 1.

É a seguinte a factualidade apurada no tribunal a quo:

  1. Factos provados (transcrição) 1) No dia 7 de Outubro de 2004, deu entrada nos serviços do Ministério Público de Esposende, subscrito pela assistente Maria M..., a “denúncia penal” contra o arguido; 2) No documento descrito em 1), e além do mais que ora não importa tratar, refere-se: “1.º – No dia 5 de Setembro de 2004, cerca das 4.30 horas, no parque de estacionamento da Discoteca P..., no Lugar de Pedreiras, Ofir, da freguesia de Fão, desta comarca, quando a denunciante pretendia sair do mesmo parque, foi impedida de o fazer pelo denunciado, 2.º – O qual mantinha o seu veículo deliberadamente parado por forma a reter a denunciante naquele parque.

  1. – A denunciante conduzia então o veículo 65-27-L... e por diversas e insistentes solicitou ao denunciado que a deixasse abandonar aquele parque, sem que este acedesse a tal pedido.

… 8.º – -Aliás, naquelas circunstâncias de tempo e local referidas, o denunciado ainda se abeirou do citado veiculo conduzido pela queixosa, e pertencente a sua mãe, tendo desferido um violento pontapé no guarda-lamas e pneu esquerdos traseiros do mesmo veículo.

3) No dia 5 de Setembro de 2004, pelas 4.30 horas, no parque de estacionamento da discoteca P..., no lugar de Pedreiras, Ofir, freguesia de Fão, Esposende, o arguido, na sequência de um acidente, imobilizou a sua viatura, impedindo a passagem do automóvel de matrícula 65-27-L..., conduzido pela assistente; 4) Então, a assistente dirigiu-se ao arguido para que este desviasse o seu veículo; 5) Depois de uma troca de palavras, tendo a assistente solicitado a intervenção dos seguranças da referida discoteca e, ainda, da GNR, o arguido dirigiu-se a ela e, em voz alta, tom grave e intimidativo, disse-lhe: “canalha”, “vai para casa que ainda levas dois pares de estalos”, “és uma puta de uma mentirosa”; 6) Entretanto, o arguido arrumou o seu carro e, quando a assistente se preparava para arrancar no veículo por si conduzido, desferiu um pontapé no guarda-lamas traseiro do lado direito do dito veículo; 7) Simultaneamente, o arguido dirigiu-se à assistente dizendo-lhe “o que fiz ao carro vou fazer a ti”; 8) Com o descrito em 6), o arguido amolgou o veículo na zona onde o pontapé foi desferido; 9) No dia 3 de Outubro de 2004, cerca das 2.30 horas, no interior do bar “Fiesta Cubana”, em Ofir, Esposende, o arguido, ao passar pela assistente, desferiu-lhe uma cotovelada no estômago; 10) Após, a assistente e retirou-se para uma espaço ao ar livre no referido bar para se restabelecer; 11) Com o descrito em 9), a assistente sentiu dores no tórax e no estômago, sofrendo traumatismo abdominal; 12) Tendo relatado o descrito em 9) a um segurança do estabelecimento, Diamantino Pinto, procuraram ambos o arguido no interior do mesmo; 13) Tendo-o encontrado, a assistente dirigiu-se ao arguido e disse-lhe em voz alta “filho da puta” e“boi”; 14) Acto contínuo, a assistente atirou ao arguido um líquido cuja concreta natureza ou composição não se logrou apurar, atingindo-o; 15) Face ao descrito em 13) e 14), o arguido apodou a assistente de “canalha” e “criança”; 16) Além disso, o arguido tentou aproximar-se da assistente, o que não conseguiu porque entre ambos se encontrava o referido segurança; 17) Então, o segurança do estabelecimento levou o arguido para fora do estabelecimento; 18) O arguido agiu com o propósito, conseguido, de atingir a saúde da assistente e de lhe provocar as lesões supra descritas, assim como sabia que as expressões por si utilizadas eram e são adequadas a provocar medo e inquietação na assistente, o que representou e quis, bem assim aptas a ofender a sua honra e consideração, tal como representou e quis; 19) Em todos os sobreditos actos, o arguido actuou livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era e é proibida e punida por lei; 20) A assistente deslocou-se ao Hospital da Santa Casa da Misericórdia de Esposende para receber tratamento médico cerca das 6.30 horas desse dia 3 de Outubro; 21) A assistente sentiu-se vexada, humilhada e ofendida na sua honra e consideração social pelas expressões proferidas pelo arguido descritas em 15); 22) As expressões proferidas em 5) e 15) foram proferidas em voz alta; 23) Em virtude deste processo, a assistente teve necessidade de se deslocar ao posto da G.N.R. e ao Tribunal; 24) Despendeu a quantia de € 178 em taxa de justiça para se constituir assistente; 25) O veículo automóvel de matrícula 65-27-L... é propriedade da mãe da ofendida, Maria M...; 26) O arguido é engenheiro civil, tendo feito um pós graduação; 27) Pratica culturismo há 13 anos; 28) Trabalha num gabinete de projectos de construção civil, auferindo mensalmente, pelo menos, € 600 líquidos; 29) É saudável e não tem filhos; 30) Vive com os pais, sendo a mãe doméstica e o pai emigrante; 31) Entrega € 150 mensalmente para ajudar nas despesas domésticas; 32) Tem ainda um veículo automóvel, o qual ainda não se encontra totalmente pago; 33) Não tem antecedentes criminais.

* * B) Factos não provados (transcrição) «Para além dos supra descritos, não se provaram quaisquer outros factos que estejam em contradição com os dados como provados.

Designadamente, não se provou:

a) A reparação do veículo 65-27-L... custou o montante de € 250; b) No momento descrito em 9), o arguido discutiu com a assistente; c) Após o descrito em 9), o arguido agarrou a assistente pelos cabelos, fê-la ajoelhar-se e arrastou-a violentamente para os lados, ao mesmo tempo que proferia a seguinte expressão “olha que vou matar-te”; d) Durante ou após o descrito em 13) a 16), o arguido agarrou a assistente pelos cabelos, fê-la ajoelhar-se e arrastou-a violentamente para os lados, ao mesmo tempo que proferia a seguinte expressão “olha que vou matar-te”; e) A assistente sentiu dores na cabeça; f) Sentiu receio que o arguido viesse a concretizar a intenção de a voltar a atingir; g) A assistente passou a evitar frequentar bares e cafés; h) No dia 3 de Outubro de 2004, o arguido disse à assistente: “és uma puta de uma mentirosa” “vai-te embora” “és uma puta de uma mentirosa”, “sai daqui senão ainda levas no focinho” e “olha que eu mato-te, sua puta”; i) A assistente sentiu-se vexada, humilhada e ofendida na sua honra e consideração social pelas expressões proferidas pelo arguido descritas em 5); j) A assistente sentiu-se vexada, humilhada e ofendida na sua honra e consideração...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT