Acórdão nº 5759/08.4TBBRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 12 de Outubro de 2010

Magistrado ResponsávelROSA TCHING
Data da Resolução12 de Outubro de 2010
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães "A" e mulher, "B", residentes na Rua do P..., n.º 5, freguesia de S. Vítor, neste concelho e comarca de Braga, intentaram a presente acção, com processo ordinário, contra "C" e mulher, "D", residentes na Rua do C..., n.º 229, freguesia de Maximinos, Braga, pedindo que se declare nulo o contrato promessa de compra e venda que celebraram com o Réu marido, por falta de reconhecimento presencial das assinaturas dos outorgantes e da certificação notarial da existência de licença de construção ou utilização dos imóveis que dele foram objecto, e que os RR sejam condenados a restituírem-lhes a quantia de €50.000,00, correspondente ao sinal passado, acrescida de juros de mora, contados à taxa legal, desde a data em que foram interpelados, extrajudicialmente, para o efeito até efectivo e integral pagamento.

Citados, os RR contestaram, sustentando que os outorgantes no contrato promessa prescindiram do reconhecimento presencial das assinaturas e que o prédio prometido vender é anterior ao Regulamento Geral das Edificações Urbanas, pelo que não necessita de licença de utilização.

Concluíram pela improcedência da acção.

Notificados, os AA não replicaram.

Proferido despacho saneador, foram elaborados os factos assentes e a base instrutória.

Procedeu-se a julgamento, com observância do formalismo legal, decidindo-se a matéria de facto controvertida pela forma constante de fls. 125 a 127.

A final, foi proferida sentença que julgou improcedente a presente acção e, em consequência, absolveu os réus do pedido, ficando as custas a cargo dos autores.

Não se conformando com esta decisão, dela apelaram os autores, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que se transcrevem: 1.ª - Perante a clara insuficiência (para não dizer ausência) de prova, o Quesito 6.º da Base Instrutória deveria ter sido dado como não provado; 2.ª - Salvo o devido respeito por melhor opinião, não se revela o documento de fls. 121 (por si só) suficiente para dar como provado, desde logo, que o autor da mensagem de fls 38 foi o Autor; 3.ª - E muito menos que aquela mensagem, com aquele teor preciso, tivesse sido remetida ao Réu e por este, efectivamente, recebida; 4.ª – De facto, nenhuma das Testemunhas ouvidas em Audiência de Julgamento (…) confirmou a existência e teor de tal mensagem; 5.ª – Assim como, em momento algum, foi exibido ao douto Tribunal a quo o telemóvel e correspondente “arquivo” onde tal mensagem teria sido recebida e onde, à partida, deveria estar gravada; 6.ª - Não se tendo, por tal, confirmado a respectiva recepção; 7.ª - Tudo o que existe é uma mera transcrição – da autoria dos próprios Réus (!?) - que, tendo sido impugnada pelos Autores e consequentemente lançada na Base Instrutória, deveria ter sido objecto de prova testemunhal; 8.ª - Sendo certo que, tal qual supra expendido, nenhuma das Testemunhas oferecidas pelos Réus confirmou a autoria e teor de tal mensagem – não obstante o ónus da prova impender sobre os ditos (!?); 9.ª - Pelo que, salvaguardando uma vez mais o devido respeito por melhor opinião, deveria o Quesito 6.º da Base Instrutória ter sido dado como não provado; 10.ª - Também o Quesito 7.º da Base Instrutória foi mal julgado pelo douto Tribunal a quo, o qual, atento o depoimento da Testemunha Manuel Gonçalves Carneiro Pereira deveria ter dado como não provado o referido Quesito.

11.ª Pois que, apesar das Testemunhas António M... e Palmira de J... terem referido que os Autores lhes pagaram, por intermédio de um tal Manuel C..., os três primeiros messes de renda da casa nova; 12.ª - Inquirida a referida Testemunha – Manuel G... – por iniciativa do Tribunal esta desmentiu que alguma vez tenha entregue, a mando dos Autores, quaisquer quantias aos caseiros da quinta; 13.ª - Depoimento que, por alegadamente parcial, não mereceu a credibilidade do douto Tribunal a quo – pese embora ter sido indicado como Testemunha comum dos Autores e Réus; 14.ª - Descrédito não justificado, nem fundamentado pelo Mmo. Juiz de 1.ª Instância; 15.ª Refira-se que, tal qual decorre do n.º 2 do artigo 653.º do Código de Processo Civil, deve o douto Tribunal a quo proceder a um exame crítico das provas, especificando os fundamentos que foram decisivos para a formação da sua convicção; 16.ª – Exigência que decorre também directamente do artigo 205.º, n.º1, da Lei Fundamental (C.R.P.); 17.ª - A exigência da motivação da decisão destina-se, não apenas a obter a exteriorização das razões psicológicas da convicção do julgador, mas a permitir que o Juiz convença os terceiros da correcção da sua decisão; 18.ª - Refira-se que, apesar do disposto no artigo 396.º do Código Civil, a livre apreciação da prova não se poderá confundir, de modo algum, com a apreciação arbitrária da prova nem com a mera impressão gerada no espírito do julgador pelos diversos meios de prova; 19.ª - A prova livre tem como pressupostos valorativos a obediência a critérios da experiência comum e da lógica do homem médio suposto pela ordem jurídica, não devendo nunca implicar o arbítrio; 20.ª - Salvo o devido respeito, o douto Tribunal a quo ao dar como provado o Quesito 7.º da Base Instrutória decidiu numa base puramente impressionista-emocial, subjectivismo que não se coaduna com os Princípios da Certeza e Segurança Jurídicas; 21.ª - Devendo, por decorrência, o referido Quesito ser dado como não provado; 22.ª - Caso assim não se entenda e atenta a clara violação do artigo 205.º da C.R.P. e n.º 2 do artigo 653.º do C.P.C. e a essencialidade do facto em questão para a boa decisão da causa; 23.ª - Devem os presentes autos, nesse pressuposto, ao abrigo do disposto no n.º 5 do artigo 712.º do C.P.C., ser devolvidos à 1.ª Instância para o Juiz de Julgamento proceder à adequada fundamentação da sua decisão de facto; 24.ª - No contrato-promessa sobre o qual versa o presente processo e tal como reconhecido em sede de Audiência de Discussão e Julgamento, foram preteridas as formalidades previstas no n.º 3 do artigo 410.º do C. Civil; 25.ª - E se é certo que a nulidade decorrente da certificação notarial da existência de licença de utilização do edifício prometido vender se encontra sanada - pois ficou demonstrado que as construções existentes no prédio prometido vender eram anteriores à entrada em vigor do Regulamento Geral das Edificações Urbanas; 26.ª - O mesmo já não se pode dizer quanto à nulidade decorrente da falta de reconhecimento notarial das assinaturas dos promitentes; 27.ª - A qual, tal qual decorre dos autos em apreço, não se mostra sanada; 28.ª - Determinando, na modesta opinião dos ora Recorrentes e nos termos da disposição legal supra referenciada, a nulidade do Contrato-Promessa celebrado com os Recorridos; 29.ª - E, consequentemente, tal qual decorre das disposições conjugadas dos artigos 220.º, 286.º, 289.º e 364.º, n.º 1 do Código Civil, a devolução do sinal prestado pelos Autores; 30.ª – Não obstante confirmar a falta de reconhecimento notarial das assinaturas dos promitentes, entendeu o douto Tribunal a quo, por recurso à figura do “Abuso de Direito”, validar o contrato-promessa aqui em discussão; 32.ª - Como refere o Prof. Baptista Machado in “Obra Dispersa”, I, pág. 415 e ss, para que uma determinada conduta seja integradora de abuso de direito na modalidade de “venire contra factum proprium”, “é sempre necessário que a conduta anterior tenha criado na contraparte uma situação de confiança, que essa situação de confiança seja justificada e que com base nessa situação de confiança a contraparte tenha tomado disposições ou organizado planos de vida de que lhe surgirão danos irreversíveis.” 33.ª – No entanto, nenhuma conduta adoptaram os Autores que, claramente, exceda os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico do direito que pretendem exercer; 34.ª - E muito menos, adoptaram qualquer conduta que determinasse os Réus a “tomar disposições ou organizar planos de vida de que lhe surgirão danos irreversíveis”; 35.ª – Acresce que, tal qual ensina Calvão da Silva in Sinal e Contrato Promessa, 11.ª Edição, pág. 77, ainda que do contrato-promessa outorgado pelos Autores conste uma Cláusula pela qual os ditos renunciam ao direito de invocar a nulidade decorrente da preterição das formalidades impostas pelo n.º 3 do artigo 410.º do Código Civil; 36.ª - Sempre tal cláusula seria nula, pois que, “A admitir-se a validade da cláusula pela qual o promitente-comprador renuncia antecipadamente ao direito de arguir a nulidade, estaria aberta a porta para, com a maioria das facilidades, os promitentes vendedores incluírem nas promessas uma cláusula de estilo, em que as partes declarariam prescindir das formalidades impostas pelo artigo 410.º, n.º 3, renunciando à invocação da respectiva omissão e assim sabotar o...

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