Acórdão nº 809/1996.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 12 de Janeiro de 2010

Magistrado ResponsávelANTÓNIO DA COSTA FERNANDES
Data da Resolução12 de Janeiro de 2010
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 2ª Secção do Tribunal da Relação de Guimarães: I. Relatório: No âmbito do Proc.

nº 809/1996 (regulação do exercício do poder paternal), a tramitar no Tribunal de Família e Menores de Braga, 2ª Secção, o Ministério Público, em representação dos menores, R…., nascido a 19-07-1992, e J …, nascido a 18-06- -1994, requereu que o Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores (FGADM) passasse a abonar-lhes prestações de alimentos, em substituição do respectivo progenitor. Por despacho de 04-05-2009 (fls. 553 a 556), foi fixada em 100,00 € (cem euros) por mês, a prestação que o FGADM deveria abonar a favor de cada um dos in-dicados menores, montante a actualizar anualmente, em Janeiro, na mesma percenta- gem em que fossem aumentados os vencimentos no âmbito da função pública.

O Ministério Público requereu a aclaração do despacho, de modo a que se con- signasse se tais prestações deveriam ser abonadas a partir da data do requerimento em que foi solicitada a intervenção do FGADM (11-03-2009) ou se apenas a partir do mês seguinte à decisão do tribunal, tendo também recorrido do mesmo, propugnando para que se estabeleça que o exacto momento em que ficou constituída tal obrigação se fixa a partir da data em que foi deduzido o incidente.

Por despacho de fls. 583, foi decidido que as indicadas prestações eram devidas a partir da notificação da decisão ao Instituto de Gestão Financeira da Segurança.

O Ministério Público recorre desse despacho, tendo alegado e formulado as seguintes conclusões: 1ª No caso que nos ocupa, quem necessita de alimentos «está no fim da linha», são os «párias» que a egoística decadência de valores e a dura dinâmica económico- -social vão criando, são os mais carenciados dos carenciados, são os indefesos que são crianças! 2ª A intervenção do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores depen- de da existência de uma obrigação de alimentos judicialmente decretada, que não é satisfeita, nem se mostra possível satisfazê-la pela forma prevista no artigo 189º do Decreto-Lei nº 314/78, de 27 de Outubro, e do facto do alimentado não ter rendimento líquido superior ao salário mínimo nacional, nem beneficiar nessa medida de rendimen- tos de outrem a cuja guarda se encontre; 3ª A fixação daquela prestação alimentícia é feita atendendo às actuais condi- ções do menor e do seu agregado familiar, podendo ser diferente da anteriormente fixada; 4ª A criação do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores, gerido pelo Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, deveu-se ao elevado número de situações de incumprimento das prestações de alimentos devidos a menores; 5ª O referido Fundo de Garantia não visa substituir definitivamente uma obriga- ção legal de alimentos devida a menor, antes reveste natureza subsidiária, visto que é seu pressuposto legitimador a não realização coactiva da prestação alimentícia já fixa- da, através das formas previstas no artigo 189º da Organização Tutelar de Menores; 6ª Excluídas as prestações alimentícias vencidas e não pagas pela pessoa judi-cialmente obrigada, importa determinar o momento a partir do qual o Fundo se encon- tra obrigado, avançando-se, em regra, duas posições: a partir da data de entrada do requerimento para a intervenção do Fundo ou a partir da data da notificação da decisão judicial. Salvo melhor opinião, entendemos mais justo e consentâneo com o espírito da lei a tese que faz retroagir os efeitos da decisão de intervenção do Fundo à data de entrada do respectivo requerimento; 7ª O artigo 4º, nº 5, do Decreto-Lei nº 164/99, de 13 de Maio, que estabelece que o Centro Regional de Segurança Social inicia o pagamento das prestações, por conta do Fundo, no mês seguinte ao da notificação da decisão do tribunal, não baliza o momento em que nasce a obrigação do Fundo, apenas se reportando ao momento e que o C.R.S.S. está obrigado a cumprir a decisão do tribunal; 8ª A verificação dos pressupostos da intervenção do Fundo pode implicar uma demorada tramitação processual, não se compreendendo que o menor, durante esse lapso de tempo, que pode ser longo (como muitas outras vezes neste Tribunal de Família e Menores de Braga o é ...

) não beneficie da prestação alimentar; 9ª Tanto a Lei nº 75/98, de 19 de Novembro, como o Decreto-Lei nº 164/99, de 13 de Maio, são omissos sobre o momento a partir do qual as prestações alimentares são devidas; 10ª Verifica-se uma lacuna patente de lei, que exige a aplicação pela via da ana- logia do artigo 2006º do Código Civil, uma vez que procedem aqui as razões justifica- tivas da regulamentação prevista para os alimentos naquele dispositivo (que estabele- ce que os alimentos são devidos desde a data da propositura da acção); 11ª Assim, o momento em que as prestações se começam a vencer só pode ser, na melhor perspectiva, o definido no artigo 2006º do Código Civil, ou seja, a data de entrada da acção em juízo, que, neste caso, é a da entrada em juízo do requerimento para a intervenção do Fundo; 12ª Nos processos, como o presente, onde se regulam as responsabilidades pa-rentais, onde se processam os incidentes de incumprimento da prestação alimentícia e onde (por impossibilidade de se obter a cobrança desta através do mecanismo de incumprimento próprio p. no art. 189º da O.T.M.

) se processa o incidente, legal e logicamente subsequente, p. no art. 1º da Lei 75/98, de 19/XII, e no art. 3º, nº 1, do D.L.164/99, de 13 de Maio, vigora - por tudo isto ser jurisdição voluntária - o princípio da equidade; 13ª Chama-se juízo de equidade àquele em que o juiz resolve o caso que lhe é posto de acordo com um critério de justiça material, e, embora sem recurso linear a uma norma jurídica pré-estabelecida, dando, no entanto, uma solução que, no momen- to e segundo as circunstâncias concretas averiguadas, se afigura a mais justa ... e, não sendo fonte de Direito é critério de correcção do Direito; 14ª É, destarte, esta tese interpretativa que recorre à analogia com a disciplina prevista no art. 2006º do Cod. Civil a que mais se coaduna com o bom uso da equida-de; 15ª É, também, esta tese interpretativa que recorre à analogia com a disciplina prevista no art. 2006° do Cod. Civil a que mais se coaduna conformemente à Consti- tuição da República Portuguesa (artigos 1º, 24° e 69º da Lei Fundamental, onde se garantem o direito à sobrevivência e à dignidade dos menores), a qual não se compadece com a implícita interpretação que é feita pelo Tribunal, que se traduz, afinal, na recusa de um direito social constitucionalmente derivado; 16ª Interpretação diversa violaria, sempre, o disposto nos artigos 1º da Lei nº 75/98, de 19 de Novembro, 3° e 4º, nº 5, do Decreto-Lei nº 164/99, de 13 de Maio, 2006º do Código Civil, 401º, nº 1, do Código de Processo Civil, e 24º, nº 1, e 69º, nºs 1 e 2, da Constituição da República Portuguesa; 17ª Para além do dever primeiro de vinculação a...

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