Acórdão nº 83/06.0TMBRG.G1-A de Tribunal da Relação de Guimarães, 16 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelEVA ALMEIDA
Data da Resolução16 de Março de 2010
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I - RELATÓRIO

  1. O Digno Magistrado do Mº Pº em representação das menores B...... e C...... intentou acção de regulação do exercício do poder paternal contra D...... e E......, pais das menores.

    Nesta acção foi proferida sentença em 31.7.2007, regulando o exercício do poder paternal do seguinte modo: – As menores ficam á guarda e cuidados da mãe a quem cabe o exercício do poder paternal. O pai poderá visitar as menores sempre que quiser, sem prejuízo dos horários de descanso, alimentação e estudo, devendo avisar a mãe com antecedência. Não se fixa a prestação de alimentos a cargo do progenitor, pelas razões acima expostas, sem prejuízo de ulterior fixação.

    Na dita sentença refere-se que se desconhece se o Requerido exerce qualquer actividade e quais os seus rendimentos ou seja, não foi possível apurar tais elementos devido ao desconhecimento do seu paradeiro, pelo que “a fim de se obstar a violação do citado artº 2004º do Código Civil não se fixa a prestação de alimentos, sem prejuízo de ulterior fixação”.

    Esta sentença transitou em julgado, embora, por se tratar de um processo de jurisdição voluntária e atenta a especificidade do Lei Tutelar de Menores, a qualquer momento, o aí decidido, possa ser alterado.

  2. Em Março de 2009 a mãe das menores, E......, veio requerer, nos termos da Lei 75/98 de 19 de Novembro, que seja fixado o montante da prestação de alimentos (em valor não inferior a 3 UC, com pagamento retroactivo à data da entrada deste requerimento) que o Estado, em substituição do pai das menores, deverá satisfazer, uma vez que este nunca contribuiu, não se sabe onde se encontra, nem se lhe conhece bens ou rendimentos e a Requerente encontra-se desempregada, a frequentar um curso ministrado pelo Centro de Emprego, recebendo o equivalente ao SMN e, por isso, tem dificuldade em suportar sozinha todas as despesas próprias das menores.

    C) Este requerimento mereceu o seguinte despacho: – Atento o teor da decisão proferida e constante de fls. 86 a 91, transitada em julgado, indefere-se o requerido a fls. 125 a 129 por falta do pressuposto legal.

  3. O Ministério Público, notificado deste despacho em 23.6.2009, dele veio, em 3 de Julho de 2009, interpor recurso, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo.

  4. O recurso foi admitido, tal como requerido e o Mº Pº apresentou alegações em que formula as seguintes e extensas conclusões: 1.– Na sua decisão proferida em 03.05.2009 (ref. 783044 da versão electrónica do processo) dos presentes autos o Tribunal, constituindo-se num lapidar epítome de concisão – e pronunciando-se sobre a pretensão da progenitora E......, formulada em 06.03.2009 e vertido no Requerimento que suscitou o incidente do Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores p. nos artigos 1.º a 6.º da Lei 75/98 de 19.XI e nos artigos 1.º a 4.º do DL 164/99 de 13.V, constante de fls.125 a 134 destes autos – e em relação às menores B......(nascida a 22-12-1996) e C...... (nascida a 30-12-1997) decidiu tão-sómente que “…Atento o teor da decisão proferida e constante de fls. 86 a 91, transitada em julgado, indefere-se o requerido a fls. 125 a 129 por falta do pressuposto legal…” – sem deixar de modo algum fundamentado qual o pressuposto legal que falta….

    1. – Representando a decisão judicial a vontade da Lei, por subsunção a esta do caso concreto, não se alcança esse escopo sem fundamentação específica bastante e inteligível – por outro lado, tal falta de fundamentação não permite às partes afectadas pela decisão conhecer o seu acerto ou desacerto…designadamente para efeito de se convencerem da bondade da decisão ou para interposição de recurso sobre o mérito da mesma. 3.– Da decisão recorrida deveria constar – para além do elenco completo dos factos provados e da específica e inteligível indicação, interpretação e aplicação das normas jurídicas correspondentes, com a descrição de todo o raciocínio feito para chegar à conclusão lógica final (cfr. artigos 158.º, 659.º, nº 2 e 668.º, n.º 1, alíneas b), do Codº Procº Civil) – a indicação do tal pressuposto legal que alegadamente faltará à pretensão requerida e ali sumariamente denegada. 4.– Na sua decisão, a Meritíssima Juiz, por vinculação ao princípio da legalidade e da suficiência da decisão, não só tem de indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes, sob pena de se verificar uma falta de fundamentação de direito (neste sentido, o Parecer do Professor Calvão da Silva in Colectânea Jurídica, 1995, Tomo I, p. 7) como também – para esgotar e decidir todo o “thema decidendo” – tem de apreciar e pronunciar-se sobre todas as questões que tal “thema decidendo” explícita e implicitamente lhe impunham: na verdade, a Sentença vale o que valem os seus fundamentos. 5.– Na decisão em crise, só se alude, por remissão para o local dos autos onde foi exarada, uma outra decisão judicial…«Atento o teor da decisão proferida e constante de fls. 86 a 91, transitada em julgado…»…sem se especificar o segmento de tal «decisão proferida e constante de fls. 86 a 91» e sem se deixar exarada qualquer fundamentação fáctica especificada, nem se deixar exposta qualquer fundamentação de direito, nem se indicar quais as normas legais em que se funda a decisão recorrida, nem qual o sentido em que o Tribunal recorrido as haja interpretado. 6.– Destarte, face à insuficiência da decisão e à evidente falta total de fundamentação e falta de pronúncia sobre todas as questões que o “thema decidendo” explícita e implicitamente impunham, a decisão recorrida viola os imperativos constitucional do artigo 205.º, da C.R.P. e legais dos artigos 659.º, n.º 1; 712.º, n.º 1, alínea b); 659.º, n.º 2 e 668.º, n.º 1, alínea b) e d), todos do Código de Processo Civil, e é Nula. 7.– Por outra parte e acautelando o eventual não acolhimento da vislumbrada Nulidade, adianta-se, desde já, não poder o Ministério Público (até pela natureza dos interesses cuja representação e defesa lhe estão estatutariamente confiados), concordar com a aparente indefinição assim perfilhada pelo Tribunal recorrido e com o implícito vencimento da tese de que a falta de fixação na Sentença judicial de fls. 86 a 91 (proferida a 31.07.2007 e transitada em julgado) do “quantum” da prestação alimentícia mensal obrigando o progenitor não guardião dos menores implicará, linearmente, a inaplicabilidade dos procedimentos instrutórios e decisórios previstos nos artigos 1.º a 6.º da Lei 75/98 de 19.XI e nos artigos 1.º a 4.º do DL 164/99 de 13.V …ou seja a inaplicabilidade da garantia alimentícia do Estado através do Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores. 8. – É verdade que o artigo 1.° da Lei n.º 75/98, de 19 de Novembro, sob a epígrafe «Garantia de alimentos devidos a menores», dispõe que «Quando a pessoa judicialmente obrigada a prestar alimentos a menor residente em território nacional não satisfizer as quantias em dívida pelas formas previstas no artigo 189.° do Decreto-Lei n.º 314/78, de 27 de Outubro, e o alimentado não tenha rendimento líquido superior ao salário mínimo nacional nem beneficie nessa medida de rendimentos de outrem a cuja guarda se encontre, o Estado assegura as prestações previstas na presente lei até ao início do efectivo cumprimento da obrigação.» 9. – É verdade também que, por seu turno, o artigo 2004º, nº 1, CC, estabelece uma correlação entra as necessidades e as possibilidades, pressupondo o conhecimento dos dois termos da equação: necessidades do alimentando e possibilidades do obrigado...

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