Acórdão nº 880/08.1TBGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 09 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelA. COSTA FERNANDES
Data da Resolução09 de Março de 2010
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Apelação nº 880/08.1TBGMR.G1 (Proc. nº 880/08.1TBGMR – T J de Guimarães, 4º Juízo Cível) Acordam na 2ª Secção do Tribunal da Relação de Guimarães: I. Relatório: [A], contribuinte fiscal nº ....., residente na Rua ......., Santa Maria da Feira, propôs a presente acção declarativa, com processo comum, na forma sumária, contra: [B] – Companhia de Seguros, S. A.

, pessoa colectiva nº ............, com sede na Rua ....., Porto, Peticionando a condenação da ré a pagar-lhe a quantia global de 9.518,52 €, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação e até efectivo cumpri- mento.

Para tanto, alegou, em síntese, que: - No dia 15-06-2005, deu-se um embate entre o veículo de matrícula SD-08-87, de que era proprietário, então conduzido por [C], e a viatura de matrícula 33-24-EZ, pertencente a [D], na altura con-duzida por [E]; - Esta última, saindo de um estacionamento, entrou na estrada sem respeitar o trânsito que aí circulava, atravessando o veículo que conduzia na frente da viatura SD; - Em consequência do embate, a viatura SD sofreu danificações, cuja reparação importou em 5.232,52 €; - Despendeu 200,00 € no transporte do veículo sinistrado para a oficina onde foi reparado; - A viatura SD esteve imobilizada, entre 15-06-2005 e 25-09-2005, período du-rante o qual ficou privado de a utilizar na sua actividade profissional e pessoal; - A ré havia assumido, por via de contrato de seguro, a obrigação de indemnizar terceiros de eventuais prejuízos decorrentes da circulação do veículo EZ.

A ré contestou, impugnando, em parte, a factualidade alegada pelo autor, e sustentando, em súmula, que: - O veículo SD era, na altura, conduzido por um terceiro, sobre ordens do autor e ao seu serviço profissional; - O valor venal da viatura SD era, à data, de apenas 700,00 €, valendo os salvados 100,00 €, pelo que a reparação era injustificável e excessivamente onerosa.

*** Por sentença de fls. 135 a 154, a acção foi julgada parcialmente procedente, tendo a ré sido condenada a pagar ao autor o montante de 7.932,52 €, acrescido de juros de mora, à taxa de 4% ao ano, desde a citação e até integral cumprimento.

*** A ré recorreu, pretendendo a revogação da sentença e a sua absolvição do pe-dido, ou, se assim se não entender, a redução do valor da condenação, tendo alegado e retirado as seguintes conclusões: 1ª Atentos os depoimentos das testemunhas [C] e [E], não poderiam ter sido dados como prova- dos os factos constantes dos quesitos 6º, 7º, 8º e 9º da base instrutória, antes se im-pondo que os mesmos fossem dados como não provados, ou, pelo menos, mereces- sem uma resposta restritiva; 2ª Com efeito, se o condutor do SD, como foi por ele afirmado, avistou a mano- bra do EZ, quando ainda vinha na recta em sentido ascendente, é patente que, se ti- vesse agido com perícia e atenção e circulasse a uma velocidade adequada, teria con-seguido evitar o acidente, bastando para tal que travasse ou abrandasse, o que não fez; 3ª O condutor do SD agiu, pois, com falta de cuidado e atenção, pelo que teve também responsabilidade na ocorrência do acidente dos autos; 4ª Acresce que o referido [C] “conduzia o SD sob as ordens e ao serviço do autor, no uso profissional daquele veículo” [cfr. alínea E) dos factos assentes], pelo que sobre ele impendia a presunção de culpa nos termos do disposto no artigo 503º, nº 3, do Código Civil; 5ª O condutor do SD não provou que não houve culpa da sua parte, o que, nos termos da supracitada disposição legal, implica a não ilisão da presunção e a conse- quente responsabilização do condutor do SD pela produção do acidente; 6ª Pela aplicação da regra do artigo 566º, nº 1, do Código Civil, deveria ter sido atribuída ao autor a quantia equivalente ao valor do veículo acrescida do valor dos salvados, isto é, a quantia de 700,00 € (600,00 € + 100,00 €); 7ª Recebendo a quantia equivalente ao valor de mercado do seu veículo, é óbvio que o autor poderia adquirir outro com as mesmas características por esse valor (que era o seu valor de mercado), bastando para isso que o procurasse; 8ª Ao contrário do que afirma o Mmº Juiz a quo, o que se verificaria com a aplicação da decisão recorrida seria o enriquecimento do lesado à custa do lesante; 9ª Com efeito, aquele era possuidor de um bem cujo valor de mercado era de 700,00 € e que passou a incorporar peças e mão-de-obra (isto é, o valor da reparação) no montante de 5.232,52 €; 10ª Ou seja, em virtude do acidente, o recorrido viu o valor do seu veículo aumentar seis vezes, enriquecendo-se nessa medida à custa da recorrente, obten- do assim uma vantagem ilegítima e injustificável, pois, como se disse, poderia adquirir um veículo semelhante, no mercado, pelo seu valor à data do acidente; 11ª É manifestamente exagerada, infundada e desprovida de equidade a quantia arbitrada a título de privação do uso do veículo e "transtornos causados pelo acidente", como se conclui do facto de o valor atribuído ser 3 vezes superior ao valor venal do veículo; 12ª A douta sentença recorrida violou as disposições dos artigos 500º, nº 1, 503º, nº 3, 505º, 562º, 563º, 566º, nº 1, e 570º, nº 2, todos do Código Civil.

*** O recorrido não contra-alegou.

*** O recurso foi admitido como apelação, com efeito devolutivo.

*** Cumpre apreciar e decidir: II. Questões a equacionar: O âmbito dos recursos é balizado pelas conclusões apresentadas pelos recor-rentes, importando apreciar as questões que delas fluem, a não ser que outras se per- filem de conhecimento oficioso - arts. 684º, 2 e 3, 684º-A, 1 e 2, 685º-A, 1 e 2, e 660º, 2, parte final, do Código de Processo Civil. Assim, «in casu», há equacionar as seguin- tes: - A impugnação da decisão de facto; - A culpa pela ocorrência do sinistro; - A excessiva onerosidade da reparação do veículo; - A indemnização pela privação do uso do veículo.

*** III. Fundamentação:A) Da impugnação da decisão de facto: De harmonia com o disposto no art. 712º, 1, a), do Cód. Proc. Civil, a decisão do tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação, se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do art. 685º-B, a decisão com base neles proferida.

In casu

, houve gravação dos depoimentos e ré pretende impugnar a decisão de facto.

Por seu turno, o mencionado art. 685º-B, 1, exige que o recorrente especifique: a) Quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julga- dos; b) Quais os concretos meios de probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.

Quanto à mencionada alínea a), temos que a ré entende que foi incorrecta- mente julgada a factualidade a que se reportam os quesitos 6, 7, 8 e 9 da base instru-tória.

No que respeita à alínea b), reportou-se aos depoimentos das testemunhas [C] e [E].

A ré cumpriu o disposto no mencionado art. 685º-B, 2.

No que concerne à matéria de facto, a ré pretende convencer de que o condutor do veículo SD se apercebeu da manobra da tripulante da viatura EZ, a tempo e em condições de evitar o sinistro, se tivesse agido com perícia e atenção e circulasse a uma velocidade adequada, bastando para tal que travasse ou reduzisse a velocidade.

No quesito 6º, reportando-se ao condutor da viatura SD-08-87, perguntava-se: Ao descrever uma curva na referida E. N. 310, deparou-se com o veículo com a matrí- cula 33-24-EZ? No quesito 7º, perguntava-se: O qual saía de um estacionamento do seu lado direito? No quesito 8º, perguntava-se: E atravessou-se na sua frente? No quesito 9º, perguntava-se: Tendo entrado na estrada em que o SD circulava? Os indicados quesitos foram considerados provados. A ré entende que devem ser considerados não provados.

Ouvidos os registos magnéticos atinentes aos depoimentos das testemunhas, temos que: - A testemunha [C], condutor do veículo SD, referiu que: trabalhou por conta do autor, porquanto, a certa altura, este se associou ao seu patrão, tendo acabado o contrato de trabalho de relações cortadas com ele (autor); quando circulava na estrada em que ocorreu o sinistro, no sentido Serzedelo / Riba de Ave, numa «recta a subir», avistou a viatura EZ estacionada (em contra-mão) na ber- ma, do seu lado direito, no ponto em que a via descreve uma curva à esquerda; con-venceu-se de que a respectiva condutora pretendia fazer inversão do sentido de...

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