Acórdão nº 303/08.6TMBRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02 de Fevereiro de 2010

Data02 Fevereiro 2010

Processo n.º 303/08.6TMBRG.G1 Relator: Desembargador António Figueiredo de Almeida 1.ª Adjunta: Desembargadora Maria Rosa Tching 2.º Adjunto: Desembargador Joaquim Espinheira Baltar Apelação 2.ª Secção Cível Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO

  1. O Ministério Público, em representação da menor [A] veio intentar Acção de Regulação do Exercício do Poder Paternal contra [B] e [C], onde conclui pedindo se regule o exercício do poder paternal, relativamente à menor.

    Foi proferida sentença onde foi decidido regular o exercício do poder paternal da menor [A], nos termos seguintes: 1 - A menor [A] fica à guarda e cuidados da mãe [B], cabendo o exercício do poder paternal a ambos os progenitores; 2 - O pai poderá visitar a menor sempre que quiser, sem prejuízo dos horários de descanso, de alimentação e de estudo, devendo avisar a mãe com antecedência; 3 – Não se fixa prestação de alimentos a cargo do progenitor, sem prejuízo de ulterior fixação.

  2. O Ministério Público, não se conformando com a decisão dela veio interpor o presente recurso onde apresenta as seguintes conclusões: 1) Os processos tutelares cíveis são processos de jurisdição voluntária, nos termos previstos no artigo 150.º da Organização Tutelar de Menores e artigos 1049.º e ss. do Código de Processo Civil; 2) Neste tipo de processos, o legislador consagrou uma entorse ao princípio do dispositivo, consagrada no artigo 1409.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, pelo que a actividade do tribunal não sofre qualquer restrição, quer quanto ao apuramento dos factos trazidos ao processo, quer relativamente à investigação de outros factos que tenham interesse para a decisão, assistindo ao Juiz um poder-dever de praticar as diligências necessárias à descoberta da verdade material; 3) Face aos critérios legais para a fixação dos alimentos constantes do artigo 2004.º do Código Civil, onde se manda atender às possibilidades do alimentante, constitui facto essencial para a regulação do exercício das responsabilidades parentais o apuramento das condições económicas do alimentante; 4) No caso, não existe nos autos prova da concreta situação económica do requerido, o que se ficou a dever não a uma impossibilidade de produção de prova, nomeadamente, pelo desconhecimento do paradeiro do requerido, mas porque a Mm.ª Juíza a quo não desenvolveu a actividade investigatória que lhe incumbia, nomeadamente, não efectuou qualquer adicional investigação sobre a comprovada intermitente e “informal” actividade profissional do pai da menor; 5) Ora, ao não ter efectuado tais indagações mais aprofundadas com vista a esclarecer cabalmente a situação económica deste progenitor, a Mm.ª Juíza a quo omitiu a prática de actos essenciais à boa decisão da causa, o que constitui nulidade, nos termos do artigo 201.º n.º 1 do CPC, pelo que deverá determinar-se a anulação da sentença na parte relativa aos alimentos, ordenando-se a efectivação de tais indagações, entre outras diligências que venham a mostrar-se pertinentes; 6) Ademais a Mm.ª Juiz a quo fez uma errada interpretação dos artigos 1987.º e 2004.º do Código Civil, a qual é ainda desconforme com o artigo 36.º n.º 5 da Constituição da República Portuguesa; 7) De facto, ainda que não se tivesse apurado com exactidão o montante dos rendimentos do requerido, sempre haveria de ter sido fixada uma pensão de alimentos a pagar por este à menor sua filha, uma vez que compete, moral e originariamente aos pais, prover ao sustento dos filhos, nos termos também solenemente garantidos pelos artigos 36.º n.º 5 da Constituição da República Portuguesa e pelos artigos 1878.º n.º 1 e 1879.º, ambos do Código Civil; 8) Tal dever de alimentar e sustentar os filhos “é atinente a princípios de Direito Natural, assume uma enorme magnitude e é eivado, inclusive, por laivos de cariz ético-moral, só se podendo o devedor a ele eximir em circunstâncias especialíssimas e extremas” [Acórdão da Relação de Lisboa de 19/06/2007, processo n.º 4823/2007-1, disponível para consulta in www.dgsi.pt] ]: circunstâncias especialíssimas e extremas que, no caso, não se verificam, pois o progenitor não só não está impedido de trabalhar e angariar quer o seu sustento quer o sustento de sua filha como, efectivamente, trabalha e disso come e disso se veste e calça e vive… 9) Já existe nos autos alguma prova das condições económicas do requerido e da sua intermitente e “informal” actividade profissional, constando expressamente que o progenitor da menor «descontou para a Segurança Social desde 1987 até Setembro de 2007, com poucas e breves interrupções» e que «Desde então vai conseguindo apenas alguns trabalhos incertos e pontuais» e também que «Nunca pediu nem recebeu subsídio de desemprego ou qualquer outro apoio económico estatal» - tal como resulta “dos relatórios sociais de fls. 44 a 55” mormente a fls.

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    10) Ditam as regras da experiência comum e do bom senso que, quem «Nunca pediu nem recebeu subsídio de desemprego ou qualquer outro apoio económico estatal», o faz, normalmente, porque tem uma situação económica melhor do que aqueles a quem a Segurança Social, depois de investigar a respectiva situação sócio-económica, concede subsídios de carácter social que lhes permitam um mínimo de sobrevivência, nomeadamente para comer e dar de comer aos seus filhos… .

    11) Face a tal, é legítimo que se conclua, sem prejuízo de se vir a apurar a concreta situação do requerido, no caso de ser julgada procedente a arguida nulidade, que o rendimento mensal presente do requerido se situa à volta do actual Salário Mínimo Nacional (que actualmente monta em €450,00, ex vi D.L. n.º 246/2008 de 18 de Dezembro) como referencial médio de quem, mesmo intermitentemente, labuta e, até, nem arrosta com os encargos das contribuições para a Segurança Social… 12) A este respeito, vem entendendo maioritariamente a jurisprudência que, mesmo no caso de não ser apurada a situação económico-financeira do progenitor, sempre o julgador deve fixar na sentença uma prestação alimentícia a favor do menor, em função de critérios gerais objectivos quanto ao custo de vida e aos rendimentos médios da sociedade portuguesa e perante a demonstração das necessidades do menor [cfr. o Acórdão da Relação de Lisboa de 19/06/2007 já supra referido].

    13) Do que decorre que, contrariamente ao que se decidiu na sentença em recurso, o requerido dispõe de condições que lhe permitam pagar uma pensão de alimentos àquela sua filha.

    14) Assim, quanto ao quantitativo da prestação alimentícia, a expressão alimentos abrange não só aquilo que é indispensável à sobrevivência dos menores (sustento, habitação, vestuário, instrução e educação do menor – cfr. artigo 2003.º, do Código Civil), mas também o que o menor precisa para usufruir de uma vida de acordo com as suas aptidões, estado de saúde e idade com vista ao seu adequado desenvolvimento físico, intelectual e emocional.

    15) Atendendo às despesas de alimentação, vestuário, saúde e educação normais para a idade desta menor, julgamos que a pensão deverá fixar-se em €120,00 (Cento e Vinte Euros), atentas, também as suas especiais necessidades e despesas com os cuidados de saúde…pois ficou provado que a mesma menor «…sofre de graves problemas de saúde que implicam forte desgaste emocional, disponibilidade de tempo e despesas elevadas»).

    16) Ao mesmo tempo, imporá a prudência e o bom-senso que se estipule um adicional mecanismo realmente equitativo que acautele uma adequada actualização da referida prestação alimentícia, actualização essa que seja, por um lado, compatível com o panorama de crise sócio-económica reinante e, por outra banda, esteja à altura do reconhecível abrandamento da inflação e do custo de vida mas sempre consonante com as reais e sempre crescentes necessidades com a alimentação, vestuário, cuidados de saúde e despesas de educação que a mesma menor demanda nas fases sucessivas da infância, adolescência e juventude até à maioridade, necessidades essas que são sempre superiores àquelas dos adultos e se não compadecem com estritos calculismos e...

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