Acórdão nº 176/19.3T9ALR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 24 de Janeiro de 2023
Magistrado Responsável | ANA BACELAR |
Data da Resolução | 24 de Janeiro de 2023 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação do Évora I.
RELATÓRIO No processo comum n.º 176/19.3T9ALR do Juízo de Competência Genérica de ... da Comarca de ..., o Ministério Público acusou AA, divorciado, nascido a .../.../1968, em ..., filho de BB e de CC, residente na Rua ..., em ..., pela prática, sob a forma consumada, de um crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, previsto e punível pelo artigo 107.º, n.ºs 1 e 2, por referência ao artigo 105.º, n.º 5 do Regime Geral das Infrações Tributárias.
O Instituto de Segurança Social, IP, Centro Distrital de Segurança Social de Santarém, devidamente identificado nos autos, pediu a condenação do Arguido a pagar-lhe «a quantia de 58.506,52 € (cinquenta e oito mil, quinhentos e seis euros e cinquenta e dois cêntimos) a título de prejuízos patrimoniais e ainda a quantia de 14.609,91 € (catorze mil, seiscentos e nove euros e noventa cêntimos) referente a juros de mora, bem como os juros que se vierem a vencer.» O Arguido apresentou contestação escrita, onde impugna os factos constantes dos pontos 4 a 11 da acusação, por não ter procedido ao pagamento dos salários nos termos declarados nas folhas de remuneração e porque não se apropriou dos descontos das retribuições que declarou, nem os afetou a qualquer outro fim. Alega, para tanto, não ter procedido ao pagamento atempado dos salários aos trabalhadores, pelas graves dificuldades económicas que, então, atravessava.
Invoca, ainda, que a imputação do crime na forma agravada viola o disposto no n.º 5 do artigo 107.º do Regime Geral das Infrações Tributárias, por o valor apurado na acusação resultar, tão-só, da soma aritmética de todos os períodos de quotização pretensamente em falta.
Afirma, também, a nulidade da acusação decorrente da indicação incorreta das disposições legais aplicáveis e a prescrição referentes a julho de 2015.
Por fim, invoca a inadmissibilidade do pedido de indemnização civil, por litispendência com processos de execução fiscal e por falta de indicação dos danos efetivamente suportados.
Realizado o julgamento, perante Tribunal Singular, por sentença proferida depositada em 9 de dezembro de 2021, foi decidido: «(…) julgar a acusação procedente, por provada e, em consequência: a) Condenar o arguido AA, pela prática, em autoria material e na forma consumada de um crime de abuso de confiança contra a segurança social, qualificado, na forma consumada, na pena de 1 ano de prisão, substituída por 365 dias de multa à taxa diária de 6,00€; b) condenar o arguido a pagar à Instituto da Segurança Social, I.P. a quantia de 58.506,52€, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal, desde a notificação até integral e efetivo pagamento.
-
mais se condena o arguido no pagamento da taxa de justiça, que se fixa em 4 UC, tendo em conta a complexidade da causa (artigos 513.º, do C.P.P., e artigo 8.º, n.º 5, do Regulamento das Custas Processuais.
Inconformado com tal decisão, o Arguido dela interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões [transcrição]: «I- O presente recurso visa a impugnação da sentença tomada pelo Tribunal a quo, que condenou de forma ilegal o ora recorrente pelo cometimento de um crime de abuso de confiança perante a segurança social, na forma agravada.
II- O artigo 5.º do despacho de acusação apresenta um quadro com pretensas quotizações retidas que não permitem uma imputação de conduta agravada, muito menos uma condenação.
III- Não foram alvo de apreciação judicial os argumentos expostos em Contestação a partir do artigo 19.º, onde se diz que a imputação é ilegal por resultar de uma soma aritmética de todos os períodos alegadamente em falta.
IV- Ao estar em causa remissão para o n.º 5 do artigo 105.º do RGIT, não poderia deixar de ser lido o n.º 7 desse mesmo artigo 105.º, uma vez que de forma clara, o artigo 107.º, n.º 2 RGIT também para ele remete, sendo clara a norma quanto aos valores a considerar.
V- No quadro da acusação observam-se 15 períodos contributivos diferentes, o que significa 15 declarações a apresentar, sendo que o montante mais elevado é o de maio de 2018, no montante de 1.982,00€.
VI- O Tribunal a quo decidiu mal e analisou erradamente os argumentos da defesa já que em sede de fundamentação fala de pressupostos que a defesa não carreou, deixando de pronunciar sobre os que verdadeiramente contam.
VII- A defesa do arguido não referiu que o artigo 105.º n.º 1 seria aplicável ao previsto no artigo 107 n.º 1 RGIT por via da fasquia dos 7.500€, o que a defesa explanou a partir de 19.º da Contestação foi a ilegalidade da imputação agravada em face dos factos, o que é bem diverso.
VIII- Foi suscitado acórdão do STJ, processo 106/01.9IDPRT, que diz, “: “A remissão para o n.º 5 não é apenas para a pena; pois aquela pena mais agravada só faz sentido, só se justifica, só se equacionará a sua aplicação, se o valor da não entrega de uma determinada declaração (de cada declaração nos termos do n.º 7) for superior a 50.000€.” IX- Pelo que há falta de mérito da acusação e da douta sentença que a esta aderiu, devendo ser decretada a absolvição do arguido, pois não cometeu o ilícito pelo qual foi condenado.
X- A acusação estabeleceu a dialética subsequente e os factos permaneceram imutáveis até à prolação da sentença, pelo que estando esses factos errados assim como o juízo de condenação por via de errada apreciação da prova, deverá haver lugar, à absolvição do arguido.
XI- Por outro lado, o Tribunal a quo consagrou como assentes o facto 6 e o facto 8, também á luz de uma errada apreciação da prova, pois a produzida, imporia decisão diversa.
XII-O arguido não pagou os salários aos trabalhadores (facto 6) como configurado na acusação, tendo-se produzido prova em sentido contrário, não tendo identicamente apropriado e integrado no seu património quantias que devesse entregar ao Estado (facto 8).
...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO